Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 06/03/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004336-71.2008.4.03.6103/SP
2008.61.03.004336-0/SP
RELATORA : Juíza Federal Convocada TÂNIA MARANGONI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MAURICEIA DA SILVA
ADVOGADO : ROGERIO OGNIBENE CELESTINO e outro
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00043367120084036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

EMENTA

PENAL - PROCESSO PENAL - ART. 2º, I, DA LEI 8137/90 - CRIME FORMAL - INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 24 DO STF - APLICABILIDADE DO ART. 156 CPP - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PENA BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSOS IMPROVIDOS.
1 - O crime imputado à ré é aquele previsto no artigo 2º, I, da Lei 8137/90 que consistem em "fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo". Trata-se de crime formal que não se confunde com aquele previsto no artigo 1º, I, do mesmo diploma legal, razão pela qual não se aplica o Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe : "Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8137/90, antes do lançamento definitivo do tributo"
2 - Incontroverso que a ré prestou declaração falsa à Receita Federal, apresentando declarações retificadoras do imposto de renda dos anos anteriores de vários contribuintes que procuravam seus serviços, alterando o campo do "imposto retido na fonte" para constar valores não condizentes com a realidade, gerando, assim, imposto a restituir para os contribuintes e vantagem para si própria, na medida em que recebia dos clientes percentual sobre o valor a ser restituído.
3 - Não restou comprovado pela defesa que a testemunha de acusação Sidnei Sanches Santana teria exercido coação sobre a ré, ônus que, nos moldes do artigo 156 do Código de Processo Penal, cabia à defesa. Alegações genéricas, desprovidas de prova, não são aptas ao reconhecimento da causa excludente de culpabilidade invocada.
4 - Tratando-se de crime formal, que se consuma sem que haja o efetivo prejuízo aos cofres públicos, seria incongruente se falar na extinção da punibilidade pelo integral pagamento do tributo, uma vez que "só há que se falar em aplicabilidade do inciso I do artigo 2º da Lei 8.137/90 quando se tratar de conduta que não chegou a causar prejuízo aos cofres públicos, ou seja, quando a apuração fiscal identificou a omissão ou a declaração falsa sem a ocorrência do dano - ainda que difuso - ao Tesouro Nacional."(ACR 200461810059480, JUIZA RAMZA TARTUCE, TRF3 - QUINTA TURMA, DJF3 CJ2 DATA:03/03/2009 PÁGINA: 510.)
5 - Não há que se falar em aumento da pena-base, dado que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis à ré, ao contrário do que argumenta a Acusação.
6 - É incontroverso que as declarações falsas prestadas pela ré, retificando declarações de imposto de renda de contribuintes que procuravam seus serviços, geraria para esses contribuintes imposto a restituir. Incontroversa, ainda, a obtenção de vantagem pela ré consistente no recebimento de numerário incidente sobre o valor a ser restituído aos contribuintes. O que não se demonstrou, no entanto, é que a ré tenha induzido a erro os contribuintes - seus clientes - havendo nos autos apenas indícios de que eles teriam sido enganados pela ré e não teriam conhecimento da conduta perpetrada pela ré, consistente na falsidade das declarações.
7 - Recursos improvidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos recursos interpostos pela Acusação e Defesa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de fevereiro de 2013.
TÂNIA MARANGONI
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004336-71.2008.4.03.6103/SP
2008.61.03.004336-0/SP
RELATORA : Juíza Federal Convocada TÂNIA MARANGONI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MAURICEIA DA SILVA
ADVOGADO : ROGERIO OGNIBENE CELESTINO e outro
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00043367120084036103 3 Vr SAO JOSE DOS CAMPOS/SP

RELATÓRIO


Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas por MAURICÉIA DA SILVA e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra sentença proferida pela MM. Juíza Federal da 3ª Vara Federal de São José dos Campos-SP, que julgou parcialmente procedente o pedido contido na denúncia em relação à acusada MAURICÉIA DA SILVA, condenando-a nos termos do artigo 2º, inciso I, da Lei 8.137/90, c.c. o artigo 71, ambos do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 09 (nove) meses de detenção, em regime aberto, além do pagamento de 15 (quinze) dias-multa, cada dia-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, com substituição da pena privativa de liberdade aplicada por uma pena restritiva de direitos.

Consta da denúncia que a ré, na qualidade de contadora contratada por Sidnei Sanches Santana, Alexandre da Silva Brito e Mario Celso Correa, sob a promessa de obtenção de 'resíduos de impostos a restituir', apresentou declarações originais e retificadores de Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF à Receita Federal, por 24 vezes, entre os meses de março e julho de 2008, contendo informações falsas.

De acordo com a inicial acusatória, tal fraude foi constatada por meio de informações prestadas pelas vítimas/contribuintes à Polícia Federal, por terem caído na 'malha fina' em decorrência das fraudes realizadas pela ré, que adulterava ou inseria valores maiores do que o correto no campo 'imposto de renda retido na fonte', resultando em créditos a serem restituídos ou redução do IRPF a pagar.

Relata que foi determinada busca e apreensão na residência da ré, acarretando a apreensão de diversos documentos e equipamentos de microinformática, que foram objeto de perícia técnica, cujo laudo foi juntado às fls. 296/326.

Narra, ainda, a denúncia que a conduta desenvolvida pela ré também encontra tipificação no crime de estelionato, na forma tentada, tendo em vista que a ré induziu seus clientes a erro, mediante fraude, visando obter vantagem ilícita, que não se consumou por circunstâncias alheias a sua vontade (fls. 231/240).

O recebimento da denúncia se deu em 28 de agosto de 2009 (fls. 398/403).

A ré foi citada (fl. 254), apresentando defesa preliminar às fls. 258/264, momento em que arrolou testemunhas.

O Ministério Público Federal manifestou-se sobre a peça apresentada pela defesa (fls. 286/290), após o que foi afastada pelo Juízo a hipótese de absolvição sumária.

As testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa foram ouvidas às fls. 357/364.

A ré foi interrogada às fls. 375-377.

Em alegações finais, o Ministério Público Federal requereu a condenação da ré (fls. 379/384), ao passo que a defesa se bateu pela sua absolvição (fls. 387/396).


A sentença condenatória foi proferida às fls. 398/403 e publicada em 09 de março de 2011 (fls. 404).

O Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação, fls.416/420 , aduzindo que:

- a pena-base deve ser fixada em montante maior do que foi na sentença recorrida, uma vez que a acusada não ingressou na empreitada criminosa por apenas uma vez, mas aderiu à conduta proibida como forma de vida, ludibriando seus clientes, induzindo-as a erro visando a obtenção de lucro e também fornecendo informações falsas `as autoridades, o que causa um grande mal à sociedade;

- estão reunidos todos os elementos necessários às configuração do estelionato, quais sejam, a obtenção de vantagem ilícita, na forma tentada, haja vista que cobraria um percentual sobre as restituições indevidas; o induzimento dos contribuintes em erro, que acreditavam na legalidade dos atos praticados pela sentenciada; e o prejuízo que os contribuintes suportaram ao devolver os valores restituídos acrescidos de multa.


A defesa também interpôs recurso de apelação (fls. 427/434), argumentando que:

-muito embora a apelante tenha cometido a prática delitiva em sua forma continuada, tais delitos foram cometidos por imposição de Sidney Sanches Santana e sob a orientação deste, o que restou comprovado por ocasião de seu interrogatório;


- as vítimas estão honrando os pagamentos do que devido à Receita Federal em virtude da Declaração incorreta via parcelamento, o que dá ensejo à aplicação do artigo 34 da Lei 9.249/95;


Com contrarrazões (fls. 435/438 e 440/441v), vieram os autos a esta E. Corte, onde o parecer ministerial foi pelo não provimento do recurso de apelação interposto pela defesa; e pelo provimento parcial do recurso interposto pelo órgão ministerial (fls. 446/449v), para que a ré fosse condenada também nas penas do crime de estelionato.

À revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.


TÂNIA MARANGONI
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004336-71.2008.4.03.6103/SP
2008.61.03.004336-0/SP
RELATORA : Juíza Federal Convocada TÂNIA MARANGONI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MAURICEIA DA SILVA
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VOTO


O crime imputado à ré é aquele previsto no artigo 2º, I, da Lei 8137/90 que consistem em "fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo". A pena prevista é de 6 (seis) meses a 2(dois) anos, e multa.

Trata-se de crime formal que não se confunde com aquele previsto no artigo 1º, I, do mesmo diploma legal, razão pela qual não se aplica o Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe : "Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8137/90, antes do lançamento definitivo do tributo"

A propósito da natureza formal do delito imputado à ré, confira-se decisão proferida pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL :

"Embargos de declaração. Efeitos infringentes. Admissibilidade excepcional. Necessidade de intimação da parte embargada para contra-razões. Art. 2º, inc I, da Lei 8137/90. Crime formal. Desnecessidade de conclusão do procedimento administrativo para a persecução penal. Visando os embargos declaratórios à modificação do provimento embargado, impõe-se, considerado o devido processo legal e a ampla defesa, a ciência da parte contrária para, querendo, apresentar contra-razões. O tipo penal previsto no artigo 2º, inc. I, da Lei 8.137/90, é crime formal e, portanto, independe da consumação do resultado naturalístico correspondente à auferição de vantagem ilícita em desfavor do Fisco, bastando a omissão de informações ou a prestação de declaração falsa, não demandando a efetiva percepção material do ardil aplicado. Dispensável, por conseguinte, a conclusão de procedimento administrativo para configurar a justa causa legitimadora da persecução. Embargos declaratórios providos." (RHC 90532 ED, Relator Ministro JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 23/09/2009, DJE de 6.11.2009; grifei);

No mesmo sentido a decisão proferida pelo TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL da 3ª REGIÃO nos autos da ACR 200461810059480, Relatora Des. Federal RAMZA TARTUCE, cuja ementa é a seguinte:

"PENAL - PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGO 1º, INCISO I e II, DA LEI 8.137/90) - PRESCRIÇÃO INOCORRENTE - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE INDEFERIDA - DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA A FIGURA DO INCISO I DO ARTIGO 2º DA LEI 8.137/90 - IMPOSSIBILIDADE - PRELIMINAR REJEITADA - MÉRITO - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS SOBEJAMENTE COMPROVADAS - PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO - NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - INOCORRÊNCIA - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS - PENA-BASE MANTIDA UM POUCO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - RECONHECIMENTO DA OCORRÊNCIA DA CONTINUIDADE DELITIVA (ARTIGO 71 DO CPB) - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA DE MULTA - LEI 4.729/65 - DERROGADA - INAPLICABILIDADE - CONDENAÇÃO MANTIDA - SENTENÇA CONDENATÓRIA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. A jurisprudência tem entendido que os delitos previstos nos incisos I e II do artigo 1º da Lei n.º 8.137/90 são crimes materiais, ou seja, consumam-se com o resultado naturalístico. 2. Desse modo, não há que se falar em prescrição em relação às omissões das receitas auferidas pela empresa ENTERPRISE referentes aos anos calendários de 1992 a 1995, como sustenta a defesa. Tais receitas foram declaradas no ano de 1997, tanto em relação aos anos-base de 1992 e 1993 (fls. 23 e 27), quanto aos de 1994 e 1995 (fls. 18 e 19) e foi em 1997 que o Fisco Federal sofreu, de fato, o prejuízo. No ano de 1997 é que a arrecadação foi fraudulentamente reduzida, advindo, nessa ocasião, o prejuízo ao erário público, que representa o resultado naturalístico dos delitos em tela. 3. Considerando a pena concretamente aplicada ao apelante e sem computar a sua exacerbação em razão do concurso material aplicado pelo Juízo sentenciante ou mesmo em razão da continuidade delitiva pretendida pela defesa no presente apelo, que não é levada em conta para a contagem do prazo prescricional, observo que não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal, na espécie. É que a pena cristalizada na sentença, com a observação acima aludida, ou seja, 02 anos e 6 meses de reclusão, prescreve em 08 anos, a teor do artigo 109, inciso IV do Código Penal. 4. Portanto, não tendo decorrido mais de 08 (oito) anos entre a data da consumação das condutas delituosas (19.08.97 e 05.09.97 - fls. 23 e 27) e a data do recebimento da denúncia (10.09.04),primeira causa interruptiva da prescrição, bem como desta data até o presente momento, conclui-se que os fatos delituosos não foram atingidos pelo fenômeno prescricional, subsistindo, em favor do Estado, o direito de punir. 5. A conduta de omitir informação ou prestar declaração falsa da renda auferida, reduzindo ou mesmo suprimindo o valor do imposto sobre a renda devido aos cofres públicos, deve ser subsumida ao artigo 1º, incisos I e II, da Lei 8.137/90 e não ao artigo 2º, inciso I, do mesmo diploma legal. 6. Uma rápida exegese gramatical do artigo 2º, inciso I, da Lei 8.137/90, permite afirmar que a conduta típica ali albergada consiste em fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, para eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributo. O presente tipo penal é doutrinariamente classificado como sendo um crime formal, ou seja, que independe do advento de um resultado naturalístico para sua consumação. 7. Só há que se falar em aplicabilidade do inciso I do artigo 2º da Lei 8.137/90 quando se tratar de conduta que não chegou a causar prejuízo aos cofres públicos, ou seja, quando a apuração fiscal identificou a omissão ou a declaração falsa sem a ocorrência do dano - ainda que difuso - ao Tesouro Nacional. 8. Por sua vez, a conduta prevista no inciso I do artigo 1º da Lei 8.137/90 se traduz como um crime material, que só tem alcançada a sua consumação com o advento de uma inovação no plano do mundo natural, ou seja, ocorrendo um prejuízo concreto ao Erário Público. 9. Na hipótese dos autos, restou evidente que a conduta desenvolvida pelo agente importou em efetivo prejuízo ao Erário Público, conforme demonstra a robusta prova produzida nos autos, especialmente pela Representação Fiscal para fins penais elaborada pela Receita Federal (fls.07/381), devendo, por tal motivo, ser mantida a tipificação legal da reprimenda imposta em primeiro grau. 10. A autoria e a materialidade delitivas se encontram solidamente demonstradas e provadas em primeiro grau de jurisdição, mostrando-se imperativa a manutenção da condenação imposta, porque em perfeita consonância com o quadro probatório delineado pela instrução processual, tendo o apelante se conformado com a decisão condenatória, até porque não a impugnou. 11. Embora sucinta, a fundamentação que embasou a decisão não é de molde a invalidá-la. Somente se anula decisão, quando ausente a fundamentação. 12. No que toca as conseqüências do crime, consoante se verifica dos autos, o total do débito decorrente dos quatro anos de sonegação de impostos alcançou o valor atualizado de R$327.805,91 (trezentos e vinte e sete mil, oitocentos e cinco reais e noventa e um centavos), valor esse que deve ser considerado de elevada monta. 13. Sobre a possibilidade de o Juiz levar em consideração o montante dos valores sonegados como circunstância judicial negativa, entendo que o próprio artigo 59 do Código Penal autoriza tal raciocínio, vez que o vulto do "quantum debeatur" se caracteriza, nitidamente, como conseqüência do delito. 14. De outro lado, deve ser afastado o concurso material de crimes, pois o entendimento é no sentido de que se trata de continuidade delitiva, devendo ser acolhida a tese levantada pela combativa defesa. 15. O apelante realizou as condutas previstas nos incisos I e II do artigo 1º da Lei 8.137/90, omitindo rendimentos relativos a quatro exercícios, nos anos fiscais de 1992 a 1995, consumando os delitos em 1997, dentro de um mesmo contexto fático, sendo que os atos posteriores devem ser havidos como continuação dos anteriores, ainda que o lapso temporal seja superior a 30 dias, tomado como parâmetro pela jurisprudência, e levando em conta, ainda, que o crime se consumou com a entrega das declarações do IR, em 19.08.97 e 05.09.97,ou seja, em intervalo de tempo inferior a 30 dias, não se justificando a aplicação do concurso material de crimes. 16. Ademais, o réu foi denunciado pelo crime descrito na denúncia, na forma continuada (fls.02/03) e, posteriormente, a acusação ofertou suas alegações finais requerendo a aplicação da continuidade delitiva (fls.558). Logo o concurso material não foi aventado ao longo da instrução processual, não podendo ele ser condenado com a incidência do artigo 69 do Código Penal. 17. É de ser reformada a sentença no que diz respeito ao afastamento do concurso material de delitos, com a aplicação do artigo 71 do Código Penal. 18. Justa é a fixação do percentual de 1/4 (um quarto) em razão da continuidade delitiva, o que implica, na redução da reprimenda corporal a ser cumprida pelo apelante, que fica estabelecida em 03 (três) anos, 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, no regime aberto. 19. Também o montante da pena pecuniária deve sofrer redução, ficando estabelecido, pelos mesmos critérios supramencionados, em 72 (setenta e dois) dias-multa. 20. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, impõe-se a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo, conforme dispuser o Juízo "a quo", e prestação pecuniária equivalente a 20 (vinte) salários mínimos em favor de instituições de caridade ou famílias carentes, com a indicação e sob a fiscalização do Juízo das Execuções Criminais. 21. Deve ser afastado o pleito da defesa de substituição da pena privativa de liberdade cominada pela pena de multa. Ocorre que a Lei 4.729/65 - antiga Lei de Sonegação Fiscal, foi tacitamente derrogada (revogação total) pelo novel diploma legal - a Lei nº 8.137/90 - que trata dos crimes contra a ordem tributária. 22. A derrogação decorreu do fato de que a Lei 8.137/90 reproduziu as figuras típicas da Lei 4.729/65, incluindo no caput do artigo 1º, a exigência do resultado lesivo; criou outras figuras típicas, antes inexistentes, como a do artigo 2º, V, e, por fim, regulamentou a aplicação da multa e da extinção da punibilidade, de modo a substituir, integralmente, o antigo diploma legal ora invocado pela defesa. 23. E mais, os fatos ocorreram no período de 1992 a 1995, tendo os crimes se consumado em 1997 (crime material que exige o resultado naturalístico), ou seja, muito depois de já estar em vigor o novo diploma legal, não sendo o caso de se repristinar a lei revogada, como pretende a defesa. 24. Preliminar rejeitada. Recurso da defesa parcialmente provido. Condenação mantida." (ACR 200461810059480, JUIZA RAMZA TARTUCE, TRF3 - QUINTA TURMA, DJF3 CJ2 DATA:03/03/2009 PÁGINA: 510.)(grifei)

Desse modo, incontroverso que a ré prestou declaração falsa à Receita Federal, apresentando declarações retificadoras do imposto de renda dos anos anteriores de vários contribuintes que procuravam seus serviços, alterando o campo do "imposto retido na fonte" para constar valores não condizentes com a realidade, gerando, assim, imposto a restituir para os contribuintes e vantagem para si própria, na medida em que recebia dos clientes percentual sobre o valor a ser restituído.

Para a configuração do tipo penal não se faz necessário o efetivo prejuízo aos cofres públicos, o que de fato não ocorreu vez que os contribuintes "beneficiados" pela fraude caíram na "malha fina" e não receberam as restituições forjadas pela ré.

A autoria e a materialidade do crime estão sobejamente demonstradas nos autos.

O recurso interposto pela defesa limita-se à discussão em torno da coação exercida por um dos declarantes sobre a ré bem como à extinção da punibilidade em razão do parcelamento do débito tributário. A Acusação, de seu turno, pugna pelo aumento da pena-base do crime previsto no artigo 2º, bem como à condenação da ré pelo crime de estelionato.

Passo a analisar, pois, os recursos interpostos pela acusação e pela defesa, simultaneamente.


DA COAÇÃO


Não restou comprovado pela defesa que a testemunha de acusação Sidnei Sanches Santana teria exercido coação sobre a ré, ônus que, nos moldes do artigo 156 do Código de Processo Penal, cabia à defesa. Alegações genéricas, desprovidas de prova, não são aptas ao reconhecimento da causa excludente de culpabilidade invocada.


Como bem argumentou a i. procuradora regional da república:


"Assim, percebe-se que restou comprovada a prática delitiva prevista no artigo 2º, inciso I, da Lei n. 8.137/90.
Quanto ao argumento de que teria ocorrido coação, percebe-se dos autos que Mauricéia não apresentou qualquer prova de que tenha sido coagida a praticar os atos ilegais. Mesmo em seu interrogatório, Mauricéia não fez qualquer menção à alegada coação.
Ao contrário, as provas mencionadas demonstram que Mauricéia agiu com vontade livre e consciente na prática do delito capitulado no artigo 2º, I, da Lei n. 8.137/90, por 24 vezes, não havendo em que se falar em sua absolvição".(fls. 448v).

DO PARCELAMENTO


Tratando-se de crime formal, que se consuma sem que haja o efetivo prejuízo aos cofres públicos, seria incongruente se falar na extinção da punibilidade pelo integral pagamento do tributo, uma vez que "só há que se falar em aplicabilidade do inciso I do artigo 2º da Lei 8.137/90 quando se tratar de conduta que não chegou a causar prejuízo aos cofres públicos, ou seja, quando a apuração fiscal identificou a omissão ou a declaração falsa sem a ocorrência do dano - ainda que difuso - ao Tesouro Nacional."(ACR 200461810059480, JUIZA RAMZA TARTUCE, TRF3 - QUINTA TURMA, DJF3 CJ2 DATA:03/03/2009 PÁGINA: 510.)

Incabível, portanto, o benefício pretendido.


CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - EXASPERAÇÃO DA PENA.

De outro lado, não há que se falar em aumento da pena-base, dado que ausentes circunstâncias judiciais desfavoráveis à ré, ao contrário do que argumenta a Acusação.

A conduta da ré não é passível de maior reprovabilidade, sendo certo ainda que os antecedentes judiciais, a personalidade, a conduta social, bem como as conseqüências do crime também não a desfavorecem.

Assim, impõe-se a manutenção da pena-base no mínimo legal.


DO CRIME DE ESTELIONATO.


Quanto à prática do crime de estelionato, em sua forma tentada, tenho que não restou comprovado pela Acusação.

É incontroverso que as declarações falsas prestadas pela ré, retificando declarações de imposto de renda de contribuintes que procuravam seus serviços, geraria para esses contribuintes imposto a restituir. Incontroversa, ainda, a obtenção de vantagem pela ré consistente no recebimento de numerário incidente sobre o valor a ser restituído aos contribuintes.

O que não se demonstrou, no entanto, é que a ré tenha induzido a erro os contribuintes - seus clientes - havendo nos autos apenas indícios de que eles teriam sido enganados pela ré e não teriam conhecimento da conduta perpetrada pela ré, consistente na falsidade das declarações.


Nesse sentido transcrevo o trecho da sentença proferida em Primeiro Grau de Jurisdição :


"A conduta prevista no artigo 171 do Código Penal é composta, ao mesmo tempo, pela obtenção de vantagem ("obter vantagem") e pela necessária indução de alguém em erro, ou seja, que o fato seja cometido em prejuízo de terceira pessoa.
No caso dos autos, conquanto esteja comprovada a vontade da autora em obter vantagem indevida - já que sabedora que sua conduta era contrária à lei, o segundo elemento do tipo não está configurado.
A "indução de alguém em erro" e o "prejuízo a terceira pessoa" não estão devidamente comprovados. Há apenas indícios de que os contribuintes que fizeram a denúncia contra a ré na Polícia Federal estariam sendo enganados. Neste ponto, não há certeza sobre esse elemento capaz de sustentar um decreto condenatório.
A instrução não deixou clara a relação entre Sidney e a ré e sobre suas intenções, bem como dos demais, quanto à obtenção ou não de vantagem indevida. Nesse caso, a vontade desses contribuintes de também auferirem vantagem indevida afasta o elemento "indução em erro".
Tampouco pode ser afirmado, além de qualquer dúvida, que os demais contribuintes não buscavam se beneficiar da conduta perpetrada pela ré. Ao contrário, ao que parece, os serviços da acusada eram procurados justamente por serem benéficos aos contribuintes, que recebiam restituições em valores maiores do que o devido. Assim, não há como se afastar o elemento subjetivo da conduta desses beneficiados"

Do exposto resulta que deve ser mantida a decisão de Primeiro Grau de Jurisdição em todos os seus termos, rejeitados os recursos da Acusação e da Defesa.


TÂNIA MARANGONI
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