Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 06/03/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002424-29.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.002424-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : FERNANDO APARECIDO CARMONI
ADVOGADO : JOSE PASCOALINO RODRIGUES e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00024242920054036108 3 Vr BAURU/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INOCORRÊNCIA DE DEFICIÊNCIA DA DEFESA. NULIDADE RELATIVA. FATOS PARCIALMENTE PRESCRITOS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. DELITO FORMAL. DOLO GENÉRICO. CONTINUIDADE DELITIVA. CONDENAÇÃO E PENA MANTIDAS. RECURSO IMPROVIDO.
1. O Código de Processo Penal acolheu o princípio pas de nullité sans grief, do qual se infere que somente há de se declarar a nulidade de ato processual, quando, além de alegada opportuno tempore, reste comprovado o efetivo prejuízo dela decorrente.
2. Somente a ausência de defesa constitui nulidade absoluta, pois constitui prejuízo presumido, já a nulidade por deficiência da defesa é relativa, devendo estar evidente o prejuízo sofrido pelo réu.
3. A prova pericial era desnecessária, pois as provas obtidas na ação fiscal realizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS já são idôneas a demonstrar a existência da materialidade.
4. Não havendo recurso da acusação, torna-se impossível a majoração da pena do acusado por este E. Tribunal, sob pena de se incorrer em reformatio in pejus, ocorrendo, assim, o trânsito em julgado para a acusação, sendo perfeitamente possível a análise da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, com base na sanção penal concreta imposta pelo Juízo a quo, nos termos do artigo 110, §§ 1º e 2º, do Código Penal (na redação anterior à Lei nº 12.234/10).
5. A pena-base foi fixada em 02 (dois) anos de reclusão, aumentada em 1/6 (um sexto) em decorrência da continuidade delitiva, que não deve ser computada no cálculo da prescrição, nos termos da Súmula nº 497, do Supremo Tribunal Federal, ensejando prazo prescricional de 4 (quatro) anos (artigos 109, V, do CP), transcorridos entre os fatos praticados até a competência do mês de julho/2003, inclusive, e o recebimento da denúncia.
6. No mérito, quanto ao período remanescente compreendido entre agosto/2003 a novembro/2003, a materialidade delitiva é incontroversa, pois restou provada através da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito, que demonstra o não recolhimento das contribuições sociais descontadas dos salários de empregados durante o período compreendido entre agosto/2003 e novembro/2003, inclusive, resultando num valor de R$ 86.491,54 (oitenta e seis mil, quatrocentos e noventa e um reais e cinqüenta e quatro centavos).
7. Igualmente comprovada a autoria delitiva, pois é possível depreender das informações prestadas pela Delegacia da Receita Previdenciária em Bauru/SP, de acordo com a cópia do processo administrativo nº 35.564.950-0, constando os co-responsáveis legais pelas contribuições da empresa, que, à época dos fatos, era o ora acusado o responsável legal pela administração financeira da empresa.
8. O tipo penal da apropriação indébita previdenciária é de natureza formal, e exige apenas o dolo genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamentos efetuados aos empregados. Não se exige do agente o animus rem sibi habendi dos valores descontados e não repassados, uma vez que a consumação do delito se dá com a mera ausência de recolhimento da contribuição.
9. A inexigibilidade de conduta diversa em razão de dificuldades financeiras, para que se caracterize como causa supra legal de exclusão da culpabilidade, exige que as dificuldades sejam de tal ordem que coloquem em risco a própria existência da empresa. Portanto, apenas a impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a omissão nos recolhimentos devidos à Previdência Social, devendo ainda ser esporádica, momentânea, e não uma situação habitual e prolongada indefinidamente por anos a fio. A empresa deve se utilizar de todos os meios legalmente possíveis para tentar saldar sua dívida para com a Previdência Social.
10. A prova da excludente da culpabilidade deve ser documental e robusta, inclusive com a realização de perícia nos livros contábeis, notas fiscais, registros de movimentação bancária e financeira, dentre outros documentos pertencentes à pessoa jurídica.
11. A defesa não conseguiu comprovar que as dificuldades financeiras vivenciadas pela empresa foram diferentes daquelas comuns a qualquer atividade de risco.
12. As justificativas utilizadas pelo réu em seu interrogatório para a omissão de recolhimento das contribuições não foram suficientes para provar que não havia outro modo da empresa continuar funcionando, não incidindo no caso a tese de inexigibilidade de conduta diversa.
13. Condenação pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária mantida.
14. Continuidade delitiva (artigo 71, do Código Penal) reconhecida, considerando-se a ofensa ao mesmo bem jurídico, e as mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.
15. As normas penais descritas no artigo 168-A, do Código Penal e no artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90 tutelam bens jurídicos distintos, àquele a seguridade social e o outro a ordem tributária, não havendo que se falar em desproporcionalidade entre as sanções penais previstas.
16. Não havendo inconformismo da defesa acerca da dosimetria da pena, bem como do regime inicial de cumprimento de pena, do valor unitário de cada dia-multa e da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, devem ser mantidos nos termos da r. sentença.
17. Punibilidade do réu pela prática do crime previsto no artigo 168-A, c/c artigo 71, ambos do Código Penal, em relação aos fatos praticados até a competência do mês de julho de 2003, declarada, ex officio, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, 109, inciso V e 110, §§1º e 2º (na redação anterior à Lei nº 12.234/10) todos do Código Penal e artigo 61, caput, do Código de Processo Penal; e apelação da defesa improvida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, declarar, ex officio, extinta a punibilidade do réu Fernando Aparecido Carmoni pela prática do crime previsto no artigo 168-A, c/c artigo 71, ambos do Código Penal, em relação aos fatos praticados até a competência do mês de julho de 2003, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, 109, inciso V e 110, §§1º e 2º (na redação anterior à Lei nº 12.234/10) todos do Código Penal e artigo 61, caput, do Código de Processo Penal; e negar provimento à apelação da defesa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 25 de fevereiro de 2013.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002424-29.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.002424-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : FERNANDO APARECIDO CARMONI
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APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00024242920054036108 3 Vr BAURU/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO CEDENHO:


Trata-se de apelação criminal interposta por Fernando Aparecido Carmoni em face da sentença que o condenou pela prática do delito previsto no artigo 168-A, § 1º, inciso I, c.c. artigo 71, todos do Código Penal.


O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em desfavor de Fernando Aparecido Carmoni como incurso nas penas do artigo 168-A, §1º, inciso I, c/c artigo 71, ambos do Código Penal, nos seguintes termos (fls. 02/05):


"(...)
A fiscalização do Instituto Nacional do Seguro Social, na representação fiscal encartada nas peças informativas 1.34.003.00364/2004-68 (anexos I e II), concluiu que a empresa Editora Botucatuense Ltda. CNPJ 50.786.946/0001-01, por meio de seu representante legal, ora denunciado, não efetuou o recolhimento, ao Instituto Previdenciário, das importâncias descontadas de seus empregados relativas às contribuições para a previdência social, nos períodos de 01/1993 a 11/2003, no valor de R$ 154.533,39 (cento e cinquenta e quatro mil, quinhentos e trinta e três e trinta e nove centavos) - extrato do devedor à fl. 90 -, insurgindo, assim, no tipo previsto no artigo 168-A, § 1º, inciso I, com incidência da majorante do artigo 71, do Código Penal, devido a continuidade delitiva.
A materialidade está evidenciada através das Peças Informativas, apenso I e II. A autoria, por sua vez, também restou demonstrada pelos documentos acostados no apenso I e II, em especial o contrato de cessão de direitos hereditários às fls. 22/27, e o depoimento do denunciado (fl. 50), afirmando que é o efetivo administrador da empresa Editora Botucatuense Ltda., tendo trabalhado duas pessoas, ele e a funcionária Cláudia Aparecida Bueno, a qual confirmou ser proprietário e administrador da empresa o denunciado (f. 62). (...)
Convém ressaltar que, até o presente momento, não há qualquer notícia de pagamento do débito, encontrando-se em fase de cobrança (fl. 89/90), o que elide a aplicação do disposto no §2º do art. 168-A e §2º do art. 337-A, ambos do CP.
(...)"

A denúncia foi recebida em 19 de setembro de 2007 (fl. 114).


Após regular instrução, sobreveio sentença (fls. 187/190), publicada em 14 de setembro de 2009 (fl. 191), que julgou procedente a ação penal para condenar Fernando Aparecido Carmoni pela prática do delito previsto no artigo 168-A, § 1º, inciso I, c/c artigo 71, todos do Código Penal, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, substituída por uma pena restritiva de direitos, e ao pagamento de 35 (trinta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.


Em razões recursais (fls. 196/198), o réu requer sua absolvição, alegando para tanto que além de não ter sido o efetivo responsável pela administração da empresa, nunca apropriou de qualquer valor referente ao recolhimento de tributos previdenciários, bem como que não restou provado que houve pagamento de salários aos empregados, muito menos faturamento, uma vez que a empresa era composta somente por ele próprio e uma terceira pessoa, os quais produziam seus próprios salários através de atos de informalidade praticados numa pequena gráfica, o que demonstraria que nunca houve retenção ou apropriação das contribuições previdenciárias.


Foram apresentadas contrarrazões pela acusação (fls. 203/205).


A Procuradoria Regional da República da 3ª Região opina, em parecer (fls. 235/243), pelo reconhecimento da nulidade do feito por deficiência de defesa e, subsidiariamente, pelo improvimento da apelação com o cálculo da pena de acordo com o artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, mantendo-se a sentença condenatória.


É o relatório.


À revisão.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002424-29.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.002424-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : FERNANDO APARECIDO CARMONI
ADVOGADO : JOSE PASCOALINO RODRIGUES e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00024242920054036108 3 Vr BAURU/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Inicialmente, não há que se falar em nulidade do feito por deficiência decorrente da atuação da defesa, como opina a douta Procuradora Regional da República da 3ª Região em parecer.


Ademais, em tema de nulidades processuais, o nosso Código de Processo Penal acolheu o princípio pas de nullité sans grief, do qual se infere que somente há de se declarar a nulidade de ato processual, quando, além de alegada opportuno tempore, reste comprovado o efetivo prejuízo dela decorrente, nos termos do artigo 563, do Código de Processo Penal, e da Súmula nº 523, do Supremo Tribunal Federal, verbis: "No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu."


Portanto, somente a ausência de defesa constitui nulidade absoluta, pois constitui prejuízo presumido, já a nulidade por deficiência da defesa é relativa, devendo estar evidente o prejuízo sofrido pelo réu.


Ausente prejuízo no presente feito, uma vez que o acusado esteve representado por advogado regularmente constituído em todos os atos processuais, tendo sido arroladas testemunhas, apresentadas defesa prévia e alegações finais e interposta, inclusive, o presente recurso visando desconstituir o decreto condenatório. Tampouco houve demonstração de prejuízo em razão da inércia do defensor na fase de requerimento de diligências (revogado artigo 499, do CPP), pois em nenhum momento a defesa indica qual diligência seria imprescindível na busca da verdade real, sendo desnecessário esgotar todas as diligências possíveis à defesa.


Nesse sentido, julgados do E. Superior Tribunal de Justiça e desta E. Corte:


"PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTE - NULIDADE - DEFESA PRELIMINAR FEITA POR DEFENSOR DATIVO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. NULIDADE DOS DEMAIS ATOS DE DIFÍCIL COMPROVAÇÃO - NECESSIDADE DE EXAME DOS AUTOS.EXCESSO DE PRAZO SUPERADO COM A SENTENÇA. PRISÃO EM FLAGRANTE - LIBERDADE PROVISÓRIA - CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO - SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA - RÉU PRIMÁRIO E DE BONS ANTECEDENTES - RECONHECIMENTO IMPLÍCITO NA SENTENÇA PELO DEFERIMENTO DE CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO. ORDEM PARCIALMENTE PREJUDICADA E PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1- Só a ausência de defesa anula o processo, sendo que a sua deficiência não tem o condão de fazê-lo.
2- Conquanto a ampla defesa compreenda, no aspecto da defesa técnica, a escolha do advogado, se o réu notificado para apresentar defesa preliminar nos crimes previstos na Lei 11.343/06, não o faz e o Juiz, sem notificar pessoalmente o advogado constituído, escoado o prazo legal, nomeia-lhe defensor, que a faz a contento, não se comprovando qualquer prejuízo ao acusado, não há que se declarar eventual nulidade.
(...)."
(HC 89913/GO, 6ª Turma, Rel. Desembargadora Convocada do TJ/MG Jane Silva, DJe 24/03/2008)
"PENAL - ROUBO - ART. 157, § 2º, incisos I e II, DO CP - INÉPCIA DA DENÚNCIA - INOCORRÊNCIA - NULIDADE EM DECORRÊNCIA DA AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO DEFENSOR CONSTITUÍDO PARA O INTERROGATÓRIO DO RÉU - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - PRELIMINARES REJEITADAS - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA - RELEVÂNCIA - ART. 61, I, DO CP - OCORRÊNCIA - RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO - ADMISSIBILIDADE - USO DE ARMA DE FOGO - EXTENSÃO AO CO-AUTOR - CONCURSO DE PESSOAS - CARACTERIZAÇÃO - PENA FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS - RECURSOS DESPROVIDOS.
(...)
2. O acusado Jefferson foi devidamente assistido por defensor nomeado pelo Juízo "a quo", não decorrendo da alegada ausência da intimação pessoal nenhum prejuízo à defesa. Portanto, em homenagem ao princípio "pás de nullité sans grief", não há que se falar em nulidade do processo.
3. É de se ressaltar que o próprio apelante, que não se encontrava certo da presença de seu defensor constituído na audiência, solicitou, quando de sua intimação para o interrogatório, a nomeação de defensor dativo para acompanhar o ato processual.
4. Preliminares rejeitadas.
(...)"
(ACR 200661100026804, relatora Des. Fed. Ramza Tartuce, DJF3 16/09/2008)
"PENAL - EMBARGOS DE NULIDADE E INFRINGENTES - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - DEFICIÊNCIA DE DEFESA - NULIDADE AFASTADA - DEFESA SUFICIENTE E ADEQUADA - PROVA DA CIÊNCIA DO TRANSPORTE DA DROGA POR PARTE DA RÉ - NÃO REALIZAÇÃO - ART. 156, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - APLICAÇÃO - PREVALÊNCIA DO VOTO MAJORITÁRIO - COMPROVAÇÃO DO CRIME - EMBARGOS IMPROVIDOS. 1.- A ré esteve assistida por advogado em todos os atos processuais, não havendo falar-se em falta de defesa, ou, também, deficiência desta, em razão das manifestações contantes dos autos. 2.- A autodefesa implica no auxílio a ser dado ao defensor por parte do acusado, no sentido de providenciar as diligências que entender necessárias à comprovação de sua inocência. 3.- Consoante dispõe o art. 156, do Código de Processo Penal, incumbe à defesa a comprovação de fato que desconstitua a imputação feita ao réu, no caso, a existência de causa excludente de culpabilidade. 4.- A versão exculpatória dada pela ré restou isolada do panorama probatório que veio a demonstrar a existência de dolo, a comprovação de autoria e materialidade do delito de tráfico internacional de entorpecentes. 5.- Embargos de nulidade e infringentes improvidos."
(EIFNU 00000363319994036119, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 - PRIMEIRA SEÇÃO, DJF3 DATA:26/11/2008 PÁGINA: 438 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) (grifo nosso)
"PENAL. PROCESSUAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO: ARTS. 12, "CAPUT" e 14, C/C O ART. 18, I, DA LEI Nº 6368/76. ART. 12, LEI 6368/76: CRIME FORMAL. INEXIGÊNCIA DE RESULTADO MATERIAL. INTERNACIONALIDADE CONFIGURADA: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA O PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO. DEFICIÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA: INOCORRÊNCIA. PRELIMINARES DE NULIDADE REJEITADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DELAÇÃO DE CO-REU CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. DEPOIMENTO DE POLICIAIS E RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO: VALIDADE. INOCORRÊNCIA DE "ABOLITIO CRIMINIS" DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 18, I, DA LEI 6368/76. AJUSTE PRÉVIO, DIVISÃO DE TAREFAS E VÍNCULO ESTÁVEL COMPROVADOS: CONFIGURAÇÃO DO CRIME AUTÔNOMO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ART. 14, LEI 6368/76). CONDENAÇÕES MANTIDAS. DOSIMETRIA DAS PENAS: QUANTIDADE DE DROGA: FUNÇÃO PEREMPTÓRIA NO CRIME DE TRÁFICO. APLICAÇÃO DO ART. 32, § 3º DA LEI 10.409/92: REDUÇÃO DA PENA DO APELANTE OSMAR NO PATAMAR MÁXIMO. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA: INICIAL FECHADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS E RECURSO EM LIBERDADE: IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI 11.343/06 DESFAVORÁVEL.
I - Não se declara a nulidade de um ato se dele não resultar efetivo prejuízo para o réu. A falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu. Art. 563 do CPP e Súmula 523 do STF.. O fato de as provas produzidas pela acusação prevalecerem sobre as provas da defesa não torna o réu indefeso nem permite a afirmação de prejuízo por deficiência ou descuido da defesa técnica. Prejudicial de nulidade processual rejeitada.
II - (...)"
(ACR 00001187120064036005, DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:07/05/2009 PÁGINA: 355 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) (grifo nosso)

Assim, o prejuízo ao réu é condição imprescindível para se declarar a nulidade dos atos processuais. No caso em questão, a falta de articulada fundamentação, bem como a prevalência das provas produzidas pela acusação sobre as da defesa, não o torna indefeso nem caracteriza efetivo prejuízo.


Aduz a Procuradoria Regional da República que a prova pericial deveria também ter sido requerida pela defesa.


Verifica-se que tal medida mostra-se desnecessária, pois as provas obtidas na ação fiscal realizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS já são idôneas a demonstrar a existência da materialidade.


Nesse sentido:


"RECURSO ESPECIAL. PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. TESE DE VIOLAÇÃO AO ART. 619 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO DE TESE. MERA ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS DISPOSITIVOS LEGAIS. SÚMULA N.º 284 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 573, § 1.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NÃO OCORRÊNCIA. ARGUIÇÃO DE NULIDADE RELATIVA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. ESTADO DE NECESSIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. FALTA DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. REEXAME PROBATÓRIO. SÚMULA N.º 7 DESTA CORTE. AFRONTA AO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ALEGADA INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
1. A alegada contrariedade a dispositivo de lei federal, sem, no entanto, desenvolver argumentos ou demonstrar de que maneira o acórdão recorrido teria violado a norma, atrai a incidência da Súmula n.º 284 do Excelso Pretório.
2. A nulidade da audiência de inquirição das testemunhas não implica necessariamente sejam declarados também nulos os atos posteriores.
Não há como ser reconhecido o vício, que tem caráter relativo, se dele não resultou qualquer prejuízo comprovado para o acusado.
3. No caso, o aresto hostilizado consignou que as oitivas realizadas em nada interferiram nas teses defensivas, bem assim não desabonaram a conduta do Réu. Dessa forma, não há indicação da utilidade da medida requerida, restando imperiosa a conclusão de que não há prejuízo para a Defesa.
4. Para configurar o crime de apropriação indébita previdenciária, não se revela imprescindível a prova pericial, podendo a materialidade ser embasada nos procedimentos administrativo ou fiscal, como na hipótese. Ademais, essa diligência foi requerida somente nas razões da apelação criminal, restando preclusa a matéria.
5. Insta sobrelevar, ainda, que as instâncias ordinárias procederam a minucioso cotejo do elementos coligidos durante a instrução criminal e, a partir do seu exame, apresentaram fundamentos coerentes para a condenação. Dessa forma, reconhecer a pretensa falta de provas esbarra no óbice contido na Súmula n.º 7 desta Corte.
6. Nos crimes de autoria coletiva, é prescindível a descrição minuciosa e individualizada da ação de cada acusado, bastando a narrativa das condutas delituosas e da suposta autoria, com elementos suficientes para garantir o direito à ampla defesa e ao contraditório, como verificado na hipótese.
7. No caso, a inicial acusatória descreve as condutas delituosas do Recorrente, relatando, em linhas gerais, os elementos indispensáveis para a demonstração da existência do crime em tese praticado, bem assim os indícios suficientes para a deflagração da persecução penal.
8. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido."
(REsp 1044537/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2011, DJe 07/11/2011) (grifo nosso)
"PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. PROVA PERICIAL. REALIZAÇÃO. DESNECESSIDADE. SUSPENSÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ART. 9º DA LEI 10.684/2003. IMPOSSIBILIDADE.
PEDIDO DE DAÇÃO EM PAGAMENTO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DA AUTORIDADE PREVIDENCIÁRIA. PAGAMENTO INTEGRAL. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA.
ORDEM DENEGADA.
1. Apresenta-se desnecessária a realização de prova pericial - exame de corpo de delito, para fins de configuração da materialidade, quando a denúncia pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária funda-se em processo administrativo. Precedentes.
2. O benefício da suspensão da pretensão punitiva do Estado, prevista no art. 9º da Lei 10.684/2003, não se mostra aplicável, tendo em vista que foi indeferido o pedido de parcelamento da dívida oriunda de contribuições descontadas dos empregados, conforme o art.
7º da Lei 10.666/2003.
3. A simples ausência de manifestação da autoridade previdenciária a respeito do pedido de dação em pagamento formulado pela pessoa jurídica não tem o condão de determinar o trancamento de ação penal.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendido ser necessária prova inequívoca do pagamento integral da dívida.
4. Satisfazendo a peça acusatória os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, a elucidação dos fatos, em tese delituosos, descritos na vestibular acusatória depende da regular instrução criminal, com o contraditório e a ampla defesa, uma vez que o trancamento da ação penal pela via do habeas corpus somente é possível quando verificadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a ausência de mínimos indícios de autoria e prova da materialidade.
5. Ordem denegada."
(HC 44.647/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 07/11/2006, DJ 27/11/2006, p. 293) (grifo nosso)
"PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGO 168-A CÓDIGO PENAL. NULIDADE POR AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DELITO. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS AMPLAMENTE COMPROVADAS. CRIME FORMAL. "ANIMUS REM SIBI HABENDI". DESNECESSIDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO CARACTERIZADA. CONDENAÇÃO MANTIDA.
1. A materialidade delitiva tem assento em todo o processamento administrativo levado a efeito pela Previdência Social, conforme se verifica do apenso aos autos, sendo despicienda a perícia técnica, em se tratando de omissão de recolhimento de contribuições previdenciárias, consoante reiteradamente vem sendo decidido nos tribunais.
2. Preliminar rejeitada.
3. Autoria e materialidade demonstradas com segurança.
4. As dificuldades financeiras acarretadoras de estado de necessidade (excludente de antijuridicidade) ou de inexigibilidade de conduta diversa (excludente de culpabilidade) devem ser de tal monta que ponham em risco a própria sobrevivência da empresa, e cabia ao apelante, segundo o disposto no art. 156 do CPP, a cabal demonstração de tal circunstância, trazendo aos autos elementos concretos de que a existência da empresa estava comprometida, caso fossem recolhidas as contribuições devidas, o que não se evidenciou in casu.
5. Em que pese a defesa ter juntado aos autos sentença judicial que rejeitou embargos interpostos pela empresa do ora apelante e decretou sua falência, em virtude do não pagamento de título executivo extrajudicial, verifico que o termo legal foi fixado no 60º dia anterior à data do despacho do requerimento inicial da falência - 25.01.99 (fls. 186/191).
6. Os fatos narrados na inicial acusatória tiveram lugar em períodos anteriores ao início do termo legal da falência, não se prestando a referida sentença para comprovar dificuldades financeiras da empresa no período tratado na presente ação penal.
7. A prova testemunhal não é suficiente para a demonstração de penúria econômica da empresa, cuja comprovação deve ser calcada em prova documental ou pericial.
8. Recurso da defesa desprovido."
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, EIFNU 0008176-46.2000.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 26/10/2009, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/01/2010 PÁGINA: 703) (grifo nosso)

Superada tal questão, convém demonstrar a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos anteriores à competência de julho/2003.


Não havendo recurso da acusação, torna-se impossível a majoração da pena do acusado por este E. Tribunal, sob pena de se incorrer em reformatio in pejus, ocorrendo, assim, o trânsito em julgado para a acusação.


Desta forma, torna-se perfeitamente possível a análise da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, com base na sanção penal concreta imposta pelo Juízo a quo, nos termos do artigo 110, §§ 1º e 2º, do Código Penal (na redação anterior à Lei nº 12.234/10).


A pena-base foi fixada em 02 (dois) anos de reclusão, aumentada em 1/6 (um sexto) em decorrência da continuidade delitiva, que não deve ser computada no cálculo da prescrição, nos termos da Súmula nº 497, do Supremo Tribunal Federal.


Ademais, a empresa é obrigada a recolher as contribuições arrecadadas de seus segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço, descontadas de suas respectivas remunerações, até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência, nos termos do artigo 30, inciso I, "b", da Lei nº 8.212/91.


Verifica-se, portanto, que transcorreram mais de 4 (quatro) anos (artigos 109, V, do CP) entre os fatos praticados até a competência do mês de julho/2003, inclusive, e o recebimento da denúncia (19.09.2007).


Assim, deve ser declarada, extinta a punibilidade do ora apelante pela prática do crime previsto no artigo 168-A, c/c artigo 71, ambos do Código Penal, em relação aos fatos praticados até a competência do mês de julho de 2003 pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, nos termos dos artigos 107, inciso IV, 109, inciso V, 110, §§ 1º e 2º (na redação anterior à Lei nº 12.234/10) todos do Código Penal, e artigo 61, caput, do Código de Processo Penal.


No mérito, passo à análise do período remanescente compreendido entre agosto/2003 a novembro/2003.


A materialidade delitiva é incontroversa, pois restou provada através da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito - NFLD nº 35.564.949-7 (fl. 70), que demonstra o não recolhimento das contribuições sociais descontadas dos salários de empregados durante o período compreendido entre agosto/2003 e novembro/2003, inclusive, resultando num valor de R$ 86.491,54 (oitenta e seis mil, quatrocentos e noventa e um reais e cinqüenta e quatro centavos),


Igualmente comprovada a autoria delitiva, pois é possível depreender das informações prestadas pela Delegacia da Receita Previdenciária em Bauru/SP, de acordo com a cópia do processo administrativo nº 35.564.950-0, constando os co-responsáveis legais pelas contribuições da empresa "EDITORA BOTUCATUENSE LTDA" (fl. 22), que à época dos fatos era o ora acusado o responsável legal pela administração financeira da empresa.


Do mesmo modo, o próprio réu, quando interrogado (fls. 138/139), afirmou "que fez um contrato de seção de direitos hereditários para poder gerir a empresa", que foi corroborado pelos depoimentos das testemunhas de defesa José Batista Garcia (fl. 168) e Dalvo Sergio Maldonado Avante (fl. 169).


Ademais, não foi demonstrado nos autos que a empregada Cláudia Aparecida Bueno era autônoma. O extrato do devedor (fl. 95) e o processo administrativo nº 35.364.948-9 (apensos I e II) indicam que a funcionária recebia seu salário subordinadamente, pois consta nos documentos citados que há um débito em relação às contribuições previdenciárias a serem recolhidas pelo réu, e que, como somente ela e o acusado eram os funcionários da empresa, a parcela do salário que deveria ser recolhida apenas se refere aos rendimentos da funcionária.


No caso, é irrelevante perquirir sobre a comprovação do elemento subjetivo, porquanto o tipo penal da apropriação indébita previdenciária é de natureza formal, e exige apenas o dolo genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamentos efetuados aos empregados. Não se exige do agente o animus rem sibi habendi dos valores descontados e não repassados, uma vez que a consumação do delito se dá com a mera ausência de recolhimento da contribuição, consoante entendimento jurisprudencial:


"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA: DESCRIÇÃO GENÉRICA. FALTA DE JUSTA CAUSA. EXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). OFENSA AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DA LEI. ALEGAÇÕES IMPROCEDENTES.
(...)
2. Ao contrário do crime de apropriação indébita comum, o delito de apropriação indébita previdenciária não exige, para sua configuração, o animus rem sibi habendi.
Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento."
(STF, RHC 88144, Relator Ministro Eros Grau, j. 04/04/2006, DJ 16/06/2006, p. 28)
"PENAL - CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS - NÃO RECOLHIMENTO - ART. 168-A - PRELIMINAR - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - INCLUSÃO NO REFIS - AFASTAMENTO - AUTORIA, MATERIALIDADE E DOLO - COMPROVAÇÃO - ESTADO DE NECESSIDADE NÃO CARACTERIZADO - REDUÇÃO DA PENA - PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO.
(...)
3.- Desnecessário o dolo específico consistente no animus rem sibi habendi, tratando-se de crime formal.
4.- As dificuldades financeiras acarretadoras de inexigibilidade de outra conduta devem ser cabalmente demonstradas pelo acusado. Art.156 do CPP.
5.- A inevitabilidade do perigo é requisito inafastável para o reconhecimento do estado de necessidade. Sem comprovação de se tratar de ação inevitável não se caracteriza o estado de necessidade.
(...)
(TRF 3, ACR 200061050073838, Relator(a) JUIZ LUIZ STEFANINI, QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:19/02/2010 PÁGINA: 367)

Por outro lado, esclarece o acusado, em seu interrogatório (fls. 138/139), que deixou de recolher as contribuições financeiras devido ao estado de necessidade derivado de dificuldades financeiras, o que caracteriza a inexigibilidade de conduta diversa.


Inicialmente, é preciso esclarecer que o interrogatório é considerado não somente meio de prova, mas também meio de defesa. Como leciona Guilherme de Souza Nucci, e entende assim também grande parcela dos penalistas brasileiros: "o interrogatório é, fundamentalmente, um meio de defesa, pois a Constituição assegura ao réu o direito ao silêncio. Logo, a primeira alternativa que se avizinha ao acusado é calar-se, daí não advindo conseqüência alguma. Defende-se apenas. Entretanto, caso opte a falar, abrindo mão do direito ao silêncio, (...) o magistrado poderá levar em consideração suas declarações para condená-lo ou absolvê-lo" (Código de Processo Penal Comentado. 11. ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012. p.185).


Porém, a inexigibilidade de conduta diversa em razão de dificuldades financeiras, para que se caracterize como causa supra legal de exclusão da culpabilidade, exige que as dificuldades sejam de tal ordem que coloquem em risco a própria existência da empresa. Portanto, apenas a impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a omissão nos recolhimentos devidos à Previdência Social, devendo ainda ser esporádica, momentânea, e não uma situação habitual e prolongada indefinidamente por anos a fio. A empresa deve se utilizar de todos os meios legalmente possíveis para tentar saldar sua dívida para com a Previdência Social.


Entende-se, em tese, ser possível excluir a culpabilidade dos agentes por inexigibilidade de conduta diversa, desde que certos requisitos sejam provados, dentre eles, por exemplo, a comprovação, por parte do acusado, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, a da efetiva existência das dificuldades financeiras, o que deve ser feito por meio de prova documental; de que estas dificuldades foram causadas por motivos não relacionados à eventual má administração; que elas punham em risco a própria sobrevivência da entidade, não bastando meras dificuldades circunstanciais; que era caótica a situação da pessoa jurídica e que não existia outra opção aos seus sócios e administradores.


A prova da excludente da culpabilidade deve ser documental e robusta, inclusive com a realização de perícia nos livros contábeis, notas fiscais, registros de movimentação bancária e financeira, dentre outros documentos pertencentes à pessoa jurídica.


No caso, a defesa não conseguiu comprovar que as dificuldades financeiras vivenciadas pela empresa foram diferentes daquelas comuns a qualquer atividade de risco.


Assim sendo, a mera existência de dívidas não pode servir como presunção de que as dificuldades financeiras impossibilitassem o repasse das contribuições já descontadas dos salários dos empregados, pois não são hábeis a eximir a empresa de suas obrigações para com os terceiros. Evidente, pois, que seria cabível se exigir do apelante conduta lícita e diversa, já que, como empresários, é de rigor sua responsabilização pelos ônus legais decorrentes da atividade exercida, bem como pelos riscos inerentes à sua empresa, que não podem ser oponíveis ao Judiciário como excludente de culpabilidade no âmbito penal, por ser inadmissível a submissão da punibilidade dos delitos contra a Previdência Social à mercê de vicissitudes do empregador em seus negócios, transferindo a esta os prejuízos advindos de dificuldades financeiras.


Não há também que se admitir que a sociedade arque com os ônus da má administração de um empreendimento, já que, nos casos de não recolhimento das contribuições previdenciárias, quem se prejudica é a Previdência Social, que existe para proporcionar o pagamento de benefícios sociais.


Portanto, a conduta que se espera do empresário que enfrenta dificuldades financeiras momentâneas para cumprir suas obrigações fiscais e previdenciárias é a de que promova a venda de ativos (seja da empresa, sejam pessoais), ao invés de simplesmente desfalcar a Previdência Social e prejudicar, de forma indireta, interesses difusos de natureza sócio-econômica.


Assim sendo, as justificativas utilizadas pelo réu em seu interrogatório para a omissão de recolhimento das contribuições não foram suficientes para provar que não havia outro modo da empresa continuar funcionando, não incidindo no caso a tese de inexigibilidade de conduta diversa.


A esse respeito, confira-se os seguintes julgados:


"PENAL - PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL - ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL - AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES DESCONTADAS DOS EMPREGADOS - APARENTE CONFLITO DE NORMAS - APLICABILIDADE DA LEI 8.212/91 PARA OS DELITOS COMETIDOS ATÉ 7/00 - PRINCÍPIO DO "TEMPUS REGIT ACTUM" - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS AMPLAMENTE COMPROVADAS - CRIME FORMAL - "ANIMUS REM SIBI HABENDI" - DESNECESSIDADE - INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO CARACTERIZADA - CONDENAÇÃO MANTIDA - SUSPENSÃO DA PUNIBILIDADE OU EXTINÇÃO PELO PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO - INOCORRÊNCIA - RECURSO DA DEFESA DESPROVIDO - ERRO MATERIAL CONTIDO NO DISPOSITIVO DA SENTENÇA CORRIGIDO, DE OFÍCIO.
(...)
9. Quanto à afirmação da ausência de dolo na conduta dos réus, não tendo os réus se apropriado das quantias não recolhidas, bem como a de que não obtiveram qualquer benefício com as condutas delituosas, nenhuma guarida merece tal alegação.
10. Com efeito, a conduta típica aqui tratada tem natureza formal e se consuma quando o agente deixa de recolher, na época própria, os valores das contribuições previdenciárias descontados de seus empregados, ou seja, trata-se de crime omissivo próprio. Assim, para a configuração do delito, basta que ele não recolha as importâncias retidas dos empregados, que deveriam ser repassadas ao órgão previdenciário.
11. Além disso, não possui nenhuma relevância jurídica o fato de os apelantes não terem tomado em proveito próprio o numerário devido à autarquia, eis que mero exaurimento do crime, não sendo exigida a presença do animus rem sibi habendi para a caracterização do delito.
(...)
13. Ressalte-se, como bem colocado pela douta Juíza sentenciante, que as declarações de imposto de renda - pessoa física, dos sócios da empresa juntada aos autos, referentes à época em que as contribuições deixaram de ser recolhidas, dão conta de que os administradores não sacrificaram seu próprio patrimônio durante o período em que as contribuições deixaram de ser recolhidas, com o intuito de salvar a empresa, estando em dissonância com a versão prestada pelos apelantes em Juízo de que venderam bens pessoais, desfazendo-se de parte do próprio patrimônio (fls.276/278 e 279/281) para quitar as dívidas da empresa que atravessava grave crise financeira.
(...)
15. E, somente caso se comprovasse a total insolvência no âmbito empresarial é que se poderia cogitar como configurada a aludida exculpante, desde que a insolvência fosse contemporânea ao não recolhimento das contribuições sociais.
16. Note-se que a existência de débitos, títulos protestados e processos de falência contra a empresa tanto pode indicar que ela passava por dificuldades, como pode demonstrar que seus administradores eram maus pagadores.
17. Acrescente-se que a alegação feita pelos acusados de que a empresa passava por uma crise financeira não tem o condão de justificar, por si só, a retenção dos valores relativos a contribuições dos empregados, que, diga-se de passagem, não lhes pertenciam.
18. Assim, nada há, nos autos, a autorizar qualquer interpretação que assegure a existência dos elementos necessários para a configuração da inexigibilidade de conduta diversa ou do estado de necessidade, não prosperando a argumentação deduzida pela defesa dos apelantes.
19. E, por fim, ressalte-se que, nos casos de crimes que não envolvam diretamente bens jurídicos relacionados à pessoa natural, faz-se necessária uma maior comprovação da causa supralegal de excludente de culpabilidade, o que deveras não ocorreu nestes autos.
20. Com efeito, impossível desconsiderar que muitos estabelecimentos empresariais, bem como pessoas físicas, passem por dificuldades financeiras, principalmente em nosso país. Porém, não é dado justificar a prática de crimes, como o tratado nestes autos, cometido contra a Previdência Social, em face dessas situações críticas por que passam todos os cidadãos. Exceto em situações extremas, tal realidade não caracteriza a figura da inexigibilidade de conduta diversa, cujos limites e pressupostos são de grande relevância para evitar que se abra definitivamente uma porta para a impunidade.
21. Conclui-se, portanto, que as eventuais dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa não foram suficientes a excluir a ilicitude do fato ou a culpabilidade dos agentes. 22. A aludida dificuldade financeira poderia ter sido facilmente demonstrada pela defesa, bastando, para tanto, que juntasse aos autos balanços patrimoniais relativos aos exercícios financeiros aludidos na inicial acusatória, ou seja, da época em que ocorreu a conduta criminosa. Ora, não tendo adotado tal providência, apesar de ter plenas condições de fazê-lo, não podem os réus ser beneficiados por uma situação que, a final, não foi por eles demonstrada.
23. Portanto, no caso em apreço, não há que se falar na causa dirimente da inexigibilidade de conduta diversa, posto que todos os réus agiram com deliberada intenção de não repassar à Previdência Social os valores descontados dos empregados, relativos às contribuições previdenciárias, agindo com consciência da ilicitude de suas condutas.
(...)"
(TRF 3, ACR 200261260117302, Relator(a) JUIZA RAMZA TARTUCE, QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:23/02/2011 PÁGINA: 1357)
"PENAL. APELAÇÃO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. NULIDADE INEXISTENTE DA DECISÃO DE ADMISSIBILIDADE DA DENÚNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. ADESÃO AO REFIS. LEI 9.249/95. PARCELAMENTO POSTERIOR AO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. ESTADO DE NECESSIDADE E INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. INAPLICABILIDADE. ART. 24, § 2º, DO CP. CRIME OMISSIVO PRÓPRIO. DELITO DO ART. 168-A, C/C ART. 71, CP. CAUSA SUPRALEGAL DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE AFASTADA. DOSIMETRIA CORRETAMENTE REALIZADA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CONTINUIDADE DELITIVA. FRAÇÃO ADEQUADA FACE AS INÚMERAS CONDUTAS PERPETRADAS. PENA ALTERNATIVA COMPATÍVEL COM O NÍVEL ECONÔMICO DOS RECORRENTES. PROVIMENTO DA APELAÇÃO MINISTERIAL.
(...)
Para a exclusão da ilicitude fundada no estado de necessidade, situação de fato em que o mal que se causa é menor ou igual àquele que se evita, certos requisitos, como a atualidade do perigo, involuntariedade na produção do perigo, razoabilidade do sacrifício do direito ameaçado e inevitabilidade da conduta, são indeclináveis.
(...)
A inexigibilidade de conduta diversa a excluir a culpabilidade é teoria aplicável não apenas às situações previstas no Código, tal como a coação moral irresistível, mas também a fatos que, por analogia, representam uma situação em que o comportamento lícito não era humanamente exigível (causas supralegais).
O recorrido não fez prova cabal das dificuldades financeiras da empresa, visto que em momento algum trouxe aos autos, mesmo sendo seu o ônus, documentação contábil idônea (balancetes, declarações de imposto de renda, contratos de compra e venda de bens próprios, protestos, empréstimos, créditos não pagos, concordata, falência, etc.). Não só deixou de comprovar a excepcional crise, como também não há indícios da involuntariedade na produção do perigo. Por ser o risco de insucesso do negócio uma circunstância indissociável da atividade empresarial, a mera existência de dívidas não enseja o reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa para a prática delitiva, pois bem pode demonstrar indiferença ao adimplemento das obrigações tributárias, ou propósito de inadimplir ou postergar o pagamento de dívidas, e não necessariamente impossibilidade de fazê-lo.
Não basta a existência de dívidas, é necessário que a insolvência ou falência da empresa não possa ser atribuída à má gestão dos administradores e, ainda, que não tenham estes dado causa, ou aproveitado, à crise, para aumentar o patrimônio pessoal em prejuízo dos credores, fisco e trabalhadores.
Há de se registrar que o recorrido responde a mais cinco processos, todos por apropriação indébita previdenciária. Assim, não é demasiado ponderar que a excludente pleiteada é incompatível com o extenso período durante o qual as condutas foram perpetradas, visto que a inexigibilidade de conduta diversa não se coaduna com situação fática que não seja excepcional e transitória.
A situação excepcional - dificuldades financeiras graves - não se caracteriza se, protraída no tempo, transforma a exceção em regra, porque, nesta hipótese, o intuito de locupletamento ilícito é evidente. O direito penal não se põe conivente com a existência de uma determinada empresa, em que seus dirigentes, para mantê-la em funcionamento, apropriam-se de valores pertencentes à Administração Pública, por longo período, com nítido propósito não de salvá-la de dificuldades circunstanciais, mas de fazê-la existir.
Não há que se falar ademais em crime impossível ou ausência de dolo específico. Classificando-se o delito em crime omissivo próprio, é despiciendo o efetivo desconto para a tipificação da conduta ou o animus rem sibi habendi. Precedentes.
XV. Eventual boa-fé em regularizar o débito, caso comprovada, também não teria o condão de excluir a tipicidade ou antijuridicidade do fato.
(...)"
(TRF 3ª Região, ACR 200703990132333, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA , QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:04/06/2009 PÁGINA: 777.)

Por esses motivos, mantenho a condenação do apelante pela prática do crime de apropriação indébita previdenciária, descrito no artigo 168-A do Código Penal.


A continuidade delitiva (artigo 71, do Código Penal) deve ser reconhecida, considerando-se a ofensa ao mesmo bem jurídico, e as mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.


Quanto à dosimetria da pena, a Procuradoria Regional Federal da 3ª Região, em seu parecer, opinou pela consideração da pena prevista no artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/90, ao invés da sanção prevista no artigo 168-A, do Código Penal, que seria inconstitucional, alegando para tanto que ambos os tipos penais referem-se à mesma conduta e ao mesmo bem jurídico tutelado. Assim, a pena decorrente do não recolhimento de contribuições destinadas previdenciárias (art. 168-A do CP) é agravada irrazoavelmente em relação àquela advinda de omissões de recolhimentos de tributos federais (art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90), violando, deste modo, a proporcionalidade entre a intensidade da sanção devida à lesão perpetrada, bem como o princípio da razoabilidade, à medida que agrava demasiadamente a situação dos devedores.


Cabe transcrever as condutas tipificadas pelo respectivos tipos penais:

"Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
I - recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
II - recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)"
"Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
(...)
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:
I - (...);
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
(...)
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa."

Assim, verifica-se que as normas penais tutelam bens jurídicos distintos, uma a ordem tributária e a outra seguridade social, respectivamente, o que justifica a desigualdade presente nos preceitos secundários.


Anteriormente, os delitos cometidos contra a seguridade social estavam dispostos na Lei nº 8.137/90, mas em 24 de julho de 1991 entrou em vigor a Lei nº 8.212/91, em cujo artigo 95, "d", passou a tipificar como crime a conduta de "deixar de recolher, na época própria, contribuição ou outra importância devida à Seguridade Social e arrecadada dos segurados ou do público", que, por sua vez, foi revogada tacitamente em 14 de julho de 2000 com o advento da Lei nº 9.983/00, a qual passou a definir o fato típico no artigo 168-A, do Código Penal.


Em que pese a referida revogação, o fato imputado ao réu continua sendo reprovado criminalmente, pelo que não ocorre a abolitio criminis. Não há que se falar, portanto, em atipicidade da conduta, que recebeu nova capitulação legal, mas sem alteração de conteúdo.


Trata-se, na verdade, de mera impropriedade do nomen iuris da infração penal, que continua a não exigir o animus de apropriação em relação aos valores descontados dos empregados e não repassados aos fiscos no prazo legal, por parte do sujeito ativo.


A modificação operou-se somente quanto à pena máxima cominada e a possibilidade de perdão judicial. Essas novas disposições são mais benéficas, portanto, se aplicam ao fato descrito na denúncia, pois a lei posterior mais benéfica ao réu deve incidir sobre fatos ocorridos antes de sua vigência.


"PENAL E PROCESSUAL PENAL. MEDIDA CAUTELAR. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. APLICAÇÃO DO ART. 9º DA LEI Nº 10.684/2003. TESE ENFRENTADA NO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS NO RECURSO ESPECIAL A QUE A PRESENTE MEDIDA ESTÁ VINCULADA. PREJUDICADO. REVOGAÇÃO DO ART. 95 DA LEI N.º 8.212, PELA LEI N.º 9.983/00. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA.
I - Se a tese referente à aplicação do art. 9º da Lei n.º 10.684/2003 à hipótese dos autos foi enfrentado nos Embargos de Declaração no Recurso Especial 515317/PR, a que esta medida cautelar é vinculada, resta o presente feito prejudicado quando a esse ponto.
II - Inocorrência da alegada abolitio criminis, uma vez que a novatio legis (art. 168-A, § 1º, do Código Penal, acrescentado pela Lei nº 9.983/00), conquanto tenha revogado o disposto no art. 95 da Lei nº 8.212/91, manteve a figura típica anterior no seu aspecto substancial, não fazendo desaparecer o delito em questão.
(Precedentes).
Medida cautelar parcialmente conhecida e, nesse ponto, julgada improcedente."
(MC 8.750/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 21/10/2004, DJ 16/11/2004, p. 302)

Diante destes fatos, de forma a não interferir na intenção do legislador, deve prevalecer o princípio da especialidade da norma jurídica, essencial para a solução dos conflitos aparentes de normas.


Como explica Damásio de Jesus, "diz-se que uma normal penal incriminadora é especial em relação à outra, geral, quando possui em sua definição legal todos os elementos típicos desta, e, mais alguns, de natureza objetiva ou subjetiva, denominados especializantes, apresentando, por isso um minus ou um plus de severidade. A norma especial, ou seja, a que acresce elemento próprio à descrição legal do crime previsto na geral, prefere a esta. "Lex specialis derogat generali; semper specialia generalibus insunt; generi per speciem derogantur" (Direito Penal: Parte Geral. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 107.).


Nesse sentido, entende este Tribunal:


PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIARIA. AUTORIA. MATERIALIDADE. PROVA. DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. DIFICULDADE FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE PROVA. ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI 8137/90. ARTIGO 95, ALÍNEA "D" §1º, DA LEI 8212/91. ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. PENA REFORMADA. APLICAÇÃO DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO ARTIGO 168-A. APELAÇÃO DO MINISTERIO PÚBLICO PROVIDA. APELAÇÃO DO RÉU NÃO PROVIDA.
1.Autoria e materialidade comprovada.
2.Desnecessidade de se demonstrar o dolo específico (animus rem sibi habendi), por se tratar de delito omissivo próprio. Basta que o agente tenha, como in casu, descontado do salário dos trabalhadores os valores relativos às contribuições que são devidas à Previdência Social e deixado de repassá-los na época própria.
3.Inexigibilidade de conduta diversa em razão de dificuldades financeiras da empresa não comprovada.
4.A Lei nº 8137/90 era aplicada aos delitos cometidos contra a seguridade social, ante a ausência de legislação específica sobre a matéria. Com a edição da Lei nº 8212/91, esses crimes passaram a ser disciplinados por esta que tem natureza de lei especial. No entanto o artigo 168-A do Código Penal, com a redação dada pela Lei nº 9983/00 revogou tacitamente o artigo 95, "d" da Lei 8212/91, prevalecendo na hipótese vertente o princípio da especialidade da norma jurídica (art. 168 A).
5.Sentença reformada no tocante à pena imposta. Apelação do Ministério Público Federal a que se dá provimento.
6.Apelação do réu que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ACR 0000670-15.2001.4.03.6004, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR, julgado em 16/08/2005, DJU DATA:05/09/2005) (grifo nosso)
PENAL E PROCESSUAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A, CÓDIGO PENAL. PAGAMENTO INTEGRAL. NOVAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRISÃO CIVIL POR DIVIDA. CONFLITO APARENTE DE NORMAS. PRELIMINARES AFASTADAS. MATERIALIDADE DO DELITO E AUTORIA CONFIGURADOS. DOLO GENÉRICO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PROVAS INSUFICIENTES. CONTINUIDADE DELITIVA. DOSIMETRIA DA PENA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1) (...). 7) Inocorrência de conflito aparente de normas, uma vez que os débitos em questão são as Contribuições Sociais descontadas dos salários dos empregados e que devem ser repassadas a Previdência pelo empregador. A falta de repasse destes valores enseja a prática do crime de Apropriação Indébita Previdenciária, prevista no art. 168 A do Código Penal. Já os crimes previstos na Lei n.º 8.137/90, se referem a sonegação de tributos em geral e não são aplicadas ao caso pelo Principio da Especialidade. 8) (...).
(ACR 00049620620024036102, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, DJF3 DATA:03/10/2008 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) (grifo nosso).

Não havendo inconformismo da defesa acerca da dosimetria da pena, bem como do regime inicial de cumprimento de pena, do valor unitário de cada dia-multa e da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, devem ser mantidos nos termos da r. sentença.


Ante o exposto, ex officio, declaro extinta a punibilidade do réu Fernando Aparecido Carmoni pela prática do crime previsto no artigo 168-A, c/c artigo 71, ambos do Código Penal, em relação aos fatos praticados até a competência do mês de julho de 2003, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, 109, inciso V e 110, §§1º e 2º (na redação anterior à Lei nº 12.234/10) todos do Código Penal e artigo 61, caput, do Código de Processo Penal; e nego provimento à apelação da defesa.


É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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