D.E. Publicado em 04/04/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso para reformar a decisão recorrida e receber a denúncia oferecida, determinando o envio dos autos ao Juízo de origem para o prosseguimento do feito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal, em face da decisão (fls. 97/101) que rejeitou a denúncia oferecida em face de Sérgia Maria Moreira Machado Albano pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 1º, inciso V c.c. § único, da Lei nº 8.137/90.
O Ministério Público Federal sustenta que o direito de o acusado não produzir prova contra si mesmo não pode ser interpretado como um "alvará" para a negativa de apresentação de documentos e livros de escrituração empresarial e/ou tributária, os quais, por força do artigo 195, do Código Tributário Nacional, não podem ser subtraídos das autoridades fiscais. Aduz, ainda, que nenhum direito fundamental é absoluto, devendo ser compatibilizado com outros como a segurança pública, a fé pública, a isonomia e a segurança jurídica (fls. 105/115).
A denunciada apresentou contrarrazões (fls. 123/135).
A Procuradoria Regional da República opinou seja dado provimento ao recurso (fls. 137/150).
É o relatório.
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
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VOTO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO:
Narra a denúncia que Sérgia Maria Moreira Machado Albano, na qualidade de sócia-administradora da empresa "ALBANO BORDADOS INDUSTRIA E COMERCIO LTDA-EPP", suprimiu tributo ao deixar de fornecer documentação exigida pela Administração Pública. Consta, ainda, que, mesmo após receber, em 25/05/2009 e 29/06/2009, termos de intimação para apresentação de documentos - TIAD, a denunciada deixou de fornecer à fiscalização documentos obrigatórios, tais como: Livro de Registro de Empregados, folhas de pagamento de pro-labore do período de 10 a 12/2005, recibos de pagamento a contribuintes individuais, documentação relativa ao pagamento de salário-família e recibos de férias. Em razão dos fatos, foi lavrado o Auto de Infração nº 37.237.457-3.
O MM. Juiz rejeitou a denúncia com fulcro no artigo 395, III, do Código de Processo Penal, em razão da atipicidade da conduta, pois "a denunciada estava sob a proteção do princípio que veda a auto-incriminação." (fl. 99,vº).
Dispõe o artigo 1º, da Lei nº 8.137/90, que:
"Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: |
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; |
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; |
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; |
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; |
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. |
Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. |
Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V." |
A sonegação fiscal caracteriza-se pela ocultação fraudulenta, total ou parcial, da obrigação tributária de natureza pecuniária, principal ou acessória, que decorre de condutas legalmente descritas (incisos I a V e § único), tendentes a impedir que as autoridades tributárias tomem conhecimento da ocorrência do fato gerador, ou que tenham informação correta acerca da base-de-cálculo, de elemento determinante da alíquota, de quantia que poderia ser deduzida da base-de-cálculo ou do montante final do tributo, etc.
Na hipótese do § único da Lei nº 8.137/90, trata a norma da recusa do contribuinte em entregar à autoridade fiscal outros documentos - além da nota fiscal ou equivalente (inciso V) - como livros fiscais e contábeis, guias de recolhimento, etc., para impedir que esta tome conhecimento da ocultação fraudulenta da obrigação tributária.
Dispõem os artigos 194, 195 e 200, ambos do Código Tributário Nacional que:
"Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação. |
Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal." |
"Art. 195. Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los. |
Parágrafo único. Os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados serão conservados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram." |
"Art. 200. As autoridades administrativas federais poderão requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção." |
E o artigo 1.193, do Código Civil, ao tratar da escrituração dos livros do empresário, estabelece que:
"Art. 1.193. As restrições estabelecidas neste Capítulo ao exame da escrituração, em parte ou por inteiro, não se aplicam às autoridades fazendárias, no exercício da fiscalização do pagamento de impostos, nos termos estritos das respectivas leis especiais." |
Nesse sentido é o teor da Súmula 439, do Supremo Tribunal Federal:
"Estão sujeitos à fiscalização tributária ou previdenciária quaisquer livros comerciais, limitado o exame aos pontos objeto da investigação." |
Trata-se, portanto, de dever legal imposto ao contribuinte, que não pode deixar de ser cumprido sob o manto do direito de o acusado, no âmbito penal, não ser obrigado a produzir prova contra si mesmo, pois nenhum direito fundamental é absoluto.
O legislador infraconstitucional elegeu à categoria de crime o mero descumprimento, após o prazo determinado, da exigência legal da autoridade fiscal competente, com o fim de suprimir ou reduzir tributo, tratando-se, pois, de crime omissivo próprio, e que se consuma com a mera omissão do agente, vez que, ao contrário das condutas previstas nos incisos I a IV do referido artigo 1º, não é considerado crime material (Súmula Vinculante 24).
Na presente hipótese, consta do Auto de Infração que a empresa contribuinte, embora intimada na pessoa da denunciada (Termos de Intimação Fiscal nº 01 e 02 - ambos com prazo de 20 dias - fls. 37/42), deixou de apresentar o Livro de Registro de Empregados de nºs 01 e 02, folhas de pagamento de pro-labore do período de 10 a 12/2005, recibos de pagamento a contribuintes individuais, documentação relativa ao pagamento de salário-família (termo de responsabilidade, certidões de nascimento, caderneta de vacinação e atestado de freqüência escolar) e recibos de férias (fl. 17).
Desta forma, revela-se a tipicidade da conduta praticada pela denunciada, subsumindo-se ao disposto no artigo 1º, inciso V c.c. § único, da Lei nº 8.137/90. Nesse sentido, trago à colação os seguintes julgados:
"CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA - NEGATIVA EM FORNECER DOCUMENTO OBRIGATÓRIO - PRESCINDIBILIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. |
O crime previsto no inciso V do artigo 1º da Lei nº 8.137/90 - "negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação" - prescinde do processo administrativo-fiscal e a instauração deste não afasta a possibilidade de imediata persecução criminal." (grifei) |
(STF, HC 96200, rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJe 27/05/2010). |
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"PENAL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DOS RÉUS - ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 1º, V, E PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI 8137/90 - OMISSÃO NA FUNDAMENTAÇÃO DA DOSIMETRIA DA PENA - ART. 59, CP - ALEGAÇÕES IMPROCEDENTES - EMBARGOS DESPROVIDOS. |
I- Embargos de Declaração dos réus, em face de Acórdão que os condenou pelo crime do art. 1º, V, e parágrafo único da Lei 8.137/90 e reduziu a pena do crime do art. 299, do Código Penal, alegando inconstitucionalidade do art. 1º, V, parágrafo único da Lei 8137/90 por violação do art. 5º, LXIII, da CF/88 (direito de não produzir provas contra si mesmo) e do princípio da proporcionalidade (no Código Penal seria desobediência, com pena de 15 dias a 6 meses). |
II- Não procedem as alegações dos Embargantes: afirmar que fornecer os documentos de uma empresa (art. 1º, V, Lei 8137/90) é produzir prova contra si mesmo, me parece ser uma curiosa "confissão de culpa"; a dosimetria da pena foi fundamentada pela culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime; a pena não foi excessiva, aplicou-se um aumento de, apenas, 2 meses para o delito da Lei 8137/90 e de 6 meses para o crime do art. 299, CP, sendo que os réus utilizaram um artifício engenhoso, com documentos falsos para forjar uma falsa transferência de empregados entre duas empresas. |
(...)." |
(TRF2, ACR 200450010047208, rel. Desembargador Federal Messod Azulay Neto, 2ª Turma Especializada, E-DJF2R de 04/05/2010) |
Diferentes são as hipóteses nas quais o contribuinte deixa de atender à intimação da autoridade fiscal para prestar esclarecimentos sobre os documentos e livros já apresentados, ou presta declaração falsa em procedimento fiscal, em relação às quais há julgados no sentido da atipicidade da conduta, desta E. Corte (ACR 200461260064203, rel. Desembargador Federal Henrique Herkenhoff, 2ª Turma, DJF3 CJ2 de 28/05/2009; e HC 200303000313712, relª. Desembargadora Federal Cecilia Mello, 2ª Turma, DJU 30/07/2004) e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (ACR 200004011147234, rel. Desembargador Federal Fábio Bittencourt Da Rosa, 7ª Turma, DJ 24/04/2002) - alguns dos precedentes citados na decisão recorrida.
De fato, a Constituição Federal de 1988 consagra o direito de permanecer calado (artigo 5º, inciso LXIII) como manifestação do princípio da ampla defesa, assegurado aos litigantes em processo judicial ou administrativo (inciso LV, da referida norma).
Mas não é esse o caso dos autos.
Por fim, observo que, ao contrário do que constou na decisão recorrida, muito embora a contribuição previdenciária esteja sujeita a lançamento por homologação, nada impede o exercício da fiscalização tributária pela Administração Fazendária, que poderá proceder à constituição do crédito tributário mediante lançamento de ofício, enquanto não operada a decadência. Aliás, consta dos autos que foi também lavrado o Auto de Infração nº 37.237.458-1 em razão da ausência de repasse ao INSS, dentro do prazo legal, de valores de contribuição previdenciária descontados dos segurados empregados, bem como ausência de recolhimento de contribuição previdenciária descontada sobre a remuneração paga a título de pro-labore da sócia-administrativa, ora denunciada, no período de 01 a 09/2005 (fl. 07). Tais fatos, porém, não foram objeto da presente denúncia.
Há prova da materialidade do delito e indícios suficientes de autoria delitiva (fls. 07/10, 16/33, 37/42 e 58). A denúncia atendeu aos requisitos descritos no artigo 41, do Código de Processo Penal, contendo a exposição clara e objetiva dos fatos alegadamente delituosos, com narração de todos os elementos essenciais e circunstanciais que lhes são inerentes e, portanto, deve ser recebida.
Com tais considerações, DOU PROVIMENTO ao recurso para reformar a decisão recorrida e receber a denúncia oferecida, determinando o envio dos autos ao Juízo de origem para o prosseguimento do feito.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 01/04/2013 12:59:56 |