Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 21/03/2013
HABEAS CORPUS Nº 0032821-18.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.032821-2/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
IMPETRANTE : PIERPAOLO CRUZ BOTTINI
: IGOR SANT ANNA TAMASAUSKAS
: ANA FERNANDA AYRES DELLOSSO
: ROSSANA BRUM LEQUES
: DEBORA CUNHA RODRIGUES
PACIENTE : JONAS JAMIL LESSA LOPES
ADVOGADO : IGOR TAMASAUSKAS e outro
: PIERPAOLO CRUZ BOTTINI
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE OURINHOS - 25ª SSJ - SP
CO-REU : MIGUEL FRANCISCO SAEZ CACERES FILHO
: MAURICIO DE OLIVEIRA PINTERICH
: JOAO PEDRO DE MOURA
: RUBENS ROGERIO DE OLIVEIRA
: MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA
: ANISIO SILVA
: JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA
: AFFONSO FERNANDES SUNIGA
: VALTEMIR DOS SANTOS
: JOAO CLAUDIO DA SILVA SOUZA
: PAULO PEREIRA DA SILVA
No. ORIG. : 00043407620074036125 1 Vr OURINHOS/SP

EMENTA

PENAL. HABEAS CORPUS. FALSIDADE IDEOLÓGICA EQUIPARAÇÃO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO. PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ADITAMENTO DA DENÚNCIA: POSSIBILIDADE. NULIDADE POR AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA: INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA INSTRUÍDA COM INQUÉRITO POLICIAL: EQUIVALÊNCIA DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CONDUZIDO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. REABERTURA DE PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA POR ESCRITO: NECESSIDADE.
1. Habeas corpus impetrado contra ato do MM. Juiz Federal da 1ª Vara Federal de Ourinhos-SP, objetivando a aplicação do artigo 89 da Lei 9.099/1995; ou, sucessivamente, que seja oportunizada a apresentação de defesa prévia na forma do artigo 514 do CPP; ou, ainda, seja dada oportunidade de apresentação de resposta à acusação, nos termos do artigo 396 do CPP.
2. A denúncia é clara em narrar que o paciente praticou a conduta delituosa na qualidade de gerente do Banco da Terra. Assim, para fins penais, o paciente é equiparado a funcionário público.
3. Na ação penal, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da qualificação jurídica a eles atribuída pelo órgão da acusação. Precedente do Supremo Tribunal Federal. A capitulação jurídica dada na denúncia determina o parâmetro para eventual a proposta de suspensão condicional do processo. No caso em tela sequer haveria necessidade de emenda da inicial, pois a conduta está suficientemente narrada com todas as suas circunstâncias, o que também não impede que a Acusação adite a denúncia a qualquer tempo.
4. Quanto ao pedido de nulidade por ausência de notificação prévia, os impetrantes não demonstraram efetivo prejuízo, a ensejar a anulação do ato, nos termos do artigo 563 do Código de Processo Penal. Em se tratando de crime praticado por funcionário público, a defesa preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal não se aplica quando a denúncia é instruída com o inquérito policial - a tanto equivalendo, por analogia, o procedimento investigatório conduzido pelo Ministério Público. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
5. A princípio, não cabe à parte fazer ressalvas ou apresentar questões de ordem no curso do processo. Contudo, a defesa apresentou questão relevante, considerado que a capitulação legal descrita na denúncia comportava, em tese, o benefício da suspensão condicional do processo.
6. A manifestação do MPF tem, inequivocamente, natureza de aditamento à denúncia, para corrigir a capitulação legal inicialmente dada. Ao acatar a manifestação do MPF, o Juízo impetrado, na verdade recebeu o aditamento à denúncia. E, assim, caberia ao Juízo determinar a reabertura de prazo para que a defesa apresentasse a defesa por escrito, nos termos do artigo 396 do CPP, sob pena de irreparável prejuízo à ampla defesa.
7. Ordem parcialmente concedida.




ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conceder em parte a ordem, tão somente para que seja concedida à defesa do paciente a reabertura de prazo para apresentação de resposta à acusação, nos termos do artigo 396 e seguintes do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 05 de março de 2013.
MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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HABEAS CORPUS Nº 0032821-18.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.032821-2/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
IMPETRANTE : PIERPAOLO CRUZ BOTTINI
: IGOR SANT ANNA TAMASAUSKAS
: ANA FERNANDA AYRES DELLOSSO
: ROSSANA BRUM LEQUES
: DEBORA CUNHA RODRIGUES
PACIENTE : JONAS JAMIL LESSA LOPES
ADVOGADO : IGOR TAMASAUSKAS e outro
IMPETRADO : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE OURINHOS - 25ª SSJ - SP
CO-REU : MIGUEL FRANCISCO SAEZ CACERES FILHO
: MAURICIO DE OLIVEIRA PINTERICH
: JOAO PEDRO DE MOURA
: RUBENS ROGERIO DE OLIVEIRA
: MILTON CAMOLESI DE ALMEIDA
: ANISIO SILVA
: JOAQUIM FERNANDES ZUNIGA
: AFFONSO FERNANDES SUNIGA
: VALTEMIR DOS SANTOS
: JOAO CLAUDIO DA SILVA SOUZA
: PAULO PEREIRA DA SILVA
No. ORIG. : 00043407620074036125 1 Vr OURINHOS/SP

RELATÓRIO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Pierpaolo Cruz Bottini, Igor Sant'Anna Tamasauskas, Ana Fernanda Ayres Dellosso, Rossana Brum Leques e Débora Cunha Rodrigues, em favor de JONAS JAMIL LESSA LOPES, contra ato do MM. Juiz Federal da 1ª Vara Federal de Ourinhos-SP, objetivando a aplicação do artigo 89 da Lei 9.099/1995; ou, sucessivamente, caso considerada a majorante da qualidade de funcionário público, que seja oportunizada a apresentação de defesa prévia na forma do artigo 514 do CPP; ou, ainda sucessivamente, seja dada oportunidade de apresentação de resposta à acusação, nos termos do artigo 396 do CPP. Em sede de liminar, pedem seja sustado o trâmite processual em relação ao paciente.

Alegam os impetrantes que o paciente figura como réu na ação penal nº 0004340-76.2007.403.6125, na qual é acusado da prática do crime de falsidade ideológica, tipificado no artigo 299 do CP, em concurso de pessoas.

Alegam ainda os impetrantes que, após a citação, a Defesa se manifestou quanto à ausência de oferta da suspensão condicional do processo, tendo o MPF se manifestado pela negativa, apontando a incidência da majorante de funcionário público, tendo então a Defesa pleiteado a aplicação do benefício ou, alternativamente, a emenda da denúncia com abertura de prazo para oferecimento de defesa nos termos do artigo 514 do CPP.

Afirmam os impetrantes que então o Juízo impetrado indeferiu todos os pedidos formulados e tomou a primeira petição como resposta à acusação, aduzindo estar precluso seu prazo para apresentação de testemunhas.

Sustentam os impetrantes a ocorrência de constrangimento ilegal, em decorrência da nulidade por inobservância das formalidades legais essenciais, por: a) ausência de oferta de suspensão condicional do processo; b) necessidade de emenda da denúncia e ausência de notificação prévia; c) afronta ao devido processo legal e ao direito à ampla defesa.

Argumentam os impetrantes que diante a qualificação jurídica indicada pela própria acusação, artigo 299 do CP, imperiosa a aplicação da suspensão condicional do processo, sendo que a denúncia não indicou, em momento algum, a incidência do parágrafo único do referido artigo, o que justificou o não oferecimento da proposta. Argumentam que deveria o Magistrado aplicar, por analogia, o artigo 28 do CPP, ou ao menos determinar a emenda da denúncia e a reabertura do prazo para resposta e, ao invés disso, concluiu pela preclusão desse direito.

Argumentam ainda os impetrantes que o novo elemento inserido pela acusação foi justamente a qualidade de funcionário público e, havendo previsão de aumento de pena, imperiosa a observância do artigo 514 do CPP, ainda que a denúncia se embase em procedimento investigatório prévio.

Sustentam também os impetrantes que não poderia o Juízo declarar precluso o direito de apresentar defesa prévia e arrolar testemunhas, em contrariedade aos artigos 396 e 396-A, §2º do CPP. Argumentam que a defesa prévia não foi apresentada, tendo a manifestação da Defesa pleiteando a aplicação do artigo 89 da Lei 9.099/1995 sido expressa ao indicar que a mesma não tinha caráter de defesa preliminar, requerendo ainda a reabertura do prazo.

Requisitadas informações à autoridade impetrada (fls. 102/103), foram prestadas às fls. 107/110 e 174/181, instruídas com os documentos de fls. 111/163 e 182/285.

A liminar foi deferida em parte, apenas para que seja concedida à defesa do paciente a reabertura do prazo para apresentação de resposta à acusação, nos termos do artigo 396 e seguintes do Código de Processo Penal (fls.165/169).

O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do DD. Procurador Regional da República Marcelo Moscogliato, opinou pela concessão parcial da ordem, confirmando-se a decisão liminar proferida (287290).


É o relatório.

Apresento o feito em mesa.


VOTO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


A ordem é de ser deferida em parte.

A denúncia oferecida em desfavor do paciente, dando-o como incurso no artigo 299 do Código Penal, é de seguinte teor:


1.6. Das informações falsas inseridas no "Relatório de Acompanhamento e Controle da Fazenda Ceres"
Em 31 de outubro de 2.001, com o objetivo de apurar as notícias veiculadas na imprensa nacional de que a Fazenda Ceres tinha grande área inapropriável (cerca de 50% de mata nativa de preservação permanente, muita pedra e terrenos arenosos) e havia sido comprada com valor superfaturado, cumprindo ordem do então Ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Belens, Jungmann Pinto, para que se fizesse uma auditoria acerca do projeto da Fazenda Ceres, os gerentes do Banco da Terra e denunciados João Claudio da Silva Souza (engenheiro agrônomo), Jonas Jamil Lessa Lopes (engenheiro agrônomo) e Valtemir dos Santos (administrador de empresas, também formado em educação física), junto com José Cristian do Carmo Mendes subscreveram um "Relatório de Acompanhamento e Controle da Fazenda Ceres" (fls. 940/956). Para a confecção desse documento, somente João Cláudo da Silva Souza e Valtemir dos Santos deslocaram-se até o local dos fatos, enquanto os demais subscritores permaneceram em Brasília/DF.
Na parte intitulada "Levantamento Técnico da Fazenda Ceres" o aludido Relatório atesta:
"De forma geral, a constatação das características abaixo relacionadas, verificadas quando da visita ao empreendimento, corrobora com levantamento realizado na Proposta de Financiamento (ver anexo 44 - folha 9). Destacamos algumas:
- Solos: apresenta predominância de latossolos, com texto variando (gradações de arenosa e argilosa) e fertilidade variável) (foto: 20 e 23). (...) (grifo nosso)
Já no tópico de "Conclusões", o mencionado no Relatório de Acompanhamento e Controle da Fazenda Ceres afirma:
(...) Considerando que a Fazenda Ceres, em termos de qualidade de solos, topografia, recursos hídricos, vias de acesso e localização, apresenta condições favoráveis à exploração agropecuária e do turismo rural; (...)
Tais considerações são inverídicas, isso porque os denunciados, embora convocados para "buscar todas as informações que pudessem elucidar o que efetivamente ocorrera no processo de aquisição e financiamento da Fazenda Ceres", sequer chegaram a fazer a "análise de solo" ou "análise agronômica precisa" do aludido imóvel, limitando-se a compulsar os termos da Proposta de Financiamento e vistoriá-lo por breve jornada.
Porém, afirmaram falsamente ter constatado, "quando da visita ao empreendimento", circunstâncias afirmadas na Proposta e cujo diagnóstico dependeria necessariamente de execução de trabalho técnico, de sorte a permitir fosse alcançado o diagnóstico condizente com a realidade.
Ademais, as provas (inclusive laudos periciais) carreadas a estes autos demonstram que na Fazenda Ceres não há predominância de latossolos (solos de ótima qualidade), já que existe somente um trecho de latossolo vermelho-escuro (cerca de 08 hectares em parte do relevo suave ondulado - topo de morros); e há predominância de relevo forte ondulado e montanhoso, grande quantidade de florestas (quase 50,00% da área do imóvel), encontrando-se estas em áreas de Reserva Legal e Preservação Permanente; bem como apenas 17,10% de terras de classes II, III e IV, são recomendadas para o cultivo com lavouras anuais/permanentes, apresentando limitações de uso.
Quanto ao preço pago pela aquisição do imóvel, após colherem preços de terras em anúncios de jornais da região à época da visita e por informações colhidas diretamente de dois corretores de imóveis da região (um deles, Douglas Howthome Ribas, intermediou a venda da fazenda Ceres, pelo que recebeu R$ 90.000,00 a título de comissão), os citados técnicos do Ministério do Desenvolvimento Agrário constataram no referido relatório que o valor pago pela Fazenda Ceres estava perfeitamente enquadrado dentro do preço de mercado, "não tendo havido (...) superfaturamento".
Assim, embora dois deles (João Claudio da Silva Souza e Jonas Jamil Lessa Lopes) sejam engenheiros agrônomos (conhecedores das normas para avaliação de imóveis rurais), os denunciados fizeram uma colheita de preços não fundada em elementos científicos que pudesse levar à aferição do correto valor venal do imóvel ao tempo dos fatos com um mínimo de acerto.
Finalmente, no item "6" do tópico de Conclusões, verifica-se que os aludidos técnicos tão-somente mencionaram que "De acordo com a Proposta de Financiamento, o empreendimento a ser desenvolvido no imóvel adquirido, Fazenda Ceres, demonstra viabilidade econômica", não fazendo referência a qualquer dado técnico ou diligência por eles empreendida, quando da visita à Fazenda Ceres para sustentar tal afirmação.
Ainda, os denunciados João Claudio da Silva Souza (engenheiro agrônomo), Jonas Jamil Lessa Lopes (engenheiro agrônomo) e Valtemir dos Santos (administrador de empresas, também formado em educação física), na qualidade de Gerentes do Banco da terra, responsáveis pela produção do "Relatório de Acompanhamento e Controle da Fazenda Ceres", nele lançaram informações cuja falsidade conheciam, atestando, enfim, a plena regularidade dos atos que redundaram na aquisição, mediante financiamento do Banco da terra, do imóvel fazenda Ceres pelos membros da Associação de Agricultores Familiares Força da terra de Piraju.

Depreende-se da narrativa da denúncia a exposição dos fatos delituosos de maneira clara e objetiva, com narração dos elementos essenciais e circunstanciais que lhes são inerentes, atendendo aos requisitos descritos no artigo 41 do Código de Processo Penal.

No caso dos autos, a denúncia é clara em narrar que o paciente praticou a conduta delituosa na qualidade de gerente do Banco da Terra.

O Fundo de Terras e da Reforma Agrária - Banco da Terra é um programa instituído pela LC 93/1998 com a finalidade de financiar programas de reordenação fundiária e de assentamento rural, com parte dos recursos oriundo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, ou seja, com aplicação de recursos públicos federais.

A gestão financeira do Fundo de Terras e da Reforma Agrária ficou a cargo do BNDES e foi criado como órgão gestor do Fundo o Conselho Curador do Banco da Terra (formado pelos Ministros de Estado do Desenvolvimento Agrário, que o presidirá, da Agricultura e do Abastecimento, do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, da Fazenda, do Meio Ambiente, do Esporte e Turismo, pelo Presidente do BNDES, pelo Presidente do INCRA, por dois representantes dos potenciais beneficiários do Banco da Terra, a serem convidados pelo Presidente do colegiado) consoante Decreto nº 3.475 de 19.05.2000, vigente ao tempo dos fatos.

Assim, para fins penais, o paciente é equiparado a funcionário público.

É assente na jurisprudência que, na ação penal, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da qualificação jurídica a eles atribuída pelo órgão da acusação (STF, Pleno, HC 70620-DF, Dj 24.11.2006 p.63).

A princípio, a capitulação jurídica dada na denúncia determina o parâmetro para eventual a proposta de suspensão condicional do processo. No entanto, no caso em tela sequer haveria necessidade de emenda da inicial, pois a conduta está suficientemente narrada com todas as suas circunstâncias, o que também não impede que a Acusação adite a denúncia a qualquer tempo, como o fez à fl. 4708 dos autos principais (fl. 53 da impetração).


Quanto ao pedido de nulidade por ausência de notificação prévia, não assiste razão aos impetrantes.

É certo que, em se tratando de crime praticado por funcionário público, "é desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial" (STJ, Súmula nº 330).

No caso concreto, as investigações iniciaram-se através de procedimento investigatório criminal instaurado pela Procuradoria da República, no qual houve a oportunidade de ampla defesa, conforme se verifica das informações da DD. Autoridade impetrada (cfr fl. 110).

A alegação dos impetrantes, feita em petição protocolada após a juntada aos autos do parecer da Procuradoria Regional da República, de que não houve oportunidade de manifestação do impetrante no procedimento investigatório criminal, não merece ser conhecida. Em primeiro lugar, porque nada foi alegado nesse sentido na petição inicial da impetração. E, em segundo lugar, porque não demonstraram os impetrantes o desacerto das informações do Juízo impetrado, não havendo nos autos cópia da íntegra do procedimento investigatório.

Assim, a prévia notificação do acusado para a apresentação de defesa preliminar prevista no artigo 514 do Código de processo Penal, revela-se prescindível.

Cumpre ressaltar que os impetrantes não demonstraram efetivo prejuízo, a ensejar a anulação do ato, nos termos do artigo 563 do Código de Processo Penal. Nesse sentido situa-se o entendimento jurisprudencial:


HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 2º, INCISO I, DO DECRETO-LEI Nº 201/67. DEFESA PRELIMINAR. RÉU EX-PREFEITO. AÇÃO PENAL PRECEDIDA DE INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. NULIDADE RELATIVA. ALEGAÇÃO A DESTEMPO. PRECLUSÃO. 1. A defesa preliminar definida no art. 2º, inciso II, do Decreto-lei nº 201/67, a exemplo da prevista nos artigos 514 do CPP e 4º da Lei nº 8.038/90, é dispensável nas ações penais antecedidas de inquérito policial bem como naquelas em que o réu já deixou a função pública (in casu, o mandato de Prefeito). Precedentes do STJ e STF. 2. Eventual inobservância a tal dispositivo configura nulidade relativa - logo, sanável - somente podendo ser reconhecida mediante comprovação do efetivo prejuízo (pas de nullité sans grief) e da influência exercida na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa (arts. 563 e 566 da Lei Adjetiva). 3. Como no caso em apreço o alegado vício deu-se em momento pré-processual, antes mesmo da instrução, deveria ter sido ventilado na primeira ocasião em que a parte se manifestou - ou seja, até a fase de apresentação da defesa prévia - o que inocorreu na hipótese, restando, por tal motivo, sanado. 4. Ordem denegada.
TRF-4a Região - 8a Turma - HC 200204010426781-PR- Rel. Des. Fed. Élcio Pinheiro de Castro - DJU 27.11.2002 p. 988

No sentido de que a defesa preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal não se aplica quando a denúncia é instruída com o inquérito policial - a tanto equivalendo, por analogia, o procedimento investigatório conduzido pelo Ministério Público - situa-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do
Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito
policial.
STJ Súmula 330
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONCUSSÃO. ART. 316 DO CP. INÉPCIA DA INICIAL NÃO CARACTERIZADA. DESNECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO RITO DO ART. 514 DO CPP. LEGALIDADE DA PRORROGAÇÃO DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO VISLUMBRADO. ORDEM DOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DA CONCUSSÃO COMPROVADOS. CRIME DE QUADRILHA NÃO CONFIGURADO. PENA-BASE MANTIDA. SÚMULA 444 DO STJ. MAUS ANTECEDENTES NÃO CONFIGURADOS. CONTINUIDADE DELITIVA NÃO VERIFICADA. CONCURSO MATERIAL. PENA DE MULTA READEQUADA. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO, NEGANDO-SE PROVIMENTO AO APELOS DA DEFESA. 1. A denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação do agente e a classificação do crime, descabendo falar-se em inépcia da exordial. 2. A não observância do rito previsto no artigo 514 do Código de Processo Penal não caracteriza cerceamento de defesa, já que os autos foram instaurados com base em inquérito policial, a teor da Súmula 330 do STJ. (...)
TRF-3a Região - 1a Turma - ACR 0014315-17.2008.4.03.6181 - Rel. Des.Fed. Jose Lunardelli - DJe 04.09.2012
PENAL. OPERAÇÃO OESTE. ARTIGOS 317, PARÁGRAFO PRIMEIRO; 325, PARÁGRAFO SEGUNDO; 333, PARÁGRAFO ÚNICO; TODOS DO CÓDIGO PENAL. ARTIGO 10 DA LEI Nº 9.296/96. CRIME CONTINUADO. PRELIMINARES AFASTADAS. MATERIALIDADE. AUTORIA. PROVAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. RESTITUIÇÃO DAS COISAS APREENDIDAS. DOSIMETRIA DA PENA. 1. Alegação de incompetência afastada. Considerando que o Juízo Federal de Assis/SP, quando do início das investigações, era em princípio competente para processar e julgar a futura ação penal, já que os fatos aparentavam ser conexos com outros objeto de ações em andamento perante o aludido Juízo, não há que se falar em ilicitude de provas autorizadas por Juiz incompetente, já que detinha competência para tanto à época dos fatos. 2. A defesa preliminar prevista no artigo 514 do Código de Processo Penal é desnecessária quando a ação penal for antecedida de inquérito policial. Súmula 330 do STJ. (...)
TRF-3a Região - 1a Turma - ACR 0002995-20.2007.4.03.6111 - Rel. Des.Fed. Vesna Kolmar - DJU 27.09.2011 p.155

Quanto ao pedido de reabertura de prazo para oferecimento de resposta à acusação e arrolamento de testemunhas por afronta ao devido processo legal e ao direito à ampla defesa pela declaração, verifico que assiste razão aos impetrantes.

A princípio, não cabe à parte fazer ressalvas ou apresentar questões de ordem no curso do processo. Contudo, verifico que a defesa apresentou questão relevante, considerado que a capitulação legal descrita na denúncia comportava, em tese, o benefício da suspensão condicional do processo.

Assim, não vislumbro intuito protelatório por parte da defesa porque, em tese, o pedido era cabível.

E, no caso dos autos, a denúncia em nenhum momento fez referência ao parágrafo único do artigo 299 do Código Penal. Instado a se manifestar sobre o requerimento do réu de aplicação da suspensão condicional do processo, nos termos do artigo 89 da Lei nº 9.099/1995, o Ministério Público Federal peticionou:


O réu JONAS JAMIL LESSA LOPES não faz jus ao benefício postulado. É que a denúncia narra com clareza ter o réu encetado a prática delitiva na condição de gerente do Banco da Terra (fl. 26, primeiro parágrafo e fl. 28, terceiro parágrafo, numeração em manuscrito).
Presente, portanto, a qualidade de funcionário público, incide aqui a majorante prevista no parágrafo único do artigo 299, ultrapassando-se o limite legal da suspensão condicional do processo.

A manifestação do MPF tem, inequivocamente, natureza de aditamento à denúncia, para corrigir a capitulação legal inicialmente dada.

Ao acatar a manifestação do MPF, o Juízo impetrado, na verdade recebeu o aditamento à denúncia. E, assim, caberia ao Juízo determinar a reabertura de prazo para que a defesa apresentasse a defesa por escrito, nos termos do artigo 396 do CPP, sob pena de irreparável prejuízo à ampla defesa.


Por estas razões, confirmando a liminar, concedo em parte a ordem tão-somente para que seja concedida à defesa do paciente a reabertura de prazo para apresentação de resposta à acusação, nos termos do artigo 396 e seguintes do Código de Processo Penal.

É como voto.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCIO SATALINO MESQUITA:10125
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Data e Hora: 18/03/2013 15:35:35