Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 07/08/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002296-94.2009.4.03.6002/MS
2009.60.02.002296-9/MS
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ reu preso
: NAZARIO DAVALOS CACERES reu preso
ADVOGADO : JAIRO JOSE DE LIMA (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE DA CONFISSÃO: NÃO CONHECIMENTO. TRANSNACIONALIDADE DO DELITO CARACTERIZADA. PENA CUMULATIVA DE MULTA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE RECLUSÃO POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE. REGIME INICIAL FECHADO: POSSIBILIDADE.
1. Apelação da Defesa contra sentença que condenou o réu VICTORINO à pena de 6 anos, 5 meses e 23 dias de reclusão, e o réu NAZÁRIO à pena de 5 anos, 8 meses e 1 dia de reclusão, ambos como incursos no artigo 33, caput, c.c. o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/2006. A sentença foi absolutória em relação à imputação do artigo 35 da Lei 11.343/2006.
2. O artigo 42 da Lei 11.343/2006 estabelece expressamente que, no crime de tráfico de drogas, a natureza e a quantidade da substância, a personalidade e a conduta social do agente devem ser considerados na fixação das penas, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal. Precedentes. Razoável a fixação da pena-base um pouco acima do mínimo legal, considerada a quantidade da droga apreendida.
3. Consoante a Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base". Dessa forma, processos em andamento não podem ser considerados como maus antecedentes, conduta social reprovável e personalidade perniciosa do agente.
4. Não se conhece do pedido quanto à circunstância atenuante da confissão espontânea, porquanto a defesa não possui interesse em recorrer quanto ao ponto.
5. Configura-se a internacionalidade do tráfico quando o agente está transportando o entorpecente e prestes a sair do território nacional. Precedentes.
6. A multa é sanção legalmente prevista, de forma cumulativa à pena privativa de liberdade, devendo ser aplicada. Questões envolvendo a impossibilidade de pagamento da multa devem ser veiculadas, oportunamente, pela via adequada.
7. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade das vedações à substituição constantes da Lei 11.343/2006 (HC 97256/RS). Contudo o réu não faz jus à substituição da pena de reclusão por penas restritivas de direitos, uma vez que não preenchidos os requisitos do inciso I do artigo 44 do Código Penal. Precedentes.
8. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do §1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/1990, na redação dada pela Lei nº 11.464/2007, que estabelecia o regime inicial fechado para cumprimento da pena para os condenados por crime de tráfico de drogas. No caso dos autos, o entendimento pela inconstitucionalidade do referido dispositivo legal firmado pelo STF, não beneficia o réu.
9. Apesar de o regime inicial ser estabelecido, a princípio, em função da quantidade da pena, nos termos do §2º do artigo 33 do Código Penal, o §3º do citado dispositivo estabelece que "a determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código". Precedentes. Foram consideradas desfavoráveis as circunstâncias do artigo 59 do CP, em relação às consequências do crime, fixando-se a pena-base em patamar superior ao mínimo legal. Dessa forma, cabível o estabelecimento do regime inicial fechado.
10. Apelo conhecido em parte e, na parte conhecida, improvido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer em parte da apelação e, na parte conhecida, negar-lhe provimento; e, de ofício, reduzir a pena-base do réu VICTORINO, fixando sua pena definitiva em 05 (cinco) anos, 08 (oito) meses e 01 (um) dia de reclusão e 568 (quinhentos e sessenta e oito) dias-multa, mantida, no mais, a sentença apelada, e comunicando-se o Juízo das Execuções Penais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 23 de julho de 2013.
MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002296-94.2009.4.03.6002/MS
2009.60.02.002296-9/MS
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ reu preso
: NAZARIO DAVALOS CACERES reu preso
ADVOGADO : JAIRO JOSE DE LIMA (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica

RELATÓRIO

O Juiz Federal Convocado MARCIO MESQUITA (Relator):


O Ministério Público Federal, em 19.06.2009, denunciou VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ, qualificado nos autos, paraguaio, nascido aos 18.11.1971, como incurso no artigo 33, caput, c.c. o artigo 35 e 40, I, da Lei nº 11.343/2006 e NAZÁRIO DÁVALOS CÁCERES, cidadão paraguaio, nascido aos 01.07.1975, como incurso no artigo 33, caput, c.c. o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/2006. Consta da denúncia:


... Consta dos inclusos autos que, no dia 19.05.2009, por volta das 02h, na Rodovia BR-463, na altura do Km 25, município de Dourados/MS, Policiais Rodoviários Federais prenderam em flagrante VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ e NAZÁRIO DÁVALOS CÁCERES, por, dolosamente e conscientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, estarem transportando, trazendo consigo e guardando, 55.600 Kg (cinquenta e cinco quilos e seiscentos gramas) da substância entorpecente Cannabis sativa Linneu, vulgarmente conhecida como MACONHA, substância esta que determina dependência física e psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (cf. Auto de Apresentação e Apreensão = fl. 11), após adquiri-la e importá-la do Paraguai.
Nas circunstâncias de tempo e lugar mencionadas, os Policiais encontravam-se em ronda noturna e depararam-se com os denunciados conduzindo duas bicicletas carregando fardos em suas garupas.
Ao avistarem os policiais, os denunciados jogaram suas bicicletas no chão e partiram em disparada em direção a um canavial existente ao longo da rodovia.
Não obstante, os Policiais lograram capturar os denunciados e identificaram na mesma ocasião que estavam sendo transportadas nas bicicletas 52 tabletes confeccionados em plásticos transparentes, envoltos em fita adesiva de cor bege, contendo em seus interiores uma substância prensada, de coloração castanho esverdeada, com características do entorpecente maconha.
Perante Autoridade Policial (fls. 07-08 e 09-10), os acusados confessaram a prática do delito.
O denunciado VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ acrescentou que "a droga foi entregue por uma pessoa que identificou-se pelo nome de JOÃO, que mora em Pedro Juan Caballero/PY, o que demonstra a origem paraguaia do entorpecente.
O mesmo denunciado afirmou, ainda, que "já realizou transporte de drogas da mesma maneira mencionada nessa ocasião, por outras três vezes, sempre a mando de JOÃO", o que demonstra o revestimento de permanência e estabilidade na associação de duas pessoas para o fim de praticar, reiteradamente, o ilícito previsto no artigo 33, da lei n. 11.343/2006...

A denúncia foi recebida em 20.07.2009 (fls. 88).

Após instrução, sobreveio sentença da lavra do MM. Juiz Federal Substituto Fábio Rubem David Müzel, publicada em 21.08.2009 (fls. 139/143 e 144 verso), condenando o réu VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ à pena de 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 649 (seiscentos e quarenta e nove) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, como incurso no artigo 33, caput, c.c. o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/2006; e o réu NAZÁRIO DÁVALOS CÁCERES à pena de 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão, em regime inicial fechado, e de 568 (quinhentos e sessenta e oito) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, como incurso no artigo 33, caput, c.c. o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/2006. A sentença foi absolutória em relação à imputação do artigo 35 da Lei 11.343/2006.

Expedidas guias de recolhimento provisório (fls. 145/146 e 147/148).

Apelam os réus (fls. 170, 171 e 181/184) requerendo: a) a exclusão da causa de aumento da transnacionalidade porque não comprovada; b) a aplicação da confissão espontânea como atenuante e c) a revisão da pena de multa, por ser "quantia astronômica para a situação financeira dos apelantes (...), impossibilitados de trabalho remunerado".

Contrarrazões do Ministério Público Federal pugnando pelo desprovimento do recurso da defesa (fls. 186/193).

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. Márcio Domene Cabrini, opinou pelo desprovimento do recurso da Defesa (fls. 196/198).

Os réus apresentaram nova petição de razões às fls. 204/208, idêntica à anteriormente apresentada.


É o relatório.

Ao MM. Revisor.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002296-94.2009.4.03.6002/MS
2009.60.02.002296-9/MS
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ reu preso
: NAZARIO DAVALOS CACERES reu preso
ADVOGADO : JAIRO JOSE DE LIMA (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica

VOTO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


Não obstante a ausência de insurgência, nos apelos, em relação à materialidade e autoria, verifico que a materialidade delitiva restou comprovada pelos laudos periciais de fls. 14/15 e 69/71 e a autoria pelas confissões dos réus em sede policial e judicial, e pelos depoimentos das testemunhas, na fase policial e na fase judicial.


Quanto à dosimetria da pena, observo com relação à pena-base que esta restou fixada em 07 anos e 700 dias-multa para o réu NAZÁRIO, " tendo em vista a grande quantidade e a natureza das substâncias entorpecentes apreendidas (55,6 kg - cinquenta e cinco quilos e seiscentos gramas de maconha)". Já para o réu VICTORINO, a pena-base foi fixada em 08 anos e 800 dias-multa,VICTORINO, pelos seguintes fundamentos:


... fixo a pena-base, acima do mínimo legal, em 8 (oito) anos de reclusão e pagamento de 800 dias-multa, tendo em vista a grande quantidade e a natureza das substâncias entorpecentes apreendidas (55,6 kg - cinquenta e cinco quilos e seiscentos gramas de maconha)", bem como ponderando que declinou em seu interrogatório judicial que "foi o interrogando quem pegou o serviço e que o acusado Nazário sabia que iria transportar droga mas era a primeira vez que fazia o serviço; que o interrogando fazia o transporte de entorpecentes pela terceira vez" (folha 109).

Observo que o artigo 42 da Lei 11.343/2006 estabelece expressamente que, no crime de tráfico de drogas, a natureza e a quantidade da substância, a personalidade e a conduta social do agente devem ser considerados na fixação das penas, com preponderância sobre o previsto no artigo 59 do Código Penal. Saliente-se que o objeto jurídico tutelado no crime de tráfico de entorpecente é a saúde pública e, portanto, quanto maior a quantidade da droga traficada maior o potencial lesivo e o perigo de dano à saúde pública, a justificar uma maior reprovabilidade da conduta empreendida e, conseqüentemente, a elevação da pena-base.

Nesse sentido situa-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADO A 4 ANOS, 2 MESES E 10 DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL FECHADO, E MULTA, POR TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES (ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, I, AMBOS DA LEI 11.343/06)... PENA-BASE CORRETAMENTE FIXADA EM 6 ANOS. REDUÇÃO POR FORÇA DO ART. 40, I DA LEI 11.343/06 APLICADA NO MÍNIMO LEGAL. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA, DE ELEVADO PODER PSICOTRÓPICO (780 GRAMAS DE COCAÍNA)... 2. A natureza da droga e a grande quantidade apreendida (cerca de 780 gramas de cocaína) têm função de extrema relevância quando do cotejo da individualização da pena, contribuindo fortemente na dosimetria da reprimenda, para uma adequada resposta social e no repúdio ainda maior da justiça criminal. Assim, devidamente justificadas a pena-base, fixada em 6 anos de reclusão, e a incidência no patamar mínimo do benefício previsto no art. 40, I da Lei 11.343/06...
STJ, 5ª Turma, HC 145242, Rel.Min. Napolão Nunes Maia Filho, j. 19/08/2010, DJe 27/09/2010
APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - MAJORAÇÃO DA PENA-BASE, À VISTA DA QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA...1. Réu condenado pela prática de tráfico internacional de entorpecentes porque trazia consigo, dentro de 2 (dois) pacotes plásticos acondicionados em sua mala, para fins de comércio ou entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, no exterior, 3.020g (três mil e vinte gramas), de cocaína, substância entorpecente que determina dependência física e/ou psíquica, sem autorização legal ou regulamentar. 2. Majoração da pena-base atentando-se à significativa quantidade (mais de três quilos) e à natureza nefasta da droga apreendida (cocaína)...
TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 00042638520074036119, Rel. Des.Fed. Johonsom di Salvo, j. 29/11/2011, DJe 07/12/2011

Do exame do caso concreto, é razoável a fixação da pena-base um pouco acima do mínimo legal. Com efeito, o montante de maconha não revela quantia ínfima, vez que tal montante seria capaz de servir a grande número de usuários e dependentes, a violar a saúde pública de maneira considerável.

Destarte, o aumento da pena-base para 07 anos de reclusão e 700 dias-multa encontra fundamentação compatível com o panorama fático e atende os preceitos legais esculpidos no artigo 42 da Lei 11.343/2006.

Contudo, com relação ao réu VICTORINO, não se justifica majoração superior à operada para o réu NAZÁRIO.

No entanto, o motivo de lucro fácil integra-se ao tipo, porque a intenção de lucro é ínsita ao comportamento delituoso no crime de tráfico. Assim, o fato de ter sido o réu VICTORINO quem "pegou o serviço" não justifica a majoração da pena-base.

Nesse sentido situa-se o entendimento desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:


APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. PRELIMINAR DE NULIDADE POR NÃO OBSERVÂNCIA DO ART. 400 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AFASTADA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. PREJUDICADO. ESTADO DE NECESSIDADE EXCULPANTE. NÃO CONFIGURADO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. MAJORADA EM MENOR PROPORÇÃO...
VII - A apelante é primária, não registra antecedentes, e as circunstâncias do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis, entretanto, em decorrência da quantidade (9.604g) e qualidade (cocaína) da droga apreendida, entendo, nos termos do art. 42 da Lei n.º 11.343/06, que a pena-base do delito deve ser majorada em menor proporção, ou seja, em 1/3 (um terço). O fato de já ter o apelante idade suficiente para entender o caráter ilícito da conduta deve ser levado em conta no momento da aferição de sua imputabilidade, e não para majorar a pena-base. A busca do lucro fácil é elemento inerente ao próprio tipo penal do delito de tráfico, razão pela qual não pode ser valorada negativamente no momento da aplicação da pena-base. O risco de dano à sociedade é indissociável do próprio resultado do crime de tráfico de entorpecentes, já ponderado pelo legislador quando da cominação da pena em abstrato, constituindo, portanto, circunstância indissociável ao tipo penal em exame...
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ACR 0001740-27.2012.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 27/11/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2012)

Por outro lado, o fato do réu haver dito que fazia o tráfico pela terceira vez não pode servir para majorar a pena-base. Como reconhecido na sentença, o réu é primário e não tem antecedentes, e ademais foi absolvido da imputação do crime de associação para o tráfico.

Consoante Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base". Dessa forma, processos em andamento não podem ser considerados como maus antecedentes, conduta social reprovável e personalidade perniciosa do agente. Nesse sentido:


PENAL E PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI 8.137/90). DIVERGÊNCIA QUE SE RESTRINGE AO QUANTUM DA FIXAÇÃO DA PENA-BASE. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. II - Não é possível agravar a pena com alusão ao desajuste na personalidade e na conduta social do acusado se tal avaliação se funda no registro de inquéritos e ações penais em andamento, ou seja, sem que haja prova da existência de trânsito em julgado, como é o caso dos autos, visto que tal juízo choca-se com o princípio da presunção de inocência. Súmula 444 do STJ. II - A avaliação da personalidade do acusado e também da sua conduta social devem estar assentadas em elementos idôneos e devidamente demonstrados nos autos, não servindo para tal fim os registros supracitados. Precedentes do STJ. III - Não havendo circunstâncias judiciais desfavoráveis ao condenado, nos termos do art. 59 do Código Penal, deve a pena-base ser fixada no mínimo legal. IV - Embargos Infringentes providos para fazer prevalecer integralmente o voto vencido
TRF 3ª Região, 1ª Seção, EINFNU 0000679-55.2008.4.03.6125, Rel. Des.Fed. José Lunardelli, j. 04/10/2012, DJe 16/10/2012

Portanto, de ofício, reduzo a pena-base do réu VICTORINO para 07 anos de reclusão e 700 dias-multa.


Na segunda fase da dosimetria da pena, quanto à circunstância atenuante da confissão espontânea, observo que a sentença aplicou referida minorante. Confira-se (fls. 141 verso e 142):


EM RELAÇÃO AO CORRÉU VICTORINO ALCARAZ GONZALEZ
(...)
Deve ser aplicada a atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal, tendo em vista que o réu admitiu a prática do crime perante a autoridade policial, bem como em juízo.
Diante disso, diminuo a pena privativa de liberdade em 1/6 (um sexto), para 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e o pagamento de pena pecuniária de 667 (seiscentos e sessenta e sete) dias-multa.
(...)
PARA O CODENUNCIADO NAZÁRIO DÁVALOS CÁCERES
(...)
Deve ser aplicada a atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal, tendo em vista que o réu admitiu a prática do crime, tanto na esfera administrativa, quanto em juízo.
Diante disso, diminuo a pena privativa de liberdade, em 1/6 (um sexto), para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e o pagamento de pena pecuniária de 584 (quinhentos e oitenta e quatro) dias-multa.

Assim, a defesa não possui interesse em recorrer quanto ao ponto, pelo que não conheço do pedido.


Na terceira fase, não procede o argumento da não demonstração de ocorrência da transnacionalidade do delito.

Configura-se a internacionalidade do tráfico quando o agente está transportando a droga e adentra o território nacional ou está prestes a dele sair. Nesse sentido situa-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3a Região:


...A incidência da causa de aumento de pena da internacionalização do tráfico não exige a presença de agentes brasileiros e estrangeiros, ou que exista um conluio internacional. Imprescindível, para a caracterização da majorante, é que a operação realizada introduza substâncias entorpecentes no território nacional ou a busca de sua difusão para o exterior...
STJ - 5a Turma - REsp 593297/DF, - Relatora Min.Laurita Vaz, DJ 05.04.2004, p.321)
PROCESSO PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL - PEDIDO DE AFASTAMENTO DA MAJORANTE PREVISTA NO ART. 18, I, DA LEI 6.368/76 - INVIABILIDADE... De outro lado, estando a paciente pronta para embarcar para o exterior, com expressiva quantidade de cocaína, verifica-se a plausibilidade da aplicação da majorante prevista no art. 18, I, da Lei 6.368/76. Ordem denegada.
STJ - 5a Turma - HC 16572-SP - Relator Ministro Jorge Scartezzini - DJ 19/8/2002 pg.186
PENAL - TRÁFICO - AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS - DOSIMETRIA DA PENA IRREPARÁVEL - APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. Ré condenada pela prática de tráfico INTERNACIONAL de entorpecentes. 2. Materialidade comprovada por auto de apresentação e apreensão de 3.476g de cocaína, objeto de laudo de constatação e exame químico-toxicológico positivos para aquele entorpecente. 3. Autoria comprovada por declarações da ré que demonstram a sua ciência quanto ao fato de que trazia consigo a droga e pela prova testemunhal, coerente e harmônica quanto à apreensão da cocaína em poder da apelante. 4. Contexto fático que revela ser insustentável a versão da apelante quanto a desconhecer o conteúdo dos pacotes que estavam em suas malas. 5. Crime consumado, posto que as malas da apelante já haviam sido despachadas para embarque. 6. Internacionalidade do tráfico comprovada pelas passagens aéreas com itinerário São Paulo, Amsterdam, Barcelona. 7. Dosimetria da pena que não comporta reparo. 8. Apelação improvida.
TRF - 3a Região - 1a Turma - ACR 2002.61.19.001050-0 - Relator Desembargador Federal Johonsom di Salvo - DJ 02/10/2003 pg.171

A prova colhida em juízo comprova que a maconha era proveniente do Paraguai, conforme testemunho de fls. 111. A sentença bem enfrentou a questão (fls. 140 verso):


Observo que a alegação de que a droga foi obtida no Brasil não se mostra verossímil, posto que em conflito com os demais elementos dos autos, inclusive com os depoimentos prestados na seara policial, mais parece uma estratégia da defesa para que não se configure a transnacionalidade do delito.
Verifica que, perante o juízo, os acusados informaram residir em Sanga Puitã/PY e se contradisseram acerca da origem do transporte da droga, asseverando um que deu-se em Sanga Puitã, do lado brasileiro, e outro que deu-se próximo a PRF - Posto Capei, demonstrando a fragilidade de tal alegação.
A testemunha de acusação destacou que 'os acusados disseram que foram contratados por uma pessoa conhecida como João para levar a droga de Sanga Puitã/PY até o trevo da pedreira em Dourados" (...)
Como destacado pelo d. membro do Parquet Federal é sabido e consabido que 'a droga apreendida nesta região de fronteira é proveniente do exterior, tratando-se a região de mero corredor de passagem, ou porta de entrada, via Paraguai, para as drogas produzidas na Colômbia, Paraguai e Bolívia'.
Portanto, trata-se de tráfico internacional de entorpecentes inequivocamente.

Dessa forma, caracterizada a internacionalidade do tráfico de drogas, restando mantida a incidência da causa de aumento do artigo 40, inciso I da Lei 11.343/2006.


E, à míngua de recurso da Acusação e em atenção à proibição da reformatio in pejus, é de ser mantida também a causa de diminuição de pena do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006, tal como fixada em 1/6 (um sexto) na sentença apelada.

Assim, é de ser mantida a pena definitiva fixada para o réu NAZÁRIO e fixada a pena definitiva do réu VICTORINO em 05 anos, 08 meses e 01 dia de reclusão e 568 dias-multa.


Da pena de multa: não procede a pretensão dos réus de revisão da pena de multa, ao argumento de não terem condições financeiras para arcar com tal sanção.

A multa é sanção legalmente prevista, de forma cumulativa à pena privativa de liberdade, devendo ser portanto aplicada.

Constato, de outro vértice, que o cálculo operado na sentença para o número de dias-multa guarda correspondência com os critérios utilizados para a pena privativa de liberdade, não se verificando qualquer ilegalidade.

E o valor do dia-multa já foi fixado na sentença no mínimo legal de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo, nos termos do parágrafo primeiro do artigo 49 Código Penal, não comportando redução em patamar inferior ao mínimo, ao argumento da incapacidade financeira do réu.

Assim, questões envolvendo alegada impossibilidade de pagamento da multa devem ser veiculadas, oportunamente, pela via adequada.


Da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito: o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus 972556/RS, declarou a inconstitucionalidade das vedações à substituição constantes da Lei 11.343/2006 (STF, Pleno, HC 97256/RS, Rel.Min. Ayres Britto, j. 01/09/2010, DJe 15/12/2010).

No caso dos autos, contudo, os réus não fazem jus à substituição da pena de reclusão por penas restritivas de direitos, uma vez que não preenchido o requisito do inciso I do artigo 44 do Código Penal.


Quanto ao regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, observo que vinha sustentando entendimento no sentido de que o estabelecimento de regime inicial aberto ou semiaberto não se mostra compatível com a condenação por crime de tráfico ilícito de entorpecentes, dada a equiparação do tráfico aos delitos hediondos.

E assim o fazia por entender que tanto o legislador constituinte (artigo 5º, inciso XLIII) quanto o legislador infraconstitucional (Lei nº 8.072/1990) dispensaram tratamento mais rigoroso na repressão ao crime de tráfico ilícito de entorpecentes, sendo portanto lícito o estabelecimento de regime inicial mais gravoso para cumprimento da pena, na esteira de precedentes do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região: STF, 1ª Turma, RHC 108011/RJ, Rel.Min. Luiz Fux, j. 06/09/2011, DJe 30/09/2011; STF, 2ª Turma, HC 103011/RN, Rel.Min. Ellen Gracie, j. 24/08/2010, DJe 09/09/2010; STF, 2ª Turma, HC 91360/SP, Rel.Min. Joaquim Barbosa, j. 13/05/2008, DJe 19/06/2008; STJ, 5ª Turma, HC 226379/SP, Rel.Min. Jorge Mussi, j. 24/04/2012, DJe 08/05/2012; TRF 3ª Região, 1ª Turma, HC 0001433-97.2012.403.0000, Rel. Des.Fed. Johonsom di Salvo, j. 06/03/2012, DJe 16/03/2012.

Contudo, não me é dado desconhecer que o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do §1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/1990, na redação dada pela Lei nº 11.464/2007, que estabelecia o regime inicial fechado para cumprimento da pena para os condenados por crime de tráfico de drogas (HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 27.6.2012. Informativo STF nº 672).

No caso dos autos, o entendimento pela inconstitucionalidade do referido dispositivo legal firmado pelo STF, não beneficia os réus.

Há de se perquirir se na dosimetria da pena, foram reconhecidos em favor do réu como favoráveis as circunstâncias judiciais. Isso porque apesar do regime inicial ser estabelecido, a princípio, em função da quantidade da pena, nos termos do §2º do artigo 33 do Código Penal, o §3º do citado dispositivo estabelece que "a determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código".

Nesse sentido, aponto precedentes do Superior Tribunal de Justiça:


(...) REGIME PRISIONAL. COMETIMENTO NA VIGÊNCIA DA LEI 11.464/07. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL DO ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90, COM A REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI 11.464/07. FIXAÇÃO DE REGIME DIVERSO DO INICIAL FECHADO. POSSIBILIDADE. GRANDE QUANTIDADE DE MATERIAL TÓXICO. GRAVIDADE CONCRETA. MODO MAIS SEVERO ACERTADO. COAÇÃO NÃO EVIDENCIADA. 1. Diante da declaração de inconstitucionalidade, pelo Plenário do STF, do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, com a redação que lhe foi conferida pela Lei 11.464/07, que estabelecia o modo inicial fechado para o resgate da reprimenda firmada em relação aos delitos hediondos, cometidos após a sua entrada em vigor, o regime prisional para esses tipos de delitos deve ser fixado de acordo com o previsto no art. 33, e seus parágrafos, do Código Penal. 2. Evidenciada a gravidade concreta da conduta criminosa, dada a elevada quantidade de entorpecente encontrado em poder do agente, não há ilegalidade na imposição do modo inicial fechado para o resgate da reprimenda, embora definitivamente dosada em patamar inferior a 4 (quatro) anos de reclusão. 4. Habeas corpus denegado.
STJ, 5ª Turma, HC 214740/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 02.08.2012, DJe 15.08.2012
HABEAS CORPUS. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. (...) IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE REGIME PRISIONAL MAIS FAVORÁVEL. NÃO CABIMENTO DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRISÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. (...) 4. A despeito da inconstitucionalidade da vedação legal à fixação de regime prisional diverso do fechado (art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990), a existência de circunstâncias judiciais negativas autoriza a fixação do regime prisional inicial fechado, nos termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal. (...)
STJ, 6ª Turma, HC 163055 / SP, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 19.06.2012, DJe 29.06.2012

E, no caso dos autos, a pena-base foi fixada em patamar superior ao mínimo legal. Dessa forma, não obstante a pena final em patamar inferior a oito anos de reclusão, é cabível o estabelecimento do regime inicial fechado.


Pelo exposto, conheço em parte da apelação e, na parte conhecida, nego-lhe provimento; e de ofício reduzo a pena-base do réu VICTORINO, fixando sua pena definitiva em 05 (cinco) anos, 08 (oito) meses e 01 (um) dia de reclusão e 568 (quinhentos e sessenta e oito) dias-multa, mantida no mais a sentença apelada, e comunicando-se o Juízo das Execuções Penais.

É como voto.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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