D.E. Publicado em 09/08/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto do Senhor Relator, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, à unanimidade, rejeitar a preliminar e negar provimento aos recursos.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas por Ministério Público Federal e LUIZ CARLOS GUILHERME contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que absolveu o réu acima com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por entender não existir prova suficiente para a condenação.
Consta da denúncia que :
Às fls. 333/334 os acusados Carlos Henrique Martinelli Rosa e Fábio Luciano Possebon aceitaram a proposta de suspensão condicional do processo, de acordo com o artigo 89, § 7º, da Lei 9.099/95. O feito foi desmembrado em relação aos dois acusados (fls. 390 e 415)
O acusado Luiz Carlos Guilherme não aceitou a proposta de suspensão condicional do processo. Às fls. 335/336 o réu foi interrogado.
Às fls. 387/390 o MM. Juiz acolheu a alegação de suspeição proposta pelo acusado em face do Procurador da República arrolado como testemunha de acusação, assim como, ex officio, seu impedimento para testemunhar.
A testemunha de acusação restante foi ouvida às fls. 409/411 e as de defesa às fls. 486/489. E, informantes do Juízo às fls. 542/545, 568/569, 574/578.
Alegações finais às fls. 596/602 e 617/628.
Sentença absolutória proferida às fls. 638/649-v., publicada em 22/04/2009.
Às fls. 654/654-v. juntada de cópia da sentença que declarou extinta a punibilidade dos acusados Carlos Henrique Martinelli Rosa e Fábio Luciano Possebon, com fundamento no § 5º, do artigo 89, da Lei 9.099/95, pelo cumprimento das condições firmadas entre acusação e acusados, proferida nos autos de n. 2007.61.06.002763-7.
Em razões de apelação (fls. 657/664), o Ministério Público Federal pede a condenação do acusado sob o fundamento de que não assiste razão para absolvição pela ausência do dolo.
1. No dia e local mencionados Fabio Luciano e Luiz Carlos, alunos de graduação em Direito, entregaram os formulários de acompanhamento de atividades jurídicas, preenchidos por Carlos Henrique, segundo os quais teriam analisado autos de inquéritos policiais e processos judiciais que passaram pelo Ministério Público Federal entre 01/09 e 31/10/2003, onde o último efetivamente fazia estágio, atestando com vistos supostamente apostos por Daniela Martins Sartori, ocupante do cargo de técnico administrativo na ocasião. Fábio e Luciano não figuraram como estagiários do Ministério Público Federal e os documentos apresentados para comprovação de estágio são ideologicamente falsos. O laudo pericial comprova que Carlos Henrique foi quem os preparou.
2. A materialidade e a autoria do fato imputado estão suficientemente provadas, não há dúvida de que ele usou dolosamente formulários ideologicamente falsos pra comprovar estágio perante a instituição de ensino que freqüentava na ocasião do ocorrido. Os documentos, o laudo pericial, a confissão e o depoimento da testemunha Daniela Martins Sartori são claros.
3. A alegação de que não sabia que estava cometendo o ilícito penal não convence, sobretudo para um estudante de Direito.
Já o acusado Luiz Carlos Guilherme, em suas razões de apelação pede a reforma parcial da sentença (fls. 683/691):
1. Em preliminar alega a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar a causa. O uso do documento, em tese, ideologicamente falso foi feito em detrimento de universidade privada, sem nenhum prejuízo à União ou qualquer de suas entidades autárquicas ou empresas públicas; os documentos utilizados eram fornecidos pela própria instituição de ensino, não podendo ser enquadrados como documento público para efeitos penais. A tese de comunicação das condições de caráter pessoal não pode prosperar para atrair a competência da Justiça Federal; condição de Funcionário Público de um dos co-réus não é elementar ao tipo previsto no artigo 299 do Código Penal, por isso, não pode ser estendida ao apelante. Pede que seja reconhecida a incompetência da Justiça Federal com a remessa dos autos a uma das varas criminais da Comarca de S.J. Rio Preto-SP.
2. Absolvição do réu por outros dispositivos do artigo 386 do Código de Processo Penal, à vista dos efeitos e conseqüência que do decisum possam decorrer. Entende que os fatos narrados na denúncia configuram o denominado "crime impossível" por absoluta impropriedade do objeto. A ineficácia dos documentos apresentados é absoluta, considerando que, não obstante sejam ideologicamente falsos, mesmo se verdadeiros fossem, não serviriam à produção do resultado porque a servidora não tinha capacidade para atestar as visitas. Deve ser absolvido pelo inciso III (o fato não constitui infração penal) ou VI (existência de circunstâncias que isentem o réu de pena) do artigo 386 do Código de Processo Penal.
Com as contrarrazões (fls. 672/675 e 696/702 ), vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal, com o conseqüente não provimento do recurso interposto por Luiz Carlos Guilherme (fls. 704/710).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
À revisão.
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VOTO
Apelam o acusado LUIZ CARLOS GUILHERME e o Ministério Público Federal dos termos da sentença absolutória , em resumo :
A defesa do acusado alega, em preliminar, a incompetência da Justiça Federal para o julgamento do feito vez que o uso do documento, em tese, ideologicamente falso foi feito em detrimento de universidade privada, sem nenhum prejuízo à União; que os documentos utilizados eram fornecidos pela própria instituição de ensino, não podendo ser enquadrados como documento público para efeitos penais; finalmente, não se aplica ao caso a tese de comunicação das condições de caráter pessoal, ou seja, a condição de funcionário público não é elementar ao tipo previsto no artigo 299 do Código Penal.
De primeira mão, o delito em questão não se trata de falsidade ideológica de documento particular enquadrado como documento público para efeitos penais. O "caput" do artigo 299 do Código Penal não restringe a prática delitiva a documento público, podendo a falsidade ideológica também ser praticada por meio da inserção de declaração falsa em documento particular.
No caso dos autos, o corréu Carlos Henrique Matrinelli Rosa era estagiário do Ministério Público Federal e preencheu os Relatórios de atividades complementares, com dados extraídos de inquéritos e processos com vistas ao Parquet, tendo aposto o carimbo de servidora pública daquela instituição e falsificado a assinatura dela para que seus colegas, os corréus Fábio Luciano Possebon e Luiz Carlos Guilherme, apresentassem os relatórios à Universidade Paulista-UNIP de São José do Rio Preto, como atividades complementares ao curso de Direito.
A Administração Pública não está isenta de ser vítima de delitos outros que não os inseridos no Título XI, do Código Penal, que trata dos crimes contra a Administração Pública. Os formulários utilizados pelos réus de fato foram confeccionados por universidade privada, entretanto, as informações neles inseridas como sendo do Ministério Público Federal eram falsas em seu conteúdo e não emanaram da pessoa que neles figura como signatária.
Há, portanto, ofensa direta a interesse da União Federal, no tocante a fé pública atestadas em tais documentos, de tal sorte a justificar a competência da Justiça Federal para o processo e o julgamento do crime de falsidade ideológica, nos termos do artigo 109, inciso, IV, da Constituição Federal.
A situação jurídica do corréu Carlos Henrique Martinelli Rosa, estagiário daquela Instituição, o enquadra no conceito amplo de funcionário público, dado pelo artigo 327 do Estatuto Repressivo, o que também atrai a competência da Justiça Federal, inclusive para crimes conexos e para demais denunciados (art. 78, IV, CPP e Súmula nº 122, do E. STJ). Vide Súmula 254, do extinto Tribunal Federal de Recursos e julgado neste sentido :
Sendo assim, a preliminar de incompetência da Justiça Federal deve ser rejeitada.
Passo à analise do mérito dos recursos.
A materialidade do delito restou comprovada pelos formulários para acompanhamento de atividades complementares do Curso de Direito da UNIP (fls. 105/126), pelo Laudo de Exame Grafotécnico atestando que "os lançamentos não promanaram do punho escriturador de Daniela Martins Sartori" e sim, de Carlos Henrique Martinelli Rosa (fls. 220/223), pelos depoimentos prestados perante a Procuradoria da República (fls. 58/65), bem como em Juízo.
No que tange a autoria delitiva, restou demonstrado nos autos que o corréu Carlos Henrique Martinelli Rosa (extinta punibilidade - com fundamento no § 5º, do artigo 89, da Lei 9.099/95), convocado a prestar depoimento perante a Procuradoria da República em São José do Rio Preto confessou ter preenchido os campos dos formulários de seus colegas Fabio Luciano e Luiz Carlos Guilherme, aposto o carimbo em nome da servidora da Procuradoria, Daniela Martins Sartori e a rubrica acima do carimbo, no período em que cumpria suas horas de estágio na procuradoria (fl. 63/64).
Depoimento de Carlos Henrique Martinelli :
"..afirma que, à exceção do campo "assinatura do aluno", foi autor do preenchimento de todos os outros campos dos FORMULÁRIOS PARA ACOMPANHAMENTO DE ATIVIDADE, juntados às fls. Referidas. Quanto ao documento de fls. 17/38 preencheu apenas as informações constantes do campo "Relatório da Atividade". Ressalta que tanto nos documentos de fls. 03/15, quanto nos de fls. 17/38, foi responsável pela aposição do carimbo em nome de servidora desta Procuradoria, DANIELA MARTINS SARTORI, bem como pela rubrica acima de tal carimbo."
O acusado Luiz Carlos Guilherme, declarou perante a Procuradoria da República que quem preencheu os Formulários para Acompanhamento de Atividade foi Carlos Henrique Martinelli Rosa, ex-estagiário do Ministério Público Federal e seu colega de classe, que acreditava que a assinatura constante dos documentos tinha realmente sido aposta pela pessoa cujo nome consta do carimbo também aposto nos referidos documentos, que protocolou os documentos na secretaria da universidade (fls. 60/61).
Em Juízo, o apelante Luiz Carlos confirmou os fatos narrados na denúncia, mas não os vê como criminosos por ser comum um aluno fazer trabalho e colocar o nome de outro colega, mas não sabia que o mesmo continha qualquer tipo de ilícito, inclusive não sabia que a assinatura da servidora do MPF tinha sido falsificada (fl. 336) :
Por sua vez, a testemunha de acusação Daniela Martins Sartori, Funcionária Publica Federal do Ministério Público Federal, declarou que nunca rubricou ficha de visita de estagiários e não conhecia as duas pessoas citadas nos fatos, que depois foi descoberto que o estagiário Carlos pegou o carimbo dela e teria sido o autor da rubrica (fls. 409/410).
Os demais depoentes, na condição de informantes do Juízo, Joni Salloum Scandar (estagiário do MPF) e Fredy Milton Ring (funcionário do MPF e ex-professor dos denunciados) declararam que ficaram sabendo que os fatos foram praticados por Carlos Henrique (fls. 542, 574 e 576).
As testemunhas de defesa do apelante, professores da universidade, nada trouxeram de novidade para os fatos senão a confirmação de que tomaram conhecimento dos fatos que envolveram os três alunos (fls. 486/487).
As circunstâncias fáticas não convergem para a atuação livre e consciente do apelante Luiz Carlos. Desde seu depoimento perante a Procuradoria da República se extrai que ele pediu ao corréu Carlos Henrique, estagiário do Ministério Público Federal, ajuda para obter carga horária de atividades complementares, mas não confirmou que tinha conhecimento de que os formulários que recebeu continham indevidamente o carimbo da servidora do Ministério Público, nem que as rubricas da servidora eram falsas.
O acusado, inclusive assumiu que muitos trabalhos e atividades durante o curso de direito eram feitos por apenas alguns colegas e beneficiavam outros que deles não tinham participado, contudo não se pode presumir sua intenção dolosa, elemento indispensável ao tipo.
Em remate, afastada a tese de crime impossível por ineficácia absoluta do meio que não se enquadra neste contexto. O uso de documento falso é delito formal, a consumação se dá com o efetivo uso, ainda que não haja proveito para o agente ou prejuízo efetivo para a vítima. Trago a colação precedente neste sentido:
Assim, entendo que não restou provado que o acusado tinha conhecimento da falsificação perpetrada por Carlos Henrique Matinelli Rosa, devendo ser mantida a sentença absolutória, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
Diante do exposto, rejeito a preliminar e nego provimento aos recursos.
É COMO VOTO.
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