D.E. Publicado em 09/08/2013 |
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EMENTA
PENAL - PROCESSUAL PENAL - 183 DA LEI 9.472/97 - REVOGAÇÃO - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA AMPLAMENTE COMPROVADA - LEIS 9.472/97 E 9.612/98 - RÁDIO PIRATA - NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO DO PODER CONCEDENTE - PRINCÍPIOS DA FRAGMENTARIEDADE E INSIGNIFICÂNCIA NÃO APLICÁVEIS - AUSÊNCIA DE DOLO NÃO COMPROVADA PELA DEFESA - DOSIMETRIA DA PENA - PENA DE MULTA - SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENA RESTRITIVA DE DIREITO - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, reformando a decisão de primeiro grau, em seu inteiro teor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra sentença absolutória proferida em favor de CREUSA BENEDITA MOREIRA e JOSE ADAIR DOS SANTOS, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, por não constituir o fato infração penal, em face da atipicidade material da conduta, decorrente da aplicação do princípio da insignificância (fls. 252/258).
Consta da denúncia que:
A denúncia foi recebida em 14 de agosto de 2009 (fl. 128).
Acusada citada em 06/10/2009 (fl. 134). Defesa preliminar as fls. 135/136 dos autos, arrolando testemunhas.
Acusado citado em 19/11/2009 (fl. 143). Defesa preliminar as fls. 145/148 dos autos, arrolando testemunhas.
Decisão do MM. Juízo de primeira instância determinando o prosseguimento do feito e designando audiência para oitiva de testemunha comum (fls. 151/152).
Termo de audiência as fls. 167/167vº. O acusado, na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal, requereu a expedição de ofício à ANATEL, o que restou indeferido pelo Juízo por não tratar de matéria afeita aos autos. A acusada e a acusação nada requereram nesta fase. Foi homologada a desistência da oitiva de uma testemunha arrolada pelo acusado. Saíram as partes intimadas para apresentação de alegações finais no prazo legal.
Testemunha comum ouvida às fls. 168/168vº.
Testemunhas de defesa ouvidas às fls. 169/170 e acusados interrogados às fls. 171/172 e 173/174.
Em alegações finais, o Parquet Federal pugnou pela parcial procedência da ação penal, com a condenação de Creusa Benedita Moreira nos exatos termos da denúncia e a absolvição de José Adair dos Santos, por falta de provas de que tenha concorrido para a prática do delito (fls. 181/188).
A defesa de Creusa pleiteou a absolvição, afirmando que o fato narrado não constitui crime, posto que o serviço prestado era de interesse da comunidade e que a potência da rádio era tão baixa que não interferia em outras comunicações (fls. 189/190).
A defesa de José Adair sustenta que ele não cometeu o crime que lhe é imputado, tendo apenas emprestado aparelho de propagação de som que, por si só, não serve para nada (fls. 232/234).
Sentença absolutória proferida às fls. 252/258, intimando-se o Ministério Público Federal em 26/10/2011 (fl. 259vº) e disponibilizando-se no Diário Eletrônico da Justiça em 07/02/2012 (fl. 272).
Em razões de apelação (fls. 261/269), o Ministério Público Federal sustenta que restaram comprovadas a autoria e materialidade do delito, sendo de rigor a condenação de Creusa. Afirma ainda que o material apreendido tinha potencial lesivo aos sistemas de telecomunicações instalados, não sendo aplicável ao caso o princípio da insignificância. Pleiteia ainda que seja mantida a absolvição do acusado José Adair dos Santos.
Contrarrazões das defesas às fls. 277 e 278/280.
Subiram os autos a esta Egrégia Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso (fls. 283/287).
O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.
É O RELATÓRIO.
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VOTO
A materialidade do delito restou demonstrada pelo Termo de Qualificação de Atividade Clandestina de fls. 07/08, pelo Relatório Técnico de fls. 09/10, pelo Auto de Apresentação e Apreensão de fls. 31 e pelo Laudo de Exame de Equipamento Eletroeletrônico de fls. 53/56.
Desta forma, tenho como provada a materialidade do crime previsto no artigo 183 da Lei 9.472/97.
Por sua vez, a autoria delitiva imputada à apelada também restou cabalmente comprovada.
Verifique-se que a apelada, nas fases inquisitorial e judicial, em alegações finais e contrarrazões de apelação, confirmou os fatos que lhe foram imputados, restando claro que admitiu o cometimento do delito. Apresentou, apenas, defesa técnica que não tem o condão de elidir o cometimento do crime.
É que suas alegações não encontraram respaldo no conjunto probatório colacionado aos autos.
Para esclarecer a questão, começo por transcrever o disposto no artigo 183, da Lei 9.472/97:
Examinando a tipicidade prevista no referido dispositivo de lei, verifica-se que a conduta incriminada diz "desenvolver atividades", não sendo exigível para a configuração do delito que o agente tenha "instalado a rádio", ou seja, basta o fato de estar em operação a rádio clandestina.
Com efeito, não há qualquer dúvida de que a ré era responsável pela rádio e, portanto, desenvolvia atividade ilegal quando da fiscalização, tendo inclusive confessado a prática da conduta delituosa.
Em suas primeiras declarações perante a autoridade policial declinou:
Quando foi novamente interrogada perante a autoridade policial, afirmou (fls. 43/44):
Em juízo, reiterou as declarações apresentadas durante a fase inquisitorial, in verbis:
Depreende-se das declarações da ré que ela era, então, a única responsável pela rádio comunitária e que esta funcionava sem autorização legal. Infere-se, ainda, que a rádio operava com freqüência, ainda que para prestar serviços gratuitos e de interesse da comunidade em que estava inserida, sendo certo que tinha capacidade técnica de atingir grande número de pessoas, em desacordo com a legislação que rege a matéria.
Neste mesmo sentido, as testemunhas ROBERTO CARLOS SOARES CAMPOS e THAÍS PEDROSO DA MOTA PINHEIRO, que prestaram depoimento às fls. 168/168vº e 170, respectivamente, confirmaram que o sinal era transmitido pela aparelhagem encontrada na sede da Associação presidida pela ré, sendo certo que esta não negou os fatos que lhe foram imputados, afirmando, ainda, quando do cumprimento de mandado de busca e apreensão realizado pela primeira testemunha, que o aparelho estava em condições de uso, bastando energizá-lo.
Assim, diante do quadro probatório que resplandece dos autos, torna-se indiscutível a autoria delitiva imputada à apelada que, até o dia 26 de março de 2007, manteve, de forma clandestina e irregular, equipamento de rádio pronto a operar na frequência de 99,50 Mhz, com potência aferida em 25 W.
Restam confirmadas, então, a materialidade delitiva e autoria imputadas a apelada.
No que se refere a aplicação das Leis 9.472/97 e 9.612/98, observo que tais diplomas legais em nenhum momento afastaram do controle do Estado a atividade de radiodifusão, que permanece só podendo ser desenvolvida mediante o preenchimento de determinados requisitos técnicos e sob a imperiosa condição de prévia autorização de funcionamento, a ser expedida pelo órgão competente. Nesse sentido é o artigo 6º da Lei 9.612/98, que reza: "Compete ao Poder Concedente outorgar à entidade autorização para exploração do Serviço de Radiodifusão Comunitária, observados os procedimentos estabelecidos nesta Lei e normas reguladoras das condições de exploração do Serviço."
É evidente que cabe exclusivamente ao Estado regular e disciplinar a instalação e funcionamento de quaisquer rádios, sejam elas comunitárias ou não, pois a ele cabe zelar pela utilização racional do espaço eletromagnético nacional, a fim de evitar a ocorrência das conhecidas interferências de transmissão, que tanto põem em risco o normal desempenho de diversas atividades essenciais à sociedade, como o controle de aeronaves e as comunicações travadas pelos órgãos de segurança pública, especialmente as viaturas policiais.
Por outro lado, registro que também merece ser afastada qualquer alegação de que a hipótese reclamaria a aplicação dos princípios da fragmentariedade e insignificância penal da conduta, pelo fato de a rádio não estar operando no momento de sua apreensão, não causando riscos ou danos à sociedade e aos meios de comunicação. Frise-se não ser possível sustentar que a ré não tinha intenção de utilizar a aparelhagem apreendida, posto que já havia operado, anteriormente, esta mesma rádio clandestina.
Assim, comprovadas a autoria e a materialidade delitivas, a condenação da ré é medida que se impõe.
Passo, portanto, à dosimetria da pena.
A ré é primária e tem bons antecedentes. O dolo é comum e as conseqüências do delito são as normais à espécie. Assim, fixo a pena-base da ré no mínimo legal, em 02 (dois) anos de detenção, em regime aberto. Não existem agravantes a serem consideradas. Com relação às atenuantes, tenho que a ré confessou, não sendo possível, todavia, diminuir a pena-base imposta, já que fixada no mínimo legal. Não existindo causas de aumento ou diminuição de pena no caso em tela, fica definitivamente fixada a pena da autora em 02 (dois) anos de detenção, em regime aberto.
Quanto à pena de multa, tenho que a dosimetria deve ser feita pelos critérios previstos no Código Penal, já que sua fixação em valor fixo de R$ 10.000,00 (dez mil reais) viola o princípio constitucional de individualização da pena. Nesse sentido, já decidiu esta E. Corte Regional, in verbis:
Assim, condeno a ré ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixando o valor do dia-multa no mínimo legal, já que inexistem nos autos elementos a indicar que possua bens ou rendimentos suficientes à autorizar a elevação do valor do dia-multa além do mínimo legalmente previsto.
Desta feita, condeno CREUSA BENEDITA MOREIRA à pena de 02 (dois) anos de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixado o valor no mínimo legal, em virtude do cometimento do delito previsto no artigo 183 da Lei n.º 9.472/97.
Por fim, observo que a pena fixada é inferior a 4 (quatro) anos e o delito não foi cometido com utilização de violência ou grave ameaça. Por outro lado, a ré não é reincidente e as circunstâncias previstas no artigo 44, inciso III, do Código Penal, indicam que a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos será suficiente a título de reprimenda.
Assim sendo, substituo a pena privativa de liberdade acima fixada por duas penas restritivas de direitos, ou seja, prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo, conforme dispuser o Juízo "a quo", e prestação pecuniária equivalente a 01 (um) salário mínimo, que deverá ser revertida em prol de entidade beneficente a ser indicada pelo juízo da execução penal, além de manter a pena de multa já arbitrada anteriormente
Diante do exposto, dou provimento ao recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, reformando a decisão de primeiro grau, em seu inteiro teor.
É COMO VOTO.
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Data e Hora: | 06/08/2013 16:01:04 |