D.E. Publicado em 02/08/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelação criminal interposta por JOEL JOCI MIYASATO em face de sentença que o condenou pela prática do delito previsto no artigo 305 do Código Penal.
Consta da denúncia (fls. 03/06):
A denúncia foi recebida em 23.11.2007 (fl. 97).
Após regular instrução, sobreveio sentença (fls. 225/233), publicada em 12.01.2010 (fl. 234), em que foi julgada procedente a ação penal, para condenar o réu JOEL JOGI MIYASATO, pela prática do delito previsto no artigo 305 do Código Penal, a cumprir pena de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente na data do fato, atualizado na execução.
Determinada, também, a substituição da pena privativa de liberdade por uma restritiva de direito, consistente em prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas, pela duração da pena substituída, bem como à pena de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente na data do fato, atualizado na execução.
Inconformado, JOEL JOGI MIYASATO apela (fls. 236/242), pugnando por sua absolvição.
Alega, em síntese, que não teria logrado, o Ministério Público Federal, comprovar, cabalmente, a responsabilidade do acusado pelo crime ora imputado.
Aduz a inexistência de dolo ou culpa na guarda dos documentos objeto dos autos, referindo a uma "retenção involuntária" destes, o que afastar a tipicidade no caso concreto.
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 252/256).
A Procuradoria Regional da República opina pelo desprovimento do recurso da defesa (fls. 258/260).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
O Apelante JOEL JOGI MIYASATO foi denunciado, e, posteriormente, condenado pela prática do crime previsto no artigo 305, do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos de reclusão, no regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, mantida a condenação em dias-multa.
Inconformado, apela o acusado, alegando ausência de dolo ou culpa na retenção do documento objeto dos autos.
Narra, a denúncia, que o Apelante Joel Jogi teria, em 10 de novembro de 2006, subtraído relatório de diligência in locu elaborado por agentes da Agência Nacional de Saúde - ANS, durante fiscalização de rotina empreendida nas dependências de sua clínica odontológica.
Da materialidade delitiva:
A materialidade delitiva restou sobejamente demonstrada tanto pelo auto de apreensão (fl. 27), quanto pelo relatório de diligência in loco (fls. 28/29). Muito claro, nesse sentido, é o auto de apreensão, ao consignar que "Referida apreensão foi efetuada às 00:51 horas, do dia 11/11/2006, nesta Superintendência de Polícia Federal, em poder do JOEL JOCI MIYASATO (...)"
Assim, diante da apreensão do relatório em questão, não resta dúvidas acerca da materialidade delitiva.
Da autoria:
Segundo a denúncia, teria o réu Joel Miyasato se recusado, de maneira injustificada, em entregar o relatório de diligência locu aos agentes da ANS, isso após o referido relatório ter constatado a falta de registro junto à ANS para comercialização de planos odontológicos e, bem assim, ter sido disponibilizado a Márcio Boni, a fim de que este efetuasse reproduções fotográficas do documento.
Em relação aos fatos relatados, o Agente Policial Federal Warley Ezequiel da Silva declarou (fls. 161/162) que "um dos servidores da ANS tentou reaver o auto de infração já lavrado que estava com um funcionário da clínica, Dr. Márcio. Ocorre que o referido funcionário da clínica lhe disse que o auto de infração fora entregue ao réu Joel. (...). Declara, outrossim: "Quando estávamos na clínica, esclarecemos as funcionárias da referida clínica que havia a necessidade de devolução do auto de infração. As referidas funcionárias diziam que o referido documento estava com o réu, telefonavam para o réu e depois nos diziam para aguardar mais dez minutos. Em seguida, novamente telefonavam ao réu, e nos diziam que ele estava há algumas quadras da clínica. Passado algum tempo, percebemos que estávamos sendo enrolados e por isso encerramos a diligência na clínica e nos dirigimos à Superintendência da Polícia Federal. Quando abordei o réu na Superintendência da PF, ele não me disse se estava com o documento em mãos." Repondeu, ainda: "O Dr. Márcio pegou o auto de infração para tirar uma xerox, sendo que depois devolveria a primeira via, porém, quando estava tirando a cópia chegou o réu e este se desentendeu com os funcionários da ANS. O réu foi até a sala onde estava o Dr. Márcio, retirou de suas mãos o auto de infração e saiu da clínica. O réu não queria devolver o auto de infração porque entendia que o documento estava errado, havia necessidade de elaborar outro auto de infração no qual o réu figuraria como representante da clínica. Essa informação me foi passada pelos servidores da ANS. (...).
Já a testemunha Márcio Wilson Boni, funcionário da clínica objeto do auto de infração, declara (fls. 163/164): "Quando cheguei à recepção, os fiscais da ANS me perguntaram se eu poderia responder algumas perguntas e eu respondi que sim. Os fiscais lavraram o relatório e me pediram para assinar, sendo que assim eu assinei. (...). Bem assim: Quando fui entregar o documento à funcionária, esta me informou que o réu já havia chegado na clínica e eu fui à sala dele quando lhe informei que havia recebido os fiscais da ANS e respondido as perguntas que constavam do documento. O réu ficou com o documento e me disse que atenderia os fiscais da ANS pessoalmente. Eu retornei à recepção e avisei os fiscais da ANS que o réu, responsável pela empresa, os atenderia pessoalmente e pedi que aguardassem. O réu disse aos fiscais da ANS que deveria ser elaborado outro documento e desconsideradas as minhas respostas acerca da empresa, porque eu sou profissional da saúde e não entendo das questões administrativas e burocráticas da empresa. Os fiscais da ANS disseram ao réu para que acrescentassem uma folha ao documento na qual faria os seus comentários. Os fiscais da ANS saíram da clínica sem o documento. Presenciei os fiscais solicitando o documento ao réu, enquanto este lhes diziam que deveria ser elaborado outro documento. Os fiscais disseram que não seria elaborado outro documento e que sairiam da empresa mas retornariam depois com a presença da polícia. O réu insistiu que havia a necessidade de elaborar outro documento e depois se dirigiu a sua sala.(..).
Lucia Maria da Silva, que trabalhava na clínica à época dos fatos, declara (fls. 180/181): "Na data dos fatos, por volta das 10 horas, fiscais da ANS compareceram à referida clínica e foram atendidos pelo Dr. Márcio. Depois, os fiscais formalizaram um documento que o Dr. Márcio levou ao réu em sua sala, sendo que eu estava presente neste momento. O réu leu o documento e saiu da sala para entregá-lo a alguém para tirar cópia. Depois não presenciei o que aconteceu. (...). Afirma, ainda, que: "A clínica reabriu às 13 horas e por volta das 13h10min chegou ao local uma viatura da Polícia Federal a procura do réu. Os policiais aguardaram cerca de vinte minutos e foram muito arrogantes. Levaram o Dr. Márcio para a Superintendência da Polícia Federal, sem algemas, porque eu esclareci que seria constrangedor o Dr. Márcio passar à frente de seus clientes algemado. Esclareço que minha declaração na PF, quando eu disse que teria visto o réu sair da clínica com o documento deve ter sido equivocada, porque como eu já disse eu estava na sala juntamente com o acusado, quando este saiu do recinto para tirar cópia do documento, sendo que eu não poderia saber se ele efetivamente saiu da clínica ou não. (...).
A testemunha Karine Ferreira Krisiaki declara (fl. 182): "O Dr. Márcio conversou e recebeu o relatório dos fiscais da ANS e depois entregou o relatório ao réu, sendo que este me entregou o referido relatório para que eu tirasse xerox. Eu saí da clínica com o relatório para tirar xerox, pois não há copiadora na clínica, e quando retornei não estavam presentes o réu e os fiscais da ANS. Eu deixei o relatório e cópia na gaveta da sala do réu e saí para o meu horário de almoço. Quando retornei à clínica, logo depois chegaram policiais da Polícia Federal. Eu demorei cerca de vinte a trinta minutos para tirar xerox do documento, pois fui a uma banca que fica a uma quadra da clínica e tive que aguardar outras pessoas que também estavam tirando xerox no local. Não vi quando chegaram os fiscais da ANS pela manhã. No período da tarde, quando chegaram à clínica os fiscais da ANS e os Policiais Federais, os fiscais estavam alterados. (...)
Depuseram, também, Lara Soares Diniz e Luis Gonzaga Amorim Luz Coronel, ficais da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e responsáveis pela diligência que deu origem ao presente processo (mídia anexada a fl. 203).
Declarou, a servidora Lara, que após a realização de diligência de fiscalização realizada na clínica do réu, solicitou a um funcionário presente que assinasse o relatório e tirasse uma cópia. Afirma que tal se deu, mas que não foi devolvido nem a via original, nem a cópia do documento. Relata que, nesse momento, teria aparecido o réu Joel muito nervoso e exaltado, dizendo que não mais devolveria o documento por discordar do seu teor. Aduz, ainda, que foi recebida pelo Dr. Márcio Boni, que, apesar de um pouco nervoso pela situação, não destratou os fiscais, informando que a clínica estava em período de transição e que, até então, o responsável permanecia sendo o réu Joel.
O servidor Luis Gonzaga declara que, em princípio, teria sido dito por Márcio Boni que Joel era o ex-proprietário da clínica. Afirma que quando da entrega do relatório para a realização de cópias, a fiscalização já havia cumprido seu objetivo e que Márcio não obstou a referida fiscalização, o que ocorreu devido a ação do réu Joel.
Por fim, segue o depoimento do réu Joel Jogi Miyasato, conforme mídia anexada a fl. 212:
Inicialmente, declara que a acusação "não é totalmente verdade". Declara que estava de folga quando da fiscalização e que o Dr. Márcio não deveria ter respondido à fiscalização, porque se trata de mero empregado da clínica, sem qualquer responsabilidade por esta.
Aduz que, tomando conhecimento das declarações prestadas pelo Dr. Márcio, constatou que o Dr. Márcio tinha respondido muitas coisas erradas, pelo que questionou, sendo suas palavras, a fiscalização quanto ao relatório, ao que lhe foi dito que este não seria alterado, mas que poderia haver um complemento com observações suas a respeito atrás do relatório. Afirma que recusou-se a assinar o relatório como estava.
Assevera, também, que solicitou à funcionária da clínica que tirasse cópia do relatório e o devolvesse ao fiscais, saindo, após, para o almoço. Atesta que, após saber da prisão do Dr. Márcio, apresentou-se voluntariamente à Polícia Federal, apresentando-se como o responsável pela clínica, momento em que foi preso e algemado. Alega que os documentos não foram entregues por estarem dentro de uma gaveta na clínica, não havendo, portanto, intenção de não entrega. Argumenta que, embora o Dr. Márcio tenha dito que estava em poder do réu o relatório em questão, na verdade o relatório estava na citada gaveta, e, não estando com o Dr. Márcio, não se encontrava com ele, réu, também. Diz que ficou sabendo que o documento estava na referida gaveta porque lhe foi dito pela funcionária responsável pela retirada de cópia do relatório, embora não soubesse dizer quem seria esta funcionária. Reafirmou que não se recusou, em qualquer momento, a entregar o documento.
Por fim, alega que não estava em condições, dado o porte da clínica, de cumprir todas as exigências da ANS, referindo que fechou, logo após, a clínica, pelo motivo mencionado, não atuando, atualmente, sequer como dentista. Nega, também, que tenha havido abuso de poder por parte dos fiscais.
O réu foi condenado pela suposta prática de supressão de documento, previsto no artigo 305, do Código Penal, cujo tipo está abaixo definido:
Assim, teria, no caso, incidido o réu no artigo em referência por ter ocultado o documento em questão.
Tenha-se em vista que o crime em questão não admite a forma culposa.
É importante notar que, no caso, não havia autorização para que o réu dispusesse do documento.
Guilherme de Souza Nucci assim define o delito em questão:
Assim, estão presentes os elementos que autorizam concluir pela autoria do crime em questão pelo réu, senão, vejamos.
O tipo em comento exige destruição, supressão ou ocultação de documento. No caso dos autos, muito claro está que o réu ocultou o relatório porque discordava do seu teor.
Embora haja negativa nesse sentido em seu depoimento, não há dúvida de que ele não anuiu com o teor do relatório. E muito claro é o depoimento do Agente da Polícia Federal Warley Ezequiel da Silva, relatando o dito pelas funcionárias de que o documento estava com o réu; de Márcio Boni, que deixa bem claro que o réu negou-se a entregar os documentos aos fiscais, sob a justificativa de que outro deveria ser elaborado; no mesmo sentido, o depoimento dos fiscais Lara e Luís.
Nesse sentido, insatisfeito com o relatório, só veio a entregá-lo após abordagem coercitiva, na Superintendência da Polícia Federal, portanto, de acordo com o conjunto probatório dos autos e diversos depoimentos de testemunhas arrolados nos autos, não havendo entrega espontânea, dando-se, portanto, a ocultação de maneira evidentemente injustificada, tendo o agente agido com evidente dolo, o que justifica sua condenação.
É importante notar que, embora pudesse discordar do teor, o réu teria que, administrativa ou, eventualmente, judicialmente, buscar contestá-la, com os meios e provas que reputasse pertinentes. Jamais poderia, no entanto, ter retido o documento, "de que não podia dispor". É relevante também atentar que os fiscais não estavam, de forma alguma, vinculados à opinião do réu acerca da correção da fiscalização, devendo, aqueles, atentar para os ditames legais e regulamentares, mas não à vontade do fiscalizado de não sofrer eventuais sanções advindas de possíveis irregularidades encontradas em seu local de trabalho, no caso, uma clínica odontológica.
Deste modo, repita-se, considerando, de acordo com todo o conjunto probatório, injustificada a ocultação do relatório de fiscalização da ANS, tratando-se este documento particular de que não podia dispor o réu, não há qualquer reparo a fazer quanto ao decreto condenatório, pelo que mantenho a condenação do réu pelo crime previsto do artigo 305, do Código Penal.
Passo à análise da dosimetria da pena.
A pena-base foi fixada no mínimo legal, isto é, em 2 (dois) anos de reclusão (considerando que no caso se trata de documento público, cuja pena no delito em questão é de no mínimo 2 (dois) anos e no máximo, de 6 (seis) anos), no regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitária de 1 (um) salário mínimo, vigente na data do fato e atualizado na execução.
Sem circunstâncias atenuantes ou agravantes.
Ausentes causas de aumento ou diminuição de pena.
A pena foi substituída por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas, pela duração da pena substituída, bem como à pena de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo, vigente na data do fato, atualizado na execução, tendo em vista a situação econômica do réu.
Considerando, pois, atendidos todos os ditames legais no que concerne à aplicação da pena no caso concreto, mantenho a pena fixada em 2 (dois) anos de reclusão, no regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas, pela duração da pena substituída, mantendo, outrossim, a pena de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente na data do fato, atualizado na execução.
Consigne-se, bem assim, que, a condição profissional do réu, que, então, dirigia clínica odontológica que, segundo ele mesmo, tinha mais de 10 funcionários, e, atualmente, trabalha como diretor de escola da rede particular de ensino, não justifica a requerida redução do valor unitário dos dias-multa, mormente porque não há qualquer indicação, no caso, de que a situação financeira do réu tenha se alterado tanto de lá pra cá, a ensejar a redução requerida.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
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Data e Hora: | 30/07/2013 13:57:03 |