Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009951-65.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.009951-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELADO : LUIS CARLOS SILVERIO
ADVOGADO : LUCIANO ALVES DA SILVA
REU ABSOLVIDO : ANDRE VIEIRA DA SILVA
EXCLUIDO : DENIS ALEXANDRE DA SENHORA (desmembramento)
No. ORIG. : 00099516520094036181 8P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL - ROUBO - ART. 157, § 2º, INCISOS I e II DO CÓDIGO PENAL - MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA - AUTORIA NÃO DEMONSTRADA NOS AUTOS - PALAVRA DA VÍTIMA INCONSISTENTE E CONFUSA - PROVA FRÁGIL PARA SUSTENTAR EVENTUAL ÉDITO CONDENATÓRIO - PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REU - RECURSO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DESPROVIDO.
1. A materialidade delitiva restou bem demonstrada pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (fls. 02/34), em especial pelo Auto de Exibição e Apreensão de fls. 22/23.
2. Relevante para a comprovação da autoria do delito o fato de ter sido reconhecido e preso apenas no momento em que se encontrava na primeira audiência realizada para oitiva de testemunhas, ocasião em que teria levado uma testemunha de defesa para prestar depoimento (fls. 205/207). O apelado foi reconhecido pela testemunha T.R.S.N. como um dos autores do delito, não tendo sido reconhecido pelas testemunhas R.A.S. e R.R.S.
3. Temos aqui a primeira situação estranha no reconhecimento do acusado. Afirma a testemunha que o correu encontrava-se presente na delegacia, quando da lavratura do flagrante. Reconheceu o réu mais de um mês depois dos fatos, mas não o reconheceu durante o período em que esteve na polícia.
4. Percebe-se, aqui, a primeira contradição no reconhecimento do réu. Como seria possível a vítima não reconhecer seu agressor logo após o ato delituoso? Porque não fez dito reconhecimento em ambiente protegido, como o da Delegacia de Polícia? Ainda que pudéssemos assumir que a vítima teve medo do acusado naquele momento, poderia ter retornado à polícia no dia posterior para dar conhecimento dos fatos a autoridade competente, mas não o fez.
5. Primeiramente devemos considerar que a vítima T.R.S.M. reconheceu, com certeza, em data de 17/08/2009, além do apelado, o correu André Vieira da Silva (fl. 207) como participante. Já em data de 16/11/2009, reconheceu André Vieira da Silva apenas como a pessoa que estava na primeira audiência e não mais como roubador (fl. 450). Todavia, no decorrer da instrução processual restou demonstrado que este acusado estava em outro local quando da data dos fatos, fato este que levou o Ministério Público Federal a requerer a absolvição do correu, o que acabou deferido na douta sentença de primeira instância.
6. O depoimento da vítima é contraditório. Reconhece o corte de cabelo do réu, mas não sabe distinguir se o correu André usava muleta ou não. Afirma que avisou aos policiais que o acompanhavam sobre Luís, mas nenhum dos policiais lembra-se do fato. Também a delegada não se lembra de ter fornecido escolta para o réu. Também informa que se sentiu intimidado por outras pessoas, e não só o acusado.
7. A vítima não foi clara ao reconhecer o acusado, com firmeza e segurança, como sendo o autor do crime em questão, devendo ser considerado que, nos crimes contra o patrimônio, a palavra da vítima assume especial relevância, mormente quando seu o depoimento apresenta-se firme e seguro, o que, in casu, não ocorreu.
8 . O reconhecimento da vítima é falho e não existem nos autos outros elementos a indicar a participação do réu no delito em comento, sendo de rigor a manutenção do decreto absolutório, aplicando-se, ao caso em tela, o princípio do in dúbio pro reo.
09. Recurso desprovido. Sentença mantida integralmente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso do Ministério Público Federal, mantendo integralmente a r. sentença de primeiro grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 29 de julho de 2013.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009951-65.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.009951-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELADO : LUIS CARLOS SILVERIO
ADVOGADO : LUCIANO ALVES DA SILVA
REU ABSOLVIDO : ANDRE VIEIRA DA SILVA
EXCLUIDO : DENIS ALEXANDRE DA SENHORA (desmembramento)
No. ORIG. : 00099516520094036181 8P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO


Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 8ª Vara Criminal de São Paulo - SP, que absolveu os réus André Vieira da Silva e Luis Carlos Silvério, da prática do crime previsto no artigo 157, § 2º, incisos I e II, c.c. os artigos 29 e 69 do Código Penal, com base no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (fls. 597/601).

Consta na denúncia que:

"(...) Consta das inclusas cópias do processo n.º 2009.61.81.006611-0, que, no dia 19 de março de 2009, por volta das 11:30, na Rua Morato Oliveira, n.º 155, Freguesia do Ó, São Paulo/SP, ANDRÉ VIEIRA DA SILVA e LUIZ CARLOS SILVERIO, agindo em concurso e com unidade de desígnio com DENIS ALEXANDRE DA SENHORA e outros três indivíduos não identificados, subtraíram, em proveito próprio, mediante grave ameaça exercida com arma de fogo contra as vítimas T.R.S.N. e R.A.S, encomendas sob a custódia dos Correios.
Segundo restou apurado, as vítimas T.R.S.N. e R.A.S. - respectivamente motorista que presta serviços para os correios e carteiro - realizavam entregas de encomendas quando foram abordados por seis indivíduos, dentre eles os réus DENIS ALEXANDRE DA SENHORA, LUIS CARLOS SILVERIO e DENIS ALEXANDRE DA SENHORA, que, armados, anunciaram o assalto, subtraíram as encomendas, e posteriormente se evadiram a pé.
Horas depois, os policiais militares Rodolpho Augusto Souza Corce e Celso Amaral de Almeida, em patrulhamento de rotina, avistaram o veículo Ford/Ka, de cor preta, placas DXB 5341/Taubaté, cujo motorista passou a empreender fuga quando visualizou a viatura, desobedecendo aos sinais de para emitidos. Após uma pequena perseguição, o veículo e seu condutor foram abordados, tendo sido o motorista identificado como DENIS ALEXANDRE DA SENHORA. Em revista pessoal nada foi encontrado.
No interior desse automóvel, entretanto, foram apreendidos um malote com o lacre violado, várias notas fiscais de mercadorias de empresas diferentes, além de embalagens e caixas de papelão vazias (fls. 22/24).
Tendo em vista que o COPOM havia irradiado a ocorrência de dois roubos contra carros dos Correios, no dia 19/03/2009, com subtração de encomendas, a Autoridade Policial determinou a presença das vítimas para tomada de depoimento e reconhecimento do réu. As vítimas TRSN e Rãs reconheceram DENIS ALEXANDRE DA SENHORA com um dos autores do crime (fls. 31).
Em relação ao segundo roubo, em que foram vítimas J.M.S. e R.R.S. (fls. 06/08), estes reconheceram as caixas de papelão e notas fiscais subtraídas, posteriormente apreendidas com DENIS ALEXANDRE DA SENHORA, como sendo produto do roubo, sem porém, terem reconhecido o acusado como autor do fato.
Segundo os policiais que efetuaram a prisão, DENIS ALEXANDRE DA SENHORA informou que estava na posse dos objetos apreendidos com o intuito de 'dispensá-los', a pedido de uma pessoa que não quis identificar.
Tendo em vista que os demais quadrilheiros não haviam sido, até aquele momento, identificados, somente DENIS ALEXANDRE DA SENHORA foi denunciado nos autos do processo n.º 2009.61.81.006611-0, como incurso nas penas do artigo 157, § 2º, I e II e artigo 349, c/c os artigos 29 e 69, todos do Código Penal (fls. 110/112).
Contudo, a autoria em relação aos acusados ANDRÉ VIEIRA DA SILVA e LUIS CARLOS SILVERIO, no tocante ao crime de roubo qualificado restou comprovada, haja vista que, quando da realização da audiência de instrução relacionada ao processo supramencionado, a testemunha T.R.S.N. mostrou-se receosa em prestar seu depoimento, momento em que esclareceu que as pessoas que se encontravam em frente à sala de audiência, que estariam aguardando a chegada do acusado DÊNIS, ou seja, ANDRÉ e LUIS, tinham participado do roubo perpetrado em concurso com DENIS, e que, portanto, faziam parte da quadrilha armada (fls. 205/206).
Dessa forma, T.R.S.N. realizou o reconhecimento pessoal dos demais denunciados, conforme fl. 207, afirmando COM CERTEZA que reconhece ANDRÉ VIEIRA DA SILVA e LUIS CARLOS SILVERIO como participantes do roubo de que foi vítima no dia 19/03/2009, juntamente dom DENIS ALEXANDRE DA SENHOR.
Ainda, verifica-se dos autos que havia um ajuste prévio entre os denunciados e os demais integrantes não identificados, visando a prática habitual de crimes de roubo contra carteiros não havendo como ignorar o caráter de permanência desta união. De fato, segundo informou a vítima T.R.S.N. os acusados ANDRÉ e LUIS estavam presentes na Delegacia, na data da prisão de DÊNIS, e, na data da audiência de instrução do feito n.º 2009.61.81.006611-0, ou seja, em 17/08/2009, estavam novamente presentes na Justiça Federal, com evidente intuito de amedontrar as testemunhas que ali iriam depor, o que demonstra que a associação dos acusados não era eventual, e sim permanente.
Além disso, apesar do segundo roubo, perpetrado no mesmo dia, contra as vítimas J.M.S. e R.R.S. (fls. 06/08), não ser objeto desta denúncia, tampouco foi objeto da denúncia oferecida em face de DENIS nos autos do processo n.º 2009.61.81.006611-0, não há que se negar que DENIS foi encontrado na posse de embalagens e documentos furtados dos Correios, o que nos leva a crer que DENIS, ANDRÉ e LUIS faziam parte de uma quadrilha armada destinada à prática reiterada e habitual de roubos contra carteiros.
E não é só. Conforme fl. 78 dos autos, o acusado DÊNIS respondeu à ação penal n.º 075.860/2003 (IPL 1040/03), por tentativa de furto qualificado ocorrida no dia 25/092003, perante a 8ª Vara Criminal de São Paulo. Conforme fl. 238/239, LUIS CARLOS SILVERIO respondeu a mesma ação penal! Ou seja, a associação entre os acusados vem de longa data, ao menos desde o ano de 2003.
Diante do exposto, o Ministério Público Federal denuncia DENIS ALEXANDRE DA SENHORA como incurso nas penas do artigo 288, parágrafo único do Código Penal, e ANDRÉ VIEIRA DA SILVA e LUIS CARLOS SILVERIO como incursos nas penas do artigo 288, parágrafo único e art. 157, § 2º, I e II c/c os arts. 29 e 69, todos do Código Penal, requerendo o recebimento da presente denúncia e a citação pessoal dos acusados para apresentação de resposta escrita e demais atos processuais, sob pena de revelia. Requer, outrossim, a notificação das testemunhas abaixo indicadas, para que sejam ouvidas sobre os fatos imputados. (...)" (fls. 276/280 - os destaques são no original).

A denúncia foi recebida em 21/08/2009 (fls. 283/284).

O correu Luis Carlos Silvério foi citado em 02/09/2009 (fl. 315), apresentando defesa preliminar, com pedido de liberdade de provisória e oitiva de testemunhas, as fls. 324/327.

O correu Andre Vieira da Silva foi citado em 01/09/2009 (fl. 317), apresentando defesa preliminar e arrolando testemunhas às fls. 336/339.

Manifestação do Ministério Público Federal acerca das defesas apresentadas e contrária a concessão de liberdade provisória aos acusados acostada a fl. 346vº.

Decisão de fls. 351/352 indeferindo os pedidos de liberdade provisória.

Sentença de fls. 365/370 absolvendo sumariamente os réus, quanto à prática do delito previsto no artigo 288, do Código Penal, e determinando o prosseguimento da ação penal quanto à acusação de roubo, designando-se data para oitiva das vítimas, testemunhas de acusação, testemunhas de defesa e interrogatório dos réus.

Recurso de apelação do Ministério Público Federal, acostado a fls. 399/400. Decisão de fl. 416 recebendo o recurso e determinando que as razões de apelação sejam apresentadas após a realização das audiências anteriormente designadas.

Termo de inquirição das vítimas acostados às fls. 448/449, 451/451vº e 453/453vº. Termo de audiência acostado a fls. 456/456vº deferindo a desistência de oitiva de uma testemunha de defesa, revogando a prisão preventiva do correu André Vieira da Silva e mantendo a prisão cautelar de Luis Carlos Silvério.

Testemunha de acusação ouvida a fls. 457/457vº. Testemunhas de defesa ouvidas as fls. 458/459.

Termo de audiência, acostado as fls. 464/465, deferindo a desistência de oitiva de uma testemunha de defesa e revogando a prisão preventiva de Luis Carlos Silvério.

Testemunhas de defesa ouvidas as fls. 466/467 e 468. Termo de interrogatório dos réus acostados as fls. 470/471 e 472/473.

Memoriais finais do Ministério Público Federal acostado as fls. 524/539 dos autos, pugnando pela absolvição de André Vieira da Silva e pela condenação de Luis Carlos Silvério nos termos da denúncia.

Memoriais finais apresentados pela Defensoria Pública da União, pelo correu André Vieira da Silva, pugnando pela sua absolvição (fls. 566/568vº). Memoriais finais do correu Luis Carlos Silvério, pugnando pela sua absolvição, acostado as fls. 589/595.

Sentença absolutória proferida as fls. 597/601. Intimado o Ministério Público Federal em 09/11/2012 (fl. 602vº) e disponibilizado em 14/02/2013 (fl. 618).

Em razões de apelação (fls. 605/616), alega o Ministério Público Federal, em apertada síntese, que o acusado foi reconhecido por uma das vítimas como um dos autores do delito, estando na delegacia e no Fórum com o fim de intimidar as testemunhas, o que indica sua periculosidade e participação nos crimes. Informa que o réu já respondeu processo criminal juntamente com Denis, correu do delito ora investigado, o que indica associação entre eles e sua participação no delito em comento.

Com as contra-razões (fls. 619/624), vieram os autos a esta Egrégia Corte, onde a Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento da apelação ministerial (fls. 627/632).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.

A revisão.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


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Data e Hora: 19/06/2013 17:13:34



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0009951-65.2009.4.03.6181/SP
2009.61.81.009951-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELADO : LUIS CARLOS SILVERIO
ADVOGADO : LUCIANO ALVES DA SILVA
REU ABSOLVIDO : ANDRE VIEIRA DA SILVA
EXCLUIDO : DENIS ALEXANDRE DA SENHORA (desmembramento)
No. ORIG. : 00099516520094036181 8P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

A materialidade delitiva restou bem demonstrada pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (fls. 02/34), em especial pelo Auto de Exibição e Apreensão de fls. 22/23.

A autoria delitiva, todavia, não emerge dos autos com a mesma clareza. Com efeito, o carteiro e o motorista do veículo que estavam a serviço dos Correios, cujas identidades foram preservadas por razões de segurança, reconheceram (fls. 281/282), com total segurança, o correu Denis como um dos agentes que participou do delito descrito na denúncia, afirmando que era ele quem portava a arma de fogo, enquanto os demais agentes se ocupavam com a retirada das mercadorias do veículo, o que foi confirmado pelos depoimentos coligidos perante o juízo.

Outrossim, a testemunha R.S.S., vítima de um segundo roubo na mesma data dos fatos descritos na denúncia, reconheceu, em seu depoimento em Juízo, as embalagens apreendidas em poder de Denis como sendo as que foram subtraídas pelos roubadores.

Em relação ao apelado, todavia, a situação é outra. Relevante para a comprovação da autoria do delito o fato de ter sido reconhecido e preso apenas no momento em que se encontrava na primeira audiência realizada para oitiva de testemunhas, ocasião em que teria levado uma testemunha de defesa para prestar depoimento (fls. 205/207). O apelado foi reconhecido pela testemunha T.R.S.N. como um dos autores do delito, não tendo sido reconhecido pelas testemunhas R.A.S. e R.R.S.

Temos aqui a primeira situação estranha no reconhecimento do acusado. Afirma a testemunha que o correu encontrava-se presente na delegacia, quando da lavratura do flagrante. Reconheceu o réu mais de um mês depois dos fatos, mas não o reconheceu durante o período em que esteve na polícia. Neste sentido, temos o depoimento do policial militar que acompanhou a ocorrência, in verbis:


"(...) Dada a palavra à defesa dos acusados, às suas perguntas, a testemunha informou que chegou para a ocorrência mais ou menos pelas dezesseis e trinta. Que as vítimas demoraram a chegar a ocorrência, tendo chegado após as dezoito horas, tendo a ocorrência terminado por volta de uma hora da manhã. Que na delegacia estava muito tumultuado, que conversou com as vítimas e que estas ficavam no interior da delegacia, enquanto os parentes e conhecidos do preso ficavam do lado de fora. Que as vítimas não comentaram com o depoente que se sentiam ameaçadas e que pelo que sabe não comentaram também com o seu parceiro que se sentiam ameaçadas. Que as vítimas não lhe disseram que havia pessoas do lado de fora que seriam coautoras do crime. Que os parentes e conhecidos do preso ficavam do lado de fora para não constranger as vítimas antes de prestar depoimento. (...)" (fls. 456/456vº - negritei).

Outra não é o teor do depoimento da Dra. Gisele Maciel Rocha, Delegada da Polícia Civil que lavrou a ocorrência:


"(...) Dada a palavra à defesa dos acusados, às suas perguntas, a testemunha informou que lavrou a ocorrência no dia dezenove de março em substituição ao delegado Dr. Paulo Moresqui, que estava terminando seu plantão. A ocorrência se iniciou por volta das dezesseis horas e que a depoente deu prosseguimento por volta das vinte horas. Que havia sido apresentado uma pessoa presa com nome de Denis por um suposto roubo aos Correios e que a depoente e o Dr. Paulo são apresentados as vítimas e costumam separar na delegacia as vítimas dos parentes e conhecidos dos presos. Que não se recorda de nenhum dos dois réus aqui presentes (André e Luís) do dia da ocorrência. Que sou eu quem colho os depoimentos pessoalmente dos presos, das vítimas e das testemunhas e que não lhe foi comunicado sobre a presença eventual de pessoas na delegacia que também teriam cometido o crime do qual estava lavrando o flagrante e que também pelo que sabe nenhum dos policiais de sua equipe foi comunicado sobre tal presença. Que certamente se tivesse lhe sido feita essa comunicação teria providenciado as medidas cabíveis. Que na ocorrência eram quatro vítimas e que as mesma relataram apenas sobre os fatos, mas que em nenhum momento falaram sobre eventual ameaça ou participação de outras pessoas no crime. Que também não lhe comunicaram sobre a presença de outros partícipes do crime naquela delegacia. Que "lhe causa estranheza" a informação de que havia outros partícipes do crime naquela delegacia naquele dia. Que na ocorrência era a oportunidade que as vítimas tinham para relatar sobre a presença de outros autores do crime que lavrava a ocorrência, porém tal fato não lhe foi comunicado. Que tem certeza que sua equipe lhe teria comunicado sobre a informação de que outros partícipes se encontravam naquela delegacia do dia da lavratura do flagrante. (...)" (fl. 459 - negritei)

Percebe-se, aqui, a primeira contradição no reconhecimento do réu. Como seria possível a vítima não reconhecer seu agressor logo após o ato delituoso? Porque não fez dito reconhecimento em ambiente protegido, como o da Delegacia de Polícia? Ainda que pudéssemos assumir que a vítima tivesse medo do acusado naquele momento, poderia ter retornado à polícia no dia posterior para dar conhecimento dos fatos à autoridade competente, mas não o fez.

Ainda que admitamos tais hipóteses como absolutamente normais, temos que, ao longo da instrução processual, o réu também não reconheceu de maneira segura o réu como autor do delito, como passaremos a demonstrar.

Primeiramente devemos considerar que a vítima T.R.S.M. reconheceu, com certeza, em data de 17/08/2009, além do apelado, o correu André Vieira da Silva (fl. 207) como participante. Já em data de 16/11/2009, reconheceu André Vieira da Silva apenas como a pessoa que estava na primeira audiência e não mais como roubador (fl. 450). Todavia, no decorrer da instrução processual restou demonstrado que este acusado estava em outro local quando da data dos fatos, fato este que levou o Ministério Público Federal a requerer a absolvição do correu, o que acabou deferido na douta sentença de primeira instância.

Ou seja, temos que o reconhecimento realizado pela vítima deve ser interpretado em conjunto com as demais provas dos autos, já que aparentemente pode apresentar certa confusão. E, no caso em tela, o mesmo se dá em relação ao correu Luis Carlos Silvério, como passaremos a demonstrar. Vale transcreve o depoimento prestado pela vítima T.R.S.N., in verbis:


"(...) Dada a palavra à representante do Ministério Público Federal, às suas perguntes, a vítima declarou que trabalha como terceirizado para os Correios já mais ou menos uns dez anos. Que exerce a função de motorista. Que estava nas proximidades na Freguesia do Ó no dia 19 de março juntamente com o carteiro R.A.S. Que no dia do assalto, eram mais ou menos 5 ou 7 pessoas a abordar o depoente. Que no momento da abordagem, R.A.S. voltou para o carro e tentou engatar a ré, porém havia um carro Astra vermelho que impediu a movimentação. Que Denis era o único que estava armado e que deu o comando para que as vítimas (T.R.S.N. e R.A.S.) saíssem de ré e não fossem para frente e que Denis apontou a arma para a cabeça de R.A.S. na janela do carro. Que não se recorda exatamente de todos, mas que lembra o rosto de Denis. Que eles abriram a porta do baú da Van e tiraram os pacotes, então conseguiu dar ré e parar num posto policial próximo. Que os assaltantes saíram a pé e o local do assalto ficava entre duas vielas que seguiam para uma favela. Que os mesmos desceram essa viela em rota de fuga. Quanto à primeira pessoa que reconheceu neste audiência, se recorda que o mesmo estava na delegacia no dia da ocorrência e que no dia da primeira audiência, ameaçava o depoente e se sentiu acoado. Que a ameaça se deu no momento anterior a realização da última audiência, que Luís Carlos ameaçou perguntando se o depoente "foi quem colocou Denis na cadeia." Que este primeiro réu reconhecido (Luís Carlos) também foi reconhecido como presente no momento do assalto, mas que à época dos fatos, tinha um cabelo Chanel e que agora está com cabelo curto, raspado. Que a segunda pessoa que reconheceu (André) estava na delegacia no dia dos fatos e também na última audiência, tendo igualmente coagido o depoente, mas não sabe exatamente se ele estava no dia do assalto. Que continua trabalhando nos Correios, na parte administrativa. Dada a palavra à defesa dos acusado, às suas reperguntas, a vítima declarou que o Sr. Luís já se encontrava na delegacia no momento que chegou para prestar depoimento. Que chegou a comentar com um policial no dia do flagrante que Luís participou do assalto, porém que não se lembra o nome deste policial. Que no dia da lavratura do flagrante, foi pedido para que o depoente reconhecesse a carga e os malotes e que nesse momento, Luís tentava chegar perto para abordá-lo. Que reconhece Luiz porque este estava no dia do assalto, no momento do assalto, não só por estar na delegacia, que quando foi lavrar a ocorrência inicialmente Luís e outras pessoas se encontravam também na delegacia. Que não houve reconhecimento formal de Luís no flagrante. Que na delegacia inicialmente havia um delegado, mas que por troca de turno, quem fez o B.O. foi uma delegada. Que no momento em que foi depor, ao entrar na sala, Luís já não estava mais na delegacia. Que na madrugada, quando foi embora, pediu escolta para a delegada, pois estava se sentindo ameaçado, tendo sido feita a escolta até a Marginal Tietê. Que no momento em que prestou depoimento na delegacia, estava na sala o depoente, o motorista da Kombi que também sofreu um assalto naquele dia, e ainda os dois carteiros, que presenciaram o assalto (R.A.S. e R.R.S.). Que não chegou a comentar com a delegada em seu depoimento que Luís também participou do assalto. Que a segunda pessoa que reconheceu nessa audiência (André), não é a pessoa que usava muleta no dia da primeira audiência, que nesta audiência em que houve o reconhecimento havia uma pessoa de muleta, porém na delegacia não havia ninguém com deficiência física. Que no momento do assalto, Denis não carregou nada, que Luís era um dos que carregavam "as coisas". Que no dia da primeira audiência, antes de entrar na sala de audiência, o depoente fez um gesto para a servidora desta vara indicando que estava se sentindo ameaçado e foi daí que foi dado o procedimento para prisão dos réus. Após perguntas formuladas pela MMº Juíza Federal Substituta, a vítima declarou que no dia da primeira audiência se sentiu ameaçado não só pelo Luís, mas pelas outras pessoas que estavam do lado de fora da sala de audiência. Que no dia da primeira audiência em que houve a prisão de André e Luís, o depoente somente reconheceu Luís como a pessoa que participou do assalto e estava na delegacia, porém explicou que quanto a André, não tem certeza se o mesmo se encontrava no dia do assalto. Que no dia do assalto, existiam pessoas com boné e sem boné e que não sabe precisar exatamente o rosto de todos eles. (...)" (fls. 448/449 - negritei)

Vê-se, pois, que o depoimento da vítima é contraditório. Reconhece o corte de cabelo do réu, mas não sabe distinguir se o correu André usava muleta ou não. Afirma que avisou aos policiais que o acompanhavam sobre Luís, mas nenhum dos policiais lembra-se do fato. Também a delegada não se lembra de ter fornecido escolta para o réu. Também informa que se sentiu intimidado por outras pessoas, e não só o acusado.

Causa estranheza, também, o fato de um suposto criminoso levar terceira pessoa ao Fórum no dia em que irá se realizar audiência para apuração do delito que supostamente cometeu. Além do que, como afirmado pela própria vítima, não era apenas o réu que acompanhava os depoentes na data em que foi identificado.

Desta feita, temos que a vítima não foi clara ao reconhecer o acusado, com firmeza e segurança, como sendo o autor do crime em questão, devendo ser considerado que, nos crimes contra o patrimônio, a palavra da vítima assume especial relevância, mormente quando seu o depoimento apresenta-se firme e seguro, o que, in casu, não ocorreu.

A corroborar tal argumentação, trago à colação os seguintes julgados do TACRIM/SP, in verbis:


"A palavra da vítima, quando se trata de demonstrar a ocorrência de subtração e do reconhecimento da autoria em um roubo, é de suma valia. Ela é a pessoa que possui contato direto com o roubador ou com os roubadores. Se o delito é praticado na presença de outras pessoas, os depoimentos destas são importantes para robustecer as declarações da vítima. Se o delito é praticado, sem que outra pessoa o presencie, a palavra da vítima é que prepondera. A preponderação resulta do fato de que uma pessoa nunca irá acusar desconhecidos da prática de uma subtração, quando esta inocorreu. Não se pode argumentar de acusação motivada por vingança ou qualquer outro motivo, quando os envolvidos não mantém qualquer vínculo de amizade ou inimizade, quando são desconhecidos entre si." (Acr - Rel. Haroldo Luz - JUTACRIM 100/266)
"Em sede do delito de roubo, as palavras da vítima são sumamente valiosas e não podem ser desconsideradas, máxime em crimes patrimoniais, quando incidem sobre o proceder de desconhecidos, pois o único interesse do lesado é apontar os verdadeiros culpados e narrar-lhes a atuação e não acusar pessoas inocentes" (TACRIM-SP - Ap. - Rel. Evaristo dos Santos - j. 10.03.1999 - RJD 43/233).
"Em delitos de roubo, rotineiramente praticados às escondidas, presentes, apenas, os agentes ativo e passivo da infração, o entendimento que segue prevalecendo, sem qualquer razão para retificação, é no sentido de que a palavra da vítima é de fundamental importância para a elucidação da autoria. E, na medida em que seja ela coerente, segura e não desmentida, o que cumpre é aceitá-la" (TACRIM-SP - AC - Rel. Luiz Ambra - RT 732/633).

Outrossim, como já anteriormente afirmado, os policiais militares que efetuaram a prisão foram incisivos ao descrever, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, a conduta de Denis, única pessoa presa em flagrante, bem como sua prisão na posse de malotes dos Correios e embalagens de sedex violadas. Assim, tais depoimentos estão a tratar apenas do caso de Denis que, como se vê, não faz parte da relação processual instaurada nestes autos.

Neste ponto, lapidar a r. sentença de primeiro grau, in verbis:


"(...) Denis Alexandre da Senhora foi denunciado pela prática de roubo majorado, ocorrido aos 19.03.2009¸ nos autos n. 2009.61.81.006611-0, perante essa Vara Federal Criminal (fls. 110/112). No dia da audiência de instrução, realizada aos 17.08.2009, uma das vítimas reconheceu 2 (duas) outras pessoas, os ora acusados André Vieira da Silva e Luís Carlos Silvério, como coautores do delito. Na própria audiência foi determinada a prisão preventiva de André e Luís Carlos. O Ministério Público Federal ofertou denúncia em desfavor preventiva de André e Luís Carlos, na data de 19.08.2009 (fls. 271/272). Foi determinado o desmembramento dos autos, com distribuição por dependência (folha 281), tendo sido gerado o presente feito, com o recebimento da exordial na data de 21.08.2009 (fls. 283/284).
Na audiência de instrução do presente feito, a mesma vítima que havia reconhecido André e Luís Carlos, na audiência realizada nos autos n. 2009.61.81.006611-0, aduziu que reconhecia Luís Carlo9s, como um dos assaltantes, mas que não sabia exatamente se André Vieira da Silva era um dos assaltantes, reconhecendo-o apenas como uma das pessoas que estiveram na Delegacia, no dia do roubo (fls. 448/49 e 450).
Nenhuma das vítimas e das testemunhas reconheceu André Vieira da Silva como sendo um dos assaltantes, o que ensejou, de pronto, a revogação de sua prisão preventiva, como se afere no termo de deliberação de fls. 456/456-verso, e o pedido de absolvição formulado pelo Parquet Federal, em sede de memoriais (fls. 524/539).
De feito, não há elementos mínimos de prova para uma condenação, em desfavor de André.
Com relação ao correu Luís Carlos Silvério, o Ministério Público Federal pugna por sua condenação, nas alegações finais (fls. 524/539).
Entretanto, não vislumbro possibilidade de proferir um decreto condenatório, considerando os elementos contidos nos autos.
Com efeito, o assalto ocorreu na data de 19.03.2009¸ e o reconhecimento feito por uma das vítimas, na audiência realizada nos autos n. 2009.61.81.006611-0, foi efetuado em 17.08.2009, ou seja: quase 5 (cinco) meses depois do roubo.
Além do decurso de longo lapso temporal, que enfraquece, por si só, o reconhecimento pessoa, e do fato da vítima ter se desdito ao afirmar que não mais reconhecia o coacusado André como sendo um dos assaltantes (e observe-se que a audiência, no presente processo, com oitiva da mesma vítima, do feito original, ocorreu aos 16.11.2012, menos, portanto, de 3 [três] meses após ter dito perante outro magistrado que reconhecia André "com certeza" como um dos roubadores - v. fls. 207 e 450), deve ser destacado também que a narrativa da vítima não é nada verossímil em relação ao coacusado Luís.
A vítima diz que o correu Luís Carlos Silvério estava na Delegacia, no dia do assalto (19.03.2009), e que "chegou a comentar com um policial no dia do flagrante que Luís participou do assalto, porém que não se lembra o nome deste policial" para complementar a seguir que "não chegou a comentar com a delegada em seu depoimento que Luís também participou do assalto" (fls. 448/448-verso).
Não parece verossímil que um policial, em plena Delegacia, tenha deixado de adotar as providências cabíveis contra um suposto assaltante que se encontrava espontaneamente no local, tampouco que uma vítima tenha deixado de comunicar para a Delegada, no dia do fato, que um dos assaltantes, que estava por vontade própria na Delegacia, tentava "chegar perto para abordá-lo" no interior da Delegacia.
O relato da vítima, em relação ao correu Luís, parece-me, portanto, pouco crível, e não é, deste modo, suficiente para ensejar um decreto condenatório. (...)" (fls. 599/601 - os destaques são no original)

Vê-se, portanto, que o reconhecimento da vítima é falho e não existem nos autos outros elementos a indicar a participação do réu no delito em comento, sendo de rigor a manutenção do decreto absolutório, aplicando-se, ao caso em tela, o princípio do in dúbio pro reo.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso do Ministério Público Federal, mantendo integralmente a r. sentença de primeiro grau.

É COMO VOTO.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


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