D.E. Publicado em 30/10/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por maioria, conceder a ordem para determinar o trancamento da ação penal nº 0000172-23.2008.403.6181, nos termos do voto do Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita, acompanhado pelo voto do Desembargador Federal José Lunardelli, vencido o Relator, que rejeitava a preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal e denegava a ordem de habeas corpus.
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VOTO-VISTA
O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA:
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar, impetrado por Miguel Pereira Neto, Luiz Fernando Ulhôa Cintra e Eduardo Agostinho Ricco em favor de LAW KIN CHONG, contra ato do Juízo Federal da 2ª Vara Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo/SP, que rejeitou a absolvição sumária do paciente, nos autos da ação penal nº 0000172-23.2008.403.6181.
Afirmam os impetrantes que o paciente foi denunciado como incurso nas penas do artigo 1º, inciso V, da Lei 9.613/98 por ter ocultado a propriedade de bens provenientes de crime contra a Administração Pública, consistente em contrabando e descaminho.
Narram que o Magistrado a quo, considerando que a conduta não configurava o delito de lavagem ou ocultação de bens em relação a um dos bens listados pela acusação, rejeitou a denúncia quanto a esse fato e, em relação aos demais, verificando a presença de indícios de autoria e materialidade, recebeu-a.
Alegam que, em resposta à acusação, suscitaram sete teses defensivas, requerendo a absolvição sumária do paciente, tendo a autoridade impetrada deixado de acolher o pedido, determinando o prosseguimento do feito.
Sustenta, em síntese, a nulidade da decisão que não acolheu o pedido de absolvição sumária, por ausência de fundamentação, ao deixar de analisar as teses argüidas pela defesa na resposta à acusação.
O feito foi levado a julgamento na sessão de 27/08/2013. Em seu voto, o E. Relator Juiz Federal Convocado Paulo Domingues, rejeitou a preliminar de não conhecimento suscitada pelo Ministério Público Federal e denegou a ordem de habeas corpus.
Pedi vista dos autos para melhor apreciar a questão.
O paciente foi denunciado como incurso nas penas do artigo 1º, inciso V, da Lei 9.613/98. Consta da denúncia (fls. 167/169):
Como se vê, o paciente foi denunciado porque teria ocultado a propriedade de bens, provenientes de delito contra a Administração Pública, consistente em contrabando e descaminho, crime este apurado nos autos nº 2007.61.81.014628-5.
Em consulta ao sistema de acompanhamento processual Siapro, verifico que a Primeira Turma desta Corte, na sessão de julgamento de 16/07/2013, por ocasião do julgamento da apelação nº 2007.61.81.014628-5, por unanimidade, negou provimento ao apelo da acusação e deu parcial provimento ao recurso de Law Kin Chong para absolvê-lo da prática do crime previsto no art. 334, §1º, "c", c.c art. 29, ambos do Código Penal, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, tendo o acórdão transitado em julgado em 15/08/2013. O acórdão encontra-se assim ementado:
Assim, considerada a absolvição do crime antecedente, perfilho do entendimento de que não há que se falar na ocorrência do crime de lavagem de dinheiro.
O artigo 1º, caput, da Lei 9.613/1998, em sua redação original, vigente ao tempo dos fatos, anteriormente à alteração dada pela Lei 12.683/2012, definia o delito de lavagem de dinheiro como a ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime antecedente.
O artigo 2º, inciso II, da Lei 9.613/98 dispunha que os processos de lavagem "independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país", de modo que prescindem da condenação em relação ao crime antecedente para que se configure o crime de lavagem de dinheiro, bastando a existência de indícios suficientes da existência do crime antecedente, "ainda que desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime" (Lei 9.613/1998, artigo 2º, §1º).
Assim, para a caracterização do crime de lavagem, não se exige a prova cabal da existência do crime antecedente nem que seja conhecido o autor do crime antecedente.
No caso em tela, há uma particularidade, o crime antecedente nessa ação penal foi um crime bem definido e com uma autoria imputada ao mesmo réu do crime de lavagem. E não houve prova suficiente para condenação do réu no crime antecedente, de modo que não restou caracterizado o crime de lavagem, por ausência da prévia ocorrência de crime do qual o numerário seja proveniente.
Em outras palavras, caso não fosse imputada a autoria conhecida a alguém, o fato de não existir condenação não impediria que o crime de lavagem fosse imputado a outra pessoa. Mas uma vez imputada a autoria do crime de lavagem a um autor, que é o mesmo agente que se imputa o crime de lavagem, a absolvição com relação ao crime antecedente, esvazia a própria imputação de lavagem.
O Estado reconheceu em outra ação penal que não existe prova suficiente para relacionar o acusado com a obtenção ilícita daqueles bens. Assim, não há como imputar a esse acusado a mera ocultação da proveniência ilícita desses bens. Se o Estado não conseguiu provar que o agente obteve ilicitamente o bem, não pode mais tentar provar que o agente está ocultando ou dissimulando bem que tinha conhecimento que era ilícito.
Assim, à vista da superveniência de sentença absolutória em relação ao crime antecedente, ainda que por insuficiência de provas em relação à autoria delitiva, entendo que não subsiste o crime de lavagem de capitais.
Ainda que assim não se entenda, observo que foi apontado na denúncia como crime antecedente ao da lavagem de dinheiro, o descaminho na modalidade "ter em depósito". Confira-se o trecho da denúncia do crime antecedente, apurado na ação penal nº 0014628-12.2007.403.6181 (fls. 89/90):
Nessa modalidade de descaminho, ter em depósito, a única dissimulação ou ocultação possível seria dos próprios bens descaminhados, mas isso não existe, pois os bens foram aprendidos naquela operação, ou seja, para que seja possível o crime de lavagem nessa modalidade (ter em depósito), teria que se imputar ao paciente a ocultação dos próprios bens descaminhados, o que não ocorreu.
Ao contrário, a denúncia imputa ao paciente a conduta de ter adquirido outros bens em nome de terceiras pessoas, na modalidade dissimulação, dissimulando a propriedade daqueles bens.
Se as mercadorias, objeto do crime de descaminho, não foram vendidas, pois foram apreendidas, imputando-se ao agente crime na modalidade ter em depósito, como esse agente poderia ter transformado o produto do descaminho apreendido em dinheiro, para posteriormente adquirir os bens que foram colocados em nomes de terceiros? Seria o mesmo que imputar o crime de lavagem do dinheiro oriundo do crime de tráfico de droga sem ter vendido a droga.
Em outras palavras, seria necessário que o agente vendesse o produto descaminhado, para conseguir transformá-los em dinheiro e adquirir aqueles bens que colocou em nome de outras pessoas.
É certo que os bens adquiridos em nome de terceiros poderiam ter sido adquiridos com o proveito de outros crimes de descaminho, em outras modalidades, mas não foi esse crime antecedente que a denúncia se referiu. A denúncia é explícita, apontando um crime específico como antecedente, qual seja, o descaminho relativo à apreensão ocorrida no dia 14/11/2007 que resultou na ação penal 2007.61.81.014628-5. E no tocante a esse descaminho, toda mercadoria que era mantida em depósito foi apreendida, não havendo que se falar em proveito econômico advindo do descaminho, de modo que não resta caracterizada um dos elementos objetivos do crime de lavagem, que é a proveniência ilícita dos bens.
Assim, entendo não configurada a justa causa para o prosseguimento da ação penal.
Por estas razões, concedo a ordem para determinar o trancamento da ação penal nº 0000172-23.2008.403.6181.
É como voto.
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RELATÓRIO
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VOTO
Inicialmente, rejeito a preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal.
O prosseguimento de persecução penal referente a infração cominada com pena privativa de liberdade possui o condão de ensejar ameaça ao direito de locomoção do paciente, de forma que as decisões nela proferidas podem dar azo à impetração de habeas corpus.
Tratando-se, assim, de ato concreto que possa causar, ainda que indiretamente, perigo ou restrição à liberdade de locomoção do paciente, torna-se viável o manejo do habeas corpus.
Nesse passo, necessário destacar que as matérias suscitadas devem ser cabalmente comprovadas pelas provas pré-constituídas (via de regra documentais) então existentes nos autos, pois se as alegações formuladas na defesa demandarem dilação probatória, não há possibilidade de decretação da absolvição sumária.
In casu, o Ministério Público Federal denunciou o paciente imputando-lhe a conduta descrita no tipo do art. 1º, V, da Lei nº 9.613/98. Narra a denúncia, em síntese, que o paciente ocultou a propriedade de bens provenientes de crimes praticados contra a Administração Pública.
Em face da decisão que rejeitou a denúncia unicamente em relação ao veículo BMW IA GL 161, mas a recebeu por reconhecer sua admissibilidade em relação aos outros fatos, o paciente interpôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados.
Após a interposição de outros embargos de declaração, que também foram rejeitados, o paciente apresentou resposta escrita à acusação (CPP, art. 396-A), suscitando as questões a seguir arroladas (fls. 192/229):
O juízo impetrado afastou tais alegações, sob os seguintes fundamentos:
Em face dessa decisão, foram interpostos embargos de declaração, os quais foram rejeitados por outro juiz.
À vista disso, observo que o juízo impetrado rejeitou as teses da defesa, utilizando-se de fundamentação adequada, já que a decisão que determina o prosseguimento da ação penal não deve, repito, esgotar o mérito da demanda, invertendo a ordem processual vigente e antecipando-se às provas a serem produzidas durante seu curso.
Desse modo, resta claro que as matérias suscitadas pela defesa, ressalvadas aquelas expressamente afastadas na decisão recorrida, demandam incursão no acervo probatório a ser produzido nos autos, de forma que sua análise deve ocorrer em sede de cognição exauriente, ou seja, no momento da prolação da sentença, sob pena de prejulgamento e ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Assim se manifesta o Superior Tribunal de Justiça e a Primeira Turma desta Corte, conforme ementas a seguir transcritas, respectivamente:
A intenção da inclusão do artigo 397 no Código de Processo Penal, com a redação atual, também não foi a de criar uma verdadeira fase de saneamento em que se apreciaria todas as questões de direito, restando para a sentença somente as questões que dependessem da instrução processual. Mesmo as questões de direito que o magistrado entenda ainda carecerem de maior e mais aprofundada análise podem remanescer para o verdadeiro local do julgamento do processo, ou seja, a sentença.
Finalmente, nada impede que magistrado diverso aprecie embargos de declaração opostos em face de decisão proferida por outro juiz.
Isso porque os pressupostos objetivos desse recurso, notadamente no caso de omissão, podem ser supridos por outro magistrado, sem que daí resulte qualquer ofensa ao princípio do livre convencimento motivado, cabendo-lhe, se assim entender, conferir efeitos excepcionalmente infringentes se suas razões não se adequarem ao resultado a que chegou o juiz que proferiu a decisão recorrida.
Assim, não há como prosperar a impetração, sendo de rigor a denegação da ordem requerida.
Posto isso, REJEITO a preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal e DENEGO A ORDEM de habeas corpus.
É como voto.
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