Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 04/11/2013
REVISÃO CRIMINAL Nº 0038863-54.2010.4.03.0000/SP
2010.03.00.038863-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
REQUERENTE : ANTONIO SERRA reu preso
ADVOGADO : ROGÉRIO GUAIUME
REQUERIDO : Justica Publica
No. ORIG. : 00100837420004036105 1 Vr CAMPINAS/SP

EMENTA

REVISÃO CRIMINAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. CONDENAÇÃO. PENA.
- Conteúdo do artigo 621 do Código de Processo Penal que consiste em matéria de mérito, não se tratando de pressupostos processuais de admissibilidade, conforme orientação firmada pela Seção.
- Condenação que tem esteio no conjunto probatório e que propicia versão acusatória logicamente oponível à tese defensiva, descabendo a revisão de critérios de julgamento em sede de revisão criminal.
- Devidamente fundamentada a pena aplicada e não encerrando erro técnico, também não se entrevendo quaisquer rasgos de injustiça explícita na sua aplicação.
- Alegação de que o decreto condenatório é extra ou ultra petita quanto ao aumento da continuidade delitiva por não constar da denúncia o artigo 71 do Código Penal que se rejeita. Caso em que a inicial acusatória não descreve apenas uma, mas plúrimas condutas delituosas praticadas em período indicado, sendo que o réu se defende dos fatos descritos na peça inaugural, não do enquadramento legal, ademais admitindo o sistema processual penal pátrio expressamente a "emendatio libelli". Inteligência do artigo 383 do Código de Processo Penal.
- Pedido de declaração da extinção da punibilidade do delito por suposto pagamento dos débitos que foi apreciado e rejeitado tanto pela sentença quanto pelo acórdão com base em elementos do conjunto probatório, também neste ponto não se vislumbrando contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos.
- Revisão criminal julgada improcedente.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar improcedente o pedido revisional, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 17 de outubro de 2013.
Peixoto Junior
Desembargador Federal


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REVISÃO CRIMINAL Nº 0038863-54.2010.4.03.0000/SP
2010.03.00.038863-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
REQUERENTE : ANTONIO SERRA reu preso
ADVOGADO : ROGÉRIO GUAIUME
REQUERIDO : Justica Publica
No. ORIG. : 00100837420004036105 1 Vr CAMPINAS/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JÚNIOR: - Antônio Serra ingressou com o presente pedido de revisão criminal noticiando condenação como incurso nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c 71, ambos do Código Penal, a quatro anos de reclusão, em regime inicial aberto, e quarenta dias-multa, no valor unitário de um salário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços a comunidade ou a entidades públicas e prestação pecuniária de quarenta salários-mínimos, e objetivando a absolvição ao fundamento de inexigibilidade de conduta diversa por dificuldades financeiras, também alegando que o delito de apropriação indébita previdenciária somente se configura se demonstrado o dolo específico.
Subsidiariamente requer o revisionando a redução da pena-base ao mínimo legal e a aplicação da atenuante da confissão espontânea, também sustentando ser o decreto condenatório extra ou ultra petita quanto ao aumento da continuidade delitiva ao argumento de que o artigo 71 do Código Penal não foi referido na denúncia, ainda alegando ter realizado o pagamento do débito e pretendendo seja declarada a extinção da punibilidade do delito.
O procurador regional da república oficiante no feito opinou pelo não conhecimento da revisão criminal ou pela improcedência.
É o relatório.
À revisão.


Peixoto Junior
Desembargador Federal Relator


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REVISÃO CRIMINAL Nº 0038863-54.2010.4.03.0000/SP
2010.03.00.038863-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
REQUERENTE : ANTONIO SERRA reu preso
ADVOGADO : ROGÉRIO GUAIUME
REQUERIDO : Justica Publica
No. ORIG. : 00100837420004036105 1 Vr CAMPINAS/SP

VOTO

Ao início, consigno que, conforme orientação firmada pela Seção (RVC 0025345-94.2010.4.03.0000, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. em 03/05/2012; RVC 0009588-26.2011.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. em 16/02/2012; RVC 0001229-24.2010.4.03.0000, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. em 15/12/2011; RVC 0001229-24.2010.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Cotrim Guimarães, j. em 15/12/2011), o disposto no artigo 621 do Código de Processo Penal consiste em matéria de mérito, não se tratando de pressupostos processuais de admissibilidade, pelo que deve ser afastada a pretensão do Ministério Público Federal de não conhecimento do pedido revisional ao argumento de que "limita-se a repetir as alegações já apreciadas em sede de apelação".

Passo, então, a examinar o pedido revisional.

O peticionário foi denunciado por delito do artigo 168-A, §1º, I, do Código Penal, descritos os fatos nestes termos pela denúncia:


"O denunciado, responsável pela empresa denominada "SERRA S/A CONSTRUÇÕES E COMÉRCIO", em Moji Guaçu/SP, agindo na qualidade de Diretor Presidente, detentor dos poderes emergentes da administração da empresa, no período de janeiro de 1996 a fevereiro de 2000, deixou de repassar, no prazo legal, as contribuições sociais devidas à Seguridade Social, descontadas de seus empregados.
O fato foi apurado pela fiscalização previdenciária, que verificou terem sido os valores descontados dos salários dos empregados, lançando-se o crédito através das NFLD´s n.º 35.071.571-8 e 35.071.573-4, cujos saldos devedores montam, respectivamente, R$ 164.308,61 e R$ 60.388,35, conforme fl. 11.
A administração da empresa era exercida pelo denunciado, conforme as próprias declarações (fls. 147)."


Após a instrução, sobreveio sentença de condenação do ora revisionando como incurso nos artigos 168-A, §1º, I c.c. 71. ambos do Código Penal a quatro anos de reclusão e quarenta dias-multa, destacando-se os seguintes excertos:


"Cuida-se de ação criminal pela qual se imputa ao denunciado a prática do delito previsto pelo art. 168-A do Código Penal, em razão de ausências de recolhimentos de contribuições de retidas de empregados e não repassadas aos cofres públicos.
Às fls. 189 consta CND Positiva com efeitos de negativa com a exigibilidade de crédito suspensa. Às fls. 284 há informação que a empresa aderiu ao REFIS em 18.08.200, mas seu pedido foi indeferido consoante Portaria 42 de 24.10.01.
Em seu interrogatório o réu insiste de forma veemente que o débito referente aos empregados já estaria pago, por intermédio de dinheiro que conseguiu com a venda de bens pessoais.
Todavia, informa o INSS que as NFLD´s objeto da presente denúncia foram pagas mas apresentam saldos remanescentes atualizados. Referidos débitos encontram-se em fase de cobrança judicial.
A materialidade está devidamente comprovada pelas provas juntadas pela acusação, em especial, a representação para fins penais. Com relação à autoria o acusado era o único administrador e gerente da empresa, responsável portanto pelo recolhimento das contribuições.
Em seu interrogatório o réu nega parte da dívida alegando que tal valor era resultante de um salvo controverso na conclusão de uma obra. Também alegou dificuldades financeiras.
Entretanto, nem a controvérsia nem as dificuldades financeiras, tampouco a prova de venda dos bens foram trazidos como prova ao processo. Cabe a quem alega a prova, o que não foi feito.
O réu insistiu em afirmar que pagou integralmente a dívida enquanto o INSS afirma que ainda há saldo devedor. O ato administrativo goza de presunção relativa e só pode ser desconstituído mediante prova robusta o que não existe nos autos. Conclui-se que o débito não foi pago em sua integralidade o que afasta a incidência do §2º do art. 9º da Lei n.º 10.684/03 só aplicável aos casos de pagamento integral do débito tributário, realizado a qualquer tempo.
Impõe-se perquirir se a inexigibilidade de conduta diversa - causa supralegal de exclusão de culpabilidade - tem aplicação na hipótese retratada nos autos, analisando se o réu estava efetivamente impossibilitado de recolher os valores descontados dos empregados da sua empresa, sob pena de colocar em risco a prova existência da empresa.
A apreciação normativa de exclusão da culpabilidade implica sua exclusão sempre que diante das circunstâncias do fato concreto, não seja exigível do sujeito conduta diversa da culpabilidade.
As dificuldades financeiras poderiam ser comprovadas através de documentos que retratassem a existência de empréstimos bancários, títulos protestados, reclamações trabalhistas, ações de execuções, pedidos de falência, venda de imóveis, automóveis, etc., prova essa que incumbiria à defesa produzir, a teor do disposto no artigo 156 do Código de Processo Penal. O pagamento extemporâneo e em grande valor somente demonstra que o réu poderia ter pago as contribuições na época própria.
Ademais, o extenso período em que as contribuições deixaram de ser recolhidas descaracteriza uma situação excepcional e demonstra, por conseguinte, que tal prática foi incorporada à rotina da empresa.
A exclusão da culpabilidade requer a existência de elementos seguros, aptos a comprovar a impossibilidade do recolhimento das contribuições devidas à Previdência, o que não ocorreu no presente feito.
Destarte, a condenação é medida que se impõe."

Contra a sentença a defesa interpôs recurso de apelação alegando cerceamento de defesa, no mérito postulando a absolvição com alegações de insuficiência de provas, ausência de dolo específico e inexigibilidade de conduta diversa, subsidiariamente impugnando as penas aplicadas.

O recurso, de relatoria do Desembargador Federal Cotrim Guimarães, foi julgado na sessão de 25 de novembro de 2008, tendo a Segunda Turma, por unanimidade, negado provimento ao recurso, consoante acórdão que encerra a seguinte ementa:


"PENAL E PROCESSUAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A, CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO PARCIAL. MATERIALIDADE DO DELITO E AUTORIA CONFIGURADOS. DOLO GENÉRICO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PROVAS INSUFICIENTES. ALEGAÇÃO IMPRESTÁVEL PARA A EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSO INTEGRALMENTE DESPROVIDO.
1.A materialidade restou devidamente comprovada. Através da documentação constante nos autos, do relatório fiscal e dos processos apensos (processo administrativo, Notificações Fiscais de Lançamento de Débito - NFLD's, recibos de pagamentos e resumos de folhas de pagamento), ficou demonstrado que houve os descontos nas folhas de salário dos empregados sem o devido repasse ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
2.A autoria restou provada. Prova testemunhal e os documentos societários demonstram que o réu era responsável pela administração e gerência da empresa.
3.Para a caracterização do delito de apropriação indébita previdenciária basta o dolo genérico (não havendo que se falar em dolo específico), devendo ser classificado como crime omissivo próprio. Não se exige que o agente se aproprie dos valores arrecadados e não repassados à Seguridade Social. Para a sua consumação, basta o não recolhimento da exação.
4. A simples alegação de dificuldades financeiras não tem o condão de afastar, prima facie, a aplicação da lei penal. Para que as dificuldades financeiras possam ser reconhecidas como causa supra legal de exclusão do crime, deve ser suficientemente comprovada a dificuldade do empresário, em face da grave crise financeira, advinda de fatos alheios a sua vontade.
5.Foram diversos os descontos de valores das folhas de pagamento de seus empregados, sem o necessário repasse para a Autarquia Previdenciária. Desta maneira, cada mês sem o recolhimento configura uma tipificação penal e, pelas condições de tempo, modo e lugar, os crimes devem ser tidos como continuação do primeiro.
6.Mantida a condenação de ANTÔNIO SERRA, como incurso na sanção do art. 168-A, § 1º, inciso I, do CP, com pena base fixada em 3 (três) anos de reclusão, em face do grau de culpabilidade e dos motivos e circunstâncias do crime; depois, com a incidência do art. 71, caput, do CP, em razão da continuidade do delito, tendo em vista a longa duração da prática delitiva, aplicou-se a fração de 1/3 (um terço), elevando-se a condenação da pena privativa de liberdade a 4 (quatro) anos de reclusão e determinando-se o regime aberto como o regime inicial de cumprimento da pena; já a pena de multa, à sua vez, foi mantida em 30 (trinta) dias-multas, aumentada também de 1/3 (um terço), perfazendo-se 40 (quarenta) dias-multas, sendo o dia-multa determinado em um salário mínimo vigente à época da omissão delitiva, atualizado segundo o índice oficial de correção monetária.
7.Presentes as circunstâncias dos artigos 44, § 2º, 45, § 1º, e 46, todos do CP, mantida a substituição da pena privativa de liberdade, por prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, sendo aquela fixada em 40 (quarenta) salários mínimos."

A pretensão de absolvição do ora revisionando foi rejeitada pela Segunda Turma, na esteira de motivação expendida nestes termos no voto do Relator:


"DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE: A autoria é inconteste. ANTONIO SERRA exercia ao tempo dos fatos delitivos a responsabilidade administrativa e gerencial da SERRA S/A CONSTRUÇÕES E COMERCIO e deixou de observar, nesta condição, o dever legal de repassar ao INSS os devidos valores descontados, a título de contribuição previdenciária, das verbas trabalhistas pagas a seus empregados, como se pode inferir da vasta documentação acostada aos autos desta ação penal, especialmente segundo o termo de interrogatório de fls. 356/359, no qual se lê que "o diretor da empresa era Antônio Serra e era o responsável pelo recolhimento das contribuições" (sic), e também conforme os documentos societários de fls. 202/242.
Provas suficientes também foram carreadas aos autos acerca da materialidade delitiva. Por meio da documentação constante dos autos (fls. 04/130), tais como a Representação Fiscal para Fins Penais (fls. 12/16), Notificação Fiscal de Lançamento de Débito - NFLD n.º 35.071.571-8 (fl. 57) e nº 35.071.573-4 (fl. 93), as Instruções para o Contribuinte - IPC's (fls. 58/59), os Discriminativos Analíticos de Débito - DAD's (fls. 60/74), os Discriminativos Sintéticos de Débito - DSD's (fls. 75/77), os Fundamentos Legais do Débito, Termos de Intimação para Apresentação de Documentos - TIAD´s (fls. 18/19 e 90/91), os Fundamentos Legais das Rubricas e os Relatórios da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito, entre outros, além dos documentos societários, cópias dos borderôs de folha de pagamento e termos de rescisão de contrato de trabalho, ficou demonstrado que o acusado ANTONIO SERRA descontou das folhas de salário dos empregados, sem o repasse integral ao INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, as contribuições previdenciárias respectivas.
Mesmo tendo afirmado o ACUSADO, durante toda a instrução, que o respectivo indébito já haveria sido pago e de que a empresa teria aderido ao REFIS, pelo que extinta estaria a punibilidade, noticiou a PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA - INSS, à fl. 378, que os indébitos tratados nas NFLD´s n.º 35.071.571-8 e n.º 35.071.573-4, os quais informam o objeto desta ação penal, não foram pagos e nem tampouco parcelados, encontrando-se o primeiro inscrito em dívida ativa e o segundo, em cobrança judicial.
Às fls. 403/404, a PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA - INSS reporta que os recolhimentos relativos aos períodos discriminados nas respectivas NFLD's apresentavam saldo remanescente, em razão de os descontos realizados sobre as verbas trabalhistas pagas aos empregados da SERRA S/A CONSTRUÇÕES E COMERCIO haverem sido repassados a menor.
É improcedente, pois, a alegação da acusação de que sofrera cerceamento de defesa, porque a sentença monocrática teria deixado de apreciar a tese da defesa, de que o pagamento ocorrera integral e tempestivamente e de que nos fundamentos do decisum não se teria apreciado a tese de inculpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa.
Ora, a decisão monocrática jamais se esquivara da apreciação dessas teses de defesa, consignando, expressamente, que tanto a defesa não provara de forma suficiente o pagamento integral dos indébitos, quanto não firmara de forma bastante a inculpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa.
E, de fato, foi segundo o contraditório e a ampla defesa, os meios e recursos e ela inerentes, que o ACUSADO alegou o pagamento integral do indébito (fls. 453/456) e juntou os Documentos de Arrecadação de Receitas Federais - DARF's de fls. 457/482. Foi também sobre o crivo do contraditório e do devido processo legal que a ACUSAÇÃO repudiou a tese da defesa, alegando que o pagamento não fora integral, isto é, de que a empresa descontou das verbas trabalhistas pagas montante superior ao que fora repassado ao INSS, e, para tanto, fez prova do saldo remanescente, o que se verifica nos ofícios da PROCURADORIA FEDERAL ESPECIALIZADA - INSS de fls. 378, 403/404 e 426/427.
Isso porque, simplesmente, segundo o art. 156, caput, do Código de Processo Penal brasileiro - CPP, recentemente alterado pelo art. 1º da Lei Federal modificadora n.º 11.690, de junho de 2008, "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer (...)", do que decorre que não são profícuas as meras alegações da parte se não acompanhadas de provas bastantes para a formação da convicção do juízo.
DA TIPIFICAÇÃO E DA CULPABILIDADE: Para a caracterização do delito de apropriação indébita previdenciária basta o dolo genérico (não havendo que se falar em dolo específico), devendo o delito ser classificado como crime omissivo próprio. Além do que, trata-se de crime de mera conduta, não se exigindo para a sua tipificação a apropriação em si dos valores retidos e não repassados ao INSS, menos ainda o locupletamento dos agentes, sendo suficiente, para tanto, apenas que os responsáveis deixem de recolher a importância descontada a título contributivo. Logo não integram o elemento subjetivo do tipo o animus rem sibi habendi, ou a intenção de auferir proveito com o não recolhimento, ou ainda o desígnio de fraudar a Previdência Social, ou qualquer outra intenção afim.
A tese absolutória foi firmada na exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa.
Tida como causa supra-legal de exclusão da culpabilidade (considerando que só se exige do indivíduo o que for materialmente possível), não é aceitável, in casu, a tese de dificuldades financeiras aduzida pelo acusado.
A simples alegação de dificuldades financeiras (atribuída a planos econômicos governamentais) não tem o condão de afastar, prima facie, a aplicação da lei penal. Acrescente-se que essas contribuições previdenciárias significam um sistema de proteção social, destinado a acudir o indivíduo diante de determinadas contingências sociais, assegurando-lhe o mínimo indispensável a uma vida digna (Jediael Galvão Miranda in Direito da Seguridade Social, Ed. Elsevier, 2007).
Para que as dificuldades financeiras possam ser reconhecidas como causa supra legal de exclusão da culpabilidade, deve ser suficientemente comprovada a dificuldade do empresário, em face da grave crise financeira, advinda de fatos alheios a sua vontade, justificando-se, assim, o não repasse das contribuições previdenciárias em espécie, seja para honrar o salário dos empregados, seja para sua sobrevivência ou da própria empresa, onde se apura, inclusive, a disposição de bens particulares. A simples alegação de que a empresa passava por dificuldades financeiras, apoiada em testemunhos e declarações vagos não é suficiente para afastar a condenação.
In casu, Juntou-se cópia de decisão judicial (fls. 482/483) proferida pelo juízo da 8ª Vara Cível da Comarca de Campinas/SP, que julga cumprida a concordara preventiva, e que, por si só, não é idônea à prova de impossibilidade material do pagamento. Do mesmo modo, a cópia dos resumos de balanços, referentes aos anos de 1996, 1998, 1999 e 2000 (fls. 484/513), não demonstram de forma suficiente que a empresa não dispunha de capacidade econômico-financeira para o integral repasse das contribuições descontadas.
Do mesmo modo, os autos desta ação penal são totalmente carentes de provas bastantes acerca da insolvência do seu sócio-diretor, de modo a demonstrar cabalmente que este não poderia solver o respectivo indébito.
Logo, é insuficiente, pois, o conjunto probatório coligido aos autos da respectiva ação penal, no tocante à demonstração segura da ausência de disponibilidade financeira e de capacidade contributiva da SERRA S/A CONSTRUÇÕES E COMERCIO e de seu sócio-administrador, em relação ao período da omissão delitiva continuada."

Observa-se que a condenação foi mantida com base no conjunto probatório e analisada a demanda penal à luz dos critérios que entendeu o colegiado presidirem as questões.

Quanto às alegações do requerente sustentando inexigibilidade de conduta diversa ao argumento de que passava por dificuldades financeiras, basta uma simples leitura do acórdão para se constatar que foram devidamente apreciadas e afastadas pela Segunda Turma, que concluiu ser insuficiente "o conjunto probatório coligido aos autos da respectiva ação penal, no tocante à demonstração segura da ausência de disponibilidade financeira e de capacidade contributiva da SERRA S/A CONSTRUÇÕES E COMERCIO e de seu sócio-administrador", convindo anotar que é da defesa o ônus de provar alegações de dificuldades financeiras para fins de reconhecimento de inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, dispondo que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer", entendimento ao qual não falta o amparo da jurisprudência, destacando-se os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:


"AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. CRIME SOCIETÁRIO. DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MINUCIOSA DAS CONDUTAS PRATICADAS PELOS SÓCIOS-ADMINISTRADORES. DIFICULDADES FINANCEIRAS DA EMPRESA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. ÔNUS DA PROVA DA DEFESA. INVERSÃO DO JULGADO. SÚMULA 07/STJ. DOSIMETRIA DA PENA. CONTINUIDADE DELITIVA. CRITÉRIO DE EXASPERAÇÃO. NÚMERO DE INFRAÇÕES. IDONEIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
............................................................................................................................................................................................................................................
2. Não cabe à acusação demonstrar e comprovar elementares que inexistem no tipo penal, de forma que o ônus da prova da impossibilidade de repasse das contribuições previdenciárias apropriadas ante às dificuldades financeiras da empresa, a evidenciar, assim, a inexigibilidade de conduta diversa - causa supralegal de exclusão da culpabilidade -, é da defesa, a teor do art. 156 do CPP. Precedentes.
............................................................................................................................................................................................................................................
5. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, AgRg no REsp 1178817, Sexta Turma, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), DJe 03/11/2011)
"PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. PRESCINDIBILIDADE DO ESPECIAL FIM DE AGIR OU DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). CRIME OMISSIVO PRÓPRIO. REGISTRO EM LIVROS CONTÁBEIS E DECLARAÇÃO À PREVIDÊNCIA SOCIAL DOS DESCONTOS NÃO RECOLHIDOS. IRRELEVÂNCIA. DIFICULDADES FINANCEIRAS. EXCLUDENTE DA CULPABILIDADE. ÔNUS DE PROVA DA DEFESA. INDÍCIOS. INADMISSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.
............................................................................................................................................................................................................................................
5. A alegada impossibilidade de repasse de tais contribuições em decorrência de crise financeira da empresa constitui, em tese, causa supralegal de exclusão da culpabilidade - inexigibilidade de conduta diversa -, e, para que reste configurada, é necessário que o julgador verifique a sua plausibilidade, de acordo com os fatos concretos revelados nos autos, não bastando para tal a referência a meros indícios de insolvência da sociedade.
6. O ônus da prova, nessa hipótese, compete à defesa, e não à acusação, por força do art. 156 do CPP.
7. Recurso conhecido e provido para denegar a ordem de habeas corpus e, conseqüentemente, determinar o prosseguimento da ação penal."
(STJ, REsp 888947, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 07/05/2007)

Com relação às alegações de que o delito de apropriação indébita previdenciária somente se configura se demonstrado o dolo específico, trata-se de questão examinada no acórdão à consideração de que "não integra o elemento subjetivo do tipo o animus rem sibi habendi, ou a intenção de auferir proveito com o não recolhimento, ou ainda o desígnio de fraudar a Previdência Social, ou qualquer outra intenção afim", concluindo que basta o dolo genérico, conforme orientação consolidada na jurisprudência, de que são exemplos os seguintes julgados:


"PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. DOLO GENÉRICO. REQUISITO DO PREQUESTIONAMENTO PREENCHIDO PARA JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA EM RAZÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. ORDEM DENEGADA. 1. A jurisprudência da Egrégia 2ª Turma deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que para a configuração do crime de apropriação indébita previdenciária basta a demonstração do dolo genérico. 2. Consoante restou consignado pela eminente relatora do REsp 1.084.072-AgR/PE, Min. Laurita Vaz, "o acórdão recorrido, ao absolver os Réus pela falta de provas da ocorrência do dolo específico, afastou implicitamente o dolo genérico, restando, portanto, comprovado o requisito do prequestionamento." 3. Além disso, não houve análise de matéria probatória no julgamento do Recurso Especial, eis que o acórdão impugnado limitou-se a afirmar que não se exige dolo específico para a configuração do crime de apropriação indébita previdenciária. 4. Esta Suprema Corte já decidiu que "a pretensão visando ao reconhecimento de inexigibilidade de conduta diversa, traduzida na impossibilidade de proceder-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias, devido a dificuldades financeiras, não pode ser examinada em habeas corpus, por demandar reexame das provas coligidas na ação penal" (RHC 86.072/PR, Rel. Min. Eros Grau, DJ 28.10.2005). 5. Habeas corpus denegado."
(STF, HC 98272, Segunda Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, j. em 29/09/2009)
"HABEAS CORPUS. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE DA CONDUTA IMPUTADA AO PACIENTE. IMPROCEDÊNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.
............................................................................................................................................................................................................................................
3. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, para a caracterização do delito de apropriação indébita previdenciária, basta o dolo genérico, já que é crime omissivo próprio, não se exigindo, portanto, o dolo específico do agente de se beneficiar dos valores arrecadados dos empregados e não repassados à Previdência Social. Precedentes da corte.
............................................................................................................................................................................................................................................
5. Ordem prejudicada."
(STJ, HC 116461, Sexta Turma, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS) DJe 29/02/2012)
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 619 DO CPP. AUSÊNCIA DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO NO MONTANTE AUFERIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. DOLO GENÉRICO. ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. ÔNUS PROBATÓRIO DA DEFESA. CONTINUIDADE DELITIVA. AUMENTO JUSTIFICADO PELO NÚMERO DE INFRAÇÕES COMETIDAS. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO.
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3. O crime de apropriação indébita previdenciária tem sido entendido como crime omissivo próprio (ou omissivo puro), isto é, aquele em que não se exige necessariamente nenhum resultado naturalístico, esgotando-se o tipo subjetivo apenas na transgressão da norma incriminadora, no dolo genérico, sem necessidade de comprovação do fim especial de agir, ou dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de ter a coisa para si (animus rem sibi habendi).
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6. Recurso especial parcialmente conhecido e improvido."
(STJ, REsp 1113735, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 29/03/2010)
"REVISÃO CRIMINAL. CABIMENTO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA . DENÚNCIA APTA. PAGAMENTO NÃO COMPROVADO. PARCELAMENTO POSTERIOR À DENÚNCIA E NÃO ADIMPLIDO. ANISTIA NÃO CONFIGURADA. MATERIALIDADE. DOLO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO CONFIGURADA. PEDIDO IMPROCEDENTE.
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9 - Relativamente ao dolo, para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária basta o dolo genérico . Tratando-se de tipo omissivo, não se exige o "animus rem sibi habendi", sendo suficiente à sua consumação, o efetivo desconto e o não recolhimento do tributo no prazo legal.
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11 - Preliminares rejeitas. Pedido improcedente."
(TRF3, Primeira Seção, RVC 0006374-90.2012.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Cecília Mello, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/04/2013)

Nota-se, enfim, que o acórdão está devidamente fundamentado e alicerçado em elementos probatórios produzidos, não se entrevendo contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos.

Provas evidentemente não faltaram e propiciavam versão acusatória logicamente oponível à tese defensiva.

No mais trata-se dos critérios de julgamento, que descabe examinar em sede de revisão criminal, não se podendo pretender que referida ação de impugnação tenha o mesmo âmbito de abrangência do recurso de apelação, afinal o Código de Processo Penal, em seu artigo 621, delineia de forma expressa as hipóteses de cabimento do pedido revisional, nenhuma das quais possibilitando reexame de juízo de valoração da prova produzida.

Neste sentido a jurisprudência desta E. Primeira Seção:


"REVISÃO CRIMINAL. ROUBO. 157, §2º, I E II DO CP. CONDENAÇÃO CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. ART. 621, I DO CPP. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. REVISÃO IMPROCEDEDENTE.
I - Não há que se falar em condenação que afronta a evidência dos autos. Isso porque tal hipótese requer que a decisão condenatória esteja em total descompasso com o conjunto probatório, de modo que todos os elementos colhidos apontem para a inocência do réu, o que não é a situação dos autos;
II - A prova no sentido de manter a condenação do revisionando é robusta, tendo sido valorada de forma razoável e com ponderação, o que afasta por completo a hipótese do artigo 621, I do CPP;
III- O que se almeja é uma reavaliação das provas, de forma alterar a decisão final a fim de absolver o condenado. Todavia, é mister esclarecer que não é esse o escopo da revisão criminal, que é ação que visa corrigir um erro judiciário, e não substituir o recurso de apelação;
IV - Revisão criminal improcedente."
(RVC 00021643020114030000, RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, e-DJF3 Judicial 1 03/01/2012)
"PENAL. REVISÃO CRIMINAL. - ROUBO À AGÊNCIA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - ALEGADA CONTRARIEDADE À PROVA DOS AUTOS E NULIDADE DE SENTENÇA - PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO AO ARGUMENTO DE NÃO COMPROVAÇÃO DO CRIME - AFASTAMENTO - PROVAS MINUCIOSAMENTE ANALISADAS - REEXAME DE MATÉRIA AMPLAMENTE APRECIADA NA SENTENÇA E NO ACÓRDÃO - NÃO CABIMENTO - REVISÃO IMPROCEDENTE.
[...]
4. A revisão criminal não se destina à reapreciação de prova já examinada em primeiro e segundo graus de jurisdição.
[...]"
(RVC 200703001006245, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, DJF3 CJ1 DATA:28/04/2011 PÁGINA: 157)
"REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CABIMENTO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. EFEITO EXTENSIVO DOS RECURSOS. REEXAME DE PROVA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. DELAÇÃO PREMIADA. PROGRESSÃO DE REGIME. REVISÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
O pedido revisional deve fazer referência a uma das hipóteses de cabimento elencadas nos incisos I a III do art. 621 do Código de Processo Penal para ser conhecido.
Foram corretamente analisadas as circunstâncias judiciais previstas no caput do art. 59 do Código Penal para a fixação da pena-base.
A contrariedade da condenação à evidência dos autos deve ser entendida com cautela, na medida em que a revisão criminal não se destina à mera reapreciação de prova já examinada em primeiro e segundo graus de jurisdição e não se trata de uma segunda apelação. O antagonismo há de ser frontal entre a fundamentação ou o dispositivo da decisão impugnada e o conjunto de provas existentes nos autos, de forma a resguardar o livre convencimento do juiz.
[...]"
(RVC 200503000692422, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, DJF3 CJ1 DATA:04/05/2010 PÁGINA: 104)
"PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. REEXAME DE MATÉRIA JÁ DISCUTIDA. INADMISSIBILIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. ART. 59 DO CP. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. PRELIMINARMENTE RECHAÇADA A PRETENSÃO DE DECLARAÇÃO DE PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL FALTA DE INTERESSE DE AGIR EM RAZÃO DE JÁ TER SIDO CONCEDIDO TAL PEDIDO ANTERIORMENTE. REVISÃO CRIMINAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
[...]
A Revisão Criminal não é a sede adequada para a reapreciação do conjunto probatório, pela repetição de teses já afastadas por ocasião da condenação definitiva.
A revisão criminal não tem a natureza de apelação, já que se apresenta como verdadeira ação rescisória do julgado, não se prestando ao mero reexame de provas, já analisadas no juízo de conhecimento e, eventualmente, em segundo grau."
(RVC 200703000641411, DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF, DJF3 CJ1 DATA:13/08/2010 PÁGINA: 87)

Quanto à pena-base, verifica-se que foi aplicada na sentença em três anos de reclusão e trinta dias-multa, quantidade mantida no julgamento do recurso de apelação, destacando-se o seguinte trecho do acórdão:


"[...] não deixou de ponderar o juízo a quo acerca da repercussão social da omissão delitiva em questão, ao tornar precário o seguro público do trabalhador perante o risco social e, ainda, que os seus empregados, aqueles cuja exploração da mão-de-obra é conditio sine qua non ao desempenho da atividade empresarial e à remuneração do capital investido, muito certamente terão sérias dificuldades quando requerem benefícios previdenciários, em face da inexistência de contribuição em relação ao período encampado pela omissão delitiva continuada, a saber, a apropriação indébita previdenciária."

Verifica-se que a pena-base foi fixada de maneira devidamente fundamentada, obedecendo aos critérios legais, não encerrando erro técnico e também não se entrevendo quaisquer rasgos de injustiça explícita.

A propósito cito o seguinte julgado da E. Primeira Seção:


"PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CONDENAÇÃO COERENTE COM AS PROVAS COLIGIDAS. PENA FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CRITÉRIOS SUBJETIVOS DO JUÍZO. ALTERAÇÃO EM SEDE DE REVISIONAL. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE LEI NOVA MAIS BENFÉFICA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO.
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II - Não há qualquer incoerência entre a decisão que condenou o réu e o conjunto probatório apurado nos autos. Tanto a sentença condenatória, como o Acórdão que a confirmou apreciaram, detalhadamente, as provas produzidas contra o réu.
III - A revisão criminal não se presta para reavaliar os critérios subjetivos utilizados pelo Juízo para avaliação das circunstâncias judiciais aplicáveis ao caso. Vale dizer que o pedido de revisão criminal não admite ampla revisão da pena aplicada, que nesta sede processual só pode ser modificada em caso de erro técnico ou de injustiça manifesta.
IV - O Juízo monocrático fixou a pena base acima do mínimo legal em virtude de o réu ter praticado o delito no gozo do benefício da suspensão condicional de outro processo, fato denotativo de sua má personalidade. Não há, portanto, que se pretender em sede revisional a redução da pena para o mínimo legal.
V - A aplicação da majorante do artigo 18, III, da Lei nº 6.368/76 foi expressamente fundamentada pela decisão que condenou o réu. Não há qualquer nulidade na dosimetria da pena por falta de fundamentação.
VI - A aplicação da lei nova na parte favorável ao réu cabe ao Juízo da Execução.
VII - Vedação à progressão de regime afastada, tendo em vista a declaração de inconstitucionalidade pelo Plenário do STF.
VIII - Revisão criminal parcialmente procedente para afastar a vedação à progressão de regime."
(REVISÃO CRIMINAL Nº 0000106-59.2008.4.03.0000/SP, RELATORA Desembargadora Federal CECILIA MELLO, D.E. Publicado em 17/10/2011)

Também alega o revisionando a incidência da atenuante da confissão espontânea ao argumento de que confessou "a ausência dos recolhimentos previdenciários por questões de precariedade financeira que se encontrava".

Para melhor compreensão da questão destaco o seguinte excerto do interrogatório (fls. 385/386):


"[...] que a empresa do interrogando se dedica à construção civil e existe há 26 anos e sempre recolheu os tributos devidos; que no período narrado na denúncia a empresa passou por dificuldades financeiras; que no período narrado na denúncia houve uma desestabilização da economia havendo queda na venda dos imóveis construídos pelo interrogando; que informa o interrogando que o débito mencionado na denúncia está pago conforme irá demonstrar documentalmente nos autos; que para saldar esses compromissos o interrogando chegou a vender bens particulares seus e de seus familiares; que quando recebeu a citação para este processo o débito já estava quitado; que com relação à parte da empresa ela está incluída no programa Refis; que a empresa sempre teve sede em Campinas e não na cidade de Moji Guaçu, conforme consta da denúncia; que nada tem a alegar contra a testemunha arrolada; que não se envolveu anteriormente em processo criminal."

Observa-se que o ora peticionário não negou os fatos imputados de ausência de repasse à Previdência das contribuições recolhidas dos empregados, mas alegou dificuldades financeiras e que já havia realizado o pagamento do débito quando da citação na ação penal, neste quadro concluindo-se que o revisionando sustentou teses de exclusão da culpabilidade e de extinção da punibilidade do delito, vale dizer, cuida-se de confissão qualificada, também sendo digno de nota que não avulta determinante a influência da confissão na sentença ou no acórdão, por estes fundamentos não havendo que se falar em contrariedade ao texto expresso da lei penal no aresto e ficando afastada a pretensão de aplicação da excogitada atenuante.

Destaco o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça de utilidade na questão:


"HABEAS CORPUS. PENAL. LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. IMPOSSIBILIDADE. CONFISSÃO QUALIFICADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA. 1. A confissão qualificada, na qual o agente agrega à confissão teses defensivas descriminantes ou exculpantes, não tem o condão de ensejar o reconhecimento da atenuante prevista no art. 65, inciso III, alínea d, do Código Penal. De qualquer forma, a versão dos fatos apresentados pelo ora Paciente sequer foi utilizada para embasar a sua condenação, uma vez que restou refutada pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. 2. In casu, o Paciente confessou ter esfaqueado a vítima para se defender, alegando, portanto, ter agido em legítima defesa. 3. Ordem de Habeas Corpus denegada."
(STJ, HC 197395, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 30/04/2013).

Quanto à alegação de que o decreto condenatório é extra ou ultra petita no tocante ao aumento da continuidade delitiva ao fundamento de que o artigo 71 do Código Penal não foi referido na denúncia, também não merece acolhida.

Com efeito, o que se verifica da análise dos autos é que, conquanto a inicial acusatória não tenha incluído o artigo 71 do Código Penal na capitulação delitiva, narra que o revisionando, na qualidade de diretor-presidente da "Serra S/A Construções e Comércio" e com poderes de administração da empresa, deixou de repassar à Previdência as contribuições sociais descontadas de seus empregados no período de janeiro de 1996 a fevereiro de 2000, neste quadro constatando-se que a denúncia não descreve apenas uma, mas plúrimas condutas delituosas praticadas no período mencionado, convindo lembrar que o réu se defende dos fatos descritos na peça inaugural, não do enquadramento legal, sendo que o sistema processual penal pátrio admite expressamente a "emendatio libelli", nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, na redação original (vigente à época da prolação da sentença) dispondo que "o juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que constar da queixa ou da denúncia, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave", além do que consistindo o instituto da continuidade delitiva - previsto no excogitado artigo de lei - em ficção jurídica criada para o momento de aplicação das penas em benefício do réu.

Destarte, considerando que a denúncia descreve de forma suficiente e clara que o ora peticionário incorreu nas condutas imputadas no período de janeiro de 1996 a fevereiro de 2000, não há que se excogitar de violação ao princípio da correlação entre acusação e sentença em face da aplicação do aumento da continuidade delitiva previsto no artigo 71 do Código Penal ("quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços").

Acerca do tema trago à baila as lições de Damásio de Jesus em nota ao artigo 41 do Código de Processo Penal (24ª edição, editora Saraiva, ano 2010, página 81):


"Não exige aditamento a denúncia que omite referência ao art. 71 do CP, que conceitua o delito continuado, desde que essa circunstância esteja contida na peça acusatória, uma vez que o juiz pode empregar o disposto no art. 383 do CPP (STF, RTJ 77/116). Entendemos que a denúncia não deve conter referência ao art. 71 do CP, uma vez que essa norma, que conceitua o nexo de continuidade, trata-se de causa de diminuição da pena."

Assevero, por fim, que o pedido de declaração da extinção da punibilidade do delito por suposto pagamento dos débitos foi apreciado e rejeitado tanto pela sentença quanto pelo acórdão à consideração de que, consoante informações prestadas pela Procuradoria Federal Especializada - INSS, existiam débitos pendentes com relação às NFLD´s nº 35.071.571-8 e 35.071.573-4 mencionadas na denúncia, conforme se verifica no ofício de fl. 510, portanto também neste ponto não se vislumbrando contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos.

Por estes fundamentos, julgo improcedente o pedido revisional.

É o voto.



Peixoto Junior
Desembargador Federal


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