D.E. Publicado em 09/08/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, alterar a classificação da conduta de uso de passaporte falso para os artigos 304 c.c. 297 do Código Penal, e fixar o regime inicial aberto para cumprimento da pena de reclusão, mantida no mais a r.sentença apelada, comunicando-se o Ministério da Justiça, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita (Relator):
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia, em 29/04/2009, contra NHELINO JACK HILARES RETO, qualificado nos autos, de nacionalidade peruana, nascido aos 15/09/1977, dando como incurso nos artigos 304 c.c. 297 e 304 c.c. 299, todos do Código Penal. Consta da denúncia:
A denúncia foi recebida em 04/05/2009 (fl. 60).
Processado o feito, sobreveio sentença, da lavra da MM. Juíza Federal Maria Izabel do Prado e publicada em 09/09/2009 (fls. 202/221), condenando o réu como incurso nos artigos 304 c.c. 297 e 304 c.c. 299, todos do Código Penal, em concurso formal, à pena de 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 30 (trinta) dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos. Foi concedido o direito de apelar em liberdade. Para o crime dos artigos 297 c/c 304 do CP a pena foi 03 anos de reclusão e 20 dias-multa, e para o crime dos artigos 299 c/c 304 do CP a pena foi de 02 anos de reclusão e 20 dias-multa.
Na audiência de cientificação, realizada em 28/09/2009, foi feita a correção da pena referente ao crime dos artigos 304 c.c. 297 para fixá-la em 02 anos de reclusão, e a pena final em 03 (três) anos de reclusão e 30 (trinta) dias multa (fls. 230/232).
A Defesa apela (fls. 244/247). Requer a desclassificação do crime de uso de documento falso para o crime de falsa identidade, já que o passaporte constitui um documento de identificação, conforme preconiza o artigo 2º do anexo do Decreto nº 5.978/2006. Pleiteia a absolvição do réu quanto ao crime do artigo 304 c.c. o artigo 299, ambos do Código Penal, por falta de provas e pelo princípio da consunção, em razão de se tratar de crime meio para a prática de outro delito.
Contrarrazões às fls. 254/261.
A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. Márcio Domene Cabrini, opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 264/266).
É o relatório.
Ao MM. Revisor.
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VOTO
O Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita (Relator):
Quanto à tipificação legal, observo que consta dos autos que o réu NHELINO JACK HILARES RETO, cidadão peruano, fez uso de documento materialmente falso, qual seja, identidade civil brasileira, pertencente a Wesley Rodrigues Santos, a fim de emitir passaporte ideologicamente falso, o qual posteriormente também foi utilizado com o intuito de embarcar para Europa.
O réu foi condenado pelo Juízo a quo como incurso nos crimes dos artigos 304 c.c. 297 e 304 c.c. 299, todos do Código Penal.
Todavia, entendo que o passaporte emitido em nome de Wesley Rodrigues Santos é materialmente falsificado, e não ideologicamente falso.
Com efeito, não obstante o laudo pericial tenha constatado que passaporte foi sido emitido pela autoridade policial, e dele não constando quaisquer vestígios de adulteração, não restaram dúvidas de que a assinatura constante do documento não é de Wesley Rodrigues dos Santos.
E, se assinatura constante do documento não foi produzida pela pessoa nele indicada, trata-se, à evidência, de falsidade material.
Logo, relata a denúncia o uso de documentos materialmente falsos, em duas oportunidades, de modo que, com base no instituto da emendatio libelli, previsto no artigo 383, caput, do Código Penal, ambas as condutas devem ser enquadradas nos artigos 304 c.c. 297 do Código Penal.
O pedido de desclassificação do crime de uso de documento falso para o crime de falsa identidade não comporta acolhimento.
Há que se distinguir o crime de uso de documento falso (art. 304) e o crime de falsa identidade (art. 307).
A prática do crime de falsa identidade se perfaz quando, por exemplo, o agente simplesmente se apresenta como sendo alguém que não é, sem que para tanto seja necessária a apresentação de qualquer documento.
No caso do crime de uso de documento falso, ao contrário, o agente se utiliza de um documento para se identificar. Ocorre, nesse caso, a apresentação de um documento espúrio.
O Supremo Tribunal Federal, no HC 1003314, constante do Informativo 628, manifestou-se acerca da diferença entre os dois delitos. Confira-se do acórdão:
Portanto, a primeira conduta (utilizar-se de identidade falsificada para obtenção de passaporte) se enquadra no tipo do artigo 304 do Código Penal.
A materialidade e autoria delitivas restaram devidamente demonstradas.
A análise conjunta dos documentos de fls. 14/17 com o Laudo de Exame Documentoscópico (fls. 97/102) demonstra que a identidade de fl. 17, bem como o passaporte de fl. 103 não são verdadeiros.
As circunstâncias fáticas do flagrante, bem como o interrogatório do acusado evidenciam que os documentos falsos foram utilizados por ele.
Com efeito, o réu foi detido quando efetuava o check in para embarque no voo JJ 8098 da companhia aérea TAM com destino a Paris. Confira-se a narrativa feita pela Agente da Polícia Federal Elza Lucia de Melo, responsável pelo flagrante:
O interrogatório do réu ratifica a situação de flagrância. Afirmou o acusado em juízo, sob o crivo do contraditório, que, de fato, veio ao Brasil por intermédio de uma pessoa, que não identificou, para conseguir visto para a Europa. Entretanto, aduz que quando já estava no Brasil essa pessoa que o ajudaria com o visto disse que apenas poderia conseguir um documento que lhe permitiria adquirir o passaporte brasileiro.
Afirmou o acusado que teve de aceitar a proposta, pois era a única opção que tinha, já que para vir ao Brasil vendeu o táxi que possuía como instrumento de trabalho. Disse, ainda, que viu que os documentos tinham o nome de outra pessoa e que aceitou a prática do delito porque no Peru a dificuldade de vida é muito grande.
Como se vê, portanto, o réu sabia da falsidade dos documentos, mas, ainda assim, concordou em utilizá-los para poder viajar ao exterior.
Ressalto que a versão apresentada pelo acusado de que sua conduta ilícita teve como motivo dificuldades por que passava no Peru não é suficiente a ilidir as demais provas constantes dos autos.
Nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, a prova das alegações incumbe a quem as fizer e, no caso, a Defesa nada comprovou sobre as alegações de dificuldades suscitadas pelo réu.
Acresço que não há falar em aplicação do princípio da consunção, pois, embora o uso da identidade espúria tenha sido o meio empregado para a emissão do passaporte, certo é que a potencialidade lesiva do documento de identidade não se esgotou nesse momento, de modo que não deve ser absorvido pelo crime posterior.
Dessa forma, restam provadas a materialidade delitiva e a autoria de NHELINO referente ao crime de uso de documento falso.
Quanto à dosimetria da pena, observo que a pena-base foi fixada no mínimo legal para ambos os crimes.
Não obstante a classificação da conduta de uso de passaporte falso nos artigos 297 e 304 do CP, em razão da inexistência de recurso da Acusação e da proibição da reformatio in pejus deve ser mantida a pena tal como lançada na sentença, de 1 (um) ano de reclusão, nos termos do artigo 299 do Código Penal, já que não há recurso do Ministério Público Federal, não sendo possível, portanto, a reformatio in pejus.
Por outro lado, observo que os crimes foram praticados em duas ocasiões distintas: o uso da carteira de identidade falsa ocorreu na apresentação desta perante a Polícia Federal, para obtenção do passaporte; e o uso do passaporte falso deu-se por ocasião da apresentação para viagem ao exterior, quando o réu foi preso em flagrante.
Assim, há concurso material de crimes, e não concurso formal como reconhecido na r. sentença apelada. Não obstante, fica mantido o concurso formal, mais benéfico ao réu, à míngua de recurso da Acusação e em razão da proibição da reformatio in pejus.
Assim sendo, fica mantida a pena definitiva lançada na sentença, de 3 (três) anos de reclusão e 20 (vinte) dias multa, no valor unitário mínimo.
Considerando que as penas-base foram fixadas no mínimo legal para ambos os crimes, o regime inicial de cumprimento da pena deve ser o aberto, nos termos do artigo 33, §2º, c, do Código Penal e do entendimento jurisprudencial consubstanciado na Súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça:
Pelo exposto, nego provimento à apelação e, de ofício, altero a classificação da conduta de uso de passaporte falso para os artigos 304 c.c. 297 do Código Penal, e fixo o regime inicial aberto para cumprimento da pena de reclusão, mantida no mais a r.sentença apelada, comunicando-se o Ministério da Justiça.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 28/07/2013 11:04:02 |