Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/08/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006528-63.2010.4.03.6181/SP
2010.61.81.006528-4/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : MOISES GOMES MOREIRA
: MAX SILVA OLIMPIO
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE ARMBRUST VIRGINELLI (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00065286320104036181 9P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO. COISA FURTADA. NECESSIDADE DE EXISTÊNCIA DE VALOR ECONÔMICO. NEGATIVA DE PROVA PERICIAL. MATERIALIDADE DELITIVA NÃO CARACTERIZADA.
1. Apelação da Defesa contra a sentença que condenou a) o réu MAX à pena de 02 anos, 03 meses e 23 dias de reclusão, como incurso no artigo 155, caput, do Código Penal; e b) o réu MOISÉS à pena de 01 ano, 01 mês e 10 dias de reclusão, como incurso no artigo 155, caput, do Código Penal.
2. O conceito de "coisa", como objeto material do crime de furto, equivale ao objeto com valor econômico. Para a caracterização do furto a coisa subtraída deve ostentar valor econômico. Precedentes.
3. O entendimento no sentido de que o valor dos objetos não deve ser medido pelos objetos si mesmos, mas sim pela utilidade ilegal que teriam, fato que reclama maior reprovação social da conduta, não se justifica.
4. Não é possível, ao argumento de necessidade de maior reprovação social da conduta, condenar alguém por conduta atípica. Na aplicação do direito penal, a defesa do princípio da legalidade tem tanta relevância (senão maior) do que a necessidade de reprovação social de condutas ilícitas.
5. Ainda que caiba ao Juízo, por força do livre convencimento motivado, sustentar tal tese, isso não justifica a negativa de produção de prova pericial, dado que a informação sobre o valor intrínseco dos objetos é relevante (ao menos para a jurisprudência majoritária).
6. Embora o furto das peças visasse à posterior implementação de um dispositivo para a prática de furtos qualificados mediante fraude (ou estelionato, segundo entendimento hoje minoritário na jurisprudência), com relação aos correntistas da instituição financeira, não é possível argumentar com a possibilidade de prática de atos futuros para ter como comprovada a materialidade do furto.
7. Apelo provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, para absolver os réus, com fundamento no artigo 386, inciso II do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 30 de julho de 2013.
MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006528-63.2010.4.03.6181/SP
2010.61.81.006528-4/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : MOISES GOMES MOREIRA
: MAX SILVA OLIMPIO
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE ARMBRUST VIRGINELLI (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00065286320104036181 9P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


O Ministério Público Federal, em 08/07/2010, denunciou MAX SILVA OLIMPIO, qualificado nos autos, nascido aos 24/10/1991, como incurso no artigo 155, §4º, IV e artigo 155, §4º, IV, c.c. artigo 14, II, todos do Código Penal, em continuidade delitiva e MOISES GOMES MOREIRA, qualificado nos autos, nascido aos 23/04/1980, como incurso artigo 155, §4º, IV, c.c. artigo 14, II, todos do Código Penal. Consta da denúncia:

(...)
... 1. Segundo consta dos presentas autos, os Denunciados foram identificados como sendo os autores de tentativa de furto qualificado perpetrado em detrimento da Caixa Econômica Federal - CEF, sendo certo que o Primeiro Denunciado confessou também a prática de um furto qualificado consumado.
De fato, no dia 14 de junho de 2010, por volta das 21:00 horas, na área dos terminais de auto-atendimento da agência da CEF localizada na rua Silva Bueno, nº 1.884, os Acusados, conforme sistema de câmaras de vigilância (fls. 32/33), foram filmados retirando um armário de frente de um dos caixas eletrônicos e em seguida realizando procedimentos de manipulação de seus dispositivos, quando foram abordados pela Polícia Militar.
A máquina em questão era justamente a que funcionários da CEF, durante o dia, identificaram como sendo alvo de troca - ou subtração, segundo MAX - de teclado, fato que os levou a colocar um armário à sua frente, para obstar que o acesso dos clientes àquele caixa eletrônico.
2- MOISES e MAX, conforme fls. 39 e 40 respectivamente, reconheceram que adentraram ao local com o fim de furtar peças plásticas daquele equipamento eletrônico, pertencente à CEF.
MAX afirmou, inclusive, que pessoa de alcunha Alemão, cuja identidade completa desconhece, teria lhe encomendado o crime. Confessou, ainda, ter comparecido àquela agência, durante o dia, para furtar o teclado do equipamento, em companhia de Alemão (fls. 31), crime este que restou consumado.
3- Sendo certo, portanto, que na data e local supra citados, o Primeiro Acusado subtraiu, por volta do meio-dia e em companhia de Alemão, um teclado integrante de um caixa de auto-atendimento da CEF, retornando à noite, já em companhia do Segundo Denunciado, para furtar outras peças daquela mesma máquina.

A denúncia foi recebida em 11.10.2010 (fls. 77).

Após instrução, sobreveio sentença, da lavra da MM. Juíza Federal Monica Aparecida Bonavina Camargo e publicada em 16.09.2011 (fls. 195/204), que condenou a) o réu MAX à pena de 02 anos, 03 meses e 23 dias de reclusão, em regime aberto, e 14 (catorze) dias-multa, no valor unitário mínimo, como incurso no artigo 155, caput, do Código Penal, sendo 01 ano, 04 meses e 20 dias de reclusão e 08 dias-multa pelo crime consumado, e 11 meses e 03 dias de reclusão e 06 dias-multa pelo crime tentado; e b) o réu MOISÉS à pena de 01 ano, 01 mês e 10 dias de reclusão, em regime aberto, e 06 dias-multa, no valor unitário mínimo, como incurso no artigo 155, caput, do Código Penal. As penas privativas de liberdade foram substituídas por multa de um salário-mínimo para cada um dos réus e prestação de seviços à comunidade.

Apelação dos réus, representados pela DPU - Defensoria Pública da União (fls. 209, 214 e 217/221) pretendendo édito absolutório ao argumento de ausência de prova de materialidade e de autoria; subsidiariamente, o reconhecimento do furto privilegiado, ao argumento de que a figura é compatível com o furto qualificado, bem como a aplicação da causa de diminuição da tentativa no patamar máximo e a isenção das custas processuais. Alegam que o furto constitui delito contra o patrimônio, exigindo resultado naturalístico, sendo imprescindível que os bens subtraídos sejam suscetíveis de apreciação econômica ou, ao menos, valor afetivo para a vítima. Aduzem que em relação ao furto consumado, ocorrido às 12:31 horas do dia 14.06.2010 as provas são insuficientes para a condenação de Max. Argumentam que embora indeferido o pleito de realização de perícia para a avaliação dos bens subtraídos, não há prova a infirmar que são de pequeno valor, possibilitando o reconhecimento do privilégio do furto. Afirmam fazer jus à diminuição máxima da tentativa porque "os apelantes foram surpreendidos ainda no interior da agência, não tendo, deste modo, percorrido grande parte do iter criminis". Sustentam não possuírem condições econômicas para o pagamento das custas, tanto que são defendidos pela Defensoria Pública da União e o juiz fixou o dia-multa no mínimo.

Contrarrazões ministeriais pugnando pela manutenção da sentença (fls. 223/230).

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. Marcelo Moscogliato, opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 233/237).


É o relatório.

Ao MM. Revisor.




MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


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Data e Hora: 26/06/2013 15:32:12



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006528-63.2010.4.03.6181/SP
2010.61.81.006528-4/SP
RELATOR : Juiz Convocado MÁRCIO MESQUITA
APELANTE : MOISES GOMES MOREIRA
: MAX SILVA OLIMPIO
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE ARMBRUST VIRGINELLI (Int.Pessoal)
: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
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No. ORIG. : 00065286320104036181 9P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):


Verifico da apelação que os réus apresentam teses defensivas relacionadas ao valor econômico do bem subtraído (teclado de caixa eletrônico) da agência da Caixa Econômica Federal.

Alegam os acusados a ausência de prova da materialidade do delito de furto por inexistir estimativa - direta ou indireta - do valor do bem subtraído, considerada a imprescindibilidade de que seja suscetível de apreciação econômica, e, subsidiariamente, requerem o reconhecimento do furto privilegiado, considerado o pequeno valor da coisa furtada.

A prova pericial para avaliação do bem, não foi realizada durante a instrução criminal, mas requerida pela defesa e rejeitada nos seguintes termos (fls. 142/144):


"De forma diversa da afirmada pela defesa dos réus, a res furtiva encontra-se suficientemente descrita na denúncia, visto que há menção expressa ao furto de um teclado de caixa eletrônico, imputado ao acusado MAX e também à tentativa de furto de demais peças do mesmo caixa eletrônico, imputada aos réus MAX e MOISÉS.
(...)
Nesta seara, entendo que a elaboração de laudo de avaliação dos objetos subtraídos, para fins de aplicação do princípio da insignificância mostra-se desnecessária, pois, conforme bem sustentado pelo Ministério Público Federal às fls. 139/140, o caso em tela reveste-se de circunstâncias específicas, uma vez que os objetos do furto eram peças que poderiam ser utilizadas na fabricação de dispositivo para armazenagem ilegal de contas e senhas bancárias (conforme constante no laudo pericial de fls. 74), sendo o seu valor medido não por si mesmas, mas sim pela utilidade ilegal que teriam, o que reclama maior reprovação social da conduta dos acusados."

O conceito de "coisa", como objeto material do crime de furto, equivale ao objeto com valor econômico. No sentido de que, para a caracterização do furto a coisa subtraída deve ostentar valor econômico, situa-se o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. FURTO E ESTELIONATO (ARTIGOS 155 E 171, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). SUBTRAÇÃO DE FOLHAS DE CHEQUE EM BRANCO, CARTÕES BANCÁRIOS E DOCUMENTOS PESSOAIS DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE EXPRESSÃO ECONÔMICA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. FLAGRANTE ILEGALIDADE. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
1. A tese referente à absolvição do paciente quanto ao delito de furto, ante a apontada atipicidade da conduta, não foi objeto de exame pelo Tribunal de origem quando do julgamento do recurso de apelação interposto pela defesa, o que impediria a sua apreciação diretamente por esta Corte Superior de Justiça, por caracterizar atuação em indevida supressão de instância.
2. Contudo, embora não exista manifestação prévia do Tribunal a quo a respeito do tema, diante da ocorrência de flagrante ilegalidade é possível a concessão da ordem de ofício.
3. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, folhas de cheque e cartões bancários não podem ser objeto material do crime de receptação, uma vez que desprovidos de valor econômico, indispensável à caracterização do delito contra o patrimônio, entendimento também aplicável ao crime de furto, destinado à tutela do mesmo bem jurídico. Precedentes.
4. In casu, a conduta atribuída ao paciente consistiu na subtração de uma carteira, na qual continham, além de documentos de identificação diversos, um talão de cheque e cartões de crédito e de movimentação de conta-corrente, objetos que não trazem em si qualquer valoração econômica, não havendo ofensa, portanto, ao bem jurídico tutelado pela norma penal invocada...
(STJ, HC 118873/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/03/2011, DJe 25/04/2011)
PROCESSO PENAL. CRIME MILITAR. PRESSUPOSTOS. CONFIGURAÇÃO. COMPETÊNCIA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. PENAL. CARTÃO DE CRÉDITO. FURTO. TIPICIDADE. ENTENDIMENTO MAJORITÁRIO DA TURMA.
1. Desborda do habeas corpus perquirir, em caso de furto de cartão de crédito, por demandar dilação probatória, quem sofreu prejuízo patrimonial, a saber, se o titular do cartão, o estabelecimento que o recebeu ou a operadora respectiva.
2. Afirmado na sentença que a vítima, policial militar, sofreu prejuízo por causa da ação delituosa do agente, também policial militar, configura-se a hipótese do art. 9º, II, a, do Cód. Penal Militar.
3. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal no sentido de que o cartão de crédito, bem como o talonário de cheques, não têm, em si, valor econômico capaz de o transformar em coisa alheia móvel suscetível de furto ou roubo. Precedentes.
4. Entendimento majoritário da Sexta Turma, com ressalva do entendimento pessoal do Relator, a julgar típica a ação descrita na denúncia.
5. Ordem denegada.
(STJ, HC 115803/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 04/11/2010, DJe 07/02/2011)

Com a devida vênia, o entendimento do MM. Juízo a quo, no sentido de que o valor dos objetos não deve ser medido pelos objetos si mesmos, mas sim pela utilidade ilegal que teriam, fato que reclama maior reprovação social da conduta, não se justifica.

Não é possível, ao argumento de necessidade de maior reprovação social da conduta, condenar alguém por conduta atípica. Na aplicação do direito penal, a defesa do princípio da legalidade tem tanta relevância (senão maior) do que a necessidade de reprovação social de condutas ilícitas.

Se produzida fosse a prova pericial ainda no inquérito, e constatada a inexistência de valor econômico expressivo dos objetos furtados (teclado de computador e outras peças), os agentes poderiam ser acusados da prática do crime de dano qualificado, assegurando-se assim a devida repressão da conduta, mas com respeito ao princípio da legalidade.

Por outro lado, ainda que caiba ao Juízo, por força do livre convencimento motivado, sustentar tal tese, isso não justifica a negativa de produção de prova pericial, dado que a informação sobre o valor intrínseco dos objetos é relevante (ao menos para a jurisprudência majoritária). E, uma vez produzida, nada obstaria fosse firmado, pelo Juízo, o mesmo entendimento esposado na r. sentença apelada.

Acresce-se que o argumento de que a materialidade resta comprovada pelo valor que teriam os objetos em razão da utilidade ilegal que poderiam ter no futuro, não se justifica.

Nos termos do entendimento jurisprudencial já anotado, folhas de cheque, por exemplo, não tem valor intrínseco, não podendo serem objeto material do crime de furto, não obstante possam, evidentemente, serem utilizadas posteriormente para crimes de estelionato. É ademais sabido que folhas de cheque são em geral furtadas visando a prática posterior do crime de estelionato, mas não é possível, a esse argumento, punir o furto.

Também no caso dos autos, embora o furto das peças visasse, ao que se apresenta, a posterior implementação de uma dispositivo para a prática de furtos qualificados mediante fraude (ou estelionato, segundo entendimento hoje minoritário na jurisprudência), com relação aos correntistas da instituição financeira, não é possível argumentar com a possibilidade de prática de atos futuros para ter como comprovada a materialidade do furto.

Destarte, não comprovada da materialidade, não obstante a prova desta tenha sido requerida durante a instrução, até mesmo pela Defesa - quanto caberia à Acusação - não resta outra alternativa senão a absolvição dos réus nos termos do artigo 386, II do CPP.


Pelo exposto, dou provimento à apelação para absolver os réus, com fundamento no artigo 386, inciso II do Código de Processo Penal.

É como voto.



MARCIO MESQUITA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCIO SATALINO MESQUITA:10125
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Data e Hora: 28/07/2013 09:39:36