D.E. Publicado em 05/06/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, tida por interposta, e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Entendeu a d. relatora em acolher em parte o apelo ministerial e o fêz para condenar os réus nas penalidades de (a) pagamento de multa civil; (b) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Por outro lado, não aplicou aos réus Paulo Pereira da Silva e João Francisco Donini a penalidade de suspensão dos direitos políticos, considerando a falta de prova de que ocorreu o enriquecimento ilícito dos mesmos e, no caso do primeiro, que não há prova de eventual favorecimento à entidade sindical.
Sucede que essa penalidade está prevista no art. 12 da Lei de Improbidade, da seguinte forma:
O que se verifica é que a lei sinaliza no parágrafo único do art. 12 um rumo para a dosimetria das penas, mas em momento algum condiciona a aplicação de qualquer dessas penas a que o agente tenha obtido um proveito patrimonial. Noutro dizer: a penalização não está atrelada a que o ímprobo tenha se enriquecido indevidamente com o ato de improbidade.
Permissa vênia, há - na espécie singular dos autos - equívoco no r. voto ao deixar de aplicar a suspensão dos direitos políticos porque os réus Paulo e João não enriqueceram com a improbidade; é que a eles foi atribuída a prática de atos que causam prejuízo ao erário (art. 10) e não atos que importam em enriquecimento ilícito (art. 9°). Ora, a lei previu a suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos para os atos da improbidade do segundo grupo (art. 9°) e de cinco a oito anos para os atos do primeiro grupo (art. 10). Logo, levar em consideração a extensão do dano e eventual benefício patrimonial do agente NÃO É CONDIÇÃO para a pena, mas sim um elemento para a dosimetria das penas.
O que deve ser levado em conta é a gravidade das condutas dos agentes ímprobos, que, a meu sentir, é bastante notável no caso sub judice.
Houve comprometimento de recursos federais em favor de entidade desqualificada para a prestação do serviço objeto da contratação, com flagrante violação de regra constitucional basilar - o dever de licitar - sem que nenhum dos envolvidos tivesse se preocupado com o teor categórico do art. 26 da Lei das Licitações; despudoradamente foi formalizada contratação direta sem qualquer preocupação com o procedimento administrativo que a lei exige para que seja justificada a não realização do certame público.
Nesse cenário, é de nenhuma importância que não haja prova de que Paulo e João enriqueceram com o desvio de dinheiro público; o que importa é que ambos direcionaram os recursos federais como bem entenderam, ou seja, como se os dinheiros públicos deles fossem, afrontando o dever legal de licitar, empenhando vultosa soma federal sem qualquer outro critério a não ser as suas vontades e o intuito de favorecimento sem justa causa.
Destarte, às penas impostas pela srª relatora deve ser acrescentada a suspensão dos direitos políticos de Paulo Pereira da Silva e João Francisco Donini pelo prazo mínimo, ou seja, por cinco anos.
Assim, pelo meu voto DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO e À REO, mas em maior extensão.
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VOTO RETIFICADOR
No caso vertente, deixei de aplicar a pena de suspensão dos direitos políticos aos réus, sob o fundamento de falta de prova de que ocorreu o enriquecimento ilícito dos mesmos, bem como, em relação a Paulo Pereira da Silva, por ausência de prova de eventual favorecimento à entidade sindical.
Uma observação mais acurada da causa e a ponderação dos argumentos expostos de forma percuciente pelo E. Desembargador Federal Johonsom Di Salvo em relação à aplicação de referida pena conduziram-me a retificar o voto.
Sendo assim, aplico aos réus Paulo Pereira da Silva e João Francisco Donini a pena de suspensão dos direitos políticos pelo prazo mínimo de cinco anos, em razão da atuação deliberada contra os preceitos legais que vedam a dispensa de licitação no caso vertente. Para tanto entendo que as circunstâncias em que cometido o ilícito apresentam gravidade suficiente a justificar o merecimento dessa sanção. Acresço que a gestão deficiente dos recursos públicos, repassados à Fundação ré nitidamente sem a expertise necessária, com a eiva da ilicitude marcada pela dispensa indevida de licitação, são condições desfavoráveis aos réus.
Não obstante a ausência de prova de enriquecimento ilícito ou de dano em concreto, em casos como o dos autos o prejuízo é presumido como reconhece a jurisprudência do C. STJ, mencionada no voto já proferido, consequência indissociável da afronta à moralidade pública e aos valores republicanos, que não admitem qualquer espécie de confusão entre o interesse público e o privado ou malversação do patrimônio público, como a apurada nestes autos.
Portanto, a ação civil pública é julgada procedente para condenar os corréus, além das penas de pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos, também à penalidade de suspensão dos direitos políticos pelo prazo mínimo, ou seja, cinco anos.
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, para também suspender os direitos políticos de Paulo Pereira da Silva e João Francisco Donini.
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RELATÓRIO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal em ação civil pública instaurada para apurar o cometimento de ato de improbidade administrativa, previsto na Lei n° 8.429/92, em face de Paulo Pereira da Silva, João Francisco Donini, Força Sindical e Fundação Donini, objetivando a condenação dos réus à devolução integral ao Tesouro Nacional dos valores concernentes ao contrato firmado entre a Força Sindical e a Fundação Donini, na importância de R$ 215.460,00, acrescidos de correção monetária desde a liberação dos recursos e dos juros previstos legalmente.
Requereu, ainda, que sejam os réus condenados também com a suspensão de seus direitos políticos pelo período de 5 a 8 anos; proibição de contratar com o Poder Público ou receber incentivos fiscais e creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de 3 anos; condenação ao pagamento de multa no valor correspondente ao dobro do prejuízo experimentado pela União.
Em sua inicial, o autor afirma que no âmbito do Ministério do Trabalho e do Emprego foi instituído o Programa Nacional de Qualificação do Trabalhador - PLANFOR, cuja finalidade era fomentar acordos com entidades do terceiro setor para qualificação profissional de trabalhadores desempregados de baixa renda. A coordenação da parceria ficou a cargo da Secretaria de Políticas Públicas do Emprego, vinculada ao TEM.Nesse desiderato, o Ministério do Trabalho e do Emprego firmou com a Força Sindical o convênio denominado TEM/SPPE n° 004/2001, no ano de 2001. Seu objetivo era a realização de cursos para a qualificação de trabalhadores desempregados ou sob o risco de desocupação, pequenos e microprodutores e autônomos em geral.
Aduz, ainda, o autor, que a Força Sindical houve por bem subcontratar nas diversas unidades da federação outras entidades, às expensas do Tesouro Nacional. Na cidade de Fartura houve a contratação da Fundação João Donini que, a propósito do convênio, recebeu o total de R$ 215.460,00 (duzentos e quinze mil quatrocentos e sessenta reais), sem prévia licitação. Alega que a referida fundação não possui vocação específica para o ensino profissionalizante.
Entende o órgão ministerial que o réu Paulo Pereira da Silva, representando a Força Sindical, ao contratar a Fundação João Donini com dispensa de regular procedimento licitatório, incorreu em ilegalidade que ocasionou prejuízos aos cofres da União.
Assevera o autor que os fatos narrados configuram a prática de ato de improbidade administrativa, capitulado no art. 10, inciso I, da Lei nº 8.429/92, o que impõe a condenação dos réus como incursos nas seguintes sanções: a) devolução, na integralidade, dos recursos concernentes ao contrato firmado entre a Força Sindical e a Fundação Donini, no valor de R$ 215.460,00 (duzentos e quinze mil quatrocentos e sessenta reais), acrescidos da devida correção monetária desde a liberação do montante e de juros de mora; b) suspensão dos direitos políticos de 5 a 8 anos; proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de 3 anos; d) condenação ao pagamento de multa no valor equivalente ao dobro do prejuízo causado à União.
A inicial foi aditada, às fls. 406/408, com a inclusão da FORÇA SINDICAL e da FUNDAÇÃO JOÃO DONINI no polo passivo da relação processual.
Esses réus apresentaram contestação, às fls. 468/488. Aduziram em sua defesa, preliminarmente, ilegitimidade passiva para a causa e a inépcia da inicial e, no mérito, a improcedência do pedido, ao argumento de que a Fundação contratada executou o contrato nos seus exatos termos, não restando caracterizado o cometimento de qualquer ato de improbidade administrativa.
Os réus João Francisco Donini e Paulo Pereira da Silva foram ouvidos em audiências realizadas em 04/10/2007 e 25/06/2008, consoante depoimentos pessoais transcritos às fls. 814/817 e 900/901, respectivamente. Ainda, foi ouvida a testemunha Carlos Alberto de Souza Oliveira, às fls. 818/819, arrolado pelo réu João Francisco Donini.
Após regular processamento do feito e instrução probatória, o r. Juízo a quo, em 29 de outubro de 2009, julgou improcedente o pedido, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC/1973. Sem condenação de custas e honorários advocatícios.
Em sua sentença, às fls. 1300/1307, o digno juízo a quo fundamenta o decisum em que, apesar de restar comprovada a realização do contrato entre a Força Sindical e a Fundação João Donini, para a realização de cursos de qualificação profissional com verba da União e com dispensa ilegal de licitação, não teria sido demonstrado o prejuízo ao erário exigido pelo artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa.
Foram opostos embargos de declaração pelo Ministério Público Federal, rejeitados (fls. 13/12/1313).
Apelou o Ministério Público Federal, em 13 de janeiro de 2010, para pleitear a reforma da sentença e a condenação dos réus. Argumenta o órgão ministerial que a irregular dispensa de licitação, sem qualquer outro resultado material, já caracteriza dano ao erário público suficiente à aplicação das sanções próprias previstas na Lei nº 8.429/1992.
Em arremate, aduz que houve malbaratamento de recursos públicos, na medida em que os valores foram repassados a entidade inidônea para a prestação dos serviços mencionados no convênio firmado. Pede a reforma da sentença com a condenação dos réus.
De sua parte, os réus, em contrarrazões, alegam que os serviços contratados foram desempenhados com satisfação, sem qualquer prejuízo ao erário. Aduzem que não foi demonstrado nos autos fato configurador de ato de improbidade administrativa, sendo de rigor a manutenção da sentença.
Apelação recebida no duplo efeito, consoante decisão à fl. 1323.
O Ministério Público Federal de segundo grau manifestou-se nestes autos pela desnecessidade da dupla intervenção do "parquet", entendendo que quando o órgão ministerial é parte na ação de improbidade administrativa não se exige sua atuação como custos legis.
Em primeiro grau foi proposta a ação cautelar nº 0001937-08.2005.4.03.6125, em apenso. Nesta ação, indeferida a liminar, o órgão ministerial ingressou com agravo de instrumento (feito n° 2005.03.00.040846-0), através do qual foi determinado a indisponibilidade e o sequestro de bens dos requeridos, representantes legais da Força Sindical e Fundação Donini. Em relação a estas entidades, incluídas no polo passivo da ação, a posteriori, por força de aditamento à inicial desta cautelar, também foi decretada a indisponibilidade de seus bens. Entretanto, julgada improcedente a ação cautelar, as liminares foram cassadas, com a expedição dos ofícios pertinentes à liberação dos bens constritos.
Reconhecida a prevenção em relação à Apelação Cível n° 0037491-50.2003.4.03.6100, o apelo foi redistribuído à minha relatoria, em 05 de janeiro de 2015.
Após, vieram os autos à conclusão para julgamento.
É o relatório.
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VOTO
A EXCELENTÍSSIMA SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA (RELATORA):
Primeiramente, é de se observar que a sentença de improcedência proferida em ação civil pública por ato de improbidade administrativa também está submetida à remessa oficial, por aplicação analógica do art. 19 da Lei n. 4.717/1965 (Lei da Ação Popular), in verbis:
Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo. |
Neste sentido, o E. Superior Tribunal de Justiça assim se manifestou:
Não é outro o entendimento adotado por esta C. Sexta Turma, in verbis:
Passo, assim, à análise do apelo.
A presente ação civil pública foi instaurada para apurar o cometimento de ato de improbidade administrativa em face dos réus Paulo Pereira da Silva, João Francisco Donini, Força Sindical e Fundação Donini.
A peça inicial imputa-lhes a conduta capitulada no artigo 10, incisos I e VIII, da Lei n° 8.429/1992.
Conforme aduz o órgão ministerial, o Ministério do Trabalho e do Emprego, amparado no Programa Nacional de Qualificação do Trabalhador - PLANFOR, firmou com a Força Sindical Convênio denominado TEM/SPPE n° 004/2001, no ano de 2001. Seu objeto foi a realização de cursos para a qualificação de trabalhadores, cujo público alvo eram trabalhadores desempregados ou em risco de desocupação, pequenos e micro produtores e autônomos em geral.
A Força Sindical, de sua parte, subcontratou outras entidades às expensas do Tesouro Nacional, nas diversas unidades da Federação.
Para a consecução do Convênio, na cidade de Piraju foi contratada, sem regular procedimento licitatório, a ré Fundação João Donini, que deveria ofertar cursos a 1.050 pessoas de cidades circunvizinhas. Essas eram as modalidades dos cursos ofertados: recursos humanos, informática, auxiliar de contabilidade, cabista e corte e costura. A Fundação ré recebeu para tanto a quantia de R$ 215.460,00 (duzentos e quinze mil quatrocentos e sessenta reais).
Afirma o autor que a Controladoria-Geral da República em Relatório de Auditoria, que teve a finalidade de avaliar os termos gerais do Convênio supracitado, apurou a existência de inúmeras irregularidades na subcontratação celebrada, consubstanciadas na irregular dispensa de licitação; pagamento antecipado pelos serviços e irregularidades na realização dos cursos promovidos pela Fundação ré.
Assevera o autor que os fatos narrados denotam que a Força Sindical promoveu a subcontratação do objeto conveniado com a indevida dispensa de licitação, ocasionando dano ao patrimônio público, destacando que há, ao menos, presunção de lesão ao erário decorrente dos atos ímprobos perpetrados pelos réus.
Após regular instrução probatória, não obstante a narrativa do autor, a ação foi julgada improcedente, com julgamento do mérito.
O digno r. juízo a quo reconheceu que a Fundação Donini não se tratava de instituição incumbida estatuariamente do ensino profissional, concluindo que houve a indevida dispensa do regular processo licitatório exigido por lei e também pelo convênio firmado pela Força Sindical e pelo Ministério do Trabalho. Todavia, entendeu que não restou provada lesão ao erário público, muito em consideração que o órgão ministerial não logrou êxito em demonstrar o descumprimento integral do contratado.
Esse o entendimento exarado na sentença recorrida (fl. 1307):
Em sua irresignação, o Parquet Federal pugnando a integral reforma da sentença, alega, em síntese: que a r. sentença recorrida reconhece a dispensa indevida de licitação, mas deixou de condenar os réus por entender não configurada à lesão ao erário; que o entendimento não deve prosperar, pois a lesividade ao erário é intrínseca à conduta que de forma ilegal dispensa a licitação; que o procedimento licitatório salvaguarda de maneira eficiente o erário público e a indevida remoção da garantia desagua fatalmente no maltrato ao patrimônio público; que há nos autos prova do malbaratamento do patrimônio público, tendo demonstrado que houve o direcionamento de recursos públicos federais à fundação inidônea para prestação de serviços de ensino profissionalizante; foram provadas irregularidades na contratação, tais como duplicidade de cadastros de alunos e má qualidade dos cursos.
Antes de apreciar o pleito recursal, por oportuno, esclareço que, como pontuado pelo Ministério Público Federal em sua inicial, o objeto desta ação civil pública é diverso daquele constante da ACP n° 0037491-50.2003.4.03.6100/SP de minha relatoria e julgado em 27/03/2014. Neste último feito, não obstante versar também sobre a dispensa indevida de licitação no âmbito do Convênio MTE/SPPE/CODEFAT n° 003/00 e MTE/SPPE n° 004/01, o pedido do órgão ministerial restringia-se a apurar irregularidades nos contratos firmados entre a Força Sindical e Instituto Paulista de Ensino e Cultura - IPEC e Instituto de Pesquisas, Estudos, Cultura e Educação - IPECE, a denotar a inexistência de identidade entre os processos.
Neste ponto, insta considerar que o dever geral de probidade administrativa impõe uma conduta conforme os princípios da ética na gestão da coisa pública, ou seja, orientada pela boa-fé, lealdade, verdade, respeito, sem causar danos, dilapidar o patrimônio público ou se valer da função para fins abjetos ou egoístas.
Por outro lado, a tutela da probidade administrativa foi contemplada em preceitos que ocupam planos distintos no ordenamento jurídico pátrio, a começar pela Constituição da República de 1988, que dispõe em seu art. 37, § 4º:
É de se notar, porém, que o texto se limitou a positivar, no plano constitucional, o repúdio aos atos de improbidade, bem como estabelecer as sanções daí decorrentes, relegando ao legislador infraconstitucional, à doutrina e à jurisprudência a árdua tarefa de desenhar um conceito minimamente uniforme.
Historicamente, o ato de improbidade administrativa guardava estreita relação com a corrupção, assim entendida como a obtenção de vantagem indevida, para si ou para outrem, valendo-se do exercício de função pública.
O conceito embrionário foi aos poucos sendo ampliado, de modo a abarcar situações outras, que não necessariamente impliquem enriquecimento ilícito.
Imbuída dessa evolução conceitual, a Lei n.º 8.429/1992, diploma que regulamentou o art. 37, § 4º da Constituição, classificou os atos de improbidade administrativa em três categoriais: a) condutas que importem enriquecimento ilícito do agente público, acarretando ou não dano ao erário (art. 9º); b) condutas lesivas ao erário (art. 10); c) condutas atentatórias aos princípios gerais da Administração Pública (art. 11).
Na visão de José Antonio Lisboa Neiva:
A improbidade administrativa configurar-se-ia como ação ou omissão dolosa de agente público ou de quem de qualquer forma concorresse para a realização da conduta, com a nota imprescindível da deslealdade, desonestidade ou ausência de caráter, que viesse a acarretar enriquecimento ilícito, lesão ao patrimônio das pessoas jurídicas mencionadas no art. 1º da LIA, ou, ainda, que violasse os princípios da Administração Pública, nos termos previstos nos arts. 9º, 10 e 11 da citada Lei. |
(Improbidade Administrativa: estudo sobre a demanda na ação de conhecimento e cautelar, 2ª ed., Niterói: Impetus, 2006, p. 13) |
Por sua vez, em relação às condutas que são objeto da imputação formulada em desfavor dos réus, a Lei n° 8.429/1992 assim dispõe:
Observa-se que, para a imputação da improbidade administrativa prevista no art. 10 da Lei n.º 8.429/92, é necessária a existência de dolo do agente, caracterizada pela sua desonestidade ou má-fé ou ao menos, culpa grave, conforme se vê nos seguintes precedentes do E. STJ, in verbis:
No que tange à legitimidade passiva dos réus, destaco que a leitura dos arts. 1º, 2º e 3º, da Lei n° 8.429/1992 permitem que a norma de improbidade alcance não somente às entidades que recebam subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, mas também o particular que se beneficie do ato de improbidade e, sendo o caso, sujeitar-se-ão às sanções compatíveis com as peculiaridades do beneficiário ou partícipe.
Ainda, o particular ou terceiro pode ser pessoa física ou jurídica, somente fazendo distinção a Lei de Improbidade Administrativa quanto à pessoa jurídica, por se afigurar incompatível com a sua natureza as sanções de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos.
Esse o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça:
A legitimidade do corréu Paulo, nesse contexto, exsurge de sua indiscutível responsabilidade como presidente da Força Sindical, à época da ocorrência dos fatos, por ter firmado o Convênio questionado, sendo responsável por todas as operações subsequentes praticadas por aquela associação, com inegável participação e ciência na perpetração dos atos ora questionados, pela própria qualidade por ele ostentada.
A legitimidade da Fundação Donini e seu representante legal, Francisco Donini, decorre inexoravelmente de terem sido beneficiados pelo contrato firmado com a Força Sindical sem a realização de procedimento licitatório, para a realização dos propósitos a que se refere o convênio TEM/SPPE n° 004/2001.
Passo, assim, à análise do caso em comento, tratando como cerne da questão a comprovação dos requisitos: subjetivo, de demonstração do dolo ou culpa dos apelados, e objetivo, no tocante à existência do dano, de forma a configurar ou não a ocorrência dos atos de improbidade administrativa a ensejar as cominações pertinentes.
No caso em espécie, a ação de improbidade em discussão encontra-se revestida dos devidos pressupostos de admissibilidade, restando, caracterizada a sua tipificação, bem como a participação dos apelados.
Para a execução do Convênio TEM/SPPE n° 004/2001, que se destinava a promover cursos para a qualificação de trabalhadores, a Força Sindical, através de seu representante legal, contratou a instituição Fundação Donini, sem a realização do devido certame licitatório, fato incontroverso que emerge do conjunto probatório destes autos.
Não identifico que seja hipótese de dispensa de licitação.
Para análise desse tópico, transcrevo o teor do art. 24, inciso XIII, e 26, parágrafo único, e incisos da Lei n° 8.666/1993, na redação vigente à época:
Verifica-se que a exigência de formalização do processo de dispensa de licitação decorre de expressa determinação legal, contida no parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/93, sendo certo que a sua ausência, confessada pelos corréus ao defenderem a tese de inexigibilidade de tal procedimento, já configura, de plano, a irregularidade formal dos atos praticados, nos termos do inc. VIII do art. 10 da Lei 8.429/92.
Imprescindível que fossem cumpridos devidamente os requisitos previstos no art. 26 da Lei de Licitações, para que se pudesse avaliar a adequação e a própria viabilidade da dispensa de licitação, através da formalização de tal procedimento, sendo aquele o momento oportuno para quaisquer comprovações nesse sentido.
De fato, as alegações formuladas posteriormente, em Juízo, na tentativa de comprovar a inquestionável reputação ético-profissional ou a capacidade técnica da contratada, não se prestam para ratificar as situações de irregularidades já efetivadas, mormente quando sequer foi caracterizada qualquer situação emergencial que justificaria a dispensa, restando plenamente configurada a impropriedade da contratação com dispensa de licitação, na forma em que foi realizada.
A ausência de licitação comprometeu o objeto do convênio de implantação de cursos técnicos e de requalificação profissional, diante da efetiva destinação de recursos públicos para alcançar tal finalidade, vez que o ato de escolha deliberada da Fundação ré, ainda que detentora de eventuais qualidades e capacitação impediu a participação de outras instituições.
Não se trata de excesso de rigorismo ou formalidade, mas de estrita observância do princípio da legalidade, sendo necessária a apreciação dos tópicos seguintes para a apuração da efetiva cominação cabível à espécie.
A esse respeito, cito o seguinte precedente jurisprudencial do C. STJ:
Sem razão os apelados quando aduzem inexistir prova cabal dos fatos, do dano e do dolo, ao pressuposto de que os autos demonstram que houve o adimplemento do contrato originário do convênio e que seus objetivos foram alcançados. Não prospera, ainda, o entendimento dos réus no tocante à descaracterização da improbidade administrativa na espécie, à ausência de provas de que houve prejuízo à administração pública.
As provas dos autos denotam a presença dos pressupostos e dos elementos indispensáveis à caracterização do ato de improbidade administrativa perpetrado pelos réus.
É fato incontroverso nos autos que a Força Sindical firmou com o Ministério do Trabalho e Emprego convênio para ministrar cursos de qualificação e profissionalização de trabalhadores desempregados, atendendo à necessidade decorrente do Programa Nacional de Qualificação do Trabalhador - PLANFOR.
Também é incontroverso que a Força Sindical terceirizou a realização dos cursos à corré Fundação Donini, sem prévio procedimento licitatório, descumprindo, ademais, exigência prevista no art. 4° da Resolução n° 258/2000 do CODEFAT, com a seguinte redação:
A prova documental e oral carreada aos autos conferem o suporte necessário à imputação descrita na inicial, posto que existe firmes elementos que demonstram não somente a irregular dispensa de licitação, mas também a inadequação técnica e ausência da expertise para atender ao objeto contratado.
A Fundação João Donini não possuía a finalidade educacional específica aos propósitos do convênio realizado.
O Convênio n° 004/2001 TEM/SPPE é expresso quanto ao seu objetivo de estabelecer cooperação técnica e financeira mútua para a execução das atividades de qualificação e re-qualificação profissional, no âmbito do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador, de trabalhadores desocupados, sob risco de desemprego, micro e pequenos empreendedores e autônomos.
A Fundação ré, destarte, tinha entre os seus objetivos sociais a "promoção de jogos de futebol, vôlei, basquete e outras modalidades esportivas; promoção educacional em qualquer área de ensino, lazer, assistencial, veiculação de informações por meio de Rádio Comunitária, televisiva e de periódico escrito, atendimento à saúde, cooperativismo, promoção cultural e religiosa junto a seus membros e associados". É o que se verifica de seu estatuto social (fl. 49).
Dizer que a Fundação ré estava habilitada a ministrar cursos de formação e requalificação profissional de trabalhadores porque tinha entre seus objetivos sociais a "promoção de atividade educacional em qualquer área de ensino" é exercício dialético sem evidências concretas nos autos. Não há indicação de provas atestando sua idoneidade técnica ou qualificação profissional para os cursos mencionados, que possam corroborar a licitude da dispensa de licitação.
Nesse sentido, inclusive, há a previsão expressa constante do anexo I, da Resolução n° 258/2000 do CODEFAT, ao fixar parâmetros para repasses de verbas e contratação de empresas com dispensa de licitação (fls. 850/860).
Referida resolução, no seu art. 5°, inciso V, menciona que poderão ser contratadas para executar ações de educação profissional "fundações incumbidas regimental e estatutariamente do ensino profissional, instituições de ensino superior (3º grau) não enquadradas no inciso I deste artigo e outras instituições comprovadamente especializadas no ensino profissional". E, no anexo I citado, elenca os requisitos indispensáveis à comprovação da qualificação técnica da instituição, conforme segue:
O parecer dirigido à Força Sindical produzido por advogada pertencente aos seus quadros, a Dra. Vera Lucia Oliveira Alcoba, OAB/SP n° 26.333, opinando pela possibilidade de contratação direta, dispensando o procedimento licitatório, a rigor não tem o condão de afastar o ato ímprobo, pois não se desincumbiu da análise acurada do cumprimento pela Fundação ré dos requisitos exigidos pela Resolução n° 258/2000 do CODEFAT.
O parecer limita-se à apreciação superficial da capacidade técnica da Fundação João Donini no cotejo com a hipótese prevista no inciso XIII do art. 24 da Lei n° 8.666/93, não em relação as exigência da referida resolução (fls. 54/56). A exigência de justificativa pormenorizada atende ao primado da moralidade administrativa, sendo indispensável como instrumento de tutela do patrimônio público.
O Relatório de Auditoria n° 98818-TEM/PLANFOR x Força Sindical, elaborado pela Controladoria-Geral da União que instruiu a Representação n° 21/2002, do Ministério Público Federal, e que pode ser lido no apenso 1, vol. 1 (fls. 04/08), é conclusivo no tocante à falta de capacidade técnica da Fundação ré e sua contratação indevida sem que fosse observada a Lei de Licitações. A propósito, daquele relatório se lê:
O relatório supracitado é categórico ao afirmar que houve irregularidade também na prestação de contas (apenso 1, vol. 1, fls. 12). Ainda, nos cadastros de matriculados aos cursos, foram verificadas inconsistências com a repetição do número de vários CPF's na prestação de contas da entidade (apenso 1, vol. 3, fls. 178, 184, 210 e 212).
Plenamente válido o relatório elaborado pela Controladoria-geral da União, órgão do Governo Federal responsável pela defesa do patrimônio público, transparência e combate à corrupção.
Os atos administrativos, dentre os quais se incluem o supracitado relatório, gozam de presunção juris tantum de veracidade, legitimidade e legalidade.
Conforme leciona Celso Antônio Bandeira de Mello, a presunção de legitimidade: (...) é a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conformes ao Direito, até prova em contrário. (Curso de Direito Administrativo. 10ª ed. Malheiros: 1998. p. 257).
Destarte, para que seja declarada a ilegitimidade de um ato administrativo, cumpre ao administrado provar os fatos constitutivos de seu direito, i.e., a inexistência dos fatos narrados como verdadeiros no relatório em questão.
Não há nos autos qualquer evidência de vício ou irregularidade, ou afronta ao princípio do devido processo legal. De sorte que a investigação procedida à época pela Controladoria-Geral da União (CGU) é válida e substanciosa e bem retrata a realidade dos fatos narrados na exordial ofertada pelo órgão ministerial.
Até aqui a prova documental se apresenta desfavorável aos réus, sobejando elementos que conduzem à caracterização dos atos de improbidade cometidos pelos réus.
No tocante à prova oral, examino as declarações prestadas em juízo, conforme segue.
Paulo Pereira da Silva, representante da Força Sindical, em depoimento pessoal, afirmou à fl. 900 dos autos:
Em seu depoimento pessoal, às fls. 814/817, o representante legal da Fundação ré, João Francisco Donini, dentre outras afirmações, aduziu:
A testemunha Carlos Alberto de Souza Oliveira, qualificado como diretor de autoescola, ouvido em juízo, à fl. 818, em repostas às perguntas que foram formuladas, assim se pronunciou:
Anoto que referido testemunho foi prestado nos autos na qualidade de informante do juízo, esclarecido que o depoente trata-se de amigo íntimo do réu João Francisco Donini. Entretanto, não verifico óbice em cotejar esse testemunho com as demais provas dos autos, posto que, pela leitura de suas declarações, não antevejo que aquela testemunha presumivelmente tenha interesse direto no resultado desta ação favoravelmente à Fundação ré e seu representante legal. Ainda, cabe salientar que, pelo que consta dos autos, os corréus não se propuseram a contraditar a sobredita testemunha.
A leitura atenta da prova oral desabona a conduta dos réus.
O dirigente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, confessa que de fato houve a contratação da Fundação ré sem a realização de licitação, apesar de se dizer amparado na assessoria jurídica dos quadros daquela entidade, cujo parecer elaborado, como já salientei era inconsistente para conferir o suporte necessário à dispensa de licitação.
Não há prova nos autos que corroborem a afirmação do dirigente sindical no tocante à autorização do Ministério do Trabalho para a (sub) contratação direta de empresa ou entidade para a realização dos cursos previstos no Convênio TEM/SPPE n° 004/2001.
Ao contrário de suas afirmações, há elementos nos autos que indicam a deficiência estrutural e de capacidade técnica da Fundação ré, que não possuía expertise para ministrar os cursos, como foi bem demonstrado na investigação proporcionada pela Controladoria-Geral da União, supracitada, que aferiu a inexistência de comprovação da reputação ético-profissional da entidade contratada, da justificação de sua escolha e do preço contratado.
O depoimento do réu João Francisco Donini realça as irregularidades cometidas. De sua fala se destaca que a Fundação ré por ocasião da subcontratação não possuía experiência na área de educação e não era aparelhada nem vocacionada para realização dos cursos de formação profissional nas modalidades previstas no Convênio TEM/SPPE n° 004/2001.
A contratada possuía à época dos fatos o pequeno capital social de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); não possuía quadro próprio de professores; não estava adequadamente aparelhada para atender a demanda dos cursos; contratou equipamentos e professores e adaptou suas instalação à medida que recebia os repasses da Força Sindical.
O depoente João Francisco Donini negou a presença de irregularidades no número de inscritos ou a possibilidade de haver trabalhadores participando de mais de um curso em turnos distintos. Entretanto, tanto quanto o dirigente da Força Sindical, não apresentou elementos que possam fragilizar as conclusões dos relatórios elaborados pela Controladoria Geral da União no que respeita à divergência ou duplicidade de CPF's.
Entendo que as declarações da testemunha Carlos Alberto de Souza Oliveira em alguma medida são relevantes ao deslinde dos fatos e corroboram a ausência de capacidade técnica da Fundação ré. Aduziu que atuava como único coordenador de todos os cursos ministrados em Tejupá, Cerqueira César e Ourinhos. Que habitualmente, antes e depois da execução do contrato sua atividade profissional era auxiliar de despachante, em empresa também de propriedade do réu João Francisco Donini.
De sorte que sem razão os réus quando aduzem inexistir prova cabal dos fatos, do dano e do dolo. O conjunto probatório é coerente, harmônico e robusto no tocante ao cometimento do ato de improbidade administrativa veiculada na inicial, consubstanciado na prática atentatória à Lei de Licitações devido à contratação direta sem o prévio procedimento administrativo de dispensa, violando dever de atender ao interesse público na melhor contratação, com a participação no certame licitatório de maior número de participantes.
Da mesma forma, acerca do tema, colho os ensinamentos de Marçal Justen Filho, in verbis:
Da análise do quadro probatório formado nos autos, além da ilegalidade da ausência de licitação, pela falta do procedimento administrativo prévio, prevista no art. 26 da Lei de Licitação, que se sobrepõe a discussão quanto à reputação da contratada, entendo restar comprovado o elemento subjetivo dos atos de improbidade em discussão.
A existência de má-fé por parte do agente público ou equiparado é fator indispensável para a configuração do ato de improbidade administrativa.
Insta considerar que o dever geral de probidade administrativa impõe uma conduta conforme os princípios da ética na gestão da coisa pública, ou seja, orientada pela boa-fé, lealdade, verdade, respeito, sem causar danos, dilapidar o patrimônio público ou se valer da função para fins abjetos ou egoístas.
Nesse mesmo sentido, colho os ensinamentos de Luiz Manoel Gomes Junior e Rogerio Favreto:
No caso em espécie, os apelados agiram, no mínimo, com culpa grave, porquanto não atuaram com a diligência esperada na contratação do convênio em questão.
A Força Sindical, por seu dirigente, menosprezou os termos do Convênio TEM/SPPE n° 004/2001 e da Resolução n° 258/2000, arts. 4º e 5º, inciso V, e anexo I, ao dispensar irregularmente a licitação contratando entidade sem adequação técnica e expertise.
As provas também convergem para o réu João Francisco Donini, que tendo plena consciência da inaptidão da Fundação ré para atender aos termos daquele convênio, aderiu à conduta do réu Paulo Pereira da Silva, nos termos do art. 3º da Lei n° 8.429/1992. Firmou ilicitamente a contratação direta e, portanto, foi diretamente beneficiado com o repasse de dinheiro público, causando prejuízo à administração pública que deixou de contratar pelo melhor preço e em condições técnicas mais adequadas.
Os corréus tinham pleno conhecimento da incapacidade técnica e da precariedade das instalações para a realização dos cursos profissionalizantes pela Fundação contratada, como foi sobejamente constatado pela minuciosa investigação realizada pela Controladoria Geral da União.
Não há dúvidas que os trabalhadores não tiveram acesso aos cursos com a qualidade exigida pela administração pública. Há ainda o fato constatado na investigação supracitada que apontou a existência de séria suspeita calcada em dados objetivos de repetição de CPF´s, que os cursos não abrangeram o universo de trabalhadores para o qual as verbas se destinavam.
Todavia, no caso destes autos, o autor não trouxe elementos de convicção da inexecução do contrato. Não obstante as irregularidades apontadas, que em alguma medida maculam a qualidade dos cursos profissionalizantes, não vislumbro que a ré Fundação Donini efetivamente não os tenha ministrado, ou que o contrato firmado com a Força Sindical tenha sido cumprido apenas parcialmente.
Saliento que, na espécie, o prejuízo causado ao erário não é necessariamente o material, envolvendo, igualmente, o patrimônio moral da Administração Pública. Daí que, o cumprimento do contrato não afasta a ilicitude da conduta dos réus, devido à natureza dos preceitos constitucionais e infraconstitucionais aplicáveis à espécie dos autos, que visam, sobretudo, à tutela do princípio republicano e dos valores dele decorrentes consubstanciados na estrita observância da moralidade e probidade administrativa.
Cabe esclarecer que é entendimento assente no E. Superior Tribunal de Justiça que a lesividade causadora do prejuízo ao erário, nos casos de irregularidade no procedimento de licitação, é in re ipsa, haja vista que, em virtude da conduta dos administradores, o Poder Público deixa de contratar a melhor proposta.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte precedentes:
De sorte que, quando a improbidade está consubstanciada na indevida dispensa de licitação, o entendimento consagrado no C. Superior Tribunal de Justiça atualmente se satisfaz com o dano in re ipsa, como suficiente à caracterização do ato ímprobo, acrescido da prova do elemento subjetivo.
O malbaratamento ou a malversação que ocasionou prejuízo ao erário público restou evidente na hipótese dos autos, vertidos na contratação da Fundação ré com a dispensa indevida de licitação.
Portanto, foi demonstrado nos autos o cometimento pelos réus do ato de improbidade previsto no art. 10, caput, e inciso VIII, da Lei nº 8.429/92.
A condenação é de rigor com a aplicação das punições previstas no art. 12, II, da Lei n.º 8.429/92.
A questão seguinte é saber quais as penas aplicáveis à situação dos réus, atendendo aos critérios previstos no parágrafo único desse dispositivo legal, assim redigido: "Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente".
A multa prevista na lei de improbidade administrativa tem natureza civil de caráter sancionatório e educativo, visando a desestimular a prática recorrente do ato ilícito, quer pelo próprio infrator, quer pelos demais agentes públicos.
A respeito do tema, ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, in verbis:
Passo a dosimetria e fixação da pena dos réus. Os fatos supramencionados determinam que a dosimetria da sanção tenha em consideração que os réus para alcançar o seu desiderato se utilizaram da Fundação ré que sabidamente não tinha qualquer idoneidade para atender adequadamente ao objeto do certame público e seu dirigente não possuía qualquer expertise na gestão de cursos profissionalizantes.
Os réus não atuaram com a diligência que se espera daqueles que contratam com a administração pública e dela recebem recursos, subsídios ou qualquer espécie de subvenção.
Subdimensionaram os recursos transferidos com a oferta de cursos de qualidade duvidosa e com a dispensa de licitação. Aturaram os réus com menoscabo ao princípio republicano e aos valores expressamente tutelados na Lei de Licitações e na Lei de Improbidade Administrativa.
Destarte, diante da gravidade das condutas dos réus que fizerem mau uso de recursos do erário público provocando, outrossim, dano frente ao patrimônio moral do Estado e da sociedade, quebrando-se a confiança e a lealdade que se espera dos agentes públicos.
Para o arbitramento da multa civil utilizo como base o valor da subcontratação irregularmente pactuada entre os réus, no caso, R$ 215.460,00 (duzentos e quinze mil, quatrocentos e sessenta reais), critério que observa a razoabilidade e proporcionalidade a atende à finalidade sancionatória em tela.
De sorte que, no tocante à Força Sindical e notadamente seu representante legal, o senhor Paulo Pereira da Silva, sua função não lhe autorizava contratar e gerir inadequadamente recursos públicos. Como dirigente sindical diretamente responsável pela gestão do Convênio TEM/SPPE n° 004/2001 que fora firmado no âmbito do Programa denominado PLANFOR, era seu o ônus indelegável de avaliar corretamente todas as condições e exigências legais para a realização dos cursos profissionalizantes. Ao subcontratar entidade inidônea e sem aparato material e profissionais habilitados para o ensino profissionalizante, com dispensa indevida de licitação, assumiu diretamente o risco de causar prejuízos aos interesses da administração pública, contribuindo decisivamente para a violação da norma de improbidade e potencialmente causando dano ao erário público, impedido que foi de contratar o objeto do convênio pelo melhor preço e em melhores condições.
A conduta grave em face do descumprimento do dever de probidade no trato do patrimônio público, na qual incorram os réus impõem sejam reprimidos adequadamente. Para tanto entendo razoável e proporcional condená-los, cada um, a multa no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).
De sua parte, a Fundação ré e seu representante legal, o senhor João Francisco Donini, se portaram ao menos com culpa. No contexto dos fatos, é grave a conduta dos réus que não diligenciaram adequadamente sobre a necessidade de prévia licitação para a contratação empreendida, impossibilitando à administração pública de contratar por melhor preço, ofertando a prestação dos serviços à empresa comprovadamente com melhor capacidade técnica. O réu João Francisco Donini tinha conhecimento da ausência de expertise apropriada para o certame. Sabia da ausência de estrutura adequada e profissionais qualificados nos seus quadros. Ainda assim se propôs a ministrar cursos profissionalizantes, atividade não abrangida pelo objetivo social da Fundação ré.
Todavia, como pontuado, a despeito de irregularidades e da inescusável contratação com dispensa de licitação, não se discute o incumprimento do contrato, mas a qualidade e eficácia do serviço de formação profissional ofertado, o que se demonstrou ficou aquém do desejável.
De modo que, atenta a tais circunstâncias, condeno a Fundação ré e João Francisco Donini ao pagamento da multa civil que fixo no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para cada um dos réus, montante que atende a finalidade de norma de improbidade.
Revela-se adequada a estipulação da multa no montante arbitrado, que considero bastante e suficiente para repercutir na esfera patrimonial dos envolvidos, a ponto de desestimulá-los a reincidir na agressão aos princípios gerais da legalidade, impessoalidade e moralidade, bem como a incidência de juros e correção monetária nos termos do Provimento COGE n° 64, de 28/04/2005 e da Resolução n° 561, de 02/07/2007 do CJF.
A multa civil a ser imposta deve equivaler à repercussão econômica negativa causada ao erário público e, sendo possível, é natural que tenha como referência o valor contratado sem a devida licitação, além da análise, em concreto, da gravidade do fato, a função do agente público e sua forma de atuação.
Essa a orientação da jurisprudência, consoante segue:
Dado a natureza do ato ímprobo cometido, entendo que atende à razoabilidade e proporcionalidade impor aos corréus a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Deixo de condenar os réus à obrigação de ressarcir integralmente o valor correspondente ao convênio firmado, pois entendo que os cursos profissionalizantes foram ministrados, ainda que com as ressalvas no tocante a sua qualidade e a inidoneidade técnica da Fundação ré, sob pena de, com entendimento contrário, incorrer em favorecimento indevido da administração pública ou seu enriquecimento sem causa.
Em resumo, a ação civil pública é julgada procedente para condenar os corréus, nos seguintes termos: a) pagamento de multa civil; b) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
Diante do quadro probatório apresentado, a r. sentença recorrida deve ser reformada, nos termos da fundamentação supramencionada.
Deixo de condenar os requeridos ao pagamento de honorários advocatícios, em observância ao critério da simetria, consoante precedentes desta E. Sexta Turma (AC n° 0009296-93.2010.4.03.6105-SP, Rel. Desembargador Federal Johonsom di Salvo, j. 02/03/2017, v.u., DJ 15.03.2017) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça (AgInt no REsp 1531504/CE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/09/2016, DJe 21/09/2016; AgInt no REsp 1435350/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 23/08/2016, DJe 31/08/2016; AgRg no REsp 1378241/MS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 01/10/2015, DJe 09/10/2015), ao apreciar a questão sob a perspectiva dos artigos 4º, 5º, 17 e 18 da Lei nº 7.347/1985. Nesse sentindo, ainda, me pronunciei no Agravo em AC nº 0029309-12.2002.4.03.6100-SP, consoante a ementa que segue:
A propósito, menciono a ementa lavrada no RESP nº 1531504/CE, que segue:
Em conformidade com a Resolução nº 172 do E. Conselho Nacional de Justiça, determino que a Subsecretaria da 6ª Turma proceda às informações devidas junto ao Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa - CNCIAI.
Em face do exposto, dou parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal e à remessa oficial, tida por interposta.
É como voto.
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