D.E. Publicado em 31/10/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa e acolher, em parte, o parecer ministerial para, de ofício, reduzir a pena do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra a sentença de fls. 234/236, que condenou Moacir Raimundo dos Santos a 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção e ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pela prática do delito do art. 183 da Lei n. 9.472/97, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos (fls. 234/236).
Apela a defesa com os seguintes argumentos:
A acusação ofereceu contrarrazões (fls. 247/250).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Isabel Cristina Groba Vieira, manifestou-se pelo desprovimento da apelação da defesa e pela substituição, de ofício, da pena restritiva de interdição temporária de direito por prestação pecuniária, assim como pela fixação da pena de multa na forma dos arts. 49 e 60 do Código Penal, considerando a inconstitucionalidade da expressão "de R$ 10.000,00", contida no preceito secundário do artigo 183 da Lei n. 9.472/97 (fls. 339/346).
É o relatório.
VOTO
Imputação. Moacir Raimundo dos Santos foi denunciado pela prática do delito do art. 183 da Lei n. 9.472/97, nos seguintes termos:
Prescrição. A pena fixada na sentença foi de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção e, sem recurso da acusação, essa é a pena a ser considerada para fins de prescrição, cujo prazo é de 8 (oito) anos, a teor do inciso IV do art. 109 do Código Penal.
Entre a data do fato (24.05.06, fl. 124) e o recebimento da denúncia (22.08.11, fl. 193v.), passaram-se 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 28 (vinte e oito) dias.
Entre a data do recebimento da denúncia (22.08.11, fl. 193v.) e a publicação da sentença condenatória (15.08.12, fl. 236), transcorreram 11 (onze) meses e 23 (vinte e três) dias.
Contado o prazo prescricional a partir da sentença condenatória (15.08.12, fl. 236), à míngua de causa interruptiva, a prescrição está prevista para ocorrer em 14.08.20.
Conclui-se, portanto, que não está prescrita a pretensão punitiva estatal com base na pena in concreto.
Materialidade. Está comprovada a materialidade do delito, conforme decorre dos seguintes elementos de convicção:
Autoria. Em interrogatório extrajudicial, Moacir Raimundo dos Santos afirmou ter recebido os fiscais da ANATEL em sua residência, no dia 24.05.06, os quais fizeram cessar a atividade de radiodifusão sonora realizada sem a devida outorga. Disse terem os fiscais lacrado os equipamentos que levavam a rádio Oásis FM ao ar, na frequência de 105,3 MHz. Declarou ter sido cumprido mandado de busca e apreensão, arrecadando-se os equipamentos em sua residência. Afirmou ter sido processado em 1998 pelos mesmos fatos (fls. 60/61).
Em interrogatório judicial, Moacir Raimundo dos Santos afirmou ter o estúdio de transmissão, em sua casa, para realizar trabalhos comunitários. Disse que havia criado uma associação de comunicação comunitária, mas não tinha conseguido a outorga da ANATEL. Declarou que a rádio funcionava esporadicamente e tinha uma programação evangélica ou pedia doações para a comunidade. Relatou que o sistema de transmissão era de baixa potência e estava no local inspecionado pela ANATEL (fl. 232/232v. e mídia à fl. 233).
Em Juízo, a testemunha de acusação Alexandre Elias de Andrade Oliveira, Agente de Fiscalização da ANATEL, disse se recordar do réu em razão de uma atividade de fiscalização em uma casa na zona leste de São Paulo, onde funcionava uma rádio denominada Oásis. Disse não se recordar se a rádio estava em funcionamento, mas acreditar que a rádio não tinha outorga, pois, caso contrário, não teria sido lacrada. Disse não se recordar de outras diligências no local, mas saber que a rádio havia sido notificada várias vezes pela Polícia Federal (fl. 231 e mídia à fl. 233).
Ouvido perante a MM.ª Juíza, a testemunha de acusação Helio Lopes de Carvalho Filho, Agente de Fiscalização da ANATEL, afirmou que, em diligências, foi constatado o funcionamento da emissora de rádio, tendo o réu se apresentado como proprietário do estúdio de radiodifusão. Esclareceu que, antes da diligência, escutou a transmissão do áudio por aparelho de rádio comum e, depois, constatou o local de funcionamento por meio de equipamento específico. Declarou que o nome da rádio era Oásis e operava na frequência 105,3 MHz. Afirmou ter solicitado a apresentação da documentação pertinente e haver efetuado pesquisa na ANATEL, mas não haver encontrado qualquer registro. Disse que a rádio funcionava em dois pontos distintos, operando em baixa potência no estúdio, de onde o sinal era irradiado para outro local e depois difundido. Relatou não ter tido acesso ao transmissor principal, por não ter o réu informado onde ficaria a antena principal (fl. 231/231v. e mídia à fl .233).
Em Juízo, a testemunha de defesa Raimundo José de Santana disse que, às vezes, são transmitidos programas religiosos na rádio do acusado, sem fins lucrativos (fl. 231v. e mídia à fl. 233).
Recorre a defesa, alegando que a prova testemunhal é falha e imprecisa, não ter o recorrente desenvolvido ato de telecomunicação e ser o local da emissora de rádio destinado a cultos religiosos, estando resguardado pelo art. 5º, VI, da Constituição Federal, que trata da inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença.
Não lhe assiste razão.
O acusado confessou ter a emissora de radiodifusão em sua residência sem a necessária autorização legal. Em Juízo, esclareceu utilizar a rádio para fins religiosos e atividades beneficentes para a comunidade local, ter criado uma associação de comunicação comunitária, mas não ter obtido a outorga na ANATEL.
As testemunhas de acusação são uníssonas quanto ao desenvolvimento da atividade clandestina de telecomunicações pelo réu, por meio de estação de radiodifusão em sua casa, onde operava a rádio Oásis, sem a competente outorga na ANATEL.
O funcionamento da rádio também restou corroborado pelo depoimento da testemunha de defesa, que confirmou a transmissão de programas religiosos pelo réu.
As provas oral e documental dos autos tornam indubitável o exercício de atividade clandestina de radiodifusão pelo réu, a partir da estação de transmissão instalada em sua residência, ciente da ilicitude de sua conduta, tendo consciência de que seria necessário obter autorização legal para tanto.
Observo que o estúdio de difusão sonora clandestina estava instalado na residência do acusado, não havendo qualquer indício de tratar-se de local especialmente protegido, a teor do art. 5º, VI, da Constituição Federal.
Outrossim, o fato de o réu, eventualmente, difundir programas religiosos não o exime da obrigação legal de prévia obtenção de outorga do Poder Público, sendo a autorização de radiodifusão comunitária regulamentada por meio da Lei n. 9.612/98.
Portanto, comprovadas a materialidade e autoria delitiva, mantém-se a condenação.
Dosimetria. Na sentença, o Juízo a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção, considerando os antecedentes do réu.
Sem atenuantes, agravantes, causas de diminuição ou aumento de pena, tornou definitiva a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção.
Regime inicial aberto.
Aplicou a pena pecuniária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) prevista no art. 183 da Lei n. 9.472/97.
Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, a saber, prestação de serviços à comunidade e interdição temporária de direitos, consistente na impossibilidade de obtenção de autorização de uso de radiofrequência, ambas pelo tempo da pena de prisão substituída.
A defesa não apelou da dosimetria.
Em parecer, a Procuradoria Regional da República pugna pela substituição, de ofício, da pena restritiva de interdição temporária de direito por prestação pecuniária, assim como pela fixação da pena de multa na forma dos arts. 49 e 60 do Código Penal, considerando a inconstitucionalidade da expressão "de R$ 10.000,00", contida no preceito secundário do artigo 183 da Lei n. 9.472/97 (fls. 339/346).
Merece acolhida, em parte, o pleito ministerial.
Passo a revisar, de ofício, a pena imposta ao acusado.
É possível a redução de-ofício da pena-base para ajustá-la à Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça (STJ, HC n. 175945, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 02.04.13; HC n. 217310, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 21.02.13; TRF da 3ª Região, ACr n. 0011035-23.2004.4.03.6102, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 13.05.13; ACr n. 00121379020036110, Rel. Des. Fed. Peixoto Júnior, j. 05.02.13; ACr n. 0001726-75.2004.4.03.6102, Rel. Des. Fed. Vesna Kolmar, j. 12.03.13; ACr n. 0001812-25.2004.4.03.6109, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 30.06.12; ACr n. 0009670-80.2007.4.03.6181, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 15.05.12).
O Órgão Especial do TRF da 3ª Região, em Argüição de Inconstitucionalidade Criminal, declarou a inconstitucionalidade da expressão "R$ 10.000,00" contida no preceito secundário do art. 183 da Lei n. 9.472/97, por entender violado o princípio da individualização da pena, previsto no art. 5º, XLVI, da Constituição da República (TRF da 3ª Região, Arguição de Inconstitucionalidade Criminal n. 2000.61.13.005455-1, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, j. 29.06.11). Afastada a pena pecuniária prevista no art. 183 da Lei n. 9.472/97, tem-se aplicado as disposições do Código Penal (TRF da 1ª Região, ACr n. 200740000074284, Rel. Des. Fed. Assusete Magalhães, j. 30.09.10 e ACr n. 200640000018594, Rel. Juiz Fed. Conv. Marcus Vinicius Bastos, j. 29.09.10).
Reduzo, de ofício, a pena privativa de liberdade ao mínimo legal de 2 (dois) anos de detenção, considerando a Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual, "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base".
Com efeito, as certidões criminais dos autos não apontam a existência de qualquer condenação criminal contra o réu (fls. 7/9, 13 e 15/17 do apenso).
Sem atenuantes, agravantes, causas de diminuição ou de aumento, torno definitiva a pena de 2 (dois) anos de detenção.
Regime inicial aberto.
Tendo em vista a inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 183 da Lei n. 9.472/97, afasto, de ofício, a pena multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e estabeleço-a em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, nos termos do Código Penal e proporcionalmente à pena privativa de liberdade fixada.
No tocante às penas restritivas de direitos, observo não ter sido interposto recurso de apelação pela acusação.
Assim, a fim de evitar eventual alegação de reformatio in pejus, deixo de acolher o pleito formulado pelo Ministério Público Federal em parecer e mantenho a substituição nos termos fixados na sentença.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da defesa e ACOLHO, em parte, o parecer ministerial para, DE OFÍCIO, reduzir a pena aplicada a Moacir Raimundo dos Santos pela prática do delito do art. 183 da Lei n. 9.472/97, resultando em 2 (dois) anos de detenção, regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, substituída a pena de prisão por duas penas restritivas de direitos.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 23/10/2013 15:04:15 |