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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento aos recursos de apelação, para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal e extinguir a punibilidade de todos os réus pelo crime de fraude processual imputado, nos termos dos artigos 109, VI, 110 e 107, IV, do Código Penal, reconhecer a prescrição e extinguir a punibilidade de Fábio Claro Figueira de Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz e Maria Regina Marra Güimil pelo crime de uso de documento falso, nos termos dos artigos 109, V, 110, e 107, IV, do Código Penal e absolver, com fulcro no art. 386, VI, do Código de Processo Penal, Paulo César de Oliveira, César Herman Rodriguez e Aparecido Hugo Carletti pelo delito de uso de documento falso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Descrição fática: consta da denúncia, recebida em 13.05.2004 (fls. 172/174), que, Paulo César de Oliveira, César Herman Rodrigues, Fábio Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz, Maria Regina Marra Guimil e Hugo Sterman Filho, em unidade de desígnios, uns como autores, outros como partícipes, falsificaram documento particular (contrato de locação), visando a induzir o Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos em erro e, ato contínuo, fizeram uso de tal documento.
Segundo a denúncia, os fatos iniciaram com a prisão em flagrante, ocorrida em novembro de 2002, de Paulo César de Oliveira, Qui Go, Lin Zheng Zhou e Mário Viana pela prática do crime de falsificação de documentos públicos (passaportes).
A fim de receber liberdade provisória, Paulo César de Oliveira, associados com os corréus, visando a iludir o juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP, forjou um contrato de locação material e ideologicamente falso, no qual figurava como locatário, com o objetivo único de fazer prova de que Paulo possuía residência fixa, habitando, na condição de locatário, um apartamento situado na Rua Dr. Luiz Migliano, 871, 15.º andar, apto. 153, Bloco C.
Gravações realizadas no bojo da "Operação Anaconda" deflagraram as atribuições dos acusados, como autores e partícipes, na elaboração do contrato de locação.
César Herman e Hugo Sterman Filho seriam os autores intelectuais do crime, chegando à conclusão, após a não aceitação pela Juíza da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP dos comprovantes de residência de Paulo César, da necessidade de falsificar um contrato de locação.
César teria afirmado que seria necessário celebrar um contrato de locação que poderia ser realizado entre os denunciados Fábio Melo e Paulo César de Oliveira.
As gravações, conjugadas a exame documentoscópico, demonstrariam a participação de todos os acusados, em especial César Herman e Hugo Sterman Filho na falsificação ideológica e material do contrato de locação. Isso porque o exame teria demonstrado que a assinatura no contrato não teria sido aposta por Paulo César, sendo que as gravações teriam demonstrado que César Herman teria sugerido que qualquer integrante da quadrilha poderia falsificar a assinatura deste.
Ambos acordam em convencer Berenice Claro Zanardi Luiz, tia de Fábio Melo, para figurar falsamente como locadora do imóvel, que consentiu emprestando o seu nome e assinatura para a empreitada criminosa.
Em 23.11.2002, César Herman teria solicitado a Maria Regina Marra Guimil, advogada, que se dirigisse à Polícia Federal, então situada na Rua Piauí (Higienópolis, São Paulo/SP), para colher a assinatura de Paulo César de Oliveira no contrato de locação contrafeito. A advogada teria sido a responsável, ainda, pela juntada aos autos do contrato de locação contrafeito.
Maria Regina Marra Guimil, contudo, não teria logrado adentrar a custódia da Polícia Federal para colher a assinatura de Paulo César de Oliveira, o que teria levado a advogada e César Herman (ou alguém a mando) falsificassem a assinatura de Paulo César Oliveira no referido contrato.
Ainda no dia 23.11.2002, César Herman e Hugo Sterman Filho, já na posse do contrato contrafeito e assinado, traçam as providências finais para concretizar a obtenção de liberdade provisória para Paulo César de Oliveira, sendo que o pedido já havia sido encaminhado ao Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos.
Assim, a magistrada da 2.ª Vara Federal de Guarulhos teria sido induzida em erro, pois, em 27.11.2002, após a juntada do contrato de locação contrafeito aos autos do processo n.º 2002.61.19.005472-2, acabou por conceder liberdade provisória a Paulo César de Oliveira.
Os acusados teriam, portanto, inserido dados falsos no contrato de locação, ou seja, uma locação que nunca existiu, o que caracterizaria falsidade ideológica, e aposto assinaturas falsas no contrato, que configuraria a falsidade material.
Os acusados teriam, ainda, feito uso de documento particular contrafeito, no momento em que este foi apresentado ao Poder Judiciário.
Imputação: art. 299 c.c. os artigos 298, 304, 347, parágrafo único, c. c. os artigos 29 e 70, do Código Penal.
A pedido da defesa e do Ministério Público Federal, realizou-se perícia técnica para apurar se a voz atribuída a "Hugo", constante das gravações que embasam a denúncia corresponderia realmente à do denunciado.
Constatou-se com a perícia realizada, assim, que a voz presente nas gravações não seria a de Hugo Sterman Filho.
Em poder de tal informação, em 07.06.2004, o Ministério Público Federal aditou a denúncia oferecida, para imputar os fatos anteriormente atribuídos a Hugo Sterman Filho a Aparecido Hugo Carletti (fls. 299/305), aditamento este que foi recebido em 24.06.2004 (428/431).
Em decisão proferida em 11.05.2005, extinguiu-se o feito em relação a Hugo Sterman Filho, excluindo-o do pólo passivo da ação penal, ante a constatação de ilegitimidade de parte (fls. 1432/1433).
Sentença (fls. 3253/3288): a MM. Juíza da 2ª Vara Federal Guarulhos/SP, em sentença publicada em 17.09.2010 (fls. 3289), julgou procedente a denúncia, para condenar, pela prática das figuras previstas nos artigos 304, 298 e 347 do Código Penal: Paulo César de Oliveira à pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada dia-multa fixado em metade do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos; César Herman Rodrigues à pena de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada dia fixado em metade do salário mínimo vigente à época dos fatos; Aparecido Hugo Carletti à pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada um em metade do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos; Fábio Claro Figueira de Melo à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada dia fixado em metade do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituindo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em uma prestação pecuniária no valor de 4 (quatro) salários mínimos, mediante depósito bancário em favor da entidade assistencial denominada "Casa de David" (Vila Airosa, São Paulo/SP) e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo período da pena privativa de liberdade; Berenice Claro Zanardi Luiz, à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada dia fixado em metade do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituindo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em uma prestação pecuniária no valor de 4 (quatro) salários mínimos, mediante depósito bancário em favor da entidade assistencial denominada "Casa de David" (Vila Airosa, São Paulo/SP) e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo período da pena privativa de liberdade; Maria Regina Marra Güimil à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 23 (vinte e três) dias-multa, cada dia fixado em metade do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituindo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em uma prestação pecuniária no valor de 4 (quatro) salários mínimos, mediante depósito bancário em favor da entidade assistencial denominada "Casa de David" (Vila Airosa, São Paulo/SP) e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo período da pena privativa de liberdade
Recurso de apelação de Maria Regina Marra Güimil (fls. 3282/3284): alega que: a pena-base foi exasperada de forma equivocada, violando o princípio da presunção de inocência, pois não poderia ter sido reconhecida a existência de maus antecedentes da acusada; o uso de documento falso deveria ser absorvido pela fraude processual; o conjunto probatório não foi considerado, pois há prova de que a assinatura lançada no contrato de locação era verdadeira; que, em pedido de liberdade provisória, a prova de residência não é determinante, exigindo-se somente a ausência dos requisitos da prisão preventiva. Reporta-se às alegações finais apresentadas em primeira instância e requer a oportunidade de sustentação oral.
Contrarrazões apresentadas às fls. 3289/3333.
Recurso de apelação de Cesar Herman Rodriguez (fls. 3493/3513): alega, preliminarmente, a inépcia da denúncia, por falta de justa causa; a incompetência do juízo, por ausência de livre distribuição, por ser o feito de competência da Justiça Estadual e, supondo a existência de "fraude processual", a juíza sentenciante seria suspeita para a instrução e julgamento do feito; que as gravações utilizadas para embasar a denúncia seriam ilegais, por não terem sido autorizadas judicialmente; que de fato residia no local indicado no contrato de locação em questão e que a ré Berenice seria de fato a proprietária do imóvel ali indicado; que o exame pericial seria falho, por não compreender a análise de diversos aspectos técnicos; a autenticidade da assinatura aposta no contrato de locação; que as gravações realizadas não respeitam os requisitos técnicos necessários para constituir prova fidedigna em um processo penal; que o acusado não possui maus antecedentes que legitimem a majoração da pena-base. Requer o conhecimento e provimento do recurso, para que seja anulada a sentença condenatória, absolvendo o acusado por atipicidade dos fatos.
Contrarrazões apresentadas às fls. 3538/3553.
Recurso de apelação de Aparecido Hugo Carletti (3427/3465): alega, preliminarmente, a ocorrência de prescrição; no mérito, que a r. sentença condenatória incorreu em equivoco ao exasperar a pena-base em razão dos maus antecedentes do acusado, ante o teor da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça; que os fatos em questão são atípicos, pois o delito imputado caracteriza-se como crime de mão própria, não sendo possível o concurso de pessoas; a desnecessidade de comprovação de residência fixa para a concessão de liberdade provisória. Requer o acolhimento da questão preliminar arguida e, no mérito, a absolvição do acusado com base no art. 386 do Código de Processo Penal.
Contrarrazões apresentadas às fls. 3523/3536.
Recurso de apelação de Paulo César de Oliveira e Fábio Claro Figueira Melo (3469/3479): alega, preliminarmente, a ocorrência de prescrição; no mérito, a ausência de provas da materialidade delitiva, uma vez que o laudo pericial que atestou a falsidade da assinatura no contrato de locação em questão é contestável, em especial por laudo trazido pela defesa; a ausência de elementos que permitam a exasperação da pena-base, pois os registros de Paulo utilizados para a majoração da pena-base não poderiam ser utilizados como maus antecedentes ou para o reconhecimento de reincidência; que Fábio é réu primário e portador de bons antecedentes. Requer a absolvição dos acusados e, subsidiariamente, o reconhecimento da prescrição e que as penas sejam fixadas no patamar mínimo legal.
Contrarrazões apresentadas às fls. 3555/3570.
Recurso de apelação de Berenice Claro Zanardi Luiz (3390/3404): alega, em síntese, a ausência de dolo, ou de provas sobre o dolo, em assinar o contrato de locação que constava como locatário Paulo César de Oliveira, incorrendo nas condutas a ela imputadas, porquanto o corréu é seu sobrinho e assinou o instrumento em razão da confiança que nele depositava; que o contrato celebrado seria verídico; que a acusada não teria incorrido na conduta "usar" tipificada no art. 304 do Código Penal, pois a conduta "assinar" não estaria abrangida pelo verbo; a perda do objeto do laudo pericial, pois o contrato de locação pode ser celebrado verbalmente e confirmado por instrumento; a ausência de provas de autoria em relação ao crime tipificado no art. 347 do Código Penal; que a ré não é portadora de maus antecedentes, não havendo fundamento para a exasperação da pena-base. Requer o conhecimento e provimento do recurso, para absolver a acusada com fulcro no art. 386, III, IV ou VII do Código de Processo Penal e, subsidiariamente, o reconhecimento de inexistência de circunstância qualificadora ou a fixação da pena-base no patamar mínimo legal.
Contrarrazões apresentadas às fls. 3409v./3420v.
Parecer da Procuradoria Regional da República (Dr. Elton Venturi, fls. 3575/3585): opina pela extinção da punibilidade de Maria Regina Marra Güimil, Fábio Claro Figueira de Melo e de Berenice Claro Zanardi Luiz e pelo parcial provimento dos recursos dos demais, para pequena diminuição de suas penas, em virtude da Súmula 444 do STJ.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES (RELATOR):
Trata-se de recursos de apelação interpostos por Maria Regina Marra Güimil, Cesar Herman Rodriguez, Aparecido Hugo Carletti, Paulo César de Oliveira, Fábio Claro Figueira Melo e Berenice Claro Zanardi Luiz em face de sentença que os condenou como incursos na prática das figuras tipificadas nos artigos 304, 298 e 347 do Código Penal.
Da prescrição
Alegam as defesas de Aparecido Hugo Carletti, Paulo César de Oliveira e Fábio Claro Figueira Melo a ocorrência da prescrição da pretensão preventiva estatal.
Aduz a Procuradoria Regional da República, em seu douto parecer, que, quanto ao crime tipificado no art. 347 do Código Penal, ocorreu a prescrição para todos os acusados, enquanto que, em relação ao delito do art. 304 c. c. o art. 298 do Código Penal, ocorreu a prescrição em relação aos corréus Fábio Claro Figueira Melo, Maria Regina Marra Güimil e Berenice Claro Zanardi Luiz.
Está com razão a defesa.
A MM. Juíza a quo condenou, pela prática do crime previsto no art. 347, parágrafo único, do Código Penal, Paulo César de Oliveira à pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção. Pelo mesmo crime, Cesar Herman Rodriguez foi condenado à pena de 11 (onze) meses de detenção; Aparecido Hugo Carletti, a 10 (dez) meses de detenção e Fábio Claro Figueira de Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz e Maria Regina Marra Güimil a penas de 8 (oito) meses de detenção.
Tendo em vista as penas concretamente aplicadas, a prescrição da pretensão punitiva estatal opera-se em 3 (três) anos, nos termos dos artigos 109, VI, e 110 do Código Penal.
Considerando que a denúncia foi recebida em 13.05.2004 e a sentença condenatória publicada em 17.09.2010, decorrendo mais de 6 (seis) anos entre estes marcos interruptivos, deve ser reconhecida a prescrição em relação ao crime previsto no art. 347, parágrafo único, do Código Penal, para todos os réus.
Note-se, oportunamente, que, mesmo com o aumento de 1/3 (um terço), pelo reconhecimento da reincidência (art. 110 do Código Penal), do réu Paulo César de Oliveira, o prazo prescricional atingiria 4 (quatro) anos, ou seja, tempo aquém dos 6 (seis) anos transcorridos.
Quanto ao delito de uso de documento particular falso (art. 304 c. c. o art. 298 do Código Penal), Paulo César de Oliveira foi condenado à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão; Cesar Herman Rodriguez à pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses; Aparecido Hugo Carletti à pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão; Fábio Claro Figueira de Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz e Maria Regina Marra Güimil, cada um, a 2 (dois) anos de reclusão.
Assim, diante das penas concretamente aplicadas, nos termos dos artigos 109, V, e 110 do Código Penal, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal quanto ao crime de uso de documento falso, em relação a Fábio Claro Figueira de Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz e Maria Regina Marra Güimil.
Aplicando o teor da Súmula 241 do extinto Tribunal Federal de Recursos, julga-se prejudicado o exame do mérito recursal de Fábio, Berenice e Maria Regina, passando-se somente à análise dos recursos dos demais corréus.
Da materialidade delitiva do crime de uso de documento falso
No mérito, dentre outras alegações, insurgem-se as defesas de Paulo César de Oliveira e César Herman Rodriguez contra o reconhecimento de provas da materialidade delitiva do crime de uso de documento falso. Segundo consta de seus recursos, o laudo pericial, sobre o qual foi fundamentado a sentença condenatória, não teria analisado aspectos técnicos suficientes para atestar que a assinatura constante do contrato de locação não seria, de fato, de Paulo César. Outrossim, alega-se que os pareceres técnicos apresentados pela defesa de César Herman Rodriguez, reconhecendo que a assinatura aposta no contrato de locação seria de fato de Paulo César, infirmariam as conclusões alcançadas pelos peritos judiciais, de forma que não haveria provas sobre a materialidade delitiva.
Está novamente com razão a defesa.
Verifica-se que a MM. Juíza a quo, ao analisar o corpo de delito apresentado pela acusação, assim se pronunciou (fls. 3257/3258):
Data maxima venia, analisando os laudos periciais em questão, chegamos a conclusão diversa.
O Laudo de Exame Documentoscópico (Grafotécnico), n.º 0847/04-SR/SP, está acostado às fls. 903/907 dos autos e, como exposto acima, conclui que a assinatura aposta no contrato de locação é inautêntica.
Nota-se, contudo, que os peritos receberam como material padrão da caligrafia de Paulo César de Oliveira, para o exame grafotécnico e confrontação com o contrato de locação supostamente falso, apenas uma "cópia da Cédula de Identidade autenticada - RG nº 10.488.589-0, expedido em 19/04/2000 SSP/SP", em nome deste acusado.
Foram arrolados pela defesa como testemunhas os peritos criminais responsáveis pelo mencionado laudo, Maria Eliza C. de Carvalho (fls. 2263/2265) e Luiz Vanderlei Marasca (fls. 2271/2273).
Maria Eliza C. de Carvalho, dentre outras alegações, afirmou que:
Luiz Vanderlei Marasca relatou que:
Por outro lado, a defesa de Paulo Cesar de Oliveira trouxe à instrução pareceres técnicos às fls. 817/913, elaborados pelos peritos Sebastião Edison Cinelli e Ricardo Molina de Figueiredo.
Para o exame, Sebastião Edison Cinelli valeu-se de um documento de reprografia do contrato de locação celebrado entre Berenice e Paulo César e, como documentos originais: a) um auto de colheita de material gráfico em seis laudas, com várias assinaturas de Paulo César; b) da cédula de identidade original do réu; e c) cédula original do CPF. Entre documentos reprográficos analisados, consta do parecer as assinaturas apostas pelo réu em 8 (oito) documentos constantes de autos da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP.
Confrontando o contrato indicado como objeto do crime com os demais documentos em seu poder, concluiu o perito pela autenticidade das assinaturas ali apostas.
Por sua vez, Ricardo Molina de Figueiredo utilizou como material padrão: a) amostras de lançamentos de Paulo César de Oliveira; b) RG e CPF originais; e c) amostras de lançamentos em documentos constantes dos autos n.º 2002.61.19005470-9 e 2003.61.19.008284-9.
Concluiu o perito que as assinaturas constantes do contrato de locação em questão foram de fato produzidas pelo réu.
Consta ainda do parecer exarado, ao contrário do exposto na sentença condenatória, expressa crítica ao laudo pericial elaborado pela Polícia Federal. As considerações são pertinentes, razão por qual são transcritos os excertos a seguir (fls. 877/879):
Deveras, é certo que, por muitas vezes, o juiz depara-se com a análise de provas que exigem aprofundados conhecimentos técnicos para a apuração dos fatos. Nessas circunstâncias, vale-se da figura do perito judicial, conforme preceituam os artigos 158 e seguintes, e 275 e seguintes do Código de Processo Penal, cujo trabalho pode ser corroborado ou questionado por laudos apresentados por assistentes técnicos indicados pelas partes, em nítido exercício dos princípios da ampla defesa e do contraditório.
No caso em apreço, por mais idoneidade e confiança que se deposite nas conclusões apresentadas pelos peritos nomeados pelo Juízo a quo, as impropriedades técnicas suscitadas pela defesa geram substancial dúvida acerca da falsidade alegada pelo Ministério Público Federal, de forma que não se pode afirmar, com insofismável segurança, que as assinaturas de Paulo César de Oliveira nos contratos de locação em questão não são suas.
Tal dúvida é ainda agravada por declarações de Paulo César de Oliveira e Maria Regina Marra Güimil prestadas em juízo - as quais não se encontram contrastadas com provas apresentadas pela acusação.
Ambos os réus asseveraram em seus interrogatórios que Maria Regina, na qualidade de advogada de Paulo César, entregou o contrato de locação, para ser assinado, a um policial presente nas dependências da Polícia Federal em que o réu estava encarcerado. O documento teria sido levado das mãos de Maria Regina a Paulo César, assinado por este e devolvido à ré.
Não logrou comprovar a acusação que Maria Regina não conseguiu entregar o contrato a Paulo César, e por isso uma terceira pessoa teria simulado a sua assinatura para posterior apresentação em pedido de liberdade provisória ao Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP.
Dessa forma, conjugando as contundentes dúvidas levantadas pelos pareceres apresentados pela defesa e à ausência de provas sobre o não contato entre Maria Regina e Paulo César, em prol do princípio in dubio pro reo, é imperiosa a absolvição dos acusados.
Conclusão
Diante do exposto, dou provimento aos recursos de apelação, para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal e extinguir a punibilidade de todos os réus pelo crime de fraude processual imputado, nos termos dos artigos 109, VI, 110 e 107, IV, do Código Penal, reconhecer a prescrição e extinguir a punibilidade de Fábio Claro Figueira de Melo, Berenice Claro Zanardi Luiz e Maria Regina Marra Güimil pelo crime de uso de documento falso, nos termos dos artigos 109, V, 110, e 107, IV, do Código Penal e absolver, com fulcro no art. 386, VI, do Código de Processo Penal, Paulo César de Oliveira, César Herman Rodriguez e Aparecido Hugo Carletti pelo delito de uso de documento falso.
É o voto.
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