D.E. Publicado em 04/11/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício declarar extinta a punibilidade do delito pela prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com redução do acréscimo da continuidade delitiva, e, quanto ao período remanescente, dar provimento ao recurso da acusação para condenação de João Domingos Florio Di Biasio pelo crime dos artigos 168-A, §1º, I c.c 71 do Código Penal e dar parcial provimento ao recurso da defesa para substituição da prestação pecuniária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JÚNIOR: - João Domingos Florio Di Basio e Francisca Maria Florio Di Basio foram denunciados nestes autos como incursos nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal e 337-A c.c. 71 do Código Penal por, segundo a preambular acusatória, na qualidade de responsáveis pela administração da empresa "Granitex Tecnologia e Comércio Ltda-ME", terem deixado de recolher os valores das contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados nos períodos de maio a julho de 1998, setembro de 1998 a janeiro de 2000, março de 2000, julho a setembro de 2000, novembro de 2000 a fevereiro de 2001, junho de 2001 a janeiro de 2003 e março de 2003 a janeiro de 2007 e por terem suprimido contribuições previdenciária e acessórios mediante a omissão de informação nas GFIP's referentes a segurados empregados e seus respectivos salários, nos períodos de janeiro a abril de 1999, junho de 1999 a março de 2000, janeiro e março de 2002, outubro de 2002 a janeiro de 2003, março, abril, junho e julho de 2003, novembro de 2003 a janeiro de 2004, março, abril, agosto e outubro de 2004, janeiro a março de 2005, junho a dezembro de 2005 e Gaetano Di Basio como incurso nos artigos 337-A c.c. 71 do Código Penal pela conduta de omissão de informações nas GFIP's acima referida.
Rejeitada parcialmente a denúncia em relação ao delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal quantos aos fatos praticados no período de maio de 1998 a novembro de 2001, décimo terceiro salário de 2001, fevereiro e maio de 2002, o processo criminal prosseguiu em seus trâmites cabíveis, sobrevindo sentença de absolvição dos acusados João Domingos Florio Di Basio e Gaetano Di Basio das imputações formuladas, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, de absolvição da acusada Francisca Maria Florio Di Basio da imputação dos artigos 337-A c.c. 71 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal e de sua condenação pelo delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal a dois anos e oito meses de reclusão, em regime aberto, com substituição por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas a ser definida pelo Juízo das Execuções e prestação pecuniária no valor de dez mil reais em favor da Associação de Apoio à Criança com Câncer, além de treze dias-multa, arbitrado o valor unitário em 1/30 do salário mínimo.
Da sentença recorre o Ministério Público Federal e nas razões oferecidas o procurador da república subscritor postula a condenação do acusado João Domingos Florio Di Basio pelo delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal.
Também recorre a defesa da acusada Francisca Maria Florio Di Basio postulando a absolvição aos argumentos de dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa e de ausência de dolo, subsidiariamente requerendo a aplicação da atenuante da confissão espontânea e a redução da pena substitutiva de prestação pecuniária.
Com contrarrazões, subiram os autos.
O parecer ministerial é pela declaração de extinção da punibilidade do delito do artigo 168-A, § 1º, inciso I, do Código Penal em relação aos fatos praticados até agosto de 2006, em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, pelo provimento do recurso da acusação e desprovimento do recurso da defesa.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Ao início, anoto que o caso dos autos é de consumação do delito nos períodos de junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a janeiro de 2007 e denúncia recebida em 23 de agosto de 2010 (fls. 353/354).
A sentença fixou a pena-base em dois anos de reclusão, com o aumento da continuidade delitiva praticado no percentual de 1/3 definindo-se em dois anos e oito meses de reclusão.
Regulando-se a prescrição, na espécie, em razão da pena aplicada, considerada sem o aumento da continuidade delitiva e isoladamente (art. 119 do CP e Súmula 497 do STF), pelo prazo de 04 (quatro) anos, e decorrido este da consumação do delito até o dia do recebimento da denúncia, é de ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com fulcro no artigo 61, "caput" do Código de Processo Penal e artigos 107, IV, primeira figura c.c. 109, V e 110, § 1º do Código Penal, na redação da Lei nº 7.209/84, remanescendo a punibilidade das infrações praticadas no período de agosto de 2006 a janeiro de 2007.
Materialidade do delito imputado no que respeita à falta dos recolhimentos provada pelos levantamentos feitos pelos fiscais do I.N.S.S., a fé inspirada pela prova documental sendo suficiente para gerar a certeza do fato, tudo o que reclama mais detida intervenção do raciocínio consiste na tese sustentada pela defesa que, alegando dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, pretende elidir a responsabilidade criminal imputada.
As ações de apropriação aferem-se pela verificação das folhas de salários e pertinentes livros da empresa tendente à apuração do débito e constatação do não-recolhimento, não havendo necessidade de minucioso levantamento contábil relativo a cada mês de incidência da contribuição social.
O tipo penal requisita para o seu aperfeiçoamento a arrecadação e, destarte, o desconto do valor da contribuição na remuneração dos empregados, conseqüentemente resolvendo-se em apropriação indébita a conduta de omissão dos recolhimentos.
O delito do artigo 95, "d" da Lei 8.212/91 e agora 168-A do Código Penal se me depara como de apropriação indébita, apenas ocorrendo de o legislador optar pela descrição do fato punível através do modo normal de inversão da posse na hipótese, correspondente à negativa de reversão dos valores arrecadados aos cofres públicos.
Entretanto, os pressupostos de seu aperfeiçoamento não necessitam ser procurados além do fato do débito não recolhido e as escusas da defesa devem ser entendidas e tratadas em consideração à economia estrutural do crime.
A procura no caixa da empresa do valor objeto de apropriação antes do recebimento dos salários é operação incompatível com as singularidades da espécie delitiva, eis que o objeto material do delito corresponde a um valor pecuniário que se individualiza no momento em que os salários são pagos com os descontos das contribuições sem a contrapartida do devido recolhimento.
A atividade econômica é feita de mecanismos de longo alcance e de correspondentes estratégias empresariais. Os verdadeiros resultados econômicos se expressam ao longo de períodos maiores e não é a verificação da exata relação entre receitas e despesas em cada mês de competência que vai decidir da existência ou não de apropriação. Pagos os salários com os descontos e omitidos os recolhimentos das contribuições, tem-se como suficientemente provada a apropriação de valores.
Destarte, provada a conduta de arrecadação e falta dos recolhimentos, é lícito concluir que os valores originariamente pertencentes aos empregados e por eles vertidos para destinação à Previdência Social foram retidos pela empresa e definitivamente incorporados ao seu patrimônio ou utilizados como capital de giro, em qualquer caso havendo o escopo e a consecução de resultados de ilícito locupletamento, ressalvado que, para que se infirme a vontade de apropriar-se, não basta a esperança ou a probabilidade de restituir, sendo imprescindível a certeza de poder restituir, consoante o magistério de Magalhães Noronha inserto em seu "Direito Penal", vol. 1, 23a. Ed., p.335, despido de interesse não sendo anotar as circunstâncias da reiteração das condutas puníveis, que desacreditam cabalmente a hipótese de ausência de dolo de apropriação.
Os fatos alegados também não caracterizam a causa de licitude do estado de necessidade ou a excludente da culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa.
Dificuldades financeiras por problemas de mercado ou injunções da política econômica do país fazem parte do modo de ser ordinário da atividade empresarial e percalços e vicissitudes comuns no funcionamento das empresas são fatos em si mesmos insuficientes para descaracterizar a ilicitude do fato ou a culpabilidade do agente.
Ademais, da primeira figura não há se cogitar também tendo em vista a evitabilidade do suposto perigo por outros meios, por outro lado não se patenteando a inexigibilidade de conduta diversa ainda em virtude da consideração de que a invocada causa supralegal de exclusão da culpabilidade assenta na anormalidade do elemento volitivo, daí deparar-se inaceitável o pensamento de sua incidência na espécie, pois a atividade criminosa perdurou por período suficiente para que o agente recuperasse a capacidade de determinação normal e imune de defeitos.
Tecnicamente a questão é esta: a apropriação dos valores das contribuições absolutamente não desponta no conjunto processual como o único e exclusivo meio de se propiciar a continuidade do funcionamento da empresa, daí a ilicitude do fato e também a exigibilidade de conduta diversa e a caracterização da culpabilidade do agente. Do ponto de vista moral a fórmula é esta: ficar menos rico, sofrer reduções no patrimônio individual ou repassar o prejuízo à coletividade. Positivamente são estes os interesses que informam a conduta praticada. Lesar o interesse público apropriando-se de valor de contribuição de que se era mero depositário não era a única conduta que possibilitava prover o necessário para manter-se o funcionamento da empresa. Era, sim, mais vantajosa do que a redução dos lucros.
No caso houve conduta de apropriação dos valores das contribuições que originariamente integram a remuneração do trabalho assalariado e que pelos segurados empregados são vertidos para destinação à Seguridade Social em longo período, a circunstância da reiteração das ilicitudes convencendo de que foi a conduta praticada com finalidades de ilícito locupletamento, intenções de pagamento quando muito expressando mera subjetividade de arrependimento que não exclui o dolo.
A autoria da acusada Francisca Maria Florio Di Basio restou devidamente comprovada, porquanto, além de sua figuração no contrato social, estava presente quando da fiscalização desenvolvida na empresa, firmando as notificações fiscais de lançamento de débito e os autos de infrações, revelando-se, assim, sua efetiva responsabilidade na gestão da sociedade.
A autoria do corréu João Domingos Florio Di Basio também se comprova por sua condição de sócio da empresa com poderes de gerência, consoante contrato social acostado às fls. 237/254, suposta mecânica de divisão de tarefas absolutamente não obstaculizando o conhecimento dos fatos, ademais graves o bastante para não serem praticados à revelia de qualquer sócio administrador, cabendo anotar ainda a circunstância de se tratar de negócio familiar em que ordinariamente os assuntos de interesse da empresa, mormente quando envolvem problemas e dívidas, são conhecidos de todos os administradores.
Neste contexto, tendo pleno domínio sobre o fato delituoso e a respeito dele nada fazendo deve também o acusado ser penalmente responsabilizado.
Sob o tema, trago à luz o comentário de Henrique Herkenhoff sobre a caracterização do sujeito ativo do crime de apropriação indébita previdenciária com o qual ponho-me inteiramente de acordo:
No mesmo sentido, a jurisprudência:
Por estes fundamentos, de ofício declaro extinta a punibilidade do delito pela prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos de junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com redução do acréscimo da continuidade delitiva, e, quanto ao período remanescente, dou provimento ao recurso da acusação para condenação de João Domingos Florio Di Biasio pelo crime dos artigos 168-A, §1º, I c.c 71 do Código Penal e dou parcial provimento ao recurso da defesa da acusada para substituição da prestação pecuniária, nos termos supra.
É o voto.
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