Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 04/11/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004815-24.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.004815-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : FRANCISCA MARIA FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : SP258532 MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : JOAO DOMINGOS FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : SP258532 MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : OS MESMOS
REU ABSOLVIDO : GAETANO DI BIASIO
No. ORIG. : 00048152420084036181 9P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. DOLO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PENA. PRESCRIÇÃO.
- Declarada a extinção da punibilidade pela prescrição em relação a parte das infrações praticadas em continuidade delitiva, com redução do acréscimo da continuidade delitiva. Aplicação dos artigos 61, "caput" do Código de Processo Penal e 107, IV, primeira figura c.c. 109, V e 110, § 1º do Código Penal, na redação da Lei nº 7.209/84.
- Corresponde o objeto material do delito a um valor econômico que se individualiza no momento em que os salários são pagos com os descontos das contribuições sem a contrapartida do devido recolhimento. Sendo a atividade econômica feita de mecanismos de longo alcance e de correspondentes estratégias empresariais, não é a verificação da exata relação entre receitas e despesas em cada mês de competência que decide da existência ou não de apropriação. Pagos os salários com os descontos e omitidos os recolhimentos das contribuições, tem-se como suficientemente provadas as ações de apropriação de valores.
- Materialidade do delito comprovada.
- Pressuposto que a causa supralegal de exclusão da culpabilidade assenta na anormalidade do elemento volitivo, depara-se inaceitável o pensamento de sua incidência quando a atividade criminosa perdurou por período suficiente para que o agente recuperasse a capacidade de determinação normal e imune de defeitos.
- Autoria do delito devidamente estabelecida no processo em relação a ambos acusados.
- Recurso da acusação provido. Condenação decretada.
- Substituição da prestação pecuniária pela entrega de uma cesta básica mensal pelo período da condenação no lugar do pagamento de quantia determinada.
- Recurso da defesa parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício declarar extinta a punibilidade do delito pela prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com redução do acréscimo da continuidade delitiva, e, quanto ao período remanescente, dar provimento ao recurso da acusação para condenação de João Domingos Florio Di Biasio pelo crime dos artigos 168-A, §1º, I c.c 71 do Código Penal e dar parcial provimento ao recurso da defesa para substituição da prestação pecuniária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 22 de outubro de 2013.
Peixoto Junior
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): OTAVIO PEIXOTO JUNIOR:10032
Nº de Série do Certificado: 31228EF05ED000E6
Data e Hora: 29/10/2013 15:26:11



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004815-24.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.004815-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : FRANCISCA MARIA FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : JOAO DOMINGOS FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : OS MESMOS
REU ABSOLVIDO : GAETANO DI BIASIO
No. ORIG. : 00048152420084036181 9P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JÚNIOR: - João Domingos Florio Di Basio e Francisca Maria Florio Di Basio foram denunciados nestes autos como incursos nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal e 337-A c.c. 71 do Código Penal por, segundo a preambular acusatória, na qualidade de responsáveis pela administração da empresa "Granitex Tecnologia e Comércio Ltda-ME", terem deixado de recolher os valores das contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados nos períodos de maio a julho de 1998, setembro de 1998 a janeiro de 2000, março de 2000, julho a setembro de 2000, novembro de 2000 a fevereiro de 2001, junho de 2001 a janeiro de 2003 e março de 2003 a janeiro de 2007 e por terem suprimido contribuições previdenciária e acessórios mediante a omissão de informação nas GFIP's referentes a segurados empregados e seus respectivos salários, nos períodos de janeiro a abril de 1999, junho de 1999 a março de 2000, janeiro e março de 2002, outubro de 2002 a janeiro de 2003, março, abril, junho e julho de 2003, novembro de 2003 a janeiro de 2004, março, abril, agosto e outubro de 2004, janeiro a março de 2005, junho a dezembro de 2005 e Gaetano Di Basio como incurso nos artigos 337-A c.c. 71 do Código Penal pela conduta de omissão de informações nas GFIP's acima referida.

Rejeitada parcialmente a denúncia em relação ao delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal quantos aos fatos praticados no período de maio de 1998 a novembro de 2001, décimo terceiro salário de 2001, fevereiro e maio de 2002, o processo criminal prosseguiu em seus trâmites cabíveis, sobrevindo sentença de absolvição dos acusados João Domingos Florio Di Basio e Gaetano Di Basio das imputações formuladas, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, de absolvição da acusada Francisca Maria Florio Di Basio da imputação dos artigos 337-A c.c. 71 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal e de sua condenação pelo delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal a dois anos e oito meses de reclusão, em regime aberto, com substituição por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas a ser definida pelo Juízo das Execuções e prestação pecuniária no valor de dez mil reais em favor da Associação de Apoio à Criança com Câncer, além de treze dias-multa, arbitrado o valor unitário em 1/30 do salário mínimo.

Da sentença recorre o Ministério Público Federal e nas razões oferecidas o procurador da república subscritor postula a condenação do acusado João Domingos Florio Di Basio pelo delito capitulado nos artigos 168-A, §1º, inciso I c.c. 71 do Código Penal.

Também recorre a defesa da acusada Francisca Maria Florio Di Basio postulando a absolvição aos argumentos de dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa e de ausência de dolo, subsidiariamente requerendo a aplicação da atenuante da confissão espontânea e a redução da pena substitutiva de prestação pecuniária.

Com contrarrazões, subiram os autos.

O parecer ministerial é pela declaração de extinção da punibilidade do delito do artigo 168-A, § 1º, inciso I, do Código Penal em relação aos fatos praticados até agosto de 2006, em razão da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, pelo provimento do recurso da acusação e desprovimento do recurso da defesa.

É o relatório.

À revisão.


Peixoto Junior
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): OTAVIO PEIXOTO JUNIOR:10032
Nº de Série do Certificado: 31228EF05ED000E6
Data e Hora: 18/10/2013 17:27:19



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004815-24.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.004815-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PEIXOTO JUNIOR
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : FRANCISCA MARIA FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : JOAO DOMINGOS FLORIO DI BIASIO
ADVOGADO : MARCOS AUGUSTO VAZÃO e outro
APELADO : OS MESMOS
REU ABSOLVIDO : GAETANO DI BIASIO
No. ORIG. : 00048152420084036181 9P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Ao início, anoto que o caso dos autos é de consumação do delito nos períodos de junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a janeiro de 2007 e denúncia recebida em 23 de agosto de 2010 (fls. 353/354).

A sentença fixou a pena-base em dois anos de reclusão, com o aumento da continuidade delitiva praticado no percentual de 1/3 definindo-se em dois anos e oito meses de reclusão.

Regulando-se a prescrição, na espécie, em razão da pena aplicada, considerada sem o aumento da continuidade delitiva e isoladamente (art. 119 do CP e Súmula 497 do STF), pelo prazo de 04 (quatro) anos, e decorrido este da consumação do delito até o dia do recebimento da denúncia, é de ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com fulcro no artigo 61, "caput" do Código de Processo Penal e artigos 107, IV, primeira figura c.c. 109, V e 110, § 1º do Código Penal, na redação da Lei nº 7.209/84, remanescendo a punibilidade das infrações praticadas no período de agosto de 2006 a janeiro de 2007.

Materialidade do delito imputado no que respeita à falta dos recolhimentos provada pelos levantamentos feitos pelos fiscais do I.N.S.S., a fé inspirada pela prova documental sendo suficiente para gerar a certeza do fato, tudo o que reclama mais detida intervenção do raciocínio consiste na tese sustentada pela defesa que, alegando dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, pretende elidir a responsabilidade criminal imputada.

As ações de apropriação aferem-se pela verificação das folhas de salários e pertinentes livros da empresa tendente à apuração do débito e constatação do não-recolhimento, não havendo necessidade de minucioso levantamento contábil relativo a cada mês de incidência da contribuição social.

O tipo penal requisita para o seu aperfeiçoamento a arrecadação e, destarte, o desconto do valor da contribuição na remuneração dos empregados, conseqüentemente resolvendo-se em apropriação indébita a conduta de omissão dos recolhimentos.

O delito do artigo 95, "d" da Lei 8.212/91 e agora 168-A do Código Penal se me depara como de apropriação indébita, apenas ocorrendo de o legislador optar pela descrição do fato punível através do modo normal de inversão da posse na hipótese, correspondente à negativa de reversão dos valores arrecadados aos cofres públicos.

Entretanto, os pressupostos de seu aperfeiçoamento não necessitam ser procurados além do fato do débito não recolhido e as escusas da defesa devem ser entendidas e tratadas em consideração à economia estrutural do crime.

A procura no caixa da empresa do valor objeto de apropriação antes do recebimento dos salários é operação incompatível com as singularidades da espécie delitiva, eis que o objeto material do delito corresponde a um valor pecuniário que se individualiza no momento em que os salários são pagos com os descontos das contribuições sem a contrapartida do devido recolhimento.

A atividade econômica é feita de mecanismos de longo alcance e de correspondentes estratégias empresariais. Os verdadeiros resultados econômicos se expressam ao longo de períodos maiores e não é a verificação da exata relação entre receitas e despesas em cada mês de competência que vai decidir da existência ou não de apropriação. Pagos os salários com os descontos e omitidos os recolhimentos das contribuições, tem-se como suficientemente provada a apropriação de valores.

Destarte, provada a conduta de arrecadação e falta dos recolhimentos, é lícito concluir que os valores originariamente pertencentes aos empregados e por eles vertidos para destinação à Previdência Social foram retidos pela empresa e definitivamente incorporados ao seu patrimônio ou utilizados como capital de giro, em qualquer caso havendo o escopo e a consecução de resultados de ilícito locupletamento, ressalvado que, para que se infirme a vontade de apropriar-se, não basta a esperança ou a probabilidade de restituir, sendo imprescindível a certeza de poder restituir, consoante o magistério de Magalhães Noronha inserto em seu "Direito Penal", vol. 1, 23a. Ed., p.335, despido de interesse não sendo anotar as circunstâncias da reiteração das condutas puníveis, que desacreditam cabalmente a hipótese de ausência de dolo de apropriação.

Os fatos alegados também não caracterizam a causa de licitude do estado de necessidade ou a excludente da culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa.

Dificuldades financeiras por problemas de mercado ou injunções da política econômica do país fazem parte do modo de ser ordinário da atividade empresarial e percalços e vicissitudes comuns no funcionamento das empresas são fatos em si mesmos insuficientes para descaracterizar a ilicitude do fato ou a culpabilidade do agente.

Ademais, da primeira figura não há se cogitar também tendo em vista a evitabilidade do suposto perigo por outros meios, por outro lado não se patenteando a inexigibilidade de conduta diversa ainda em virtude da consideração de que a invocada causa supralegal de exclusão da culpabilidade assenta na anormalidade do elemento volitivo, daí deparar-se inaceitável o pensamento de sua incidência na espécie, pois a atividade criminosa perdurou por período suficiente para que o agente recuperasse a capacidade de determinação normal e imune de defeitos.

Tecnicamente a questão é esta: a apropriação dos valores das contribuições absolutamente não desponta no conjunto processual como o único e exclusivo meio de se propiciar a continuidade do funcionamento da empresa, daí a ilicitude do fato e também a exigibilidade de conduta diversa e a caracterização da culpabilidade do agente. Do ponto de vista moral a fórmula é esta: ficar menos rico, sofrer reduções no patrimônio individual ou repassar o prejuízo à coletividade. Positivamente são estes os interesses que informam a conduta praticada. Lesar o interesse público apropriando-se de valor de contribuição de que se era mero depositário não era a única conduta que possibilitava prover o necessário para manter-se o funcionamento da empresa. Era, sim, mais vantajosa do que a redução dos lucros.

No caso houve conduta de apropriação dos valores das contribuições que originariamente integram a remuneração do trabalho assalariado e que pelos segurados empregados são vertidos para destinação à Seguridade Social em longo período, a circunstância da reiteração das ilicitudes convencendo de que foi a conduta praticada com finalidades de ilícito locupletamento, intenções de pagamento quando muito expressando mera subjetividade de arrependimento que não exclui o dolo.

A autoria da acusada Francisca Maria Florio Di Basio restou devidamente comprovada, porquanto, além de sua figuração no contrato social, estava presente quando da fiscalização desenvolvida na empresa, firmando as notificações fiscais de lançamento de débito e os autos de infrações, revelando-se, assim, sua efetiva responsabilidade na gestão da sociedade.

A autoria do corréu João Domingos Florio Di Basio também se comprova por sua condição de sócio da empresa com poderes de gerência, consoante contrato social acostado às fls. 237/254, suposta mecânica de divisão de tarefas absolutamente não obstaculizando o conhecimento dos fatos, ademais graves o bastante para não serem praticados à revelia de qualquer sócio administrador, cabendo anotar ainda a circunstância de se tratar de negócio familiar em que ordinariamente os assuntos de interesse da empresa, mormente quando envolvem problemas e dívidas, são conhecidos de todos os administradores.

Neste contexto, tendo pleno domínio sobre o fato delituoso e a respeito dele nada fazendo deve também o acusado ser penalmente responsabilizado.

Sob o tema, trago à luz o comentário de Henrique Herkenhoff sobre a caracterização do sujeito ativo do crime de apropriação indébita previdenciária com o qual ponho-me inteiramente de acordo:


"(...) há uma presunção homnis de que o sócio-administrador tem conhecimento tanto do desconto quanto da obrigatoriedade do recolhimento, bastando que também ele se omita, por exemplo, da inércia do co-gerente a quem, em princípio, caberia tal providência; tratando-se de crime omissivo, todos quantos tomaram conhecimento do desconto e tinham poderes para determinar o recolhimento - e, portanto, o dever legal de agir - haverão contribuído com a sua omissão, e incidem nas penas cominadas."
(in Novos Crimes Previdenciários - Modificações no Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 12 - grifei).

No mesmo sentido, a jurisprudência:


"PENAL - ADMINISTRADORES - RESPONSABILIDADE - AUTORIA - DOMÍNIO DO FATO - CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS - FALTA DE RECOLHIMENTO NATUREZA - DIFICULDADES FINANCEIRAS - ÔNUS DA PROVA - TESTEMUNHAS. 1. A responsabilidade penal é sempre subjetiva. Os crimes praticados na pessoa jurídica ou por meio dessa somente podem ser punidos através da apuração da responsabilidade individual dos seus mandatários, desde que comprovada a sua efetiva participação nos fatos. A responsabilidade penal dos administradores pode resultar tanto de haverem praticado o fato delituoso quanto de haverem permitido que ele ocorresse, se tinham a obrigação e a possibilidade concreta de evitá-lo - é dizer, se tinham o domínio do fato, como acontece, de regra, nas empresas familiares em que todos os sócios detêm amplos poderes de administração. (...)"
(ACr 96.04.54456-0/RS, TRF da 4ª Região, Primeira Turma, Unânime, Relator Desembargador Federal Amir Sarti, DJ 16/12/98, p. 285 - grifei).

Em todos os seus pressupostos de constituição provado o delito e comprovada a autoria imputada aos acusados, mantém-se a condenação da acusada Francisca Maria Florio Di Biasio e impõe-se o veredicto condenatório do acusado João Domingos Florio Di Biasio, descabido o perdão judicial em face do valor do débito de R$ 21.401,27 (vinte e um mil e quatrocentos e um reais e vinte e sete centavos), já à época do oferecimento da denúncia.
Mantém-se as penas da acusada Francisca Maria Florio Di Biasio aplicadas no mínimo legal e o valor unitário fixado em 1/30 do salário do salário mínimo.
Com o parcial decreto de extinção da punibilidade modifica-se o aumento da continuidade delitiva elevando-se as penas em 1/6 em razão do critério da quantidade de infrações encadeadas com ajustes para os delitos da espécie, não se aplicando o critério jurisprudencial integralmente em sua fórmula original a fim de se evitar resultados de desproporção da pena com a gravidade em tese do delito, que por sua natureza tende a se repetir porque a cada mês dada novamente a ocasião para o cometimento, de modo a impor-se avaliação de menor rigor.
Quanto ao acusado João Domingos Florio Di Biasio, ausentes causas de aumento ou diminuição, ficam as penas definidas no mínimo legal, o valor unitário fixado em 1/30 do salário do salário mínimo e incidindo a causa de aumento da continuidade delitiva no percentual mínimo.
Ressalvo que não reconheço a atenuante da confissão espontânea que como tal somente se configura quando amplamente admitida a responsabilidade pelo delito, não sendo este o caso em que apenas os acusaddos admitem o não recolhimento dos valores mas negam o dolo e/ou a culpabilidade com suas alegações de dificuldades financeiras, além do que impossibilita-se o benefício porquanto fixada a pena-base no mínimo legal, em respeito ao sistema do Código Penal, que só admite a fixação da pena em quantidade inferior ao mínimo previsto quando incidente causa de diminuição.
Assim reiteradamente vem decidindo o E. STJ: REsp 217624, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, j. 08/08/2000, DJ 18/09/2000; REsp 439751, Rel. Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma, j. 05/11/2002, DJ 03/02/2003; HC 42002, Rel. Ministro Paulo Medina, 6ª Turma, j. 18/10/2005, DJ 12/12/2005; HC 83146, Rel. Ministra Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 27/03/2008, DJ 22/04/2008; HC 131854, Rel. Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, j. 05/08/2010, DJ 23/08/2010.
Orientação reiteradamente adotada, editou o Tribunal Superior a Súmula 231:

"A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal".

Pacífica também é a jurisprudência desta Corte na matéria: ACR 27133, Rel. Juiz Federal Convocado Sílvio Gemaque, 1ª Turma, j. 10/08/2010, DJ 20/08/2010; ACR 41346, Rel. Juíza Federal Convocada Eliana Marcelo, 2ª Turma, j. 14/09/2010, DJ 23/09/2010; ACR 23523, Rel. Desembargadora Federal Ramza Tartuce, 5ª Turma, j. 29/11/2010 DJ 03/12/2010.
Do mesmo modo tratam a questão as demais Cortes Regionais Federais: TRF1, ACR 200534000351164, Rel. Desembargador Federal Carlos Olavo, 3ª Turma, j. 17/08/2010, DJ 03/09/2010; TRF2, ACR 7129, Rel. Desembargador Federal Messod Azulay Neto, 2ª Turma, j. 13/04/2010; TRF4, ACR 00067368720074047001, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, 8ª Turma, j. 02/06/2010, DJ 11/06/2010; TRF5, ACR 7017, Rel. Desembargadora Federal Danielle de Andrade e Silva Cavalcanti, 4ª Turma, j. 02/02/2010, DJ 24/02/2010).
Torrencial a jurisprudência, só pela força dos precedentes justifica-se a aplicação da orientação adotada.
Convém frisar que toda a argumentação que se faz na linha de oposição mais não traduz do que a mera possibilidade de uma interpretação diferente do direito na questão, não absolutamente suposto conflito com o direito vigente, mormente em grau superior de convencimento para justificar a preterição de um entendimento sumulado pelo Tribunal Superior.
E outro não poderia ser o enquadramento da iniciativa da defesa porque se é possível, sem manifesta transgressão às regras de interpretação, sustentar a tese contrária, o mesmo verifica-se quanto à orientação triunfante na jurisprudência.
Nenhuma das teses em confronto é invulnerável, a sustentada pela defesa também tem seus pontos fracos.
Falar em violação aos princípios da individualização da pena, da proporcionalidade e da culpabilidade não é, para mim, uma argumentação forte e convincente, já porque semelhante efeito teoricamente poderia ocorrer também na primeira fase da dosimetria, a saber, na situação em que as circunstâncias judiciais não somente não fossem desfavoráveis mas fossem mesmo meritórias. Por outro lado, pressuposto que estamos interpretando e aplicando a lei vigente e nenhum projeto de reforma e que suposto teor literal do vocábulo empregado pelo legislador (diz-se na doutrina que "atenuar não é eliminar") não é elemento infalível e ainda que fosse então ao menos poder-se-ia reduzir a pena até um dia, já que então "espantado o fantasma da pena zero", é lícito concluir que, a ser levada a suas últimas conseqüências pode tal ordem de fundamentação, por sua lógica, conduzir até à conseqüência da aplicação de pena nenhuma, ou ao menos praticamente nenhuma, em última análise tergiversando-se na questão da vontade da lei na delimitação da área reservada à atuação jurisdicional e argumentando-se como se esta última pudesse se sobrepor ou mesmo anular a primeira.
Destarte, ficam as penas dos acusados João Domingos Florio Di Biasio e Francisca Maria Florio Di Basio definidas em dois anos e quatro meses de reclusão e onze dias-multas.
Quanto à pena substitutiva de prestação pecuniária fixada na sentença para a acusada Francisca Maria Florio Di Basio no montante de dez mil reais, a meu juízo depara-se desproporcional a gravidade do delito, razão pela qual a substituo pela entrega de uma cesta básica mensal a favor da Associação de Apoio à Criança com Câncer pelo período da condenação.
Considerando a ausência de circunstância judicial desfavorável ao acusado João Domingos Florio Di Biasio a justificar a fixação de regime mais gravoso, fica estabelecido o regime aberto para início de cumprimento de pena, na forma do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.
Presentes os requisitos da Lei 9.714/98, substituo a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, consistente também na entrega de uma cesta básica mensal a Associação de Apoio à Criança com Câncer pelo período da condenação.
Observo que a prestação pecuniária ora fixada não viola o critério da capacidade econômica e ainda adequando-se às finalidades de reprovação e prevenção do delito alguma dose de sacrifício pessoal além da perda representada pela mera redução patrimonial.
Custas a cargo do réu (artigo 804 do Código de Processo Penal).
Com o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados.

Por estes fundamentos, de ofício declaro extinta a punibilidade do delito pela prescrição da pretensão punitiva estatal quanto aos fatos praticados nos períodos de junho de 2002 a janeiro de 2003 e março de 2003 a julho de 2006, com redução do acréscimo da continuidade delitiva, e, quanto ao período remanescente, dou provimento ao recurso da acusação para condenação de João Domingos Florio Di Biasio pelo crime dos artigos 168-A, §1º, I c.c 71 do Código Penal e dou parcial provimento ao recurso da defesa da acusada para substituição da prestação pecuniária, nos termos supra.

É o voto.


Peixoto Junior
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): OTAVIO PEIXOTO JUNIOR:10032
Nº de Série do Certificado: 31228EF05ED000E6
Data e Hora: 29/10/2013 15:26:08