D.E. Publicado em 04/11/2013 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento parcial à apelação Apelação para manter a condenação de Gilberto Bispo como incurso nas penas do artigo 334, § 1º, "c", do Código Penal e reduzir a pena para 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão, no regime aberto, substituindo-a por duas restritivas de direitos consistentes em: a) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, assistencial ou filantrópica, a critério do Juízo das Execuções Penais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelação criminal interposta pelo réu Gilberto Bispo contra sentença que o condenou pela prática do crime previsto no artigo 334, § 1º, "c", do Código Penal.
Narra a denúncia (fls. 02/04) que o apelante, em 05 de julho de 2001, internalizou em território nacional cigarros de procedência estrangeira sem a devida documentação e autorização legal. Na oportunidade, agentes da polícia federal abordaram um veículo Kombi e surpreenderam Aristides Simões e Devair Aparecido Leme transportando cigarros sem a devida documentação, todos pertencentes a Gilberto Bispo, o qual acompanhava o veículo em sua motocicleta. Apreendidas as mercadorias pelos Policiais Federais, estes foram informados pelo próprio apelante acerca de outros cigarros acondicionados na sua residência e ferro-velho. Foi realizada, no momento, a prisão em flagrante dos 03 (três) sujeitos.
A denúncia, oferecida contra Gilberto Bispo e Devair Aparecido Leme, foi recebida em 17/10/2001 (fl. 105).
No curso do processo, o réu Devair veio a falecer (fl. 329).
Às fls. 366/369 foi proferida sentença, publicada em 26.03.2010, condenando o apelante à pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, no regime de cumprimento inicial semi-aberto, como incurso nas penas do artigo 334, § 1º, "c", do Código Penal.
Às fls. 375/381 o apelante interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese: a) incompetência da Justiça Federal para processar o feito; b) desconhecimento, por parte do apelante, de que os cigarros foram importados sem pagamento de tributos; c) perseguição do Fisco e da Polícia estatal; d) pena base exasperada indevidamente, sobremaneira pela consideração indevida de maus antecedentes. Ao final, requer sua absolvição.
O Ministério Público Federal apresentou suas contrarrazões (fls. 417/425) e requereu a manutenção da condenação.
Em parecer (fls. 430/434), a Procuradoria Regional da República opina pelo desprovimento do recurso. Às fls. 455/458, a Procuradoria Regional da República pugna pela não aplicação do princípio da insignificância e, ao fim, pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Em primeiro, insurge-se o apelante contra o processamento do feito perante a Justiça Federal.
A esse respeito, assevero que a competência da Justiça Federal é definida em razão da matéria, critério este de ordem absoluta, o que implica dizer que os crimes que atentam contra o interesse da União não são passíveis de processamento perante a Justiça Estadual.
O crime de contrabando e descaminho insere-se dentre as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, razão pela qual é processado na Vara Federal competente, qual seja, a que exerça jurisdição sobre o local de apreensão dos bens.
Nesse tocante, confira-se o teor da Súmula 151 do Superior Tribunal de Justiça:
Assim, sem mais sobre o assunto, afasto a alegação.
Pois bem.
Quanto à materialidade delitiva, esta é incontestável. Às fls. 13/15 consta auto de apresentação e apreensão das mercadorias (cigarros). Às fls. 109/110 consta laudo de exame merceológico dando conta do valor das mercadorias e de sua condição alienígena. Às fls. 111/116 consta Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal relativo às mercadorias apreendidas.
Nesse tocante, friso, de forma a espancar alegações do gênero, que os fatos narrados na inicial correspondem ao crime de descaminho quanto à internalização no país de cigarros cuja comercialização no Brasil é permitida e, também, ao crime de contrabando, já que foram importados cigarros cuja comercialização é proibida, o que se infere da análise do Registro de Produto Fumígeno - Relação de Marca de Cigarros - Ano de 2013 - ANVISA (http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/fc7ae1004d2d1476aed7fe4031a95fac/Marcas+de+Cigarros_2013-08-20.pdf?MOD=AJPERES).
Nesse sentido:
Ressalto, como bem salientado pela Procuradoria da República, que a comercialização, no Brasil, de cigarros importados, depende do cumprimento de uma série de requisitos legais. Transcrevo, para fins ilustrativos, trecho do parecer da Procuradoria da República acostado às fls. 455/458.
A corroborar o quanto sobredito, o artigo 47 da Lei 9.532/97 é enfático:
Da acurada análise da legislação de regência, extrai-se, indubitavelmente, que o legislador criou uma série de limitações à importação de fumígenos, com uma razão de ser bem definida.
Com efeito, essas restrições estão insertas em uma política de Estado que visa, a partir da certeza da procedência dos cigarros estrangeiros, proteger a saúde pública. As exigências legais acabam por garantir minimamente um controle de qualidade apto a evitar malefícios além daqueles já inerentes ao uso do tabaco.
Essas regras, portanto, devem ser estritamente observadas. O descumprimento de tais preceitos, conseqüentemente, é crime e, como tal, deve ser coibido e punido pelo Estado.
O fato é que, no caso, não foram cumpridos nenhum dos requisitos necessários à importação regular de cigarros, o que configura como criminosa a conduta narrada na inicial. Isso sem contar que os cigarros importados se destinavam à venda, subsumindo-se os fatos à conduta descrita no artigo 334, § 1º, "c", do Código Penal.
Assim, por destinarem-se os cigarros à venda e não haver nos autos qualquer prova no sentido de que foram regularmente importados, com submissão à tributação fiscal, configurado está o descaminho, além do contrabando com relação àqueles cuja comercialização no Brasil não foi chancelada pela ANVISA.
A autoria também está provada nos autos. Em primeiro, frise-se que o apelante foi preso em flagrante decorrente da atuação da Polícia Federal no intento de flagrar o crime perpetrado (fl. 07/12).
Em sede policial, o acusado afirmou (fl. 10):
Sob contraditório, ratificou (fl. 153,v):
O Policial Federal ouvido judicialmente como testemunha apontou que (fl. 278):
A testemunha de defesa Aristides Simões trouxe aos autos que (fl. 326):
Observa-se, pelo cotejo entre depoimentos, que todos estão em absoluta consonância. O apelante afirma que os fatos aconteceram, ou seja, que trouxe cigarros do exterior e que pretendia vendê-los. Afirma, também, que tinha um ferro velho, exatamente como o Policial Federal descreve os fatos, ou seja, que pegou o apelante em flagrante e que este último o levou ao seu ferro velho, local em que havia mais cigarros de origem estrangeira. A testemunha de defesa corrobora a prática delitiva perpetrada pelo apelante.
Assim, não há dúvidas de que o apelante é autor dos fatos, exatamente como apontado na denúncia.
E, portanto, é leviana a alegação da defesa de que o apelante teria sido perseguido pela Polícia e pelo Fisco. O que se colhe da prova dos autos é que os agentes estatais não fizeram mais do que cumprir, com eficiência, seus deveres de ofício, não havendo mais a considerar neste ponto.
De mais a mais, o dolo, igualmente, é manifesto. O apelante afirma que corriqueiramente adquiria cigarros no Paraguai e os revendia na cidade de José Bonifácio/SP e região. É de clareza solar, portanto, que sabia muito bem das circunstâncias que envolviam as condutas que perpetrava e que tinha pleno conhecimento de que os tributos devidos não estavam sendo recolhidos.
Aliás, conforme exposto alhures, o apelante sequer poderia importar cigarros sem constituir pessoa jurídica para tal e sem submeter-se à legislação que rege a importação de produtos fumígenos.
O apelante não negou os fatos e suas intenções, deixando clara a trama delitiva. Por óbvio que tinha plena consciência da ilicitude da conduta, bem como acerca da ausência de recolhimento dos impostos devidos. Portanto, está configurado o dolo do apelante, tornando-se desnecessárias maiores digressões sobre o tema.
Prossigo.
A Procuradoria Regional da República, no parecer de fls. 455/458, menciona o princípio da insignificância, pugnando pela não aplicação ao caso por tratar-se de contrabando de cigarros. Sustenta sua argumentação afirmando que "o comércio ilícito de produtos de tabaco liga-se não só à tutela da Administração Pública, mas também à preservação da saúde pública, não sendo matéria limitada meramente ao campo da tributação".
Todavia, deixo de aplicar o princípio da insignificância, mas por fundamento diverso.
Esse Tribunal Regional Federal da 3ª Região já aplicou o princípio da insignificância em situações como a vertente. Ademais, como o artigo 1º da Portaria nº 75/2012 do Ministério da Fazenda atualizou o valor das execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), tem-se considerado este como o valor limite para a aplicação do princípio da insignificância.
Ademais, ainda que algumas das marcas dos cigarros apreendidos não possuam registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, não há óbice à aplicação do princípio da insignificância (o limite de dez mil reais nos julgados abaixo foram considerados antes da Portaria do Ministério da Fazenda, editada no ano de 2012).
No caso dos autos, todavia, o montante de impostos devidos supera o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), uma vez que totaliza R$ 34.048,26 (trinta e quatro mil, quarenta e oito reais e vinte e seis centavos), conforme consta na planilha de fl. 450, pelo que, pelas razões dantes expostas, não é cabível a aplicação do princípio da insignificância.
Desse modo, passo à análise da dosimetria da pena.
A defesa insurge-se contra a aplicação dos maus antecedentes como causa de aumento de pena.
A pena-base, considerando-se os antecedentes criminais relativos a um processo transitado em julgado e outro em andamento (sentença, fl. 369), foi fixada em dois anos e meio de reclusão.
Todavia, é entendimento pacificado, a teor do verbete da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, que "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base".
Assim, o aumento da pena-base, in casu, mostra-se exacerbado, devendo a pena ser reduzida, sobremaneira tendo em vista que as demais circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal não indicam necessidade de elevação.
Assim, fixo a pena-base em 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão.
Afasto, ex officio, a multa aplicada pelo Juízo monocrático ante a ausência de previsão legal.
Não há agravantes ou atenuantes a considerar, tampouco causas de aumento ou diminuição.
Fixo, como regime inicial de cumprimento de pena, o aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal, pois não vislumbro, pela análise das circunstâncias judiciais do artigo 59, necessidade de fixação de regime de pena mais gravoso.
Substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em: a) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, assistencial ou filantrópica, a critério do Juízo das Execuções Penais; b) limitação de final de semana, ambas pelo prazo da condenação.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para manter a condenação de Gilberto Bispo como incurso nas penas do artigo 334, § 1º, "c", do Código Penal e reduzir a pena para 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão, no regime aberto, substituindo-a por duas restritivas de direitos consistentes em a) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, assistencial ou filantrópica, a critério do Juízo das Execuções Penais; b) limitação de final de semana, ambas pelo prazo da condenação.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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