D.E. Publicado em 18/06/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo e, de ofício, reconhecer a incidência da atenuante da confissão espontânea, mantida a pena no mínimo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Cuida-se de Ação Penal Pública fundada em denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra CESAR AUGUSTO TEIXEIRA, pela prática do crime definido no art. 273, §1º e §1º-B, do Código Penal.
Consta da denúncia (fls. 221/223) que, no dia 18 de setembro de 2007, em cumprimento a um mandado de busca e apreensão expedido no bojo da Operação Placebo, o réu foi autuado em flagrante delito, em sua residência, onde mantinha diversos medicamentos sem registro na ANVISA, destinados à venda e sem autorização para a armazenagem e comercialização.
Narra, ainda, a peça acusatória que no caso do medicamento Oxandrolona, foi constatada a ausência do princípio ativo e, no caso do medicamento Lipostabil, não foi verificada a presença de diacilglicerofosfatidilcolinas.
A denúncia foi recebida em 14 de novembro de 2008 (fl. 224).
Regularmente processado o feito, sobreveio a r. sentença de fls. 379/380, por meio da qual a i. magistrada a quo julgou procedente a pretensão estatal, para condenar o réu como incurso nas penas do art. 273, §1º e §1-B, do Código Penal, imputando-lhe a pena de 10 (dez) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Em suas razões recursais (fls. 397/415), o réu sustenta, preliminarmente, a inépcia da denúncia e a inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273, do Código Penal, por violação aos princípios da proporcionalidade e da ofensividade.
No mérito, sustenta a ausência de demonstração da autoria, bem como a impossibilidade de condenação com base exclusivamente nos elementos de convicção coligidos em sede inquisitorial.
Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República apresentou contrarrazões e parecer, em peça única, pelo desprovimento do recurso da defesa e manutenção da sentença condenatória (fls. 417/422).
Às fls. 430/439, 446/455, 465/473 e 476/482 foram juntados, respectivamente, o Laudo de Exame de dispositivo de Armazenamento Computacional (PEN DRIVE) nº. 1721/2010- NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, o Laudo de Exame de dispositivo de Armazenamento Computacional (Disco Rígido) nº. 1646/2010- NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, o Laudo de Exame de dispositivo de Armazenamento Computacional (Disco Rígido) nº. 2026/2010- NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP e o Laudo de Exame de dispositivo de Armazenamento Computacional (Disco Rígido) nº. 1857/2010- NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP.
Regularmente intimada, a defesa quedou-se silente sobre os referidos documentos, enquanto o Parquet Federal manifestou-se às fls. 460 e 492.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Consoante se depreende do Relatório, imputa-se ao réu a prática da conduta descrita no art. 273, §§ 1º e 1º-B, do Código Penal:
Cuida-se de crime formal, já que prescinde da efetiva ocorrência do dano a alguém. O objeto material do crime é o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Por sua vez, o objeto jurídico é a saúde pública.
Trata-se de crime do tipo misto alternativo na medida em que a prática de uma ou mais condutas, desde que inseridas no mesmo contexto, implica sempre num delito único.
Dos Fatos
Extrai-se da exordial que:
Diante desse contexto, o Ministério Público Federal denunciou o réu pela prática do delito previsto no art. 273, §1º e §1-B, do Código Penal.
Da Alegação de Inconstitucionalidade
Em suas razões recursais, aduz a defesa que o art. 273 do Código Penal impõe uma sanção excessivamente severa, razão pela qual deveria declarada inconstitucional a norma e absolvido o réu.
A despeito dos argumentos expendidos, verifico que a alegação de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal não pode ser acolhida.
Com efeito, já houve o julgamento pelo Órgão Especial desta E. Corte, referente à Argüição de Inconstitucionalidade quanto ao preceito secundário do art. 273 do Código Penal.
Na ocasião, por maioria, foi rejeitada a Arguição de Inconstitucionalidade nº 0000793-60.2009.4.03.6124, nos seguintes termos:
Dessa forma, cumpre à Primeira Turma, órgão fracionário deste Tribunal, nos termos do artigo 97 da Constituição, adotar a referida orientação.
Da Materialidade
A materialidade do delito restou sobejamente demonstrada.
O auto de apreensão de fls. 21/23 aponta que foram encontrados na residência do réu, dentre outros itens:
- 11 (onze) caixas do remédio HEMOGENIN de 50 mg. fechadas;
- 13 (treze) caixas do remédio DEPOSTERON de 200 mg. fechadas;
- 04 (quatro) caixas do remédio ESTANOZOLOL de 50 mg. abertas;
- 04 (quatro) caixas do remédio STANOZOLAND de 10 mg. abertas;
- 06 (seis) caixas do remédio DESOBESI-M de 25 mg. fechadas;
- 20 (vinte) cartelas do remédio BRONTEL, contendo 10 comprimidos cada;
- 04 (quatro) vidros do remédio EQUIPOISE de 10ml. fechados;
- 02 (duas) caixas do remédio RITALINA de 10 mg. fechadas;
- 01 (uma) caixa do remédio PRAMIL SILDENAFIL de 50 mg. aberta;
- 01 (uma) caixa do remédio LIPOSTABIL contendo 5 ampolas de 5ml. aberta;
- 01 (uma) caixa do remédio CLORIDRATO DE SIBUTRAMINA MONOIDRATADO de 15 mg. fechada;
- 01 (uma) caixa do remédio MARAX fechada;
- 02 (duas) caixas do remédio DUALID'S de 75 mg. fechada;
- 01 (uma) caixa do remédio ALPRAZOLAM de 0,5 mg. fechadas;
- 01 (uma) caixa do remédio CICLO-6 de 10 ml. aberta;
- 01 (um) frasco do remédio OXANDROLONA de 10 mg. aparentemente de manipulação fechado;
- 27 (vinte e sete) caixas do remédio DECA DURABOLIN de 50 mg. fechadas;
- 04 (quatro) caixas do remédio DURATESTON contendo uma ampola de 1ml. cada.
No Laudo de Exame de Produto Farmacêutico nº. 4383/2007 restou destacado que:
O Laudo de Exame em Produto Farmacêutico nº 0446/08 - INC (fls. 161/165) atesta que:
Consigne-se que o fiscal da ANVISA presente no momento do flagrante declarou perante a autoridade policial (depoimento confirmado em Juízo - mídia de fl. 321) que:
Por conseguinte, resta evidenciada a irregularidade da manutenção em depósito dos medicamentos destinados à venda, em desconformidade com a legislação sanitária vigente.
Ressalto ainda que os medicamentos não apresentavam qualquer identificação que pudesse comprovar sua procedência.
Comprovada, portanto, a materialidade, nos termos do art. 273, §1º e §1º-B do Código Penal.
Da Autoria
A autoria delitiva é incontroversa, já que a apreensão dos medicamentos decorreu do cumprimento de mandado de busca e apreensão, no endereço onde residia o acusado.
Embora tenha confessado a prática delitiva perante a autoridade policial (fls. 09/11), o réu alterou sua versão dos fatos no interrogatório judicial. No entanto, as alegações em Juízo, além de carecerem de verossimilhança, não encontram arrimo nas demais provas produzidas.
Senão vejamos.
À fl. 320, foi ouvido Rodrigo Abrão Veloso Taveira, fiscal da ANVISA, que confirmou o depoimento prestado perante a autoridade policial (fls. 06/07) e assim respondeu às perguntas formuladas pela acusação:
As testemunhas arroladas pela defesa, ouvidas na audiência realizada em 06/08/2009, afirmaram, em síntese que conheceram o réu em academias, que treinaram juntos e que presenciaram o acusado oferecendo medicamentos para terceiros, nem foram pessoalmente abordados com propostas dessa natureza (mídia fl. 330).
A testemunha Sabbato de Ângelo Pagliuca trabalhou com o acusado em uma equipe de segurança em casa noturna, entre sete e cinco anos antes. Durante o período em que trabalharam juntos, nunca presenciou o réu oferecendo medicamentos a terceiros ou recebeu esse tipo de oferta.
Não se olvida que na esfera judicial o apelante negou a prática delitiva. No entanto, a versão trazida na fase judicial está em total dissonância com as demais provas produzidas nos autos, revelando ser fato isolado, sem qualquer respaldo probatório.
Em Juízo, o réu afirmou que apenas estava em posse dos medicamentos porque realizaria a tradução das bulas e que a nota de culpa foi-lhe entregue já confeccionada pelos policiais federais, sem que sequer tivesse sido colhido o seu depoimento.
Tal versão, todavia, não é convincente e restou absolutamente isolada, sendo certo que sequer a noiva do réu, com quem coabitava à época dos fatos e que foi ouvida como informante, confirmou tais alegações.
Como bem asseverou o Juízo a quo:
Não é demais apontar que os laudos da perícia realizada no equipamento informático apreendido na residência do réu confirmam que o acusado realizava transações comerciais dos medicamentos apreendidos em sua residência, conforme se verifica dos e-mails trocados com terceiros, planilhas de pedidos, compras e preços e material publicitário.
Com efeito, os laudos nº. 1721/2010, nº. 1646/2010, nº. 2026/2010 e nº. 1857/2010, de fls. 430/439, 446/455, 465/473 e 476/482, indicam que os dispositivos de armazenamento analisados (Pen Drive e discos rígidos dos computadores apreendidos na residência do réu) continham arquivos de planilhas com a descrição dos medicamentos indicados na denúncia, uso e preços de comercialização, a exemplo da planilha reproduzida à fl. 433 (arquivo denominado "PREÇO PARA REVENDA_FITNESS.xls").
Comprovada, portanto, a autoria.
Dosimetria
O apelante foi condenado à pena privativa de liberdade fixada em 10 (dez) anos de reclusão e multa de 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, por infração ao artigo 273, §1º e §1º-B, do Código Penal.
Conforme se depreende da leitura da decisão recorrida, o Juízo de 1º grau cumpriu o escopo constitucional inserto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, fundamentando, à saciedade, os motivos de fato e de direito que resultaram na condenação da ré.
Inicialmente, na primeira etapa da dosimetria da pena, inexistindo circunstância judicial desfavorável, a pena base foi mantida no mínimo legal. Assim, a pena-base restou fixada em 10 (dez) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
Na segunda fase, não foram consideradas quaisquer agravantes ou atenuantes.
O Juízo a quo deixou de reconhecer a atenuante da confissão espontânea.
Cabível o reconhecimento, de ofício, da incidência da referida atenuante.
Extrai-se dos autos que o Juízo de 1º grau alicerçou a sentença condenatória, dentre outros elementos, na confissão do acusado (fl. 379/v).
A confissão do réu, porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de fatores externos, autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, inclusive porque foi utilizada como um dos fundamentos da condenação.
Nesse sentido:
Ademais, o fato de o acusado somente ter confessado após ser preso em flagrante não tem o condão de afastar o reconhecimento da atenuante, direito subjetivo do réu que confessa os fatos, inclusive porque expressamente utilizada para a formação do convencimento do julgador.
Nesse sentido, decisão do Superior Tribunal de Justiça:
Todavia, conquanto deva ser reconhecida a atenuante da confissão espontânea, não admitida na sentença apelada, tal reconhecimento não influirá na definição da pena que não pode ficar aquém do mínimo, consoante preconizado na Súmula 231 do STJ.
Na terceira fase, inexistem quaisquer causas de aumento ou diminuição.
Assim, a pena fica definitivamente fixada em 10 (dez) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
Quanto ao regime inicial para cumprimento da pena, o magistrado sentenciante, determinou o regime fechado, com esteio no art. 33, §2º "a" do Código Penal.
Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, pois o recorrente foi condenado à pena superior a 04 (quatro) anos de reclusão, não preenchendo os requisitos do art. 44 do Código Penal.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo e, de ofício, reconheço a incidência da atenuante da confissão espontânea, mantida a pena no mínimo legal, na forma acima fundamentada.
É como voto.
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