D.E. Publicado em 22/08/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso em sentido estrito para receber a denúncia, bem como para determinar a requisição das certidões de antecedentes criminais, determinando o envio dos autos ao Juízo de origem para regular processamento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):
O Ministério Público Federal, em 05/07/2013, denunciou DEMÉTRIO CARTA, LEANDRO FORTES, DINO MIRAGLIA FILHO e NILTON ANTONIO MONTEIRO, qualificados nos autos, nascidos aos 06/09/1933, 18/03/1966, 27/07/1959 e 12/03/1957, respectivamente, como incursos, por três vezes, no artigo 138, caput, do CP - Código Penal, com as duas causas especiais de aumento de pena previstas no artigo 141, incisos II e III, e ainda a agravante do artigo 61, inciso II, alínea "a', todos do Código Penal (fls. 288/299). Consta da denúncia:
Pela decisão de fls. 352/356, da lavra da MM. Juíza Federal Substituta Fabiana Alves Rodrigues e publicada em 28/08/2013, a denúncia foi rejeitada com fundamento no artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal, bem como indeferido o pedido de diligências.
Interpõe o Ministério Público Federal recurso em sentido estrito pedindo a reforma da decisão para que a denúncia seja recebida, bem como para que seja deferido o pedido de requisição de informações de antecedentes dos acusados (fls. 358/373).
Argumenta o recorrente com o caráter calunioso das reportagens veiculadas por DEMÉTRIO CARTA e LEANDRO FORTES, sustentando ser equivocada a decisão de entendeu que o fato narrado seria atípico em vista do caráter meramente informativo da reportagem, que não teria imputado o recebimento de vantagem indevida e que não teria indicado contrapartida dessa vantagem.
Sustenta o MPF que uma reportagem não deixa de ter cunho calunioso apenas porque utiliza um tempo verbal menos incisivo (teria recebido), se a expressão equivale-se, em desvalor calunioso, a "recebeu", se é isto o que se depreende do teor completo do artigo.
Argumenta também o recorrente que "a completa imputação ofensiva já foi formulada na capa da revista, alcançou todas as pessoas que a tenham visto, mesmo aquelas que nem mesmo leram o artigo". Sustenta que no crime do artigo 317 do CP o recebimento da vantagem é mero exaurimento do delito, e ainda que "nem mesmo foi esse o caso" pois "ao sentenciar, na capa, que "o valerioduto abasteceu Gilmar", é cristalino que a reportagem imputou ao ofendido o recebimento de vantagem indevida".
Argumenta também o MPF com a comprovação da falsidade do documento em que se embasou a reportagem, sustentando que "a pretexto de analisar a existência de justa causa para a deflagração da ação penal, assim entendido o lastro probatório mínimo que autoriza a persecução em juízo, a d. magistrada equivocadamente procedeu a verdadeira cognição exauriente, em verticalidade inteiramente incompatível com o momento processual".
Argumenta ainda o MPF que ao decidir que a denúncia não tem justa causa porque o documento com base no qual o ofendido foi acusado de corrupção não foi submetido à perícia, a decisão recorrida inverteu todo o sistema de proteção à honra, sustentando que "a quem faz a ampla divulgação da imputação de um crime é que incumbe demonstrar a veracidade da sua acusação, e não o contrário" e "por isso mesmo, o processo por crime de calúnia garante ao acusado a exceção da verdade".
Sustenta também que houve o arrolamento pelo MPF de inúmeros elementos de prova que demonstram a falsidade do único documento em que se fundamentaram as imputações caluniosas, além da indicação de várias circunstâncias e indícios que deixam patente o dolo dos acusados.
Aduz o recorrente que "há seriedade na acusação, isto é, há prova da materialidade e indícios de autoria dolosa a permitir a deflagração da ação penal por crime de calúnia" e que "o exame pericial demonstrando a falsidade material do documento seria exigível apenas caso se imputasse o crime de falsificação documental, o que simplesmente não é objeto da denúncia, como, aliás, deflui da leitura da exordial e é explicitado na cota introdutória"
Faz ainda o recorrente uma longa explanação sobre os indícios de falsidade do documento referido na denúncia, reiterando os argumentos expostos na inicial e refutando as conclusões da decisão recorrida.
Insurge-se o recorrente, por fim, contra o indeferimento de pedido de folhas de antecedentes dos acusados, sustentando que constituem elemento imprescindível à aplicação da pena, da qual incumbe ao magistrado velar, inclusive de ofício, e não elementos probatórios de interesse da acusação.
O denunciado DEMÉTRIO CARTA, que também assina MINO CARTA, apresentou contrarrazões (fls.383/394), aduzindo, em apertada síntese, que a reportagem da edições 708 e 709 da revista Carta Capital é assinada por LEANDRO FORTES, e portanto no que diz respeito à responsabilidade penal por supostas ofensas à honra, poderá responder apenas, em tese, pelas afirmações contidas no editorial da edição de nº 708, que assina, já que o editorial da edição 709 nada diz a respeito, dada a não recepção da Lei 5.250/1967 pela CF/1988, como assentado pelo STF na ADPF nº 130.
Argumenta ainda o denunciado MINO CARTA que a representação do ofendido limita-se às edições 708 e 709, e portanto não se há de cogitar de uma terceira edição, dada a ausência de representação. Sustenta que o documento em questão tinha autenticidade presumida pelo reconhecimento de firma em cartório, não havendo perícia que ateste o contrário, e o animus narrandi afasta o dolo, seja direto ou eventual.
Sustenta também o denunciado que a denúncia não esclarece quais foram as condutas que especificamente atribui a MINO CARTA, não sendo admissível imputar-se conduta omissiva de, como diretor da revista, não ter censurado a matéria redigida e assinada por LEANDRO FORTES.
O denunciado DINO MIRAGLIA FILHO também ofereceu contrarrazões (fls.408/502), aduzindo, em apertadíssima síntese, que apenas entregou o documento no Poder Judiciário; que não se pode saber se o documento é falso, pois não foi periciado; que não se pode atribuir dolo a quem apresenta documento com reconhecimento de firma; que apenas apresentou os documentos na defesa de seus clientes, a família de Cristiana Aparecida Ferreira; e que Nilton Monteiro é responsável pela documentação entregue, tendo o denunciado apenas juntado aos autos documentos entregues pelo cliente.
Argumenta também o denunciado com a ausência de narrativa de fato delituoso em relação a si; que o recebimento da lista se deu em razão da atuação no processo de Cristiana Ferreira; que o seu trabalho deu-se em defesa da liberdade de expressão; que recebeu a lista assinada pro Marcos Valério de NILTON MONTEIRO; que assumiu a defesa de NILTON MONTEIRO; que há equívoco do Ministro em tentar envolver o denunciado, advogado de trincheira; que há forças ocultas criminosas que infestam o poder de Minas Gerais.
Contrarrazões oferecidas pelo denunciado LEANDRO BOAVISTA FORTES às fls.523/544. Argumenta, em síntese, que a representação somente faz referência às edições 708 e 709, e que portanto a denúncia não poderia incluir uma terceira imputação, pois nos crimes contra a honra de ação pública condicionada, a representação estabelece os limite do objeto da acusação.
Argumenta também o denunciado que a denúncia não individualizou as condutas de LEANDRO FORTES e MINO CARTA, atribuindo a ambos, indistintamente, ter publicado falsas imputações de crime ao ofendido. Sustenta que o documento em questão tinha autenticidade presumida pelo reconhecimento de firma em cartório, não havendo perícia que ateste o contrário, o que afasta o dolo, seja direto ou eventual, havendo apenas o animus narrandi.
O denunciado NILTON ANTONIO MONTEIRO apresentou contrarrazões representado pela DPU - Defensoria Pública da União. Argumenta com a falta de justa causa para a ação penal, sustentando que incumbe à Acusação da prova da falsidade da lista, que constitui a própria tipicidade do delito em questão. Sustenta também que a informação jornalística é uma garantia fundamental do Estado de Direito, sendo de se afastar a tipicidade de condutas sindicadas como ofensivas à honra de outrem, mercê do ânimo meramente informacional do responsável pela divulgação da notícia. Por fim, argumenta que o denunciado nenhuma participação teve na prática da conduta nuclear do tipo penal do delito de calúnia.
A decisão foi mantida (fls. 558/559).
A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra da Dra. Samantha Chantal Dobrowski, opinou pelo provimento do recurso, determinando-se o recebimento da denúncia e o regular prosseguimento do feito (fls. 563/574).
É o relatório.
Dispensada da revisão, nos termos regimentais.
VOTO
O Juiz Federal Convocado MÁRCIO MESQUITA (Relator):
O recurso comporta provimento. A MM. Juíza a quo rejeitou a denúncia sob os seguintes argumentos (fls. 353/356):
A rejeição de denúncia foi mantida, sob os seguintes fundamentos (fls. 558/559):
Como se vê, embora a decisão recorrida tenha concluído pela regularidade formal da denúncia, esta foi rejeitada por entender a MM. Juíza a quo pela falta de justa causa, pelos seguintes fundamentos: a) os denunciados agiram ao abrigo da liberdade informação, pensamento e expressão, sendo o intuito meramente informativo; b) a Acusação não procedeu ao exame pericial do documento apontado como falso, ônus que lhe cabia, nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal; c) tratando-se de imputação de calúnia, não se prescinde que haja mínima demonstração de que o alegado fato criminoso imputado à vítima seja falso, não sendo suficientes ilações acerca da falsidade conteúdo da lista e da ciência desta falsidade por parte dos denunciados; d) não foi demonstrado que os denunciados tinham ciência da falsidade material da lista.
A denúncia encontra-se formalmente regular, e contém exposição clara e objetiva dos fatos ditos delituosos, com narração de todos os elementos essenciais e circunstanciais que lhes são inerentes, atendendo aos requisitos descritos no artigo 41 do Código de Processo Penal.
Os fatos descritos na denúncia evidenciam a ocorrência de fato típico, qual seja, a imputação falsa, pelos denunciados a Gilmar Ferreira Mendes, da conduta de receber vantagem indevida em razão de exercício do cargo público de Ministro do Supremo Tribunal Federal, fato esse tipificado no artigo 317 do Código Penal (crime de corrupção passiva).
A denúncia individualizada pormenorizadamente a conduta de cada um dos denunciados, apontando as frases constantes da edição 708 da revista Carta Capital que imputam ao ofendido a conduta referida, na capa e em matéria assinada por LEANDRO, e ainda no editorial assinado por DEMÉTRIO; e indica das razões pelas quais se pode concluir pela falsidade da lista mencionada na reportagem e do conhecimento dessa falsidade pelos denunciados, e a finalidade de diminuir a autoridade do ofendido na sua condição de Ministro do Supremo Tribunal Federal; bem como os trechos das reportagens nas edições posteriores.
Indica ainda a denúncia que o documento que embasou as reportagens foi falsificado pelo denunciado NILTON, que agiu em conluio com o denunciado DINO, que por sua vez divulgou os documentos, e também encaminhou cópias à revista, com a única intensão de propiciar a divulgação pela imprensa da imputação falsa de crime.
Quanto à fundamentação da decisão recorrida pela inexistência de animus caluniandi, mas apenas e tão somente animus narrandi, observo que, na fase inicial da ação penal vigora o princípio in dubio pro societate, cumprindo ao juiz a verificação da prova da existência do crime e indícios de autoria, bastando para o recebimento da denúncia a mera probabilidade de procedência da ação penal.
A rejeição da denúncia somente se justifica diante da absoluta ausência de indícios de autoria, flagrante atipicidade da conduta ou extinção da punibilidade, posto que se existente a prova indiciária, ainda que mínima, a dúvida deve ser resolvida, nesse momento processual, em favor da Acusação. Nesse sentido:
Dessa forma, a conclusão pela inexistência de animus caluniandi, mas apenas e tão somente animus narrandi por parte dos denunciados, ou seja, de que estes agiram com mera intenção de informar, e não de caluniar, nessa fase processual, somente seria possível se tal circunstância restasse extreme de dúvidas, constatável ictu oculi. Com a devida vênia, não é o que ocorre no caso dos autos.
É certo que, especificamente com relação à imprensa, a Constituição, em seu artigo 220, veda qualquer restrição à informação e qualquer forma de embaraço à liberdade de imprensa, e qualquer censura. É nítida portanto à relevância dada pela Constituição à liberdade de imprensa, dada a importância de uma imprensa livre para a concretização de um Estado verdadeiramente democrático. Quanto à isso, não há dúvida.
Contudo, isso evidentemente não exclui a possibilidade de responsabilização criminal, posto que a liberdade de imprensa não significa imunidade quanto à responsabilização por crimes contra a honra, na forma como tipificados no Código Penal. Nesse sentido situa-se, desde há muito, o entendimento do Supremo Tribunal Federal, reiterado após a declaração de não-recepção, pela Constituição de 1988, da Lei nº 5.250/1967 - Lei de Imprensa:
A denúncia indica elementos suficientes para que se afaste a conclusão, nessa fase processual, de inexistência de intenção de caluniar. O fato da reportagem indicar que o ofendido "aparece entre os beneficiários" da lista e que "teria recebido 185 mil", com a devida vênia não permite concluir, ao menos nessa fase processual, que "sequer se afirma que efetivamente houve o recebimento do numerário".
Ao contrário, a capa da revista Carta Capital, na edição 708, afirma peremptoriamente que "O valerioduto abasteceu Gilmar", estampando a foto do ofendido. Ou seja, afirma incondicionadamente, utilizando-se do pretérito perfeito, que o ofendido foi abastecido pelo valerioduto.
Ou seja, a revista não se limita a afirmar que o nome do ofendido consta em uma lista de pessoas que teriam recebido dinheiro, mas vai além, e faz um juízo de valor sobre a veracidade da informação contida na lista. Em seu editorial, reafirma o juízo sobre a veracidade da informação obtida na lista, ao concluir que disso decorre ser evidente a suspeição do Ministro.
Assim, estão presentes indícios suficientes de que os denunciados agiram com intenção caluniosa, o que é o que basta para o recebimento da denúncia que, repita-se, somente poderia ser rejeitada com base na conclusão de exclusivo animus narrandi caso este restasse extreme de dúvidas.
Quanto à fundamentação da decisão recorrida no sentido de que a Acusação não procedeu ao exame pericial do documento apontado como falso, ônus que lhe cabia, nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal, com a devida vênia, entendo equivocada.
É certo que, no crime de falsidade material, o exame pericial é em regra indispensável, salvo se a sua realização for impossível e a falsidade puder ser provada por outros meios.
Contudo, no caso dos autos, a denúncia imputa aos acusados o crime de calúnia, tipificado no artigo 138 do Código Penal, e não o crime de falsidade material. O crime de calúnia é de natureza formal, e portanto prescinde de qualquer exame pericial.
Da leitura da denúncia resta claro que não se está imputando aos denunciados o crime de falsidade material, o que ademais está expressamente dito na cota de oferecimento da peça: "O Ministério Público Federal esclarece não ser objeto do presente processo penal a falsificação do documento que fundamentou as reportagens contendo a falsa imputação de crime à vítima Gilmar Ferreira Mendes, a qual é alvo de procedimento próprio em Belo Horizonte/MG, onde ocorreu".
O fato criminoso que a denúncia indica ter sido falsamente imputado ao ofendido é ter recebido dinheiro de um esquema de corrupção, inclusive para facilitar a concessão de decisão judicial.
Ou seja, o fato criminoso que a denúncia indica ter sido falsamente imputado ao ofendido não é a falsificação da lista; esta circunstância é indicada na denúncia como comprobatória da presença do dolo, ou seja, de que os denunciados tinham plena consciência da falsidade da imputação.
Dessa forma, não é cabível a discussão, nesse momento processual, e com a devida vênia, sobre estar ou não demonstrada a falsidade da lista, pelas apontadas incongruências em seu conteúdo.
Isso porque, repita-se, o fato que a denúncia indica ter sido imputado falsamente ao ofendido não depende da falsidade ou autenticidade material da lista.
Em outras palavras, a denúncia indica que os denunciados imputaram falsamente ao ofendido o fato de ter recebido dinheiro, incorrendo no crime de corrupção passiva. Assim, ainda que a lista seja materialmente verdadeira, ou seja, redigida e assinada pela pessoa nela indicada, com reconhecimento de firma autêntico, isso não significa, por óbvio, que os fatos nela descritos sejam verdadeiros.
Quanto à fundamentação da decisão recorrida no sentido de ser imprescindível mínima demonstração de que o fato criminoso imputado à vítima seja falso, observo que tal conclusão não tem, com a devida vênia, qualquer relação lógica com a apontada insuficiência das ilações acerca da falsidade da lista.
É certo que para a caracterização do delito de calúnia, é necessário que a imputação seja falsa, que o réu saiba desta circunstância e que o fato atribuído ao ofendido seja definido como crime.
Contudo, isso não significa que caiba ao ofendido provar a falsidade da imputação. Ao contrário, se o denunciado por crime de calúnia alega que o fato imputado, embora criminoso, é verdadeiro, a ele cabe essa prova, mediante o incidente de exceção da verdade, previsto no §3º do artigo 138 do Código Penal.
Nesse sentido a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, Ed. Forense, 14ª ed., p. 749:
No sentido de que cabe ao denunciado por crime de calúnia provar, por meio da exceção da verdade, a veracidade do fato criminoso imputado ao ofendido, aponto precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça:
Quanto à fundamentação da decisão recorrida no sentido de que não foi demonstrado que os denunciados tinham ciência da falsidade material da lista, entendo, com a devida vênia, equivocada.
Repita-se, o fato criminoso falsamente imputado, segundo a denúncia, ao ofendido, é ter recebido dinheiro, incidindo no crime de corrupção passiva.
Assim, se é certo que o crime da calúnia exige, para sua caracterização, que o agente tenha ciência da falsidade da imputação, no caso concreto o que se exige é que os denunciados tenham ciência da falsidade da imputação do recebimento do dinheiro pelo ofendido, em razão de sua função de Ministro do Supremo Tribunal Federal, praticando crime de corrupção passiva - e não da falsidade da lista.
E a denúncia aponta indícios suficientes de que os denunciados tinham conhecimento da falsidade da imputação, não só pelos elementos indicativos do conhecimento da falsidade da lista, mas por outros fatos elencados (v.g., pelo fato da revista sequer ter procurado ouvir a versão do ofendido).
Por fim, anoto que a questão da representação ter se referido apenas às edições 708 e 709 da revista Carta Capital e a denúncia ter feito menção à ocorrência de crime de calúnia, por três vezes, não comporta decisão nesse momento processual de recebimento da denúncia.
Com efeito, ainda que efetivamente a representação faça referência à duas edições da revista e a denúncia impute a prática do crime de calúnia por três vezes, refere-se à mesma imputação de fato criminoso, sendo prematuro, nesse momento processual, decidir-se pela ocorrência ou não de crime único, concurso material ou crime continuado, pelo fato da mesma imputação criminosa ter sido feita em mais de uma oportunidade. Dessa forma, tal questão deve ser resolvida por ocasião da sentença, se for o caso.
Assim, demonstrada a materialidade e indícios suficientes de autoria, bem como inexistindo qualquer das hipóteses descritas no artigo 395 do Código de Processo Penal, há elementos suficientes para a instauração da ação penal. E nos termos do entendimento consagrado na Súmula n. 709 do Supremo Tribunal Federal, o provimento do recurso interposto contra a rejeição da denúncia resulta no seu recebimento.
Quanto ao pedido de juntada das certidões de antecedentes criminais, com a devida vênia, não procede o argumento de que a juntada das certidões de antecedentes criminais deve ser feita pelo próprio Ministério Público Federal, por se tratar de providência que interessa somente à Acusação, cabendo a intervenção do Juízo apenas na hipótese de recusa comprovada.
No sistema processual penal brasileiro, o Ministério Público limita-se ao oferecimento da denúncia, não formulando pedido de condenação do réu em determinada quantidade de pena.
Por outro lado, cabe ao Juiz, se procedente a denúncia, proceder à dosimetria da pena considerando, de ofício, todas as circunstâncias, inclusive eventuais antecedentes do réu, independentemente de requerimento expresso da Acusação. Assim, a juntada aos autos das certidões de antecedentes interessa não só à Acusação, mas também ao Juízo, a quem cabe, como assinalado, proceder à dosimetria da pena, independentemente de requerimento da Acusação.
No sentido de que cabe ao Juízo deferir o requerimento de requisição de certidões de antecedentes criminais formulado pelo Ministério Público situa-se o entendimento da Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região: (TRF 3ª Região, PRIMEIRA SEÇÃO, MS 0027348-51.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR, julgado em 29/11/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/12/2012); (TRF 3ª Região, PRIMEIRA SEÇÃO, MS 0021352-72.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 29/11/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2012).
Pelo exposto, dou provimento ao recurso em sentido estrito para receber a denúncia, bem como para determinar a requisição das certidões de antecedentes criminais, determinando o envio dos autos ao Juízo de origem para regular processamento.
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