Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/08/2014
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0011454-02.2002.4.03.6106/SP
2002.61.06.011454-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : HERMAN KALLMEYER JUNIOR
ADVOGADO : SP238707 RICARDO PEREIRA DA SILVA e outro
No. ORIG. : 00114540220024036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA


PENAL - PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CABIMENTO DO RECURSO - LEI 9.605/98, ARTIGO 48 - EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL PERMANENTE - IMPEDIMENTO DE REGENERAÇÃO NATURAL - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA - RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO - DECISÃO MANTIDA.
1. Apesar de a decisão recorrida ter, ao mesmo passo, absolvido o recorrido da prática do artigo 40 da Lei 9.605/98 e declarado a prescrição do crime previsto no artigo 48 da mesma lei, em suas razões recursais, o Ministério Público Federal insurge-se, tão somente, quanto ao reconhecimento da prescrição. Assim, correta a utilização do recurso em sentido estrito na hipótese, conforme pacífica jurisprudência.
2. O recorrido foi denunciado por manter edificação em área de preservação permanente, e por ter causado dano em área de preservação permanente incorreu, de acordo com o Ministério Público Federal, nas penas do artigo 48 da Lei 9.605/98. Para o Ilustre Representante do Parquet Federal, ora apelante, em suas razões recursais aduz, em síntese, tratar-se o crime descrito no artigo 48 da Lei 9.605/98 de delito permanente, não havendo falar-se, portanto, em prescrição retroativa. No entanto, entendeu o douto Juiz sentenciante que tal crime estaria prescrito reconhecendo o advento desta causa extintiva de punibilidade.
3. Para além da dicotomia estabelecida pelo juiz sentenciante e pelo Parquet Federal, não se apresenta razoável que a mera posse de uma residência em local protegido possa tipificar a conduta prevista no artigo 48, da Lei 9.605/08, à míngua de indícios de uma ação ou omissão deliberada no sentido de impedir a regeneração natural.
4. Com efeito, a construção da residência pode estar ligada à prática de outros crimes contra a flora, como os de supressão indevida da vegetação, a merecer pronta atuação do Estado tanto na órbita administrativa quanto judicial. Pensar, contudo, que, suprimida a vegetação e construída a residência, o seu possuidor passa a praticar de modo permanente o delito do art. 48 da Lei Ambiental, parece-me uma forma cômoda de estabelecer a imprescritibilidade da primeira conduta, o que não é admitido pelo ordenamento jurídico.
5. Por outro lado, se o agente com sua ação antrópica, continua a desmatar, construir e interferir em lugar onde já existe a degradação ambiental, cometerá o delito do artigo 48 da lei, porque estará a impedir a regeneração natural da área de preservação ambiental.
6. No caso, a simples presença constante do recorrido no local em área que já se encontrava degradada antes dele adquirir o imóvel, sem a sua intervenção direta danificando, destruindo ou impedindo a regeneração da mata nativa, e com isto mantendo a degradação ambiental, não pratica o delito descrito no artigo 48 da Lei Ambiental.
7. Não basta o agente simplesmente permanecer em área de preservação permanente, mas é necessária a comprovação de que o agente está causando danos ao meio ambiente, gerando dano direto à vegetação natural protegida por lei.
8. Além do mais, para a tipificação pretendida, a ação ou omissão do agente deve defrontar-se com a realidade da "regeneração natural", ainda que potencial, e que só não ocorre por conta de sua atuação - o que também não resta demonstrado nos autos. Precedentes.
9. No caso concreto, o delito somente está sendo imputado ao recorrido porque a construção erguida no imóvel de sua titularidade permanece em área de proteção ambiental, não havendo notícia nos autos de que em decorrência desta ocupação permanente ele esteja ocasionando degradação ambiental, como verbi gratia, com novas construções sem autorização no local, desmatamento, cortes de árvores, uso de pesticidas etc.
10. Ainda que se cogitasse da ocorrência de conduta passível de ser enquadrada no art. 48 da Lei Ambiental, fato é que, como o laudo pericial não indicou a data provável da remoção da vegetação nativa e da construção no imóvel de titularidade do acusado, para fins de consumação do crime é de considerar a data em que ocorrida a fiscalização ambiental (18.09.2002), o que fatalmente conduz ao reconhecimento da prescrição, tal como reconhecido pela decisão impugnada.
11. Recurso ministerial desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes os acima indicados, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, nos termos do relatório e voto do Senhor Relator, constantes dos autos, e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, por unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso ministerial, mantendo integralmente a r. decisão ora objurgada.



São Paulo, 04 de agosto de 2014.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0011454-02.2002.4.03.6106/SP
2002.61.06.011454-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : HERMAN KALLMEYER JUNIOR
ADVOGADO : SP238707 RICARDO PEREIRA DA SILVA e outro
No. ORIG. : 00114540220024036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de RECURSO EM SENTIDO ESTRITO interposto pela JUSTIÇA PÚBLICA contra sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 4ª Vara Federal de São José do Rio Preto/SP, que julgou improcedente a denúncia, absolvendo o réu HERMAN KALLMEYER JUNIOR, da imputação contida no artigo 40 da Lei 9.605/98, e julgou extinta a punibilidade do delito previsto no artigo 48 da mesma lei, pela ocorrência da prescrição.


Consta da denúncia (fls. 02/04) que:



"No dia 18 de setembro de 2002, soldados da Polícia Militar Ambiental verificaram que o denunciado, proprietário do rancho situado na Quadra 26 - Loteamento Pedregal, localizado às margens da Represa de Marimbondo, município de Guaraci/SP, causara dano direto ao meio ambiente, impedindo a regeneração da vegetação em área considerada de preservação permanente.
De fato, consoante laudo pericial de fls. 60/64, o imóvel em alvenaria está edificado em área de preservação permanente (APP) a menos de 100 (cem) metros do nível máximo de elevação das águas, impedindo de forma permanente a regeneração da vegetação, perfazendo aproximadamente a área de 0,40 hectares.
Considerando que acusado não possuía a devida licença ambiental que o autorizasse a promover qualquer tipo de ação, verbi gratia, construção em APP, foi lavrado o Auto de Infração Ambiental e respectivo Boletim de Ocorrência (fls. 08 e 07).
Não obstante o acusado aduzir não ser o responsável pela edificação do imóvel de alvenaria, haja vista existir a mais de 20 (vinte) anos no local, (fls. 86), consoante certidão da escritura de compra e venda (fls. 57/58), ao descriminar o objeto da transação realizada em 30/07/2001 - um décimo do lote de terreno nº 26, "achando-se o mesmo servido por instalações de rede elétrica e hidráulica e cercado com cercas de arame liso" -, não menciona nenhuma construção em alvenaria.
Portanto, agindo assim, o denunciado causou dano direto à Unidade de Conservação (Área de Preservação Permanente), bem como impediu a regeneração natural das formas de vegetação existentes no local."


A denúncia foi recebida em 31/03/2003 (fl. 101) e a sentença foi prolatada em 16 de dezembro de 2009 (fls. 373/379).


Inconformado com o reconhecimento da prescrição relativamente ao delito previsto no artigo 48 da Lei 9.605/98, o Ministério Público Federal interpôs Recurso em Sentido Estrito (fls. 383/389vº), em cujas razões sustenta, em síntese, que o tipo penal em referência retrata a hipótese de crime permanente, porquanto sua consumação e seu efeitos se prolongam no tempo. Por outro lado, mesmo que se acatasse a tese da instantaneidade da ação, admitindo-se que o resultado ilícito seria alcançado e exaurido com a prática delitiva, tanto a ação quanto o resultado são reiterados ao longo do tempo, completando-se o tipo penal a cada intervenção mínima do agente para manter a habitabilidade do local, o que afasta a tese de prescrição.


As contrarrazões foram ofertadas às fls. 393/396, tendo sido mantida a decisão recorrida em sede de juízo de retratação (fl. 398).


Após, subiram os autos a esta E. Corte, onde o Ministério Público Federal pugnou pelo provimento do recurso (fls. 402/406).


É o relatório.


Dispensada a revisão, na forma regimental.


VOTO

De início, registro que, apesar de a decisão recorrida ter, ao mesmo tempo, absolvido o recorrido da prática do artigo 40 da Lei 9.605/98 e declarado a prescrição do crime previsto no artigo 48 da mesma lei, em suas razões recursais, o Ministério Público Federal insurge-se, tão somente, quanto ao reconhecimento da prescrição.


Assim, correta a utilização do recurso em sentido estrito na hipótese, conforme pacífica jurisprudência (destaquei):


PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO PRATICADO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. SISTEMÁTICA DA PRESCRIÇÃO. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA EM RAZÃO DA PRESCRIÇÃO. CABIMENTO DA APELAÇÃO. 1. Cabe recurso em sentido estrito da sentença que decretar a prescrição ou julgar, por outro motivo, extinta a punibilidade (art. 581, VIII - CPP). A interposição de apelação traduz erro grosseiro, isto é, quando nada justifica o manejo de um recurso pelo outro, por não haver nenhuma controvérsia sobre o tema. Todavia, em caso de absolvição sumária em razão da extinção da punibilidade do agente (art. 397, IV - CPP), o recurso adequado é a apelação (art. 416 - CPP). 2. Se o estelionato é praticado pelo segurado-beneficiário, o crime é permanente, de ação contínua, não se cuidando de várias condutas independentes entre si, hipótese em que a contagem do prazo prescricional se dá a partir do último pagamento recebido (art. 111, I - CP). Se é o servidor do instituto de previdência ou terceiro que atuou para o recebimento do benefício, o crime é instantâneo com efeitos permanentes, contando-se a prescrição a partir do primeiro pagamento indevido. 3. Provimento da apelação.(ACR 200339000050504, DESEMBARGADOR FEDERAL OLINDO MENEZES, TRF1 - QUARTA TURMA, e-DJF1 DATA:02/05/2014 PAGINA:268.)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS RECEBIDAS COMO RECURSOS EM SENTIDO ESTRITO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO (ART. 171 § 3º DO CP). SENTENÇA QUE EXTINGUE O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO POR RECONHECER A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE COM FUNDAMENTO NA PRESCRIÇÃO VIRTUAL. HIPÓTESE DE DENÚNCIA RECEBIDA POR JUIZ INCOMPETENTE. NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. RECURSO DA ACUSAÇÃO DESPROVIDO. PROVIDO O RECURSO DEFENSIVO, MANTENDO-SE A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE RECONHECIDA PELO JUÍZO A QUO POR FUNDAMENTO DIVERSO. I - Esta Turma já se manifestou pelo cabimento de recurso em sentido estrito, nos termos do art. 581, VIII, do CPP, e não de apelação criminal contra decisão que declara extinta a punibilidade em razão da prescrição da pretensão punitiva estatal. II - A prescrição virtual, antecipada ou em perspectiva vem sendo rechaçada pela doutrina e jurisprudência pátrias por falta de amparo legal. III - O Juízo da 9ª VFCRIM/RJ é absolutamente incompetente para processar e julgar o presente feito, não se constituindo, pois, marco interruptivo do prazo prescricional a denúncia por ele recebida, devendo prevalecer a data da ratificação pelo Juízo competente (04/08/2010 - fl. 141) como momento de interrupção do curso do prazo prescricional. IV - Considerando-se que a pena máxima (6 anos e 8 meses) cominada ao delito em comento prescreve em 12 anos, verifica-se que entre a suspensão administrativa do benefício (01/08/1998) e a ratificação do recebimento da denúncia procedida pelo Juízo competente (04/08/2010) consumou-se o lapso prescricional, restando fulminada a pretensão punitiva estatal ante a ocorrência da prescrição pela pena em abstrato (art. 107, IV, 1ª figura, c/c art 109, III, ambos do CP). V - Recurso do Ministério Público DESPROVIDO. Recurso defensivo PROVIDO. (RSE 200451015233367, Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO, TRF2 - SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data::19/05/2012 - Página::229/230.)

Assentada a idoneidade do recurso interposto, passo a analisá-lo no mérito.


O recorrido foi denunciado por manter edificação em área de preservação permanente, e por ter causado dano em área de preservação permanente incorreu, de acordo com o Ministério Público Federal, nas penas do artigo 48 da Lei 9.605/98.


Para o ilustre Representante do Parquet Federal, ora apelante, o crime descrito no artigo 48 da Lei 9.605/98 caracterizaria delito permanente, não havendo falar-se, portanto, em prescrição retroativa.


No entanto, entendeu o douto juiz sentenciante que tal crime estaria prescrito, reconhecendo o advento desta causa extintiva de punibilidade sob os seguintes fundamentos:


"(...) Embora não haja data determinada para o fato na peça acusatória, com certeza quando da fiscalização de fls. 12, em 18/09/2002 já havia construção no local. O réu afirmou em seu interrogatório que adquiriu o imóvel constante da denúncia em 2001, época em que já havia a construção no local. Por outro lado, o laudo pericial juntado às fls. 82/88 não estimou a data, ainda que aproximada, da remoção da vegetação nativa e da construção no imóvel. Não havendo provas outras, fixo que a obra é anterior a 18/09/2002. Passo a analisar os requisitos:1 - Se o fato se deu após a edição da lei penal (leia-se após 12 de fevereiro de 1998).Conforme análise já realizada, a obra foi realizada após 12 de fevereiro de 1998, portanto já durante a vigência da Lei 9605/98.2 - Se não foi afetado pelo instituto da prescrição; A denúncia foi recebida em 31/03/2003. Por outro lado, o delito previsto no artigo 48 da Lei 9605/98 prevê a pena de detenção de 06 meses a 01 ano, prescrevendo então em 4 anos, conforme dispõe o artigo 109, V do Código Penal. Art. 109 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (...)V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; O processo e o prazo prescricional estiveram suspensos no período de 26/07/2006 a 23/08/2007, em que foi concedido o benefício da suspensão condicional do processo ao réu. Entretanto, o benefício foi revogado em 23/08/2007 a pedido do MPF, em razão das certidões de antecedentes criminais do réu juntadas às fls. 243/245. Ainda assim, forçoso reconhecer a incidência da prescrição in abstrato em 28 de abril de 2008, vez que o prazo prescricional a partir do recebimento da denúncia findaria em 31/03/2007 mas se estendeu em virtude da suspensão do processo. Ressalto que o réu é primário, não se lhe aplicando pois o acréscimo na contagem do prazo prescricional decorrente da reincidência (CP, art. 110, caput). Com essas considerações, observo que a prescrição pela pena máxima cominada ao delito, prescrição da pretensão punitiva do Estado, já afetou a presente ação penal quando ao tipo descrito no artigo 48 da Lei 9605/98. (..) Em relação ao tipo previsto no artigo 48 da Lei 9605/98, JULGO EXTINTA A PUNIBILIDADE PELA OCORRENCIA DA PRESCRIÇÃO, nos termos do art. 107, V do Código Penal."

Para além da dicotomia estabelecida pelo juiz sentenciante e pelo Parquet Federal, não me parece razoável que a mera posse de uma residência em local protegido possa tipificar a conduta prevista no artigo 48, da Lei 9.605/08, à míngua de indícios de uma ação ou omissão deliberada no sentido de impedir a regeneração natural.


Com efeito, a construção da residência pode estar ligada à prática de outros crimes contra a flora, como os de supressão indevida da vegetação, a merecer pronta atuação do Estado tanto na órbita administrativa quanto judicial. Pensar, contudo, que, suprimida a vegetação e construída a residência, o seu possuidor passa a praticar de modo permanente o delito do art. 48 da Lei Ambiental, parece-me uma forma cômoda de estabelecer a imprescritibilidade da primeira conduta, o que não é admitido pelo ordenamento jurídico.


Por outro lado, se o agente com sua ação antrópica, continua a desmatar, construir e interferir em lugar onde já existe a degradação ambiental, cometerá o delito do artigo 48 da lei, porque estará a impedir a regeneração natural da área de preservação ambiental.


Na lição de Vladimir Passos Freitas:


"Art. 48. (...)
Conduta: Duas são as formas de conduta previstas no tipo: impedir ou dificultar. Impedir é obstruir, não permitir, tornar impraticável. Por exemplo, cortar a vegetação em solo que foi desmatado, de forma a impedir a recuperação. Dificultar é tornar difícil, custoso, demorado. Por exemplo, soltar o gado em local de preservação permanente, que se acha degradado e que começa a recuperar-se."
(in "Crimes contra a Natureza (de acordo com a Lei 9.605/98) - 6ª edição. rev. atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000).

Assim, de acordo com os exemplos citados pelo ilustre jurista, estará a impedir a regeneração natural do local o agente, toda a vez em que ele desmata o local onde já houve dano ao meio ambiente.


No caso, a simples presença constante do recorrido no local em área que já se encontrava degradada antes dele adquirir o imóvel, sem a sua intervenção direta danificando, destruindo ou impedindo a regeneração da mata nativa, e com isto mantendo a degradação ambiental, não pratica o delito descrito no artigo 48 da Lei Ambiental.


Com efeito, não basta o agente simplesmente permanecer em área de preservação permanente, mas é necessária a comprovação de que o agente está causando danos ao meio ambiente, gerando dano direto à vegetação natural protegida por lei, como já se aludiu.


Além do mais, para a tipificação pretendida, a ação ou omissão do agente deve defrontar-se com a realidade da "regeneração natural", ainda que potencial, e que só não ocorre por conta de sua atuação - o que também não resta demonstrado nos autos. Em sentido semelhante, confira-se:

"PROCESSO PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - REJEIÇÃO DE DENÚNCIA QUE IMPUTA OS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 40 E 48 DA LEI Nº 9.605/98 - CONSTRUÇÃO DE CASINHOLA DE OITO METROS QUADRADOS EM "RANCHO" DE LAZER, NA MARGEM DA REPRESA DA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA, ADQUIRIDO DA PREFEITURA MUNICIPAL DAQUELA CIDADE - ENTENDIMENTO DO JUÍZO NO SENTIDO DA AUSÊNCIA DE TIPICIDADE, EM FACE DAS CONCLUSÕES DE VISTORIA REALIZADA PELOS PRÓPRIOS AGENTES DA FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO.
1. Denúncia merecedora de rejeição omitir a espécie vegetal que teria sido suprimida ou cuja regeneração foi impedida, com a construção de uma casinhola de oito metros quadrados; ademais, a se levar em conta a vistoria feita pelo engenheiro agrônomo do DEPRN/Secretaria do Meio Ambiente, a pedido da autoridade policial, verifica-se que o antigo proprietário do local há muito tempo já o havia desmatado, colocando em substituição "mata de pastagem" alienígena, consistente em capim colonião, planta forrageira originária da África (Congo) e que nem é mata de preservação permanente porquanto sua utilidade é fornecer alimento para bovinos e cavalos; 2. Denúncia inepta também ao atribuir ao recorrido o delito do artigo 40 da Lei nº 9.605/98, porque se o Ministério Público Federal quer ver alguém processado e condenado por danificar "unidade de conservação" deve ao menos apontar qual delas suportou o efeito da conduta do agente. Local que não se configura como "unidade de conservação" ambiental por se tratar de um loteamento de sítios de recreio promovido no passado pela Prefeitura Municipal, talvez irregularmente mas por tal fato não pode o denunciado ser responsabilizado;
3. Recurso improvido."
(TRF - Tribunal Regional Federal da 3ª Região - Órgão Julgador: 1ª Turma - RSE 2002.61.24.001111-7 - Relator: Des. Federal Johonsom di Salvo - DJ 19/07/2005, pg.214).

Frise-se, pois, que, no caso concreto, o delito somente está sendo imputado ao recorrido porque a construção erguida no imóvel de sua titularidade permanece em área de proteção ambiental, não havendo notícia nos autos de que em decorrência desta ocupação permanente ele esteja ocasionando degradação ambiental, como verbi gratia, com novas construções sem autorização no local, desmatamento, cortes de árvores, uso de pesticidas etc.


Assim, ainda que se cogitasse da ocorrência de conduta passível de ser enquadrada no art. 48 da Lei Ambiental, fato é que, como o laudo pericial não indicou a data provável da remoção da vegetação nativa e da construção no imóvel de titularidade do acusado, para fins de consumação do crime é de considerar a data em que ocorrida a fiscalização ambiental (18.09.2002), o que fatalmente conduz ao reconhecimento da prescrição, tal como reconhecido pela decisão impugnada.


Diante do exposto, nego provimento ao recurso ministerial, mantendo a decisão recorrida.


É COMO VOTO.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:67
Nº de Série do Certificado: 3DDA401E3F58F0FE
Data e Hora: 05/08/2014 17:45:11