D.E. Publicado em 02/10/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, para aumentar a pena-base aplicada ao réu para 07 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa, e, por maioria, dar parcial provimento ao recurso da defesa, para aplicar a minorante prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, à razão de 1/6, ficando definitivamente fixada a pena em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, mais a pena pecuniária de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, mantida a r. sentença em seus demais termos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo réu preso INNOCENT EKWE contra a r. sentença proferida pelo Juízo Federal da 6ª Vara Federal de Guarulhos/SP, que condenou o réu pela prática do delito previsto no artigo 33, caput, c.c. o artigo 40, inciso I, ambos da Lei 11.343/2006, a pena de 07 (sete) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. O dia-multa foi fixado em 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigidos até a data do pagamento. Os réus ficaram isentos do pagamento de custas, tendo em vista a hipossuficiência econômico-financeira (fls. 200/212vº).
Consta da denúncia que:
Os laudos de Constatação de substância entorpecente foram juntados aos autos às fls. 08/09 (laudo preliminar de constatação) e 98/102 (laudo pericial definitivo de substância entorpecente).
A defesa preliminar foi apresentada às fls. 106/106vº.
A denúncia foi recebida em 18 de maio de 2012 (fls. 107/110).
Decisão determinando o regular prosseguimento da ação penal à fl. 124.
Em audiência de instrução e julgamento foi ouvida uma testemunha comum e houve o interrogatório do réu (fls. 162/166 - mídia de fl. 214).
As partes apresentaram memoriais, respectivamente às fls. 168/178 (parquet) e 179/199 (defesa).
A sentença condenatória foi proferida em audiência em 12 de novembro de 2012 (fls. 200/212vº), saindo as partes intimadas.
Inconformado com a r. sentença, apela o Ministério Público Federal requerendo, em apertada síntese, que seja majorada a pena-base aplicada ao acusado, bem como seja majorado o percentual aplicado a título de transnacionalidade do delito (fls. 221/223vº).
O inconformismo de INNOCENT EKWE (fls. 229/253) reside nos seguintes argumentos:
a) o reconhecimento do erro de tipo e consequente absolvição do réu;
b) a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, não se podendo levar em consideração apenas a natureza e quantidade da droga apreendida, bem como o motivo do lucro fácil para a prática do crime, sendo o caso de ponderar-se igualmente os bons antecedentes e primariedade do réu;
c) inaplicabilidade da causa de aumento de pena prevista no art. 40, I, da Lei 11.343/06, referente à internacionalidade do tráfico, pois haveria dupla penalização da mesma conduta, visto que os verbos importar e exportar, mencionados na majorante, já se encontrariam previstos no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06;
d) a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, deve ser aplicada no máximo legal, diante da primariedade e bons antecedentes do réu, que, ademais, não integra organização criminosa;
e) o regime inicial de cumprimento da pena não deverá ser o integralmente fechado, sendo inconstitucional a Lei 11.343/06, nesse tocante, diante da afronta ao princípio da individualização da pena;
f) a pena privativa de liberdade deverá ser substituída por penas restritivas de direitos, consoante art. 44, do Código Penal;
g) pleiteia a não aplicação da pena de multa, pois o réu não possui condições de pagá-la, além do que, após o cumprimento total da pena privativa de liberdade, o réu só poderá retornar a seu país de origem após o pagamento integral da multa, redundando na sua permanência na prisão por mais tempo do que o devido, e;
h) a concessão ao apelante do direto de recorrer em liberdade, tendo em vista a inconstitucionalidade do uso da prisão cautelar como antecipação do cumprimento da pena.
Com as contrarrazões (fls. 225/228 e 260/269vº), subiram os autos a esta Egrégia Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo parcial provimento dos recursos da acusação e da defesa (fls. 285/296).
É O RELATÓRIO.
À revisão na forma regimental.
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VOTO
Consta dos autos que INNOCENT EKWE foi preso em flagrante delito, transportando 4.005 g (quatro mil e cinco gramas) de cocaína, acondicionados em sua bagagem, no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, quando tentava embarcar para Dubai/Emirados Árabes Unidos.
A autoria e a materialidade do delito previsto no art. 33, caput, c.c. art. 40, I, da Lei 11.343/06, restaram bem demonstradas pelos Auto de Prisão em Flagrante (fls. 02/03), Laudo Preliminar de Constatação (fls. 08/09), Auto de Apresentação e Apreensão (fls. 10/29), Laudo de Perícia Criminal (fls. 98/102) e pelos depoimentos das testemunhas e pelo interrogatório do réu (mídia de fl. 214).
Com efeito, as circunstâncias em que foi realizada a prisão em flagrante, aliadas à prova oral colhida, tanto na fase policial como judicial, confirmam, de forma precisa e harmônica, a ocorrência dos fatos e a responsabilidade do acusado, fato incontroverso no presente caso.
As alegações do apelante, no sentido de que desconhecia a existência da droga na mala que trazia consigo, incorrendo em erro de tipo, se mostram desprovidas de verossimilhança e não encontram nenhum respaldo no conjunto probatório trazido aos autos que, ao contrário do alegado, demonstra claramente o dolo do réu para o cometimento do delito.
Nesse sentido transcrevo o seguinte excerto do parecer ofertado pelo Ilustre Procurador Regional da República atuante perante essa Egrégia Corte Regional, in verbis:
Vê-se, pois, que a versão apresentada pelo réu, de que estaria levando formas de bolo, a pedido de seu tio, que iria embarcar para o mesmo destino um ou dois dias depois, com o fim único de entregá-las para terceira pessoa, que não conhecia, não encontra respaldo nos autos. Como se tal não bastasse, verifico que não haveria motivo para seu tio pagar-lhe grande quantia em dinheiro (mil e quinhentos dólares) para que o réu "enterrasse sua mãe" que, como por ele dito, estaria aguardando para ser enterrada há mais de três meses, em um frezzer. Verifica-se, dessa maneira, que sua versão é totalmente inverossímil e desprovida de qualquer suporte lógico ou fático.
Com efeito, as circunstâncias do caso concreto indicam que a apelante possuía plena ciência de que transportava substância entorpecente e, somente a título de argumentação, mesmo que o apelante não tivesse conhecimento da ilicitude do conteúdo da mala, no mínimo assumiu o risco de transportá-la, configurando o dolo eventual a ensejar sua condenação nas penas do art. 33, da Lei 11.343/2006, não havendo como falar-se em erro de tipo.
Essa é a conclusão da r. sentença, fls. 202vº/203, in verbis:
Mantida a condenação, cumpre verificar a dosimetria da pena.
Na primeira fase de fixação da pena, verifico que o Magistrado sentenciante considerou favoráveis ao acusado as circunstancias de ser primário e não possuir antecedentes criminais, porém, ponderou em sentido contrário a qualidade e elevada quantidade de droga apreendida (4,005 kg de cocaína), e por essas razões fixou a pena base acima do patamar mínimo legal, estabelecendo-a em 06 (seis) anos de reclusão.
A despeito dos fatores de primariedade e bons antecedentes do réu, assim como a inexistência de vínculo com organização criminosa, deve ser considerado o elevado grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela nocividade e elevada quantidade de tóxico que se buscou transportar, o que indica que a pena-base deverá ser elevada para 07 (sete) anos de reclusão, e 700 (setecentos) dias-multa.
Não existem circunstâncias agravantes ou atenuantes a serem consideradas na segunda fase de fixação da pena.
Na terceira fase de fixação da pena, verifico que o juízo a quo aplicou causa de aumento de pena, à razão de 1/6 (um sexto), conforme previsto no art. 40, I, da Lei 11.343/06, diante da transnacionalidade do delito.
Deve ser mantida esta causa de aumento da pena, visto que a internacionalidade do tráfico se encontra configurada.
A majorante prevista no artigo 40, inciso I da Lei n.º 11.343/06, aplica-se ao tráfico com o exterior, seja quando o tóxico venha para o Brasil, seja quando esteja em vias de ser exportado. Portanto, é evidente, in casu, a tipificação do tráfico internacional de entorpecentes.
Para corroborar tal assertiva, utilizo-me dos ensinamentos do insigne professor Vicente Greco Filho, in verbis:
O acusado é Nigeriano, residia na Costa Rica e veio ao Brasil, para obter a droga apreendida, que seria embarcada para Dubai/Emirados Árabes Unidos.
Desses elementos infere-se a transnacionalidade do delito, a autorizar a aplicação da majorante prevista no art. 40, I, da Lei 11.343/06.
Há entendimento no sentido de que o legislador previu, nos incisos do artigo 40, da Lei 11.343/06, uma série de causas de aumento de pena, que justificam um aumento variável de um sexto a dois terços, porém não estabeleceu os parâmetros para a quantificação do percentual. À míngua desses critérios, o índice de aumento pode ser calculado de acordo com as circunstâncias especificamente relacionadas com a causa de aumento, (e não às do crime), e variar de acordo com a quantidade de majorantes que estiverem presentes.
Por estes mesmos fundamentos, rejeito a argumentação da defesa no sentido de que a conduta de "exportar", para o exterior, já se encontraria contido no art. 33, da Lei 11.343/06, consubstanciando bis in idem.
Trata-se de conduta diversa daquela prevista no caput do art. 33, a merecer o aquinhoamento legal de causa de aumento de pena, nos termos do art. 40, I, daquele mesmo diploma legal.
Assim, mantenho essa causa de aumento de pena, nos exatos termos lançados em sentença, do que resulta a pena de 8 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão, e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa.
A minorante prevista no artigo 33, § 4º da Lei 11.343/06 não foi aplicada pelo juízo de piso. Pretende a defesa seja aplicada no patamar máximo.
Passo a analisar se o réu preenche os requisitos para aplicação do benefício, quais sejam:
Percebe-se que se trata de requisitos cumulativos. No caso destes autos, a despeito de o réu ser primário e não ostentar maus antecedentes, deve ser considerada a nocividade e quantidade elevada de droga apreendida (4,005 quilos de cocaína). Ademais, não se pode afirmar com segurança que o réu se dedica às atividades ilícitas e que integre ou faça parte de organização criminosa. O que as circunstâncias indicam com segurança é que se está diante de pessoa contratada para transportar substância entorpecente, o que, por si só, denota o caráter lucrativo e profissional da atividade.
Todavia, nos autos não há provas seguras de que o réu faça parte da organização criminosa, havendo de se concluir que serviu como transportador de forma esporádica, eventual, diferenciando-se do traficante profissional, sendo, pois, merecedor do benefício legal de redução de pena previsto no art. 33, § 4º da Lei 11.343/06.
Deve ser avaliada, caso a caso, a interpretação que entende cabível a aplicação do art. 33, § 4º da Lei nº 11.343/06 aos meros transportadores do tráfico internacional de drogas. Neste caso concreto, não trouxe o Ministério Público Federal provas suficientes a testar a sua participação ativa e reiterada em uma organização criminosa, nela atuando de forma estável e habitual, sendo, pois, merecedor do benefício de redução da pena previsto no artigo 33, § 4º da Lei nº 11.343/06.
Nesse sentido, oportuno citar os seguintes precedentes da Primeira Seção deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
E apenas a título de argumentação, na esteira do julgado do Supremo Tribunal Federal (Habeas Corpus nº 101.265/SP) entendo que a mera traficância transnacional não basta para afirmar que o agente integra organização criminosa, sendo necessária a presença de indícios que indiquem muito mais que uma simples cooperação ou cooptação de agentes, como, por exemplo, que o réu ou a ré tenha, de alguma forma, uma participação mais efetiva nas atividades da quadrilha - v.g., que tenha combinado o preço do serviço, a data ou o roteiro da viagem, a quantidade de droga a ser transportada etc. -, ou, ainda, que venha se colocando à disposição do bando sempre que necessário, empreendendo, rotineiramente, viagens internacionais em situações análogas.
Por tais razões, entendo cabível a aplicação da minorante prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, tão somente no mínimo legal de 1/6 (um sexto), em razão das circunstâncias objetivas e subjetivas do caso concreto, especialmente a quantidade de droga apreendida (4,005 kg de cocaína).
Destarte, da aplicação dessa causa de diminuição de pena no mínimo legal decorre a pena de 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, mais a pena pecuniária de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, que torno definitiva, vez que ausentes outras causas modificativas.
O valor do dia-multa continua sendo o mínimo unitário legal, já que inexistente recurso das partes quanto ao seu valor.
No que tange ao pedido de afastamento da imposição da pena de multa, cabe ressaltar que o legislador, ao fixar os parâmetros da pena pecuniária, observou as características inerentes ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes, cometido quase que exclusivamente pela ganância e busca do lucro fácil, tendo o recrudescimento da pena pecuniária se mostrado totalmente adequado e proporcional, não se podendo falar em sua inconstitucionalidade, devendo as questões referentes à eventual impossibilidade de cumprimento serem discutidas perante o Juízo das Execuções.
As alegações da defesa, no sentido de que a pena de multa poderia se convolar em prisão civil por dívida, não possuem embasamento jurídico, devendo ser ela mantida.
O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deve permanecer como o fechado, nos termos do § 3º do artigo 33, do Código Penal, considerando a lesividade da conduta praticada pelo apelante, que aceitou colaborar para o transporte internacional e posterior distribuição de razoável quantidade de substância entorpecente de elevado potencial lesivo (4,005 kg de cocaína).
Pelas mesmas razões, verifico que a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos não se mostra suficiente no caso concreto, nos termos do inciso III, do artigo 44, do Código Penal, sendo certo, ademais, que o apelante, tendo em vista o quantum da condenação, não preenche os requisitos objetivos do inciso I, do mesmo artigo 44 do Código Penal.
Por fim, no que se refere ao pedido de liberdade provisória, verifico que os motivos que determinaram a prisão cautelar do apelante permanecem hígidos, considerando a ausência de vínculos do réu com o distrito da culpa e a necessidade de garantia de aplicação da lei penal.
Ademais, como bem salientado pelo Ilustre Representante do Ministério Público Federal perante essa Egrégia Corte Regional, "Preso, por ocasião de sua prisão em flagrante, quando tentava embarcar com o entorpecente para o exterior, assim permaneceu durante todo o transcurso da ação penal, a fim de garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal. Resultam ainda inalterados os motivos ensejadores de sua prisão cautelar, que deve, portanto, ser mantida." (fls. 295vº).
Nesse sentido, assim já se decidiu:
Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, para aumentar a pena-base aplicada ao réu para 07 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa, e parcial provimento ao recurso da defesa, para aplicar a minorante prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, à razão de 1/6, ficando definitivamente fixada a pena em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, mais a pena pecuniária de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, mantida a r. sentença em seus demais termos.
É COMO VOTO.
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