D.E. Publicado em 05/12/2014 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, proceder, ex officio, à emendatio libelli, na forma do artigo 383, do Código de Processo Penal, para enquadrar a conduta da acusada Rosa Maria Arid Alves no delito tipificado no artigo 297, §3º, inciso II, c/c §4º, do Código Penal, e negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelações criminais interpostas pelos réus Donizetti Aparecido da Silva e Rosa Maria Arid Alves contra sentença que os condenaram como incursos nas penas do artigo 171, §3°, c/c artigos 29 e 71, todos do Código Penal.
Narra a denúncia que:
A denúncia foi recebida em 26 de março de 2007 (fl. 197).
Após regular instrução, sobreveio sentença, publicada em 24 de março de 2011 (fl. 391), que julgou procedente da ação penal para condenar Donizetti Aparecido da Silva e Rosa Maria Arid Alves ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, e 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) e 1/2 (metade) do salário mínimo vigente ao tempo da infração, respectivamente, pela prática do crime previsto no artigo 171, §3°, c/c artigos 29 e 71, ambos do Código Penal (fls. 383/390).
Em razões recursais, a defesa de Rosa Maria Arid Alves pugna por sua absolvição em razão da inexistência de materialidade e autoria delitivas decorrente da inexistência de relação de emprego durante o período em que Donizetti Aparecido da Silva recebeu o seguro-desemprego, bem como ausência de dolo em sua conduta (fls. 411/418).
A seu turno, a defesa de Donizettti Aparecido da Silva alega, inicialmente, que sua punibilidade encontra-se extinta em face da prescrição da pretensão punitiva e, no mérito, pugna pela absolvição sob os mesmos argumentos da acusada (fls. 439/452).
Foram apresentadas contrarrazões pelo Parquet (fls. 454v/457v).
A Procuradoria Regional da República da 3ª Região opina, em parecer, pelo improvimento dos recursos (fls. 459/464).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Inicialmente, não há que se falar em extinção da punibilidade do acusado pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal.
Não havendo recurso ministerial, ocorreu o trânsito em julgado para a acusação, não sendo possível a majoração da pena por este E. Tribunal, sob pena de se incorrer em reformatio in pejus, tornando perfeitamente possível a análise da prescrição da pretensão punitiva com base na sanção penal concreta imposta pelo Juízo a quo ao denunciado, nos termos do artigo 110, § 1º, do Código Penal.
Quanto ao delito de estelionato, é pacífico na Suprema Corte o entendimento da necessidade de se diferenciar a situação jurídica daquele que comete a falsificação para permitir que terceiro receba o benefício fraudulento, caso em que o crime é instantâneo de efeitos permanentes, daquela em que a fraude é perpetrada pelo próprio beneficiário, caso em que o crime é permanente, atraindo a incidência do artigo 111, inciso III, do Código Penal:
Por sua vez, o C. Superior Tribunal de Justiça vem proferindo reiteradamente decisões a corroborar a orientação do Pretório Excelso, verbis:
Nesse mesmo sentido, a Primeira Seção desta Corte coaduna com o entendimento dos Tribunais Superiores:
Segundo a denúncia, os acusados teriam acordado entre si que Rosa Maria não registraria o contrato de trabalho de Donizetti Aparecido em CTPS para que ele recebesse parcelas do seguro-desemprego, as quais foram pagas entre fevereiro a junho de 2003 (fls. 133/137).
Portanto, considerando a natureza binária do crime de estelionato, o delito, em relação ao acusado se trata de delito permanente.
Assim, considerando que a decisão recorrida fixou a pena definitiva pouco acima de 1 (um) ano de reclusão para ambos os acusados, o que enseja prazo prescricional de 4 (quatro) anos, nos termos do artigo 109, inciso V, do Código Penal, não transcorrido entre a data do recebimento da última parcela do seguro-desemprego (18.06.2003) e a data do recebimento da denúncia (26.03.2007) ou entre esta e a data da publicação da sentença condenatória (24.03.2011), mesmo desconsiderando o acréscimo decorrente da continuidade delitiva, nos termos da Súmula nº 497, do Supremo Tribunal Federal.
Assim, não há que se falar em extinção da punibilidade decorrente da prescrição da pretensão punitiva do acusado.
Ainda, antes de analisar o mérito recursal, cabe proceder ao reenquadramento da conduta praticada pela acusada Rosa Maria Arid Alves na figura típica prevista no artigo 297, §3º, inciso II, c/c §4º, do Código Penal, in verbis:
Conclui-se que a citada norma penal é especial em relação ao delito previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal, razão pela qual é de rigor aplicar o disposto no artigo 383, do Código de Processo Penal para alterar a definição jurídica dada aos fatos pela denúncia, classificando a conduta da acusada na figura típica prevista no artigo 297, §3º, inciso II, c/c §4º, do Código Penal.
Outrossim, a conduta ilícita da acusada não exauriu sua potencialidade lesiva apenas no estelionato, pois a omissão do contrato de trabalho na Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS enseja o não pagamento de parcelas remuneratórias, o não recolhimento de tributos resultantes de tal vínculo jurídico, além de lesionar a fé pública.
Não há qualquer vedação para a aplicação da denominada emendatio libelli pelo Tribunal, pois a desclassificação, operada sem qualquer outra providência, não resultará em ofensa ao princípio da correlação entre a acusação e a decisão final ou ao direito de ampla defesa, pois não haverá surpresa para o acusado, que se defendeu amplamente dos fatos que lhe foram imputados na denúncia, conforme julgados do Superior Tribunal de Justiça:
Com tais considerações, passo ao exame das materialidades e autorias delitivas.
As materialidades delitivas restaram comprovadas através do ofício expedido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (fls. 132/137) o qual demonstra que o acusado Donizetti Aparecido da Silva recebeu 5 (cinco) parcelas de seguro-desemprego relativo ao período compreendido entre fevereiro a junho de 2003, em que ele não estava desempregado, conforme declarado pelo próprio acusado quando ouvido como testemunha na reclamação trabalhista n° 1926/2003-6, tramitada na 2ª Vara do Trabalho de São José do Rio Preto/SP, proposta pelo reclamante Sandro Rodrigues Gaia contra a outrora reclamada Rosa Maria Arid Alves, ora ré, verbis:
Tal versão apresentada no Juízo Trabalhista foi corroborada pelas declarações do acusado em sede policial:
Assim restou demonstrado que, além de residir na Fazenda Santa Rosa, de propriedade da denunciada Rosa, o acusado Donizetti recebia salário mensal, leite e cesta básica em contrapartida aos trabalhos executados na aludida propriedade rural, concomitantemente ao período em que recebia seguro-desemprego.
A corroborar tal vínculo empregatício, consta na Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS do acusado Donizetti como penúltimo contrato de trabalho anotado o celebrado com o empregador "José Carlos Cian e Outro", com admissão em 08.04.2002 e saída em 30.11.2002, inexistindo qualquer anotação entre essa última data e 01.07.2003, quando foi contratado novamente por Rosa Maria Arid Alves em 01.07.2003 (fls. 158/160).
As autorias delitivas são igualmente incontestáveis, pois a ré Rosa Maria Arid Alves era a proprietária da Fazenda Santa Rosa e empregadora de Donizetti Aparecido da Silva, ora réu, tendo ela a obrigação legal de anotar o contrato de trabalho celebrado entre eles em sua CTPS, enquanto ele efetivamente recebeu as parcelas do seguro desemprego relativos aos meses de fevereiro a junho de 2003.
Não há como prevalecer a tese defensiva no sentido de que durante os meses de fevereiro a junho de 2003, o acusado Donizetti estava apenas residindo de favor na fazenda da acusada Rosa, pois as provas constantes nos autos revelam que todos os requisitos da relação trabalhista - empregado pessoa física, não eventualidade, onerosidade e subordinação - restaram comprovados pelo conjunto probatório, tendo havido conluio entre os réus para que ela deixasse de anotar na CTPS dele o contrato de trabalho, viabilizando assim a percepção indevida de parcelas do seguro-desemprego.
Constata-se que as últimas versões apresentadas pelo acusado (fls. 146/147), inclusive em Juízo (fls. 232/2324), convergem com as declarações da acusada no sentido de que ele não trabalhava na Fazenda Santa Rosa, mas apenas residia lá por favor da acusada Rosa (fls. 148/149 e 235/237), em nítido descompasso com os depoimentos prestados anteriormente, até que não apresentou nenhuma razão a justificar tais divergências, o que revela o único propósito de induzir o julgador à atipicidade penal da conduta, pois seria uma das poucas teses defensivas possíveis, senão a única, a culminar na absolvição.
Quanto ao elemento subjetivo, por residir apenas na mente do agente, não pode ser demonstrado diretamente, devendo ser analisados os elementos colhidos nos autos como um todo, de forma a demonstrar sua vontade em pratica a conduta descrita no tipo penal.
In casu, os dolos nas condutas restaram evidenciados, vez que a acusada Rosa, com consciência e vontade, omitiu contrato de trabalho na CTPS do acusado Donizetti, que, por sua vez, anuiu com tal situação com o fim específico de receber indevidamente parcelas do seguro desemprego.
Destarte, a condenação dos réus Donizetti Aparecido da Silva e Rosa Maria Arid Alves pela prática dos delitos previstos nos artigos 171, §3º, e 297, §3º, inciso II, c/c §4º, ambos do Código Penal, respectivamente, é medida de rigor.
No tocante às penas, a decisão a quo não merece quaisquer reparos, pois, além de inexistir qualquer insurgência a respeito, a pena-base do acusado Donizetti Aparecido da Silva foi fixada no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, não incidindo qualquer agravante ou atenuante, mas apenas, na terceira fase, as causas de aumento previstas nos artigos 71 e 171, §3º, ambos do Código Penal.
Quanto à ré Rosa Maria Arid Alves, considerando que a pena mínima decorrente da prática do crime pelo qual está sendo condenada (dois anos) é maior que a pena aplicada na sentença pela prática de estelionato (um ano e seis meses) e a inexistência de recurso ministerial, sua pena deve-se limitar àquela fixada em primeira instância, em respeito ao princípio non reformatio in pejus, nos termos do artigo 617, do Código de Processo Penal.
Nesse sentido é a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça:
Por fim, o valor unitário do dia-multa, o regime inicial de cumprimento de penas e a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos devem ser mantidos nos termos da r. sentença.
Diante do exposto, procedo, ex officio, à emendatio libelli, na forma do artigo 383, do Código de Processo Penal, para enquadrar a conduta da acusada Rosa Maria Arid Alves no delito tipificado no artigo 297, §3º, inciso II, c/c §4º, do Código Penal, e nego provimento às apelações.
É o voto.
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