Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/12/2014
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003475-45.2009.4.03.6105/SP
2009.61.05.003475-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : GIUSEPPE MARIO PRIOR
ADVOGADO : SP275032 RAFAEL DUARTE MOYA e outro
No. ORIG. : 00034754520094036105 9 Vr CAMPINAS/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. 168-A. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. OCORRÊNCIA.
1. A materialidade delitiva restou demonstrada pelos diversos documentos que instruíram os procedimentos administrativo-fiscais acostados aos autos, tais como Auto de Infração, totalizando um valor consolidado em 18.09.2008 de R$ 467.153,12 (quatrocentos e sessenta e sete mil, cento e cinquenta e três reais e doze centavos), excluídos juros e multa, Discriminativo Analítico de Débito, Discriminativo Sintético de Débito, Relatório de Lançamentos e relação de notas fiscais de prestadores de serviços cujas retenções efetuadas não foram recolhidas, sendo incontroverso que contribuições foram descontadas de segurados e não foram repassadas à Previdência Social.
2. No caso dos autos, verifique-se, por primeiro, além do depoimento do acusado, os relatos testemunhais de Alvim Morais Cardozo Neto, Flávia Cristiane de Araújo e Maria Inês Poltronieri de Oliveira, indicando a perda de clientes importantes e grande queda no faturamento da empresa, inclusive com paralisação da produção pela falta de matéria-prima, bem como atrasos nos salários de funcionários, tornando prejudicado o funcionamento da empresa.
É importante notar que, como já mencionado, não basta apenas que haja demonstração de crise financeira para a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa, mas, também, que esta não tenha ocorrida por irresponsabilidade gerencial do administrador.
3. Nesse sentido, é importante verificar a substancial perda patrimonial sofrida pela empresa entre os anos de 2002 a 2005 (fl. 337), período que coincide com os débitos da presente ação (01/2003 a 12/2004), bem como corrobora o argumento segundo o qual tornara-se bastante dificultoso adimplir os tributos relacionados aos autos.
4. Diante, portanto, dos argumentos trazidos acima, reputo presentes os elementos necessários a atestar a correção do Julgador de primeiro grau em aplicar, no caso, a causa supralegal de exclusão da culpabilidade caracterizada pela inexigibilidade de conduta diversa, diante da insuportável crise financeira que se abateu à empresa Labormax.
5. Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso ministerial, mantendo a sentença de primeiro grau em todos os seus termos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 25 de novembro de 2014.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003475-45.2009.4.03.6105/SP
2009.61.05.003475-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : GIUSEPPE MARIO PRIOR
ADVOGADO : SP275032 RAFAEL DUARTE MOYA e outro
No. ORIG. : 00034754520094036105 9 Vr CAMPINAS/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face de sentença em que foi julgada improcedente a pretensão punitiva estatal para absolver GIUSEPPE MÁRIO PRIOR por supostamente incurso nas sanções do artigo 168-A, § 1º, inciso I, combinado com o artigo 71, ambos do Código Penal.


Narra a denúncia (fls. 175/178):


"(...)
O DENUNCIADO, na qualidade de sócio-gerente responsável pela administração da sociedade empresária LABORMAX PRODUTOS QUÍMICOS INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA., CNPJ nº 49.448.608/0001-72, sita à Rodovia Eng. Ermênio de Oliveira Penteado, KM 56,5, Tombadouro, Idaiatuba/SP, CEP 13330-970, deixou de recolher, no prazo legal, de modo consciente, voluntário e reiterado, nos períodos descritos abaixo, contribuições destinadas à Previdência Social que foram descontadas dos pagamentos realizados a empresas prestadoras de serviços de mão-de-obra.
Verificou-se que o DENUNCIADO, entre os períodos de 01 a 08/2003, 05 e 06/2004 e 10 a 12/2004, nos termos da tabela abaixo, em 16 (dezesseis) ocasiões, deixou de serviços de mão-de-obra. Nos termos do Anexo IV que acompanhou o Auto de Infração nº 37.174.342-7 (fls. 144/154) e discriminativo analítico de débito de fls. 113/116, os valores específicos referentes às contribuições previdenciárias que foram descontadas dos valores pagos pela realização de serviços de mão-de-obra realizados por terceiros, os quais geraram a emissão das notas fiscais cujas cópias estão acostadas às fls. 27/55, mas que não foram recolhidas na época própria aos cofres públicos (...).
Tais circunstâncias foram constatadas pela fiscalização tributária e geraram débitos consignados no Auto de Infração DEBCAD nº 37.174.342-7, consolidado em 19.09.2008, nos termos seguintes (fl. 107):
AI Nº 37.174.342-7, VALOR ATUALIZADO: R$ 467.153,12, MULTA: R$ 136.412,40, JUROS: R$ 273.143,96, TOTAL: R$ 876.709,48.
Não obstante, o valor acima inclui, além dos valores advindos das omissões imputadas na presente denúncia, valores oriundos de condutas que se subsumem ao tipo penal descrito no artigo 337-A, do Código Penal e que são objeto de apuração específica nos autos da PI nº 1.34.004.100880/2008-13.
A lei nº 9.528/97 introduziu a obrigatoriedade de apresentação da Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social - GFIP. Desde a competência janeiro de 1999, todas as pessoas físicas ou jurídicas sujeitas ao recolhimento do FGTS, conforme estabelece a lei nº 8.036/90 e legislação posterior, bem como às contribuições e/ou informações à Previdência Social, conforme disposto nas leis nº 8.212/91 e 8.213/91 e legislação posterior, estão obrigadas ao cumprimento desta obrigação.
Os prazos para a arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social estão disciplinados nos arts. 30 e 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
No que tange à autoria delituosa, a responsabilidade pelas omissões é imputada a GIUSEPPE MARIO PRIOR o qual era exclusivamente responsável pelos atos de gestão da sociedade, nos termos da cláusula quinta da trigésima quinta alteração e consolidação contratual de fls. 56/61, datada de 1º de julho de 2002, repetida na trigésima sétima alteração e consolidação contratual (fls. 62/69), datado de 1º de abril de 2008. Estas diretrizes contratuais são realçadas pela Procuração assinada pelo DENUNCIADO, encartada à fl. 18, conferindo poderes ao contador para acompanhar o procedimento fiscal.
Deixa-se de imputar ao ACUSADO a omissão relativa à competência de fevereiro de 2003, porquanto já abrangida pela prescrição.
(...)"

A denúncia foi recebida em 06 de abril de 2009 (fl. 179).


Após regular instrução, sobreveio sentença (fls. 379/386), em que foi julgada improcedente a pretensão punitiva estatal para absolver GIUSEPPE MÁRIO PRIOR por supostamente incurso nas sanções do artigo 168-A, § 1º, inciso I, combinado com o artigo 71, ambos do Código Penal.


Em sede de apelação (fls. 388/400), pugna, o Ministério Público Federal, pela reforma da sentença, para o fim de condenar o acusado Giuseppe Mario Prior, uma vez que teriam restado comprovadas a autoria e materialidade delitivas no caso.


Foram apresentadas contrarrazões (fls. 406/409).


A Procuradoria Regional da República, em sede de parecer (fls. 412/417v), opinou pelo provimento do recurso de apelação.


É o relatório.


À revisão.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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Data e Hora: 01/10/2014 13:00:31



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003475-45.2009.4.03.6105/SP
2009.61.05.003475-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : GIUSEPPE MARIO PRIOR
ADVOGADO : SP275032 RAFAEL DUARTE MOYA e outro
No. ORIG. : 00034754520094036105 9 Vr CAMPINAS/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


No caso dos autos, GIUSEPPE MÁRIO PRIOR foi denunciado e, posteriormente, absolvido, por supostamente incurso nas sanções do artigo 168-A, § 1º, inciso I, combinado com o artigo 71, ambos do Código Penal.

A materialidade delitiva restou demonstrada pelos diversos documentos que instruíram os procedimentos administrativo-fiscais acostados aos autos, tais como Auto de Infração (fl. 107), totalizando um valor consolidado em 18.09.2008 de R$ 467.153,12 (quatrocentos e sessenta e sete mil, cento e cinquenta e três reais e doze centavos), excluídos juros e multa, Discriminativo Analítico de Débito (fls. 110/116 e 163), Discriminativo Sintético de Débito (fls. 117/119 e 164), Relatório de Lançamentos (fls. 120/124) e relação de notas fiscais de prestadores de serviços cujas retenções efetuadas não foram recolhidas (fls. 144/155), sendo incontroverso que contribuições foram descontadas de segurados e não foram repassadas à Previdência Social.


Em sede de interrogatório, declara, o acusado José Mário Prior:


"Que tem uma renda mensal de aproximadamente R$ 4.000,00 (quatro mil reais). Que deixou de recolher as contribuições em situação de desespero. Que ou pagava os funcionários ou recolhia as contribuições. Que chegou a penhorar a própria residência para fazer os pagamentos dos funcionários. Que passou a ter dificuldades a partir de planos econômicos. Que tem bastantes causas trabalhistas pendentes na empresa, aproximadamente 70 ou 80. Que a empresa Labormax encontra-se em processo de recuperação judicial. Que vendeu um salão de 400 m para adimplir os salários. Que a empresa deixou de pagar outros tributos, além da Contribuição Previdenciária. Que sofreu protestos e ações de cobrança. Que contratou uma empresa de consultoria, mas não houve ganho administrativo relevante em tal contratação. Que a empresa era administrada por funcionários. Que sabia da ausência de repasses, mas que não era possível fazê-los por absoluta impossibilidade financeira. Que não demitiu funcionários nesse período em razão da crise financeira. Que deixou de pagar fornecedores. Que tinha um preço de caixa que, por exemplo, custava R$ 0,50 (cinquenta centavos), passou a custar R$ 3,00 (três reais). Que o aumento foi inesperado se deveu ao aumento repentino do dólar e das matérias-primas. Que a mudança brusca na economia causou grandes danos à empresa. Que a crise começou em 2003. Que houve atrasos de salários, mas não mais de 30 (trinta) dias. Que tentou aderir ao REFIS, mas que a crise de energia elétrica também causou mais problemas financeiros à empresa, ocasionando a exclusão posterior do REFIS".

Da análise do contrato social e suas alterações (fls. 56/69), verifica-se que a administração e gerência da empresa "LABORMAX PRODUTOS QUÍMICOS INDÚSTRIA E COMÉRCIO" eram exercidas exclusivamente pelo acusado Giuseppe Mário Prior (fl. 67). Bem assim, ainda que o acusado argumente que a parte administrativa era comandada por funcionários, sequer logrou indicar quem seriam estes funcionários, como era a divisão gerencial entre eles, além de, conforme já mencionado em relação ao contrato social, ser incabível se desincumbir das obrigações societárias, quando o próprio contrato social é expresso em relação ao poder de gerência e administração, ressaltando, ainda, que se tratava de um poder exclusivo do acusado.


Quanto ao elemento subjetivo, verifica-se que é irrelevante perquirir sobre sua comprovação, porquanto os tipos penais de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária exigem apenas o dolo genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamentos efetuados aos empregados, e de suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária ou qualquer acessório.


Não se exige do agente o animus rem sibi habendi dos valores descontados e não repassados, bem como suprimidos ou reduzidos, uma vez que a consumação do delito se dá com a mera ausência de recolhimento, bem como de supressão ou redução da contribuição:


"AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. CRIMES DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA E SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (INCISO I DO § 1º DO ART. 168-A E INCISO III DO ART. 337-A, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). (...) DOLO ESPECÍFICO. NÃO-EXIGÊNCIA PARA AMBAS AS FIGURAS TÍPICAS. (...)
(...)
3. A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, para a configuração do crime de apropriação indébita previdenciária, basta a demonstração do dolo genérico, sendo dispensável um especial fim de agir, conhecido como animus rem sibi habendi (a intenção de ter a coisa para si). Assim como ocorre quanto ao delito de apropriação indébita previdenciária, o elemento subjetivo animador da conduta típica do crime de sonegação de contribuição previdenciária é o dolo genérico, consistente na intenção de concretizar a evasão tributária."
(STF, AP 516, Rel. Min. Ayres Britto, j. 27.09.10)
 
HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO (ANIMUS REM SIBI HABENDI). IMPROCEDÊNCIA DAS ALEGAÇÕES. ORDEM DENEGADA.
1. É firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária, não é necessário um fim específico, ou seja, o animus rem sibi habendi (cf., por exemplo, HC 84.589, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 10.12.2004), "bastando para nesta incidir a vontade livre e consciente de não recolher as importâncias descontadas dos salários dos empregados da empresa pela qual responde o agente" (HC 78.234, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 21.5.1999). No mesmo sentido: HC 86.478, de minha relatoria, DJ 7.12.2006; RHC 86.072, Rel. Min. Eros Grau, DJ 28.10.2005; HC 84.021, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 14.5.2004; entre outros). 2. A espécie de dolo não tem influência na classificação dos crimes segundo o resultado, pois crimes materiais ou formais podem ter como móvel tanto o dolo genérico quanto o dolo específico. 3. Habeas corpus denegado.(HC 96092, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 02/06/2009, DJe-121 DIVULG 30-06-2009 PUBLIC 01-07-2009 EMENT VOL-02367-04 PP-00589 RT v. 98, n. 888, 2009, p. 500-507)

Analise-se, bem assim, no caso, a tese de inexigibilidade de conduta diversa, fundamento da absolvição do acusado em primeiro grau.


Bem assim, para que a inexigibilidade de conduta diversa se caracterize como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, exige-se que as dificuldades sejam de tal ordem que coloquem em risco a própria existência da empresa. Portanto, apenas a impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a supressão ou redução de contribuição social previdenciária, devendo ainda ser esporádica, momentânea, e não uma situação habitual e prolongada indefinidamente por anos a fio.


Entende-se, em tese, ser possível excluir a culpabilidade dos agentes por inexigibilidade de conduta diversa, desde que certos requisitos sejam provados, dentre eles, por exemplo, a comprovação, por parte do acusado, nos termos do artigo 156, do Código de Processo Penal, a da efetiva existência das dificuldades financeiras, o que deve ser feito por meio de prova documental; de que estas dificuldades foram causadas por motivos não relacionados a eventual má administração; que elas punham em risco a própria sobrevivência da entidade, não bastando meras dificuldade circunstanciais; que era caótica a situação da pessoa jurídica e que não existia outra opção aos seus sócios e administradores, de que o dinheiro não repassado à Previdência Social foi efetivamente utilizado na tentativa de preservação da empresa, especialmente no pagamento dos salários, e não no enriquecimento de sócios e administradores e, no caso das pessoas jurídicas com fins lucrativos, como o dos autos, do sacrifício dos bens pessoais dos sócios em benefício da empresa.


A prova da excludente da culpabilidade deve ser documental e robusta, inclusive com a realização de perícia nos livros contábeis, notas fiscais, registros de movimentação bancária e financeira, dentre outros documentos pertencentes à pessoa jurídica. Tal ônus é da própria defesa, que teve oportunidade de produzir provas a respeito da alegada dificuldade financeira, e, não as tendo realizado, descabe qualquer pleito de nulidade, nos termos do artigo 565, do Código de Processo Penal.


Nesse sentido:


"RECURSO ESPECIAL. PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. AUSÊNCIA DE PERÍCIA CONTÁBIL. NULIDADE. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. DIFICULDADES FINANCEIRAS DA EMPRESA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. SÚMULA N.º 7 DESTA CORTE. ARTIGO 168-A DO CP. CRIME OMISSIVO. DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. SÚMULA 83 DESTA CORTE. APLICAÇÃO RETROATIVA DE LEI MAIS GRAVOSA. INOCORRÊNCIA. RECURSO QUE SE CONHECE PARCIALMENTE E, NA EXTENSÃO, NEGA-SE PROVIMENTO.
1. Mostrava-se desnecessária a prova pericial no caso em apreço, para demonstração das dificuldades financeiras sofridas pela empresa, eis que outros elementos de prova puderam ser produzidos e exibidos pela defesa formando o convencimento do juiz; além disso, aplicável à espécie o princípio de que não há nulidade sem a demonstração do prejuízo, previsto no artigo 563 do Código de Processo Penal, pois a ausência da perícia contábil não enseja o reconhecimento de nulidade diante do teor da documentação já se encontrava nos autos, não restando comprovado o prejuízo sofrido pela parte;
2. De outra parte, o princípio do livre convencimento fundamentado, regente no direito processual penal brasileiro, permite ao juiz que aprecie livremente a prova, conforme o ditame principiológico contido no artigo 157 do Código de Processo Penal;
3. A alegação de que a empresa passava por uma série de dificuldades financeiras, motivo pelo qual não foi possível repassar a contribuição previdenciária recolhida dos empregados implicaria, no caso, o reexame de provas, inviável em sede de recurso especial, por esbarrar no óbice imposto pelo enunciado sumular n.º 7 desta Corte;
4. O dolo, nesses delitos, esgota-se com a simples omissão, pois não se pretende a causação de resultado algum. Daí porque a jurisprudência desta Corte pacificou-se no sentido de não exigir o fim especial de agir do agente, o dolo específico, não havendo de se demonstrar o animus rem sibi habendi para a caracterização do delito;
5. Este Superior Tribunal já consolidou posicionamento no sentido de que a Lei 9.983/00, ao acrescentar o artigo 168-A, § 1º, ao Código Penal, revogando no art. 95 da Lei nº 8.212/91, manteve a figura típica anterior no seu aspecto substancial, não fazendo desaparecer o delito em questão ou configurando aplicação de lei mais gravosa;
6. Recurso de que se conhece parcialmente e a que, nessa extensão, se nega provimento."
(REsp 510.742/RS, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, SEXTA TURMA, julgado em 09/12/2005, DJ 13/02/2006, p. 855)

No caso dos autos, verifique-se, por primeiro, além do depoimento do acusado, os relatos testemunhais de Alvim Morais Cardozo Neto, Flávia Cristiane de Araújo e Maria Inês Poltronieri de Oliveira, indicando a perda de clientes importantes e grande queda no faturamento da empresa, inclusive com paralisação da produção pela falta de matéria-prima, bem como atrasos nos salários de funcionários, tornando prejudicado o funcionamento da empresa.


Aos autos foram juntados, também, diversas certidões de protestos (fls. 196/249), certidão de distribuição cível (fls. 250/254), demonstrando inúmeras ações de natureza fiscal, além de a empresa Labormax figurar como reclamada em grande quantidade de processos trabalhistas, além da indicação de que que a empresa encontrava-se em recuperação judicial (fls. 255/293).


É importante notar que, como já mencionado, não basta apenas que haja demonstração de crise financeira para a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa, mas, também, que esta não tenha ocorrida por irresponsabilidade gerencial do administrador.


Nesse sentido, é importante verificar a substancial perda patrimonial sofrida pela empresa entre os anos de 2002 a 2005 (fl. 337), período que coincide com os débitos da presente ação (01/2003 a 12/2004), bem como corrobora o argumento segundo o qual tornara-se bastante dificultoso adimplir os tributos relacionados aos autos.


Diante, portanto, dos argumentos trazidos acima, reputo presentes os elementos necessários a atestar a correção do Julgador de primeiro grau em aplicar, no caso, a causa supralegal de exclusão da culpabilidade caracterizada pela inexigibilidade de conduta diversa, diante da insuportável crise financeira que se abateu na empresa Labormax.


Confiram-se, nesse sentido, precedentes desta Colenda Corte:


"PENAL E PROCESSUAL. APELAÇÃO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CP. MATERIALIDADE DO DELITO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DA AUTORIA DELITIVA. DOLO GENÉRICO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA CONFIGURADA. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, V, DO CPP.
1. Os documentos obtidos no procedimento administrativo-fiscal são suficientes para a demonstração do tipo objetivo da infração penal em comento. 2. No entanto, a instrução processual não dissipou as dúvidas no que tange à autoria delitiva, remanescendo controvérsias na prova oral colhida acerca da responsabilidade pela gerência financeira e fiscal da empresa em questão. 3. Apelação da defesa provida. Absolvição, nos termos do art. 386, V, do CPP."
(ACR 00099885320054036110, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/06/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"PENAL E PROCESSO PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL. CONSTITUCIONALIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADOS. DOLO PRESENTE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. ABSOLVIÇÃO. APELO PROVIDO.
1. Não há violação ao princípio da isonomia pelo art. 168-A do Código Penal em face do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, uma vez que as normas tutelam bens jurídicos diversos e as condutas têm potencialidade lesiva muito desigual, o que justifica diferença dos preceitos secundários dos tipos penais, não sendo o momento processual adequado para sustentar a inconstitucionalidade do preceito. 2. Os diversos documentos que instruem os autos comprovam a materialidade delitiva que, ademais, é inconteste. 3. Autoria atestada pelo interrogatório e cópias dos instrumentos particulares de constituição da sociedade. 4. O elemento subjetivo do tipo descrito no artigo 168-A do Código Penal é o dolo genérico, assim entendido a vontade livre e consciente de descontar contribuição previdenciária da folha de salário dos empregados e deixar de repassar os valores à Previdência Social, o que esteve demonstrado nos autos. 5. Existência de provas substanciais quanto à alegada dificuldade financeira da empresa, no período em que foi administrada pelo apelante, reconhecendo-se a causa excludente de sua culpabilidade, qual seja, inexigibilidade de conduta diversa. 6. Recurso a que se dá provimento para absolver o réu da imputação contida na denúncia, com supedâneo no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal."(ACR 00078592720034036181, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/10/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"PENAL - PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL - AUSÊNCIA DO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES DESCONTADAS DOS EMPREGADOS - ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL - PRELIMINARES DE DEFESA REJEITADAS - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS - DOLO - CRIME FORMAL - "ANIMUS REM SIBI HABENDI" - INEXIGÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO - INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA - DIFICULDADES FINANCEIRAS COMPROVADAS - RECURSO DO RÉU PROVIDO.
1. Preliminares de defesa: Preliminares defensivas rejeitadas. 2. Materialidade e autoria delitivas. A materialidade e autoria delitivas comprovadas. 3. Do dolo. Quanto à afirmação da ausência de dolo na conduta do réu, não tendo o propósito de se apropriar das quantias, bem como a de que não obteve qualquer benefício com a conduta, não merece guarida tal alegação, uma vez que não possui relevância jurídica o fato de a apelante não ter tomado em proveito próprio o numerário devido à autarquia, eis que mero exaurimento do crime, não sendo exigida a presença do animus rem sibi habendi para a caracterização do delito. Precedente do C. STF. 4. Inexigibilidade de conduta diversa. Alegação de dificuldades financeiras da empresa. A construção doutrinária e jurisprudencial se encarregou de atenuar o rigor da norma, de maneira que, em circunstâncias excepcionais, a retenção dos valores devidos pode não sofrer um juízo de reprovação. Com efeito, se as dificuldades financeiras não resultaram de fraude ou má-fé e se foram graves a ponto de colocar em risco a própria sobrevivência da empresa, admite-se, repito, excepcionalmente, a aplicação da causa supralegal de exclusão da culpabilidade consistente na inexigibilidade de conduta diversa. Ressalta-se que o caráter antijurídico ou ilícito da conduta permanece íntegra, contudo a reprovabilidade do ato é afastada. Precedentes dos nossos E. Tribunais Regionais Federais. 5. Desta forma, resta caracterizada a inexigibilidade de conduta diversa em razão da crise financeira enfrentada pela empresa, comprovada através dos depoimentos citados e pela farta prova documental (Certidão de Objeto e Pé relativa ao processo n.º 96.846645-9 - fls. 458/459; Certidão emitida pelo 1º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital - fls. 460/532; existência de diversas ações em desfavor do acusado e suas empresas associadas - fls. 535/550; existência de diversas ações trabalhistas em desfavor do acusado e suas empresas associadas - fls. 551/581), ante a comprovação das dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, que inclusive teve requerida a declaração de sua falência, torna-se aplicável, na hipótese, a causa excludente da culpabilidade consistente na inexigibilidade de conduta diversa. 6. Preliminares de defesa rejeitadas. Apelação defensiva a que se dá provimento para absolver o réu, embora, provadas a materialidade e autoria delitivas, por aplicação da causa supralegal de exclusão da culpabilidade consistente na inexigibilidade de conduta diversa - dificuldades financeiras."
(ACR 00270920720004036119, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/08/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Diante do exposto, nego provimento ao recurso ministerial, mantendo a sentença de primeiro grau em todos os seus termos.


É o voto.



Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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