Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/12/2014
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000805-80.2008.4.03.6004/MS
2008.60.04.000805-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : JOSE CLAUDIO DA SILVA reu preso
ADVOGADO : MS010283 LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR (Int.Pessoal)
APELADO(A) : LEANDRO DA CRUZ FARIAS
ADVOGADO : MS006016 ROBERTO ROCHA (Int.Pessoal)
No. ORIG. : 00008058020084036004 1 Vr CORUMBA/MS

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA. CIRCUNSTÂNCIAS PREPONDERANTES. TRANSNACIONALIDADE. MEMBRO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. FINANCIADOR DA PRÁTICA DO CRIME. RECURSO PROVIDO.
1. Condenação pela prática do crime de tráfico internacional de drogas, pois materialidade, autoria e dolo comprovados, já que restou demonstrado a participação do acusado L.C.F., que com consciência e vontade, contratou outrem para importar, trazer e transportar droga entre países, inclusive planejado, financiado e coordenado a empreitada criminosa.
2. Reconhecimento fotográfico realizado na fase policial corroborado na fase judicial, constituindo meio de prova.
3. Não há que se falar em inadmissibilidade como meio de prova do depoimento prestado por codenunciado, uma vez que enquadra-se como delação, haja vista que desde suas declarações em sede policial, por ocasião de sua prisão em flagrante, até seu interrogatório judicial, confessou a autoria do crime e atribuiu ao corréu a participação na infração penal como articulador.
4. Quanto à dosimetria da pena do acusado J.C.S., afastada, "ex officio", a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06, haja vista que a mera utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita não é suficiente para a aplicação da majorante, devendo ser demonstrada a efetiva comercialização da droga no próprio transporte público.
5. Aplicável o disposto no artigo 41, da Lei nº 11.343/06, vez que houve a efetiva colaboração do réu com a investigação policial e o processo criminal, tendo confessado sua participação no delito e fornecido informações precisas e detalhadas acerca da pessoa que financiou a empreitada criminosa, de maneira a elucidar o caso e possibilitar a identificação do partícipe, o qual foi processado e condenado, razão pela qual reduzo sua pena em 1/3 (um terços), haja vista que não foram fornecidas informações suficientes a desmantelar uma organização criminosa, resultando na pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa.
6. Em relação à dosimetria da pena do acusado L.C.F., na primeira fase de dosimetria da pena, a natureza e a quantidade da droga, bem como a personalidade e a conduta do agente, prepodenrem sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/06, razão pela qual sua pena-base deve ser fixada em 6 (seis) anos reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
7. Agravante de reincidência reconhecida, uma vez que o acusado praticou novo crime após o trânsito em julgado de sentença que o condenou também pelo delito de tráfico de drogas, além de associação para o tráfico, razão pela qual majoro a pena em 1/6 (um sexto), resultando em 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
8. Incidência das causas de aumento previstas nos incisos I e VII, do artigo 40, da Lei de Drogas, uma vez que financiou a viagem de outrem para trazer e transportar o entorpecente da Bolívia até o Brasil, razão pela qual aumento a pena em 1/5 (um quinto), resultando na pena de 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa.
9. Inaplicável a causa de diminuição de pena descrita no §4°, do artigo 33, do Código Penal, pois, entre outros motivos, se trata de agente reincidente, inclusive pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico.
10. Valor unitário do dia-multa fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos em razão de ausência de informações acerca de sua condição econômico-financeira.
11. Regime inicial fechado para cumprimento da pena em face da quantidade da pena, da reincidência do acusado, além da elevada quantidade e natureza altamente nociva do entorpecente apreendido.
12. Incabível a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, porque não está preenchido o requisito objetivo exigido pelo artigo 44, do Código Penal, diante da quantidade da pena ora aplicada.
13. Prisão preventiva restabelecida em face da presença do "fumus comissi delicti" e "periculum libertatis", haja vista que o decreto condenatório por si só demonstra que a materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas.
14. Afastamento, "ex officio", da causa de aumento descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06 da dosimetria da pena do réu J.C.S. e apelação provida para condenar o réu L.C.F. ao cumprimento da pena definitiva de 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime previsto no artigo 33, "caput", c/c artigo 40, incisos I e VII, ambos da Lei n° 11.343/06, e aplicar a causa de diminuição prevista no artigo 41, da Lei n° 11.343/06 na pena do réu J.C.S., resultando na pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, afastar, ex officio, a causa de aumento descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06 da dosimetria da pena do réu José Cláudio da Silva e dar provimento à apelação para condenar o réu Leandro da Cruz Farias ao cumprimento da pena definitiva de 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multas, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c/ artigo 40, incisos I e VII, ambos da Lei nº 11.343/06, e aplicar a causa de diminuição prevista no artigo 41, da Lei 11.343/06 na pena do réu José Cláudio da Silva, resultando na pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito ) dias-multa, mantida, no mais, a r. sentença, nos termos do voto do Senhor Desembargador Federal, Relator, acompanhado pelo voto do Senhor Desembargador Federal Peixoto Junior, pela conclusão, e pelo voto do Senhor Desembargador Federal Cotrim Guimarães.



São Paulo, 25 de novembro de 2014.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000805-80.2008.4.03.6004/MS
2008.60.04.000805-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : JOSE CLAUDIO DA SILVA reu preso
ADVOGADO : MS010283 LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR (Int.Pessoal)
APELADO(A) : LEANDRO DA CRUZ FARIAS
ADVOGADO : MS006016 ROBERTO ROCHA (Int.Pessoal)
No. ORIG. : 00008058020084036004 1 Vr CORUMBA/MS

RELATÓRIO


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença que condenou o réu José Cláudio da Silva e absolveu o réu Leandro da Cruz Farias pela prática do crime previsto no artigo 33, "caput", c/c artigo 40, incisos I e III, ambos da Lei n° 11.343/06.


Narra a denúncia que:


"No dia 09 de julho de 2008, por volta das 11:20 horas, durante fiscalização de rotina realizada junto ao posto fiscal Lampião Aceso, na Rodovia BR 262, neste município de Corumbá/MS, uma equipe de policiais federais flagrou JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA, passageiro embarcado no ônibus da Viação Andorinha que partira de Corumbá/MS com destino a Campo Grande/MS às 11:00 horas, levando consigo, dolosamente e plenamente ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, no interior de sua mala de mão, quatro pacotes de plástico no interior dos quais estavam acondicionadas, no total, 51 (cinqüenta e uma) cápsulas contendo aproximadamente 600g (seiscentos gramas) de substância entorpecente identificada como sendo "COCAÍNA", além de outras 09 (nove) cápsulas, contendo aproximadamente 106g (cento e seis gramas) da mesma substância, em seu trato intestinal.
O flagrante ocorreu quando, na abordagem ao referido ônibus, a equipe de policiais começou a entrevistar os passageiros, dentre eles JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA, que informou que teria vindo de Três Lagoas/MS até Corumbá/MS para "pregar a palavra de Deus" na Igreja Assembléia de Deus, sem que, contudo, soubesse precisar o endereço da citada igreja ou tampouco o nome do "irmão da igreja" com quem ficara hospedado. Ato continuo, foi feita a revista em seus pertences, inclusive uma pequena mala marrom que estava debaixo de sua poltrona e que ele admitiu ser de sua propriedade, no interior da qual foram encontrados, envoltos em um casaco, quatro pacotes contendo cápsulas de cor preta semelhantes àquelas normalmente utilizadas para transportar cocaína.
Assim que as cápsulas foram encontradas, CLÁUDIO, vulgo "MAGRÃO", admitiu aos policiais que se tratava de entorpecente e que o estava transportando a mando de um homem também residente em Três Lagoas/MS, que conhecia apenas pela alcunha de "TESTA", o qual lhe havia prometido R$500,00 (quinhentos reais) pelo "serviço". Ademais, afirmou que o contratante lhe entregara um aparelho celular para que se comunicassem no curso da empreitada, relatando que assim que chegara em Corumbá, "TESTA" ligara e fornecera as coordenadas para que fosse até a feirinha da Bolívia apanhar a "mercadoria".
Em seu interrogatório policial, JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA reafirmou que fora aliciado por "TESTA" para realizar a empreitada criminosa, fornecendo informações detalhadas sobre a localização da residência deste último no município de Três Lagoas/MS, onde funcionaria uma "boca de fumo". Disse também que "TESTA" tem aproximadamente 25 (vinte e cinco) anos, é moreno claro, forte, mas não musculoso, com altura aproximada de 1,65m, cabelo cortado baixo, olhos pretos, nariz afilado, dentes para frente, com uma tatuagem no antebraço, afirmando que o mesmo está cumprindo pena em regime semi-aberto em Três Lagoas/MS, provavelmente por tráfico, acrescentando ainda que "TESTA" já havia contratado anteriormente uma pessoa para buscar drogas na Bolívia, a qual fora presa em Três Lagoas/MS.
A propósito, especificamente, da empreitada criminosa por ele protagonizada, JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA relatou que, no dia 07 de julho, "TESTA" lhe entregara o dinheiro para que comprasse as passagens de Três Lagoas para Corumbá, bem como um telefone celular para que pudessem manter contato. Assim que chegara a Corumbá, na tarde do dia 08 de julho, JOSÉ CLÁUDIO recebera uma ligação de "TESTA", que lhe dissera para que se dirigisse até a "feirinha" na Bolívia, para apanhar "umas pedras de crack". Seguindo as coordenadas passadas por "TESTA", JOSÉ CARLOS tomara um moto-táxi que o levara até a fronteira, dirigindo-se então a pé até o país vizinho, onde recebera a ligação de um boliviano que, informado sobre sua localização, fora ao seu encontro e lhe entregara um pacote, dizendo-lhe que continha 60 (sessenta) cápsulas, passando-lhe ainda a orientação de que não passasse pela ponte de concreto ao retornar para o Brasil, mas sim por um caminho de terra debaixo da citada ponte.
De volta ao hotel onde havia se hospedado em Corumbá, JOSÉ CARLOS começara a engolir parte das cápsulas, porém não se sentira bem e expelira algumas delas, as quais guardara em um saco plástico, posteriormente acondicionado, juntamente com os outros três pacotes confeccionados com filme plástico contendo o restante das cápsulas, em sua mala de mão. Na manhã seguinte, o denunciado iniciara sua jornada de volta a Três Lagoas, onde deveria entregar a droga para "TESTA", que em contrapartida lhe pagaria os R$ 500,00 (quinhentos reais) combinados, mas não chegara a seu destino porque fora surpreendido pelos policiais federais. Relatou, por fim, o denunciado, que naquele momento ainda possuía 9 (nove) cápsulas no interior do seu corpo, razão pela qual foi então conduzido ao hospital para expeli-las.
Através de diligências realizadas inclusive com o apoio da Delegacia de Polícia Federal em Três Lagoas, a autoridade policial logrou êxito em obter a possível identificação de "TESTA", que seria na verdade LEONARDO DA CRUZ FARIAS (fl. 41).
Outrossim, com o intuito de confirmar a identidade de "TESTA", a autoridade policial entrou em contato com o Instituto de Identificação de Mato Grosso do Sul, solicitando o encaminhamento do prontuário de identificação de LEONARDO DA CRUZ FARIAS, documento no qual apostas a fotografia e as impressões digitais do indigitado suspeito. Após o envio do aludido documento (fls. 30/31 e 44/45), foi formalizada a lavratura de auto de reconhecimento fotográfico, realizado com a devida observância das cautelas previstas no art. 226 do Código de Processo Penal, tendo JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA reconhecido, com segurança e convicção, que a pessoa de alcunha "TESTA" a quem se referira se tratava, na verdade, de LEONARDO DA CRUZ FARIAS (fls. 32/33).
Cabe ressaltar ainda que agentes da Delegacia de Polícia Federal em Três Lagoas confirmaram a veracidade das declarações de "MAGRÃO" no sentido de que "TESTA" estava cumprindo pena em regime semi-aberto naquele município, bem como que este tinha a posse de um veículo Volkswagen, modelo Saveiro, e de uma motocicleta. De fato, através de breve vigilância realizada nos locais freqüentados por LEONARDO DA CRUZ FARIAS, foi observado que em seus deslocamentos ele se utilizou de dois veículos, um Volkswagen Saveiro, cor verde, placas MOY-7619, e uma motocicleta Honda TITAN, cor preta, placas HSZ-7113 (fl. 41), tendo, porém, a checagem das placas indicado que tais veículos se encontram registrados em nome de outras pessoas, que podem ser os donos anteriores ou "laranjas" (fl. 421/v.°), contexto a partir do qual se pode inferir que referidos bens, assim como outros que segundo "MAGRÃO" estariam na posse de "TESTA", cuja única fonte de renda seria advinda do comércio de drogas praticado em sua "boca de fumo", muito provavelmente representam o proveito auferido com a prática da traficância.
Verifica-se, portanto, que apesar de ainda não ter sido juntado aos autos o termo de interrogatório - cuja realização foi deprecada pela i. Autoridade Policial (fls. 47/48) - de LEONARDO DA CRUZ FARIAS referente aos fatos de que ora se cuida, os elementos de convicção apontados consubstanciam indícios suficientes de seu concurso para a prática da empreitada criminosa protagonizada por JOSÉ CLAUDIO DA SILVA.
Diante do quadro fático anteriormente relatado, tem-se que: a) a materialidade delitiva do crime de tráfico ilícito de drogas já está comprovada pelo Laudo de Exame de Substância acostado às fls. 36/39 dos autos, que identificou como sendo cocaína, na forma de base, a substância acondicionada nas 60 (sessenta) cápsulas apreendidas em poder do denunciado JOSÉ CLÁUDIO, perfazendo o peso bruto total de aproximadamente 720 (setecentos e vinte) gramas; os indícios suficientes de autoria, por seu turno, emergem da prova oral colhida em sede policial, conforme análise anteriormente esposada; b) a transnacionalidade do crime de tráfico ilícito de drogas está demonstrada pelas circunstâncias do caso, inclusive pelas declarações do denunciado JOSÉ CLAUDIO DA SILVA, que admitiu que a droga foi obtida na Bolívia; c) a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso III, da Lei n.° 11.343/06, restou configurada pelo transporte da substância em transporte público, vez que o denunciado JOSÉ CLÁUDIO foi flagrado quando levava consigo a droga em ônibus da Viação Andorinha; d) extrai-se do interrogatório inquisitorial de JOSÉ CLAUDIO DA SILVA, que foi LEONARDO DA CRUZ FARIAS o articulador do tráfico, tendo custeado a prática do crime e arcado com as despesas necessárias para pôr em marcha o plano criminoso, razão pela qual deve-lhe ser aplicada a causa de aumento de pena prevista no inciso VII do artigo 40 da Lei n0 11.343/2006; e) não obstante tenham os denunciados se associado com o propósito de praticarem o tráfico de entorpecentes durante cuja consumação foi JOSÉ CLÁUDIO flagrado, não existem nos autos indícios de que haja estabilidade no vinculo que os uniu para a perpetração do ilícito, razão pela se deixa de denunciá-los, ao menos por ora, pela prática do crime previsto no artigo 35, caput, da Lei n° 11.343/2006 (associação para o tráfico).
Portanto, considerando que JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA e LEONARDO DA CRUZ FARIAS, de forma livre e plenamente conscientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, uniram esforços para que o primeiro, sob coordenação do segundo, adquirisse, importasse e transportasse substância entorpecente, da Bolívia para o Brasil, sem autorização e em desacordo com qualquer determinação legal ou regulamentar, utilizando-se inclusive de transporte público, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL os DENUNCIA por incurso nas penas do artigo 33, caput (modalidades adquirir/importar/transportar), com a incidência das causas de aumento de pena previstas no artigo 40, incisos I, III, ambos da Lei n.° 11.343/2006, alvitrando ainda a incidência da causa de aumento de pena prevista no inciso VII do artigo 40 do referido diploma legal em relação a LEONARDO, por ter sido o responsável pelo financiamento da empreitada criminosa."
(fls. 81/88)

Posteriormente, o Ministério Público Federal aditou a denúncia para retificar o nome do denunciado Leandro da Cruz Farias (fl. 107).


A denúncia foi recebida em 30 de janeiro de 2009, quanto ao acusado José Claudio da Silva (fl. 178), e em 25 de março de 2009, quanto ao acusado Leandro da Cruz Farias (fl. 200).


Após regular instrução, sobreveio sentença, publicada aos 25 de maio de 2010 (fl. 516), que julgou parcialmente procedente a ação penal para absolver o réu Leandro da Cruz Farias da imputação feita na denúncia, com fulcro no artigo 386, inciso V, do Código de Processo penal, e condenar o réu José Cláudio da Silva ao cumprimento da pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo à época dos fatos, pela prática do delito tipificado no artigo 33, "caput", c/c artigo 40, incisos I e III, da Lei n° 11.343/06 (fls. 507/515).


Em razões recursais, o "Parquet" pugna pela condenação do acusado Leandro da Cruz Farias, em razão de sua responsabilidade pelo tráfico transnacional de drogas ser inequívoca, com a aplicação do benefício da delação premiada, previsto no artigo 41, da Lei n° 11.343/06, ao acusado José Claudio da Silva em face de sua colaboração na identificação daquele (fls. 520/535).


Foram apresentadas contrarrazões (fs. 687/689 e 702/703).


A Procuradoria Regional da República da 3ª Região opina, em parecer, pelo provimento do recurso (fls. 706/709v).


É o relatório.


À revisão.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 14/10/2014 22:18:04



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000805-80.2008.4.03.6004/MS
2008.60.04.000805-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : JOSE CLAUDIO DA SILVA reu preso
ADVOGADO : MS010283 LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR (Int.Pessoal)
APELADO(A) : LEANDRO DA CRUZ FARIAS
ADVOGADO : MS006016 ROBERTO ROCHA (Int.Pessoal)
No. ORIG. : 00008058020084036004 1 Vr CORUMBA/MS

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


Inexistindo preliminares a serem analisadas, passo ao exame do mérito recursal.


A materialidade delitiva está demonstrada pelo laudo de exame preliminar de constatação de substância (fl. 20), auto de apresentação e apreensão (fls. 10/18), auto de apreensão (fls. 31/32) e laudo de exame de substância (fls. 42/45), os quais demonstraram que o material apreendido consistiu na massa bruta total de 720g (setecentos e vinte gramas) de cocaína, acondicionada num total 60 (sessenta) cápsulas.


Embora não tenha recorrido, cabe destacar que a autoria delitiva do réu José Cláudio da Silva restou inequívoca, uma vez que ele próprio confessou em Juízo que importou, trazia consigo e transportava a droga (fls. 226/228), o que foi corroborado pelos depoimentos testemunhais dos policiais que abordaram o ônibus em que o mesmo se encontrava (fls. 285/289 e 329/330).


Porém, o objeto do presente recurso consiste na comprovação ou não da responsabilidade do réu Leandro da Cruz Farias na prática delitiva, uma vez que o "Parquet" aduz que os elementos probatórios colhidos nos autos não deixam dúvidas a respeito, em decorrência, principalmente, das declarações prestadas pelo réu José Cláudio da Silva em sede policial e judicial.


Destarte, é de rigor transcrever integralmente o teor de seu depoimento prestado perante a autoridade policial:


"QUE deseja que lhe seja indicado um Defensor Público da União ou um Advogado Dativo; QUE comunicou a sua prisão ao seu sobrinho FELIPE através dó telefone (11) 6839.6971, já que não se recorda do n° de sua residência; QUE já foi preso por assalto a mão armada no ano de 1992 pelo que se recorda; QUE deseja colaborar apontando o nome de seu contratante e demais circunstâncias do tráfico que praticou; QUE reside na cidade de Três Lagoas, na Vila Piloto, Rua Taufic Farran, n° 580; QUE está em situação difícil, com várias dividas; QUE um conhecido de nome "TESTA" foi até a casa do declarante para oferecer um "serviço", tendo em vista que soube das dificuldades financeiras pelas quais estava passando; QUE "TESTA" tem idade aproximada de 25 anos, é moreno claro, forte mas não musculoso, com 1,65m aproximadamente, cabelo cortado baixo, quase sem cabelo, tem uma tatuagem no antebraço, olhos pretos, nariz afilado, dentes para frente; QUE "TESTA" também mora na Vila Piloto à distância de quinhentos metros da casa do conduzido; QUE "TESTA" está em regime semi-aberto em Três Lagoas/MS, provavelmente por tráfico, já que ele só mexe com droga ; QUE a casa de "TESTA", salvo engano, é a terceira do lado direito, no término da rua de quem segue do "figueirão"; QUE a casa tem muro alto com portão de correr, provavelmente cor verde, sem árvore na frente e possui dois cachorros Pitbull; QUE "TESTA" tem um carro VW, modelo Saveiro; um Renault azul quatro portas, com uma batida na frente, e duas motocicletas; QUE "TESTA" já contratou uma pessoa para vir buscar drogas na Bolívia, sendo que esta pessoa foi presa em Três Lagoas/MS; QUE sabe informar que a casa serve como "boca de fumo"; QUE "TESTA" foi na casa do declarante para lhe oferecer um serviço no último fim de semana; QUE tal serviço consistia em vir até Corumbá/MS buscar uns comprimidos; QUE "TESTA" ofereceu R$ 500,00 pelo transporte, dando tempo, até a segunda-feira, para o conduzido pensar; QUE "TESTA" comprou um botijão de gás para o declarante; QUE na segunda-feira "TESTA" procurou novamente o declarante e lhe indagou se aceitaria o serviço; QUE aceitou o serviço; QUE "TESTA" deu ao declarante o dinheiro para comprar as passagens da viagem; QUE comprou passagens de Três Lagoas para Campo Grande/MS, saindo à 00:30 de terça-feira; QUE antes de sair de Três Lagoas "TESTA" lhe entregou um aparelho de telefonia celular marca Motorola, para que fossem realizadas as comunicações entre eles; QUE chegou a Campo Grande e embarcou em outro ônibus com destino a Corumbá/MS, chegando a esta cidade na terça-feira às 15 horas aproximadamente; QUE se hospedou no Hotel Corumbá, localizado nas proximidades do Terminal Rodoviário desta cidade; QUE "TESTA" ligou para o declarante e disse que deveria ir até a feirinha para pegar umas "pedras de crack"; QUE o declarante disse que o trato não era esse, mas diante da insistência de "TESTA" prosseguiu no intento; QUE "TESTA" mandou o declarante procurar um moto-taxista que o levasse até a feirinha da Bolívia; QUE foi até a fronteira de moto e atravessou a pé; QUE "TESTA" ligou para um boliviano e este ligou para o telefone que estava com o declarante; QUE o boliviano perguntou ao declarante onde estava, havendo respondido que estava em uma casa de móveis e se descreveu para o nacional boliviano; QUE o boliviano chegou em um carro branco de quatro portas, sendo que havia uma mulher no banco do carona do carro; QUE o boliviano entregou um pacote que estava dentro de um saco plástico; QUE havia diversas cápsulas, sendo que o boliviano lhe falou que eram de 60 (sessenta); QUE o boliviano lhe orientou a não passar pela ponte de concreto, mas sim por um caminho de terra quase embaixo da ponte, assim fazendo; QUE pegou um moto-táxi e retornou ao hotel para engolir as cápsulas; QUE engoliu as cápsulas à noite e não se sentiu bem havendo defecado algumas cápsulas, as quais foram guardadas em um saco plástico; QUE declara que ainda está com 9 (nove) cápsulas no interior de seu corpo, as quais não foram expelidas; QUE comprou a passagem da empresa Andorinha para retornar a Campo Grande, poltrona n° 09; QUE iniciou a viagem de volta às 11:00 horas da manhã de hoje, dia 09 de julho de 2008; QUE foi abordado pelos Agentes Policiais Federais logo após o coletivo entrar na Rodovia de saída desta cidade; QUE foi revistado pelos policiais, sendo que a droga foi encontrada no interior da valise de viagem que trazia consigo; QUE foi orientado pelos policiais para colaborar com a investigação para obter os benefícios da delação premiada; QUE nada tem contra os policiais que o prenderam e tampouco contra os que lavram o presente auto; QUE autoriza o acesso aos dados do celular Motorola que está em seu poder; QUE o número (67) 9279-2310 era para contato com "TESTA"; QUE o numero (67) 9629-6911 pertence a "TESTA", que ligou através desse número para o declarante na manhã de hoje; QUE o numero (67) 9211-9804 pertence a "TESTA", que ligou através desse número para o declarante no fim da tarde de ontem."
(fls. 06/08)

Verifica-se, portanto, que, segundo José Cláudio da Silva, o réu Leandro da Cruz Farias, conhecido como "Testa", teria o aliciado a transportar drogas, fornecendo informações detalhadas sobre a residência do último, bem como suas características físicas.


Posteriormente, José Cláudio da Silva apontou com segurança e convicção a foto de n° 2 como sendo da pessoa descrita anteriormente, a qual realmente é do corréu Leandro da Cruz Farias (fls. 38/39), o que foi corroborado em sede judicial, ocasião em que ratificou integralmente suas declarações prestadas no inquérito policial:


"(...) Estava morando na Vila Piloto, em Três Lagoas, juntamente com a minha esposa e a minha filha. Estava trabalhando na Sivobras, uma empresa de construção. Ganhava aproximadamente quinhentos e cinqüenta reais. São verdadeiros os fatos descritos na denúncia. Como eu estava com necessidades financeiras e Testa, não sei informar o verdadeiro nome, morava perto de minha residência, ficou sabendo da minha situação, emprestou-me quinhentos reais. Como eu não estava conseguindo pagar Testa, ele me fez a proposta de vir até Corumbá para buscar a droga e disse-me que ninguém ficaria sabendo, pois era só eu engolir as cápsulas. Tendo em vista ele ter ameaçado se eu não fizesse o serviço ele apagaria todos da minha família, eu aceitei. Conversei com a minha esposa quanto à proposta feita por Testa, sendo que ela me disse para eu falar, denunciar, para a Policia. No entanto, disse a ela que, se eu fizesse isso, eu temia uma represália para ela e minha filha. Testa tinha uma boca de fumo lá na Vila Piloto. Testa estava no regime semi-aberto, mas ele ligou para o moto-taxista me pegar na casa dele e levar até a rodoviária. Toda a despesa da minha viagem foi paga por Testa. Testa me deu um celular. Durante a viagem ele me ligava constantemente, pois ele estava preocupado com a viagem. No momento em que cheguei na rodoviária, em Corumbá, Testa orientou para eu ir até um hotel, após, pegar um moto-táxi, ir até a feirinha. Diante do questionamento do moto-taxista, no tocante ao local em que ficava localizada a feirinha, eu liguei para Testa, sendo que ele me disse que era a feirinha localizada na Bolívia. Fiquei na feirinha, em território boliviano, quando um boliviano se aproximou, pois me identificou pela minha roupa. O boliviano questionou-me se eu era o Magrão e após eu ter confirmado, ele me entregou um pacote contendo a droga. Assim, retornei para o hotel em Corumbá. No hotel, tentei engolir algumas cápsulas, mas não consegui. Só consegui engolir nove cápsulas, sendo que as outras coloquei dentro da mala para realizar o transporte. Segui para a rodoviária em Corumbá, momento em que peguei o ônibus para retornar para Três Lagoas. Tem um rapaz em Três Lagoas que foi preso pelo tráfico de drogas, pois estava atuando a mando de Testa. Reconheço sem dificuldade nenhuma que Testa é a pessoa que consta na foto n° 02, de fls. 33, pois é a mesma pessoa que reconheci na Policia Federal. Via Testa passar constantemente na frente da minha casa, com a Saveiro. Depois que ele me fez o empréstimo, as pessoas me orientaram que ele tinha uma boca de fumo. Não tenho nada contra as testemunhas arroladas na denúncia."
PERGUNTADO AO(À) ACUSADO(A) SE TERIA ALGO MAIS A ACRESCENTAR EM SUA DEFESA, RESPONDEU: "Na verdade, foi bom eu ser preso, pois essa droga iria ser usada para destruir pessoas, bem como era uma coisa que eu estava fazendo pressionado. Inclusive, dentro do presídio em que estou, eu estou no Anexo, que é um seguro, sendo que eu trabalho no local. Fui colocado no Anexo, pois eu estava sendo pressionado para retirar a queixa. Fiquei trancado em uma cela por cinco meses, sem o convívio com os meus companheiros, por causa desse problema. No anexo, não sofro nenhuma pressão, pois no local só há trabalhadores. O diretor do presídio esta consciente do meu problema, pois eu disse a ele que estava sendo pressionado pelo 1° Comando."
ÀS PERGUNTAS DO PROCURADOR DA REPÚBLICA, RESPONDEU: "Eu estava com tuberculose quando fiz o empréstimo com Testa. Eu havia conseguido, inclusive, um benefício no INSS. Não me recordo o nome do benefício, mas fiquei "encostado" do trabalho, recebendo meu salário, isto é, quinhentos reais. Minha esposa e minha minhas dependentes econômicas. Minha filha vai fazer quatorze anos. Após a minha prisão minha esposa começou a trabalhar. Não sei informar se minha esposa esta recebendo Auxílio-reclusão. Testa falou como ameaça que iria colocar "minha filha no peito dele", como namorada, caso eu não pagasse. Minha filha, assim como minha esposa, são evangélicas. Fiquei com medo, pois observei "o movimento dele" na região. Testa tem pessoas que trabalham para ele, isto é, batem em pessoas que não realizam pagamento para ele, manda mudar de região."
(fls. 226/228)

Constata-se, dessa forma, que o reconhecimento fotográfico realizado na fase policial foi corroborado na fase judicial, constituindo meio de prova, conforme entendimento jurisprudencial:


HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO-CABIMENTO. RESSALVA DO ENTENDIMENTO PESSOAL DA RELATORA. PROCESSUAL PENAL. ART. 157, § 2.º, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL. RECONHECIMENTO PESSOAL DO ACUSADO. ARGUIDA INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES PREVISTAS NO ART. 266 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDA.
(...)
3. A jurisprudência dos Tribunais Pátrios admite a possibilidade de reconhecimento do acusado por meio fotográfico, desde que observadas as formalidades contidas no art. 226 do Código de Processo Penal, como na hipótese. Com efeito, o reconhecimento fotográfico do réu, quando ratificado em juízo, sob a garantia do contraditório e ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para fundamentar a condenação. Precedente.
4. "Tendo a fundamentação da r. sentença condenatória, no que se refere à autoria do ilícito, se apoiado no conjunto das provas, e não apenas no reconhecimento por parte da vítima, na delegacia, não há que se falar, in casu, em nulidade por desobediência às formalidades insculpidas no art. 226, do CPP" (HC 156.559/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJe de 13/09/2010). Precedentes.
5. Segundo a legislação penal em vigor, é imprescindível, quando se fala em nulidade de ato processual, a demonstração do prejuízo sofrido, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, o qual não foi demonstrado na hipótese.
6. Ordem de habeas corpus não conhecida.
(HC 273.043/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 27/03/2014, DJe 03/04/2014)
PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 157, § 2.°, I E II, C.C. ART. 70 DO CÓDIGO PENAL. (1) CONDENAÇÃO. APELAÇÃO JULGADA. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE. VIA INADEQUADA. (2) RECONHECIMENTO DO ACUSADO FEITO NA FASE INQUISITORIAL POR MEIO DE FOTOGRAFIA E PESSOALMENTE. CONFIRMAÇÃO EM JUÍZO. POSSIBILIDADE. (3) AUSÊNCIA DE APREENSÃO DA ARMA DE FOGO UTILIZADA. IRRELEVÂNCIA. (4) WRIT NÃO CONHECIDO.
1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso especial.
2. Esta Corte sufragou entendimento "no sentido de que o reconhecimento fotográfico, como meio de prova, é plenamente apto para a identificação do réu e fixação da autoria delituosa, desde que corroborado por outros elementos idôneos de convicção" (HC 22.907/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJ 04/08/2003), assim como na hipótese, em que o reconhecimento ocorreu por meio de fotografia e pessoalmente, tanto na fase inquisitiva como em juízo, sendo referendado por outros meios de prova produzidos em sede judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Esclareça-se que análise mais acurada do referido tema não prescinde do revolvimento material fático-probatório, o que se afigura inviável na via estreita do habeas corpus.
3. A Terceira Seção pacificou o entendimento no sentido da desnecessidade de apreensão e perícia da arma de fogo para que seja configurada a causa de aumento prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal, desde que os demais elementos probatórios demonstrem sua utilização na prática do delito. Ressalva de entendimento da relatora.
4. Habeas corpus não conhecido.
(HC 262.715/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 09/04/2014)
HABEAS CORPUS. ART. 157, § 2.º, INCISO I E II (POR QUATRO VEZES), NA FORMA DO ART. 70, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. CONDENAÇÃO. INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. INVERSÃO DA ORDEM PREVISTA NO ART. 212 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NULIDADE RELATIVA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. PRECEDENTES. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO E PESSOAL. RATIFICAÇÃO EM JUÍZO. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. OBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES DO ART. 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. REPARAÇÃO PELOS DANOS CAUSADOS À VÍTIMA PREVISTA NO ART. 387, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. VIA PROCESSUAL INADEQUADA. PREJUDICIALIDADE NO RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA MENORIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 231 DESTA CORTE. ARMA DE FOGO. EXAME PERICIAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO APREENSÃO DO INSTRUMENTO. DISPENSABILIDADE PARA A CARACTERIZAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO, QUANDO PROVADO O SEU EMPREGO NA PRÁTICA DO CRIME. ORIENTAÇÃO FIRMADA PELA TERCEIRA SEÇÃO DESTA CORTE, NO JULGAMENTO DO ERESP N.º 961.863/RS. PLEITO DE FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL MENOS GRAVOSO. SENTENCIADOS EM CUMPRIMENTO DE PENA POR OUTROS PROCESSOS. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PARA A DETERMINAÇÃO DO NOVO REGIME PRISIONAL. ART. 111 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.
(...)
2. A jurisprudência dos Tribunais Pátrios admite a possibilidade de reconhecimento do acusado por meio fotográfico e pessoal, desde que observadas as formalidades contidas no art. 226 do Código de Processo Penal, o que ocorreu na hipótese.
3. Na espécie dos autos, o reconhecimento fotográfico dos Pacientes foi feito pelas vítimas na fase policial, e ratificado em Juízo.
Observa-se que houve também o reconhecimento pessoal dos acusados pelas vítimas na fase judicial quando da realização da audiência de instrução e julgamento, sob o manto das garantias constitucionais, como se observa do acórdão recorrido.
(...)
10. Ordem de habeas corpus denegada.
(HC 191.724/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/10/2013, DJe 25/10/2013)

O depoimento testemunhal de Maicon dos Santos Amaral, um dos policiais federais que prenderam em flagrante delito o acusado José Cláudio, afirma que ele, desde o momento de sua prisão, alegou que fora contratado por "Testa" (fls. 287/288).


Por sua vez, o corréu Leandro da Cruz Farias afirmou, em sede inquisitorial e judicial, respectivamente, que:


"(...) reside atualmente na Vila Piloto em Três Lagoas/MS no endereço constante acima; QUANTO AO QUESITO DOIS RESPONDEU QUE: sim, tem o apelido de TESTA, apenas acrescentando que há outras pessoas com o mesmo apelido, inclusive na Vila Piloto; QUANTO AO QUESITO TRÊS RESPONDEU QUE: atualmente trabalha tirando leite para um assentamento Pontal do Faia nesta cidade, mas não tem ocupação definida, trabalhando em qualquer área que consiga emprego; QUE, quem lhe paga é uma pessoa chamada JESUS DE TAL, cujo apelido é BRANCO, sendo que acabou de ter sua CTPS registrado pelo empregador ADILSON DE TAL, também para tirar leite em uma Fazenda cujo nome desconhece, localizada no município de Inocência/MS; QUE, está esperando obter liberdade condicional, pois atualmente encontra-se cumprindo pena no regime aberto, fato que ocorrerá no dia 25 do presente mês; QUANTO AO QUESITO QUATRO RESPONDEU QUE: apesar de ter várias passagens por furto quando era menor de idade, nunca foi internado na UNEI, tendo sempre respondido a estes atos infracionais em liberdade por furto de animais; QUE, no ano de 2005 foi detido pela Polícia Militar nesta cidade, estando na posse de 19Kg de maconha, tendo sido autuado em flagrante por esta Delegacia de Polícia Federal; QUE, foi condenado a 5 anos de reclusão, sendo que cumpriu 2 anos no regime fechado passando para o regime semi-aberto em 2007 e para o aberto no final do mesmo ano, sendo que como dito acima, no próximo dia 25, conforme informação da Vara de Execuções Penais desta comarca, obterá o benefício a liberdade condicional; QUE, só foi preso em razão deste crime, sendo que na data em que recebeu a intimação pára comparecer a esta Delegacia para ser ouvido na presente Carta Precatória, Policiais Militares entraram em sua casa em perseguição a um suposto homicida, ocasião em que, em razão de dias atrás, ter sido pego transitando sem habilitação pela Policia Militar, fato que foi conduzido para o Delegado da DIG para checagem sendo constado que o mesmo estaria transitando em horário violando as normas do regime aberto, fato que gerou a suspensão do benefício, sendo novamente recolhido, tendo o interrogado posteriormente esclarecido ao juízo que em razão de estudar a noite, direito garantido pelo juiz da Execução, sendo que o juiz que determinou a suspensão era o juiz criminal que o substituía, o qual desconhecia tal circunstância, gozando o interrogado novamente dos benefícios do regime aberto; QUANTO AO QUESITO CINCO RESPONDEU QUE: cumpre a mencionada pena do regime aberto na Casa do Albergado, no bairro Vila Nova nesta cidade; QUANTO AO QUESITO SEIS RESPONDEU QUE: o único veículo que utilizava era uma moto CG TITAN 125, vermelha, não se recordando do número da placa, a qual era de sua propriedade mas sua esposa a vendeu há aproximadamente 2 meses a pessoa cujo nome desconhece; QUANTO AO QUESITO SETE RESPONDEU QUE: não sabe a quem pertence o veículo VW Saveiro, placas MOY-7619; QUE, não conhece ÉRICA HIBARI YAMAGUTI ALVES; QUANTO AO QUESITO OITO RESPONDEU QUE: não sabe a quem pertence o veículo HONDA CG 150 TITAN, placa HSZ-7113; QUE, não conhece IZAIAS DE OLIVEIRA TEIXEIRA; QUANTO AO QUESITO NOVE RESPONDEU QUE: não utiliza e nunca utilizou os veículos descritos nos quesitos 7 e 8, não sabendo nada a respeito dos mesmos; QUANTO AO QUESITO DEZ RESPONDEU QUE: não conhece JOSE CLÁUDIO DA SILVA, nem conhece ninguém com o apelido de "MAGRÃO", sendo que não adquiriu e nem entregou butijão de gás para ninguém; QUANTO AO QUESITO ONZE RESPONDEU QUE: não contratou ninguém para buscar qualquer droga em qualquer lugar; QUE, justifica o fato de ter sido apontado por referida pessoa como sendo o contratante de tal empreitada criminosa, pelo fato de ter sido confundido por JOSE CLAUDIO, já que não conhece o mesmo; QUANTO AO QUESITO DOZE RESPONDEU QUE: prejudicado; QUANTO AO QUESITO TREZE RESPONDEU QUE: apesar de possuir o telefone celular marca MOTOROLA, modelo novo quadrado, com chip da empresa CLARO, não entregou tal celular a ninguém, pois o mesmo encontra-se queimado em sua residência, sendo que para sua defesa irá apresentá-lo na data de hoje; QUANTO AO QUESITO CATORZE RESPONDEU QUE: não o número 67-9279.2310, nem ligou para tal número nem nos dias 08 e 09 de julho de 2008 e nem em outro dia; QUANTO AO QUESITO QUINZE RESPONDEU QUE: o único aparelho de telefone celular que possui é o MOTOROLA descrito no quesito 13, não utilizando aparelho celular de quaisquer pessoas; QUANTO AO QUESITO DEZESSEIS RESPONDEU QUE: não conhece, não utiliza, nem ligou para os números 67-9629.6911 e 9211.9804 nos dias 08 e 09 de julho de 2008 e nem em qualquer dia; QUANTO AO QUESITO DEZESSETE RESPONDEU QUE: não pode afirmar com certeza, por razões óbvias, mas acha que nos dias 08 e 09 do mês de julho de 2008, tendo sido informado nesta ato que trata-se de 3ª e 4ª feiras, respectivamente, que talvez, por ser sua rotina na época, tenha deixado a casa do Albergado por volta das 05h ou 06h da manhã naqueles dias, tenha se dirigido ao Assentamento mencionado no quesito 3, por volta das 06:30h a 07h, tenha tirado leite até 12h ou 13h, tenha se dirigido a sua residência no endereço acima mencionado, onde reside com esposa, filhas e seus pais, tenha dirigido a escola Edwardes Correia de Souza, bairro Interlagos nesta cidade, onde cursa 1ª e 2ª séries do ensino básico, por volta das 18:45h e tenha se recolhido novamente na Casa do Albergado às 23h; QUE, pode ser que após ter tirado leite tenha conseguido algum "bico" ou serviço na parte da tarde; QUANTO AO QUESITO DEZOITO RESPONDEU QUE: exceto o transporte que fez de 19Kg de maconha em 2005, nunca mais teve nenhum contato com entorpecente nem como usuário, nem como traficante; QUANTO AO QUESITO DEZENOVE RESPONDEU QUE: nunca contratou ninguém para ir para Bolívia; QUANTO AO QUESITO VINTE RESPONDEU QUE: nunca esteve em Corumbá/MS e nem na Bolívia, não conhecendo nenhum boliviano; QUANTO AO QUESITO VINTE E UM RESPONDEU QUE: o interrogado além de negar o delito em apuração, alega em sua defesa que não possui nenhuma tatuagem no corpo, ao contrário que afirmou JOSE CLAUDIO DA SILVA em seu interrogatório, quando afirmou que o interrogado teria uma tatuagem no ante-braço."
(fls. 141/145)
"Que já foi processado anteriormente por tráfico de drogas, tendo sido condenado a cumprir pena de cinco anos, "eu estava cumprindo o regime aberto, quando fui preso novamente" pela acusação constante destes autos. Que não conhece as testemunhas arroladas na denúncia. Que tem baixa escolaridade, tendo cursado até a segunda série do Ensino Fundamental. Que não tem uma profissão definida, "ultimamente eu estava trabalhando registrado como ajudante em um local de extração de leite, mas eu já trabalhei em tudo quanto é coisa, em oficina de veículo, em obra de construção". Que tem duas filhas, uma com seis e outra com três anos de idade. Que sua companheira trabalha atualmente como doméstica. Que tem conhecimento dos fatos narrados na denúncia e os mesmos não são verdadeiros, "eu nego, os fatos não são verdadeiros, eu não tenho condições financeiramente para bancar isso aí não". Que não conhece o réu José Cláudio da Silva, "Nunca vi essa pessoa, não sei quem é, não é meu vizinho, não conheço ninguém de apelido Magrão". Que, perguntado se' saberia a razão do réu José Cláudio ter apontado a sua pessoa como mandante do crime, descrevendo com muitos detalhes a sua pessoa, seu endereço, e seu modo de vida, respondeu "não tenho a mínima idéia, ele pode ter alguma contra mim, não sei porque ele fez isso, pode ser alguém que tem raiva de mim". Que não é proprietário de nenhuma moto ou carro, não tendo nenhum bem em seu nome. Que, na data dos fatos, se encontrava cumprindo pena em casa de albergado, e saía durante o dia para trabalhar e, à noite, estudava na escola Edivardes Correa, em Três Lagoas/MS, retornando ao final da noite para dormir da casa de albergado, "eu trabalhava no mesmo lugar onde estava atualmente, antes de ser preso, na extração de leite". Que é conhecido pela alcunha de "Testa". Que o único telefone celular que utiliza é o da sua esposa, cujo número é (67)9108-3074. ÀS REPERGUNTAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: Que a residência onde mora o interrogando e sua família tem descrição semelhante com a feita pelo réu José Cláudio da Silva quando do interrogatório policial de fls.07/08 desta Precatória, "mas na vila onde eu moro são casas de Cohab, muitas casas têm a mesma descrição". ÀS REPERGUNTAS DA DEFESA DO INTERROGANDO RESPONDEU: Que o nome de sua companheira é Carina da Silva Leite. Que o pai do interrogando tem uma moto Titan vermelha, 125 cilindradas. Que nunca dirigiu uma Saveiro. Que o interrogando afirma que não possui nenhuma tatuagem em seu corpo. Que este magistrado pediu para que o interrogando mostrasse os seus antebraços aos presentes nesta audiência, e foi verificado que nos mesmos não há nenhuma tatuagem. Que durante o cumprimento da pena fez algumas inimizades dentro do presídio. Que a CTPS do interrogando se encontra na posse de sua esposa, cujo contato pode ser feito por meio do número de celular acima transcrito. Que a casa onde mora com sua família é de propriedade de seus pais. SEM REPERGUNTAS PELA DEFESA DO RÉU JOSÉ CLÁUDIO DA SILVA. Que, perguntado se havia algo mais a ser dito em sua defesa, disse que: "e só quero dizer novamente que não cometi esse crime, que não conheço essa pessoa (José Cláudio da Silva) e só o que eu quero é cumprir a minha pena com a Justiça e nunca mais me envolver em nenhum tipo de crime, quero estudar trabalhar e cuidar da minha família."
(fls. 253/256)

Assim, apesar de ter confirmado os dados relativos a sua pessoa e ao local onde reside, fornecidos inicialmente pelo corréu José Cláudio, a Informação n° 015/08 - NI/DPFB/TLS/MS emitida pelo Departamento de Polícia Federal narra que policiais federais, os quais realizaram vigilância nos locais frequentados por Leandro da Cruz Farias, vulgo "Testa", o observaram utilizando o veículo Volkswagen Saveiro, cor verde, placa MOY-7619, e a motocicleta Honda Titan, cor preta, placa HSZ-7113, ambos em nome de terceiros (fls. 47 e 48v).


Assim, pode-se inferir que as declarações do corréu Leandro não se revelaram verídicas, as quais,por serem apenas meio de defesa, devem ser corroboradas pelas provas colhidas nos autos para prevalecerem.


Tendo em vista que os fatos ocorreram no dia 09 de julho de 2008, a juntada da CTPS do acusado Leandro a fim de demonstrar que encontrava-se trabalhando naquela data não é hábil para tanto, uma vez que único registro de contrato de trabalho constante no documento teve início em 5 de dezembro de 2008 (fl. 263).


Por outro lado, observa-se que Leandro da Cruz Farias ostenta antecedente criminal justamente pela prática dos delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico (fls. 404/408), o que corrobora os demais elementos probatórios colhidos neste feito no sentido de que ele foi o articulador da empreitada criminosa.


Não há que se falar em inadmissibilidade como meio de prova do depoimento prestado pelo codenunciado José Cláudio, uma vez que enquadra-se como delação, haja vista que desde suas declarações em sede policial, por ocasião de sua prisão em flagrante, até seu interrogatório judicial, confessou a autoria do crime e atribuiu ao corréu Leandro da Cruz Farias, vulgo "Testa", a participação na infração penal como articulador.


Assim, para ser considerada como meio de prova, a delação deve preencher três requisitos, a saber: "(1) o corréu que fez a delação tenha confessado sua participação no crime; (2) a delação encontre amparo em outros elementos de prova existentes nos autos; (3) no caso de delação extrajudicial, que tenha sido confirmada em juízo. Sem estes requisitos e sem que tenha sido respeitado o contraditório, com possibilidade de reperguntas pelas partes, a delação não tem qualquer valor, sendo um ato destituído de eficácia jurídica. (...)" (Badaró, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Processo Penal. Rio de Janeiro: Campus: Elsevier,2012. p. 315), o que se verificou no caso em tela.


Outrossim, como bem observado pela acusação, obviamente que o laudo pericial, cujo objetivo era examinar eventuais registros de ligações efetuadas e registradas entre os números telefônicos (67) 9279-2310, (67) 9629-6911 e (67) 9211-9804, concluiu que não houve ligações entre tais números (fls. 339/342), já que todos pertenciam ao réu Leandro ("Testa"), conforme declarado pelo réu José Cláudio à autoridade policial, sendo que o número (67) 9279-2310 era para contato com "TESTA", tendo este entregue àquele, na véspera da viagem à Campo Grande/MS, o celular de número (67) 9243-1551.


Todavia, analisando o extrato telefônico, decorrente de autorização judicial, relativo ao número (67) 9279-2310 (fl. 343), pelo qual José Cláudio ligava para contatar "Testa", verifica-se que recebeu ligações do número (67) 9243-1551, em 08.07.2008, da Estação Rádio Base - ERB de Três Lagoas/MS, às 00:27:00, horário de embarque de José Cláudio no ônibus que realizou o trajeto Três Lagoas/MS - Campo Grande/MS, e, na mesma data, às 13:47:49, da ERB de Corumbá/MS, momento em que José Cláudio lá chegou.


Posteriormente, alguma ligações foram feitas entre os número (67) 9243-1551, da ERB de Corumbá/MS, e (67) 9279-2310, da ERB de Três Lagoas/MS, durante o período da tarde do dia 08.07.2008, cujo assunto não era outro senão acerca do encontro entre José Cláudio e o homem boliviano na feirinha para que este entregasse a droga àquele.


Assim, é possível concluir que as inúmeras ligações feitas entre os números (67) 9279-2310 e (67) 9243-1551 entre 08.07.2008, a partir de 00:27:42 (início da viagem de José Cláudio de Três Lagoas/MS a Corumbá/MS), até a manhã de 09.07.2008 (data da prisão em flagrante do réu José Cláudio em Corumbá/MS, quando retornava a Três Lagoas/MS), sendo o primeiro, em poder de Leandro, sempre utilizando da ERB de Três Lagoas/MS, e o segundo, em poder de José Cláudio, utilizando de ERB de várias cidades entre o trecho Três Lagoas/MS e Corumbá/MS, tais como Campo Grande/MS, Miranda/MS e Ladário/MS, revelam que aquele acompanhava todo o itinerário da viagem deste, já que as datas e os horários de saída de Três Lagoas/MS e chegada em Corumbá/MS, declarados por José Cláudio, considerando a distância e o tempo entre as cidades, conferem com os horários das ligações.


Por fim, os extratos telefônicos demonstram que os telefones de números (67) 9629-6911 e (67) 9211-9804, em poder de "Testa", efetuaram ligações ao número (67) 9243-1551, em poder de José Cláudio, na manhã e na tarde da véspera dos fatos, respectivamente, conforme afirmado por este em sede policial: "(...) QUE o número (67) 9629-6911 pertence a "TESTA", que ligou através desse número para o declarante na manhã de hoje; (...) QUE o número (67) 9211-9804 pertence a "TESTA", que ligou através desse número para o declarante no fim da tarde de ontem (...)"(fl. 08).


Dessa maneira, em face do conjunto probatório consistente e harmonioso, restou comprovada a participação do réu Leandro da Cruz Farias no delito de tráfico transnacional de drogas, tendo com consciência e vontade, contratado outrem para importar, trazer e transportar droga da Bolívia para o Brasil, inclusive planejado, financiado e coordenado a empreitada criminosa, razão pela qual sua condenação é medida que se impõe.


Passo à análise da dosimetria das penas.


Quanto ao acusado José Cláudio da Silva, sua pena-base deve ser mantida no mínimo legal, em face do princípio "non reformatio in pejus".


Na segunda fase, embora devesse ser reconhecida a atenuante da confissão, uma vez que, de acordo com o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, ainda que não seja espontânea ou seja parcial, deve incidir sempre que fundamentar a condenação do acusado, como no caso, ainda que tenha sido preso em flagrante delito, sua pena não deve ser reduzida, nos termos da Súmula n° 231, do Superior Tribunal de Justiça.


Na terceira fase, deve ser afastada, ex officio, a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06, haja vista que o Pretório Excelso alterou seu entendimento no sentido de que a mera utilização de transporte público para a circulação da substância entorpecente ilícita não é suficiente para a aplicação da majorante, devendo ser demonstrada a efetiva comercialização da droga no próprio transporte público, verbis:


"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ART. 40, INCISO III, DA LEI 11.343/06. INAPLICABILIDADE. ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.464/07, E ART. 44 DA LEI 11.343/06. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ORDEM CONCEDIDA.
1. A aplicação da causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso III, da Lei 11.343/06, tem como objetivo punir com mais rigor a comercialização de drogas em determinados locais onde se verifique uma maior aglomeração de pessoas, de modo a facilitar a disseminação da mercancia, tais como escolas, hospitais, teatros, unidades de tratamento de dependentes, entre outros.
2. A aplicação da majorante do inciso III exige a comercialização da droga no próprio transporte público, sendo insuficiente a mera utilização do transporte para o carregamento do entorpecente. Precedentes: HC 119.782, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJe de 03.02.14 e HC 109.538, Primeira Turma, Redatora para o acórdão a Ministra Rosa Weber, DJe de 26.10.12.
3. In casu, a Corte Estadual, em sede de apelação, afirmou que "no caso em apreço, verifica-se que a recorrida não se utilizou do transporte coletivo para disseminar entorpecentes, mas tão somente para levar a droga escondida em suas partes íntimas até o destino final. Ou seja, não tinha a intenção de difundir, usar e/ou comercializar a referida droga, aproveitando-se do fato de estar no interior do veículo público".
4. O artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, na redação conferida pela Lei 11.464/07 - que determina que o condenado pela prática de crime hediondo inicie o cumprimento da pena privativa de liberdade, necessariamente, no regime fechado - foi declarado inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 27.06.12, ao julgar o HC 11.840, Relator o Ministro Dias Toffoli.
5. O artigo 44 da Lei 11.343/06 foi declarado inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 97.256, Relator o Ministro Ayres Britto, sob o fundamento de que afronta os princípios da presunção de não culpabilidade e da dignidade humana.
6. In casu, a paciente foi flagrada transportando 100 (cem) gramas de cocaína dentro de um ônibus, tendo sido condenada a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e ao pagamento de 180 (cento e oitenta) dias-multa, pela prática do crime de tráfico de entorpecentes. O juiz singular fixou o regime inicial fechado, com fundamento apenas no artigo 2º, caput, e § 1º, da Lei 8.072/90, bem vedou a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, com respaldo no artigo 44 da Lei 11.343/06.
7. Ordem concedida a fim de afastar a aplicação da causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso III, do Código Penal, restabelecendo o quantum da pena privativa de liberdade fixado na sentença condenatória (um ano e oito meses de reclusão). Ordem concedida de ofício para fixar o regime aberto para o início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, § 2º, b, do Código Penal e também para remover o óbice da parte final do art. 44 da Lei 11.343/2006, determinando ao Juízo processante ou, se for o caso, ao Juízo da execução penal, que avalie os requisitos necessários à substituição da pena privativa de liberdade por outra restritiva de direitos."
(HC 118676, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 11/03/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-062 DIVULG 27-03-2014 PUBLIC 28-03-2014)

No mesmo sentido, julgado desta E. Turma:


EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DA ENTORPECENTES. OMISSÃO. INTEGRAÇÃO DA FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO PARA AFASTAR A INCIDÊNCIA DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA DO ART. 40, III, DA LEI 11.343/06. USO DE TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO PARA FINS DE MERO DESLOCAMENTO. DESCONTO DE FRAÇÃO DE DIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO RÉU.
1. Impõe-se o saneamento da omissão do acórdão quanto à incidência da circunstância majorante do art. 40, III, da Lei de Drogas, aplicada no patamar de 1/6 (um sexto) na sentença condenatória.
2. No entanto, a despeito da matéria não haver integrado o recurso da defesa, é imperiosa a concessão de habeas corpus de ofício para o seu afastamento na hipótese dos autos, pois o uso de transporte público coletivo pelo acusado ocorreu para fins de mero deslocamento, sem acarretar maior gravidade ao fato imputado.
(...)
6. Embargos parcialmente acolhidos.
(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ACR 0000716-15.2012.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 20/05/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/05/2014)

No caso em tela, inexiste nos autos sequer indícios de que o acusado estaria comercializando ou distribuindo entorpecente no ônibus, tendo nele embarcado apenas para viajar de Corumbá/SP a Campo Grande/MS.


Porém, incontestável a incidência da causa de aumento relativa à transnacionalidade, como bem reconhecido na sentença, devendo ser mantido o patamar mínimo de aumento em 1/6 (um sexto), resultando na pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.


Em relação à causa de diminuição prevista no § 4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, o acusado efetivamente figurou, ainda que de forma eventual, em uma ponta da organização criminosa voltada ao tráfico de drogas, a ela prestando serviços e colaborando para a distribuição de cocaína, ao exercer a função de transportá-la de um país para o Brasil mediante remuneração, sendo seu papel exercido na empreitada criminosa suficiente a caracterizá-lo como integrante de organização criminosa.


Porém, aplicável o disposto no artigo 41, da Lei nº 11.343/06 que, repetindo as disposições do artigo 8º, parágrafo único, da Lei nº 8.072/90 e artigo 14, da Lei nº 9.807/99, dispõe que:


"O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços."

Trata-se de um estímulo para que os autores de delitos denunciem eventuais coautores ou partícipes, a fim de desestruturar organizações criminosas, sendo que, para a aplicação de eventual diminuição de pena, exige-se um efetivo e eficaz resultado para a identificação do outro agente, devendo ser reservado para situações de especial colaboração do réu para o desmantelamento de associações criminosas, não bastando simples prestações de informações, para que seja considerada eficaz.


No caso, houve a efetiva colaboração do réu com a investigação policial e o processo criminal, tendo confessado sua participação no delito e fornecido informações precisas e detalhadas acerca da pessoa que financiou a empreitada criminosa, de maneira a elucidar o caso e possibilitar a identificação do partícipe, o qual foi processado e condenado, razão pela qual reduzo sua pena em 1/3 (um terços), haja vista que não foram fornecidas informações suficientes a desmantelar uma organização criminosa, resultando na pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa.


Nesse sentido:


HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PACIENTE FLAGRADA COM CERCA DE 70 GRAMAS DE MACONHA NO INTERIOR DO CORPO AO TENTAR ADENTRAR EM UNIDADE PRISIONAL. DELAÇÃO PREMIADA. IMPOSSIBILIDADE. CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33, § 4.º, DA LEI N.º 11.343/06. APLICAÇÃO NO PATAMAR MÁXIMO. POSSIBILIDADE. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. A sentença, no que foi referendada pelo acórdão ora vergastado, consignou que a Paciente "confessou sua atividade criminosa, contando, em detalhes como foi contratada para o serviço, o local e a forma como colocou a droga dentro da vagina", bem como esclareceu quem a contratou e o destinatário do entorpecente. Todavia, não há nenhuma informação nos autos que ateste o uso de tais informações para fundamentar a condenação dos outros envolvidos. Assim, considerando que, no que se refere à delação premiada, "cabe ressaltar que tal instituto exige, para sua configuração, a admissão, pelo acusado, da participação no ilícito, bem como o fornecimento de informações eficazes, capazes de contribuir para a identificação dos comparsas e da trama delituosa" (HC 92.922/SP, 6.ª Turma, Rel. Min. JANE SILVA (Desembargadora Convocada do TJ/MG), DJe de 10/03/2008), verifica-se a ausência de subsunção do caso concreto ao disposto no art. 41, da Lei n.º 11.343/06.
(...)
(HC 115.065/DF, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09/11/2010, DJe 13/12/2010)
PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRELIMINAR. REJEIÇÃO. PROVA. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. PENA. GRADUAÇÃO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, §4º DA LEI Nº 11.343/06. DELAÇÃO PREMIADA. TRANSNACIONALIDADE. REGIME DE CUMPRIMENTO. SUBSTITUIÇÃO DE PENA. PENA DE MULTA.
(...)
- Hipótese dos autos em que o acusado contribuiu efetivamente para a identificação de co-autor do delito, conforme exige a lei, pelo que faz jus ao benefício da delação premiada, mas por outro lado não se tratando de caso em que a colaboração do acusado permite a identificação de toda a cadeia criminosa operante na prática do delito, adequado o percentual do benefício em 1/3 aplicado na sentença.
(...)
(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ACR 0002427-04.2012.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR, julgado em 06/05/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/05/2014)
O valor unitário do dia-multa deve ser mantido no mínimo legal.
PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS - ESTADO DE NECESSIDADE NÃO CONFIGURADO - DOSIMETRIA DA PENA - PENA-BASE MANTIDA - ATENUANTE GENÉRICA DA CONFISSÃO - APLICAÇÃO - INTERNACIONALIDADE - APLICABILIDADE DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTAS NO § 4º, DO ARTIGO 33, E ARTIGO 41, AMBOS DA LEI 11.343/06 - REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA - CONVERSÃO DA PENA EM RESTRITIVA DE DIREITOS - IMPOSSIBILIDADE - DETRAÇÃO PENAL A SER ANALISADA PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO - PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA - PENA DE MULTA MANTIDA - RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
11. Foi reconhecido o direito do apelante à benesse constante do artigo 41, da Lei 11.343/06, espécie de "delação premiada". No caso, o réu indicou o nome da pessoa que supostamente estaria envolvida com o tráfico, de modo a possibilitar às autoridades policiais identificar, de forma efetiva, outros integrantes de quadrilha que se dedica ao tráfico de entorpecentes. As informações prestadas pelo réu foram úteis na repressão ao cometimento de novos delitos da mesma natureza, sendo de rigor o reconhecimento da aplicação, ao caso dos autos, da minorante ora tratada, devendo ser mantido o quantum de 1/3 aplicado pelo Juízo de Piso a esse título, do que resulta a pena de 3 (três) anos, 06 (seis) meses e 03 (três) dias de reclusão, mais a pena pecuniária de 350 (trezentos e cinquenta) dias-multa, que torno definitiva, vez que ausentes outras causas modificativas.
(...)
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR 0008753-77.2012.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 08/09/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/09/2014)

Em relação ao acusado Leandro da Cruz Farias, na primeira fase da dosimetria da pena, a natureza e a quantidade da droga, bem como a personalidade e a conduta do agente, devem preponderar sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/06.


De fato, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade apreendida nestes autos, 720g (setecentos e vinte gramas) de massa bruta de cocaína, ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.


No mais, a cocaína é muito mais maléfica ao organismo se comparada com as demais drogas que são usualmente traficadas (crack, ecstasy, anfetamina, heroína, LSD, etc), já que consiste numa substância que vicia facilmente, sendo alta sua lesividade à saúde dos usuários, pois pode levar a óbito ainda que consumida em pequena quantidade.


Dessa forma, a natureza e a quantidade da droga ensejam a fixação da pena-base acima do mínimo legal.


Nesse sentido, julgados da 1ª Seção desta E. Corte:


"PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES TRÁFICO TRANSNACIONAL DE COCAÍNA. DIVERGÊNCIA ADSTRITA À DOSIMETRIA DA PENA-BASE. EMBARGOS PROVIDOS.
1- No caso dos autos, o voto condutor do acórdão recorrido manteve a pena-base do réu, ora embargante, no quantum de 8 (oito) anos de reclusão, tal como fixada na sentença. Já o voto divergente entendeu que o quantum de 7 (sete) anos de reclusão representava pena-base suficiente à prevenção e à repressão do delito praticado pelo embargante.
2- Malgrado a quantidade e a natureza da substância entorpecente apreendida em poder do embargante - 8kg de cocaína -, todas as demais circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal lhe são favoráveis, razão pela qual, na hipótese, deve prevalecer a pena-base fixada pelo voto divergente, máxime quando, a partir da análise dos precedentes jurisprudenciais desta E. Corte envolvendo casos análogos, é possível verificar que quantum próximos a 8(oito) anos de reclusão tem servido de pena-base para sancionar o porte de quantidades um pouco maiores de cocaína - acima de 10kg.
3- Nas demais fases da dosimetria penal não houve divergências, haja vista que tanto o voto vencedor como o vencido reduziram a pena em 06 (seis) meses pelo reconhecimento da atenuante da confissão espontânea e, na terceira e última fase, fizeram incidir a causa de aumento pela transnacionalidade do tráfico (art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006) no quantum de 1/3 (um terço), o que resultou, a partir da pena-base fixada pelo voto dissidente, uma sanção total de 8 (oito) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 866 (oitocentos e sessenta e seis) dias-multa.
4- O regime inicial do cumprimento da pena privativa de liberdade e o valor unitário do dia multa impostos ao embargante devem ser aqueles fixados na r. sentença, porquanto, nesse ponto, também não houve divergência.
5- Embargos providos."
(EIFNU 0000030-06.2011.4.03.6119, rel. Desembargador Federal Paulo Fontes, e-DJF3 Judicial 1 de 20/12/2013)
"PENAL - CRIME DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - DOSIMETRIA DA PENA - PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - ART. 42 DA LEI Nº 11.343/06 - QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA - PREPONDERÂNCIA - ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS - PENA JUSTA ESTABELECIDA NO ACÓRDÃO - CAUSA DE DIMINUIÇÃO - ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06 - REDUÇÃO EM METADE - REPRIMENDA QUE NÃO ATINGIRIA OS FINS DA PENA - MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO - IMPROVIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES.
1.A pena-base merece ser fixada mais acima do mínimo legal, ao comando do disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/06, tendo como circunstâncias preponderantes a quantidade e natureza da droga. O réu transportava no aparelho digestivo mais de um quilo de cocaína em forma de cápsulas, cuja quantia era de quase cem invólucros, quantidade significativa de substância nefasta que poderia ser disseminada entre muitos usuários e de alta potencialidade lesiva.
2.Sem dúvida, a quantidade e natureza do entorpecente, bem como as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, delas integrantes o motivo de lucro com a ilicitude, ofensividade da conduta, as consequências do crime, bem como a personalidade desabonadora do réu todos esses fatores reconhecidos pelo MM. Juiz na sentença quando do balizamento da pena-base não autorizam, nem justificam o estabelecimento da pena-base no mínimo legal, tendo resultado incongruente essa pena-base mínima por ele fixada, diante da pluralidade das circunstâncias desfavoráveis na sentença apontadas.
3.Justificada a majoração operada no voto vencedor, em 06 anos e 06 meses de reclusão para esse réu, considerando os fatores elencados, totalizando a pena final de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão pouco acima do mínimo legal da pena abstratamente prevista para o crime, reprimenda que reputo proporcional, adequada e suficiente à prevenção e repressão do crime, em observância aos fins da pena, de acordo com o estabelecido no art. 59, in fine, do Código Penal.
4. Também para a ré, conquanto levasse consigo a quantia de 326gs da droga, em menor escala que o correu, verifico que a sentença reputou desfavoráveis a natureza da substância entorpecente cocaína, considerando seu alto poder lesivo, delito que desencadeia outros, inclusive de natureza violenta, com vistas a angariar recursos para o sustento de incontrolável vício, atingindo uma variedade incalculável de pessoas, a personalidade e conduta desabonadora da ré que ocultou em suas vestes íntimas a substância entorpecente, a culpabilidade consubstanciada na reprovação social, os motivos que lhes são desfavoráveis, o lucro fácil obtido com a narcotraficância e as consequências de efeitos deletérios da conduta, todos esses fatores foram reconhecidos na sentença.
5. Verifica-se que somente a quantidade e os antecedentes, restaram isolados como mais favoráveis, não parecendo justa a pena-base mínima imposta, o que não se coaduna com a adoção de todos esses fatores aqui e na sentença relacionados, a autorizar ter-se por acertada a fundamentação do voto vencedor com dimensionamento da reprimenda pouco acima do mínimo legal em cinco anos e seis meses de reclusão.
6.É excessiva a redução em metade da pena aplicada na sentença e no voto vencido para essa ré, por força do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, o que resultaria, no meu sentir, em pena muito abaixo do mínimo legal previsto para o crime, ou seja, pena definitiva de 2 anos e 11 meses de reclusão, não se mostrando razoável esse quantum da pena.
7.Beneficiando-se a ré com redução de pena em grau médio não haveria suficiência para a prevenção (compreendendo-se dissuasão da conduta em relação a si própria e a outros futuros agentes) e repressão do crime, A curta permanência no cárcere estaria na contramão do necessário combate ao tráfico transnacional de entorpecentes, crime que assola e arruína toda a sociedade e que, inclusive é objeto de cooperação internacional visando sua erradicação.
8.Justa, adequada e necessária a pena final imposta a corré fixada no voto vencedor em 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão.
9.Mantido o voto vencedor e o acórdão proferido.
10.Improvimento dos embargos."
(EIFNU 00129351420094036119, rel. Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 Judicial 1 de 02/10/2012)
"PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTROPECENTES. DOSIMETRIA. APELO DA DEFESA. REFORMATIO IN PEJUS. APLICABILIDADE DO ARTIGO 42 DA LEI Nº 11.343/06. PENA-BASE REDUZIDA AO PATAMAR ESTABELECIDO NA SENTENÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - O embargante foi denunciado como incurso nas sanções do delito previsto no artigo 33, caput, c.c artigo 40, I, da Lei nº 11.343/06.
2 - Sentença condenatória. Pena-base fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa, com base nas circunstâncias, consequências e motivo do delito, na natureza e quantidade da substância entorpecente e no comportamento da vítima (vitimização difusa). Majorada a pena para 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa, dada a transnacionalidade do delito.
3 - Apelação da defesa julgada, por maioria de votos, parcialmente procedente para reduzir a pena em razão da atenuante da confissão.
4 - Pena-base fixada acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa, consideradas a quantidade e natureza do entorpecente, com fundamento no art. 42 da Lei n. 11.343/06. Reduzida a pena para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa, em razão da confissão. Majorada a pena para 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa, pela transnacionalidade.
5 - Voto vencido. Pena-base fixada no mínimo legal. Inaplicabilidade do artigo 42 da Lei nº 11.343/06. Não incidência da atenuante da confissão espontânea, pela irredutibilidade da pena-base. Majoração da pena em razão da internacionalidade, para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
6 - O E. Relator fixou a pena-base acima da estabelecida na sentença, e considerando que houve recurso somente da defesa está configurada a reformatio in pejus.
7 - Pena-base reduzida para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa, consoante fixado da sentença.
8 - Cabe ao juiz, no caso concreto, examinar o grau de reprovação da conduta delitiva do réu, levando em consideração além dos requisitos previstos no artigo 59 do Código Penal, também aqueles dispostos no artigo 42 da Lei Especial.
9 - Não deve o magistrado recusar a aplicação deste dispositivo de lei sob o fundamento de sua insuficiência no concernente à regulamentação de quais são as substâncias mais ou menos nocivas à saúde. A norma é clara, válida e não está a depender de norma regulamentar para exprimir a sua plena eficácia. Para sua aplicação, basta que, diante do caso sub examine, pondere o aplicador da lei o grau de prevenção e censurabilidade que a sociedade, por meio do legislador, impõe a determinada conduta, considerada esta sob o espectro da natureza e da quantidade de substância entorpecente que se buscava traficar. Assim quis o legislador não para deixar ao talante do magistrado quando e como considerar os requisitos previstos em lei, mas porque somente ele terá condições de avaliar no caso concreto a nocividade da conduta perpetrada.
10 - Cocaína apreendida em quantidade expressiva. Substância entorpecente com efeitos deletérios. Alta capacidade de gerar dependência química e, inclusive, levar a óbito. Destinada ao tráfico internacional, tem alto potencial lesivo, dado que, em geral, é muito concentrada, o que propicia a multiplicação da quantidade da substância entorpecente e, por consequencia, do número de vítimas.
11 - Mantida a pena-base tal qual fixada na sentença, sobre a qual incide a atenuante da confissão como estabelecida no Acórdão e, aplicada a causa de aumento pela internacionalidade, o que totaliza a pena definitiva de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
12 - Embargos a que se dá parcial provimento."
(EIFNU 00000661920094036119, relª. Desembargadora Federal Vesna Kolmar, e-DJF3 Judicial 1 de 18/07/2012)

Dessa forma, fixo sua pena-base em 6 (seis) anos reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa por se revelar justa e suficiente para a prevenção, a reprovação e a repressão do crime.


Na segunda fase, ausentes atenuantes, reconheço a agravante de reincidência, nos termos do artigo 63, do Código Penal, uma vez que o acusado praticou novo crime (08.07.2008) após o trânsito em julgado de sentença que o condenou também pelo delito de tráfico de drogas, além de associação para o tráfico (fls. 404/408), razão pela qual majoro a pena em 1/6 (um sexto), resultando em 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.


Na terceira fase, como exposto acima, não restam dúvidas quanto à incidência das causas de aumento previstas nos incisos I e VII, do artigo 40, da Lei de Drogas, uma vez que financiou a viagem de outrem para trazer e transportar o entorpecente da Bolívia até o Brasil, razão pela qual aumento a pena em 1/5 (um quinto), resultando na pena de 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa.


Inaplicável a causa de diminuição de pena descrita no §4°, do artigo 33, do Código Penal, pois, entre outros motivos, se trata de agente reincidente, inclusive pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico.


Portanto, a pena do réu Leandro da Cruz Farias resta definitivamente fixada em 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa.


O valor unitário do dia-multa deve ser fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos em razão de ausência de informações acerca de sua condição econômico-financeira.


A fixação de regime inicial fechado de cumprimento de pena encontrava supedâneo no artigo 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90), por ser o tráfico de drogas crime a eles equiparado, conforme previsão constitucional (art. 5º, XLIII, CF).


Ocorre que, em sessão realizada em 27.06.2012, o Plenário da Suprema Corte, ao analisar o Habeas Corpus nº 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, por maioria, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º, do artigo 2º, da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007.


Desse modo, restou superada a obrigatoriedade de início do cumprimento de pena no regime fechado aos condenados por crimes hediondos ou a eles equiparados.


Contudo, para determinar o regime inicial de cumprimento da pena, o magistrado deve se valer, além do quantum de pena imposta (art. 33, §2º, CP), dos critérios previstos no artigo 59, do Código Penal, conforme exegese do artigo 33, §3º, do mesmo Codex.


Em se tratando de crime de tráfico de drogas, as circunstâncias judiciais para fixação da pena-base incluem, ainda, a natureza e a quantidade da droga, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/2006.


In casu, fixo o regime inicial fechado para cumprimento da pena em face da quantidade da pena, da reincidência do acusado, além da elevada quantidade e natureza altamente nociva do entorpecente apreendido.


Ainda, reconheço que o Plenário do E. Supremo Tribunal Federal declarou, nos autos do Habeas Corpus nº 97.256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44, da mesma lei.


Após, o Senado Federal editou a Resolução nº 05, de 15.02.2012, publicada em 16.02.2012, que suspendeu, nos termos do artigo 52, inciso X, da Constituição Federal, a execução de parte do §4º, do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, nestes termos:


"Art. 1º É suspensa a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS."

Contudo, há que se considerar que as penas restritivas de direitos dificilmente serão aptas a reprimir o tráfico ilícito de drogas e, portanto, além dos requisitos objetivos exigidos pelo artigo 44, do Código Penal, deve haver outros elementos subjetivos altamente favoráveis aos réus para que possa ser concedida a substituição.


In casu, incabível a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, porque não está preenchido o requisito objetivo exigido pelo artigo 44, do Código Penal, diante da quantidade da pena ora aplicada.


Por fim, destaco que deve ser restabelecida a prisão preventiva do réu Leandro da Cruz Farias em face da presença do "fumus comissi delicti" e "periculum libertatis", haja vista que o decreto condenatório por si só demonstra que a materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas.


Outrossim, em razão de ser reincidente em crime de tráfico de drogas, já tendo sido condenado também pela prática do delito de associação para o tráfico (fls. 404/408), estando cumprindo pena em regime semiaberto quando praticou a infração penal em tela, corrobora a necessidade de garantia da ordem pública e aplicação da lei penal, razão pela qual não cabe o benefício do recurso em liberdade.


Desta forma, presentes os requisitos dos artigos 312 e 313, ambos do Código de Processo Penal, decreto a prisão preventiva do réu Leandro da Cruz Farias.


Diante do exposto, afasto, "ex officio", a causa de aumento descrita no artigo 40, inciso III, da Lei nº 11.343/06 da dosimetria da pena do réu José Cláudio da Silva e dou provimento à apelação para condenar o réu Leandro da Cruz Farias ao cumprimento da pena definitiva de 8 (oito) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime previsto no artigo 33, "caput", c/c artigo 40, incisos I e VII, ambos da Lei n° 11.343/06, e aplicar a causa de diminuição prevista no artigo 41, da Lei n° 11.343/06 na pena do réu José Cláudio da Silva, resultando na pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa, mantida, no mais, a r. sentença.


Expeça-se mandado de prisão em desfavor do réu Leandro da Cruz Farias.


Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados e oficie-se à Justiça Eleitoral para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal.


Comunique-se com urgência o Juízo da Execução Criminal.


É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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