Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 04/03/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001921-87.2014.4.03.6109/SP
2014.61.09.001921-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELADO : Justica Publica
APELANTE : JOAO GABRIEL FERNANDES DA SILVA reu preso
ADVOGADO : SP180118 MAURÍCIO PERES LESSA e outro
IMPETRADO(A) : OS MESMOS
EXCLUIDO : JHONATAN RODRIGUES DOS SANTOS (desmembramento)
: JULIANA DOS SANTOS BEZERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00019218720144036109 2 Vr PIRACICABA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O § 2º DO ART. 289 DO CÓDIGO PENAL. DESCABIMENTO. DOSIMETRIA. CONTINUIDADE DELITIVA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Provadas a materialidade e a autoria delitiva mediante prova documental e testemunhal.
2. O réu foi preso em flagrante com numerário falso em seu poder, não logrando fazer prova de sua origem lícita e da boa-fé em adquiri-lo.
3. O delito do art. 289, § 1º, do Código Penal é de conduta múltipla alternativa, razão pela qual a prática de mais de uma ação nuclear, como guardar e introduzir em circulação as cédulas, caracteriza crime único, não configurando continuação delitiva.
4. Apelação parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de fevereiro de 2015.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001921-87.2014.4.03.6109/SP
2014.61.09.001921-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELADO : Justica Publica
APELANTE : JOAO GABRIEL FERNANDES DA SILVA reu preso
ADVOGADO : SP180118 MAURÍCIO PERES LESSA e outro
IMPETRADO(A) : OS MESMOS
EXCLUIDO : JHONATAN RODRIGUES DOS SANTOS (desmembramento)
: JULIANA DOS SANTOS BEZERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00019218720144036109 2 Vr PIRACICABA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por João Gabriel Fernandes da Silva contra a sentença que julgou procedente o pedido e o condenou a 8 (oito) anos e 3 (três) meses de reclusão, regime inicial fechado, e ao pagamento de 247 (duzentos e quarenta e sete) dias-multa, valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo à época do fato, pelo delito do art. 289, § 1º, do Código Penal (fls. 325/328v.).

Apela a defesa com base nos seguintes argumentos:

a) segundo constatação da vítima, a nota introduzida em circulação tinha falsificação grosseira;
b) não houve dolo na conduta do agente, haja vista que as notas encontradas pelos Policiais não estavam escondidas no momento da revista no veículo conduzido pelo apelante;
c) o Ministério Público Federal não se desincumbiu do ônus de provar a responsabilidade do apelante pela prática do delito, razão pela qual requer a absolvição;
d) é inaplicável a continuidade delitiva prevista no art. 71 do Código Penal;
e) requer a desclassificação para o delito do artigo 289, § 2º, do Código Penal, dada a falta de dolo (fls. 342/348).

Contrarrazões às fls. 351/360.

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 369/371).

Feito sujeito à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.



Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001921-87.2014.4.03.6109/SP
2014.61.09.001921-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELADO : Justica Publica
APELANTE : JOAO GABRIEL FERNANDES DA SILVA reu preso
ADVOGADO : SP180118 MAURÍCIO PERES LESSA e outro
IMPETRADO(A) : OS MESMOS
EXCLUIDO : JHONATAN RODRIGUES DOS SANTOS (desmembramento)
: JULIANA DOS SANTOS BEZERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00019218720144036109 2 Vr PIRACICABA/SP

VOTO

Denúncia. João Gabriel Fernandes da Silva, Jhonatan Rodrigues dos Santos e Juliana dos Santos Bezerra foram denunciados pelo delito do art. 289, § 1º, c. c. o art. 29, ambos do Código Penal, porque, em 26.03.14, juntamente com Bianca dos Santos Bezerra (menor de idade), introduziram em circulação uma cédula de R$100,00 (cem reais) falsa, bem como mantinham sob sua guarda outra duas cédulas falsas de igual valor, com as respectivas numerações AA014446121, AA019917448 e BD000522656.

Consta na denúncia que, após serem informados via COPOM a respeito de tentativas de introdução de cédulas falsas no comércio da Vila Rezende, em Piracicaba, Policiais Militares abordaram o veículo Fiat Uno, placa BZM-2073, ocupado pelos dois casais, e iniciaram a revista em seu interior. Localizaram no console do automóvel, em meio a outras cédulas, uma nota de R$100,00 (cem reais) falsa, pertencente a João Gabriel e, na carteira de Jhonatan, outra cédula de R$100,00 (cem reais) falsa, momento em que foram presos em flagrante delito.

Uma cédula de R$100,00 (cem reais) foi introduzida no estabelecimento Mercado Família para a aquisição de refrigerantes, suco e cigarros.

A falsidade foi confirmada pelo laudo pericial de fls. 26/28.

No interrogatório de Paula Stefany, proprietária do estabelecimento comercial Mercado Família, Juliana e a menor Bianca, no momento do pagamento das mercadorias solicitadas, insistiram em conversar com a vendedora, com o intuito de distraí-la e lograr êxito na introdução da cédula falsa em circulação.

Com efeito, o modus operandi utilizado, aquisição de mercadorias de baixo valor pago com notas falsas de cem reais, visando a obtenção de troco em numerário verdadeiro, comprova a presença de dolo na conduta dos denunciados (fls. 117/120).

Processo. Aos réus Jhonathan Rodrigues dos Santos e Juliana dos Santos Bezerra foi concedida a liberdade provisória independente de fiança, com base no art. 310, III, do Código de Processo Penal, condicionada a determinadas obrigações (fls. 155/155v.).

Acolhido o parecer ministerial de fl. 254, o feito foi desmembrado em relação aos réus Jhonatan Rodrigues dos Santos e Juliana dos Santos Bezerra (fl. 258).

Materialidade. A materialidade restou devidamente comprovada com base nos seguintes elementos de convicção:

a) boletim de ocorrência (fls. 14/17);

b) auto de exibição e apreensão de 3 (três) cédulas de R$100,00 (cem reais) (fls. 18/20);

c) laudo pericial conclusivo de que as 3 (três) cédulas de R$100,00 (cem reais) apreendidas, com a numeração de série AA014446121, AA019917448 e BD000522656, são falsas e que a contrafação não é grosseira (fls. 26/28).

Autoria. A autoria foi provada.

João Gabriel tentou afastar sua responsabilidade pela prática do crime, alegando desconhecimento da falsidade das cédulas. Disse que recebeu as cédulas contrafeitas de seu cliente na venda de um tablet em seu estabelecimento comercial, localizado em Santos, totalizando R$450,00 (quatrocentos e cinquenta reais), e que, ao término de seu expediente, se dirigiu à Piracicaba para visitar um amigo, acompanhado de Juliana, Bianca e Jhonatam. Chegando à cidade, parou no estabelecimento Mercado Família e entregou à Bianca uma nota de R$ 100,00 (cem reais) para que, junto com Juliana, comprassem bebidas e cigarro. Indagado sobre o motivo pelo qual não utilizou, dentre as notas autênticas apreendidas em seu poder (fl. 20), cédula de menor valor, respondeu que sua carteira é pequena para armazenar as cédulas de R$100,00 (cem reais) e que, por essa razão, costuma gastá-la para receber outras de tamanho reduzido (fls. 8 e mídia de fl. 324).

Felipe Rosal de Vasconcelos, Policial Militar que participou da abordagem ao acusado, afirmou que seu companheiro de trabalho, o Policial Thiago Meneghetti, ao vistoriar o veículo dirigido por João Gabriel, encontrou notas espúrias no console do veículo e no banco de trás do automóvel, no meio de outras cédulas autênticas. Asseverou que foi avisado, via COPOM, de que o acusado tentou introduzir notas falsas em outros estabelecimentos comerciais, porém teve êxito apenas no Mercado Família (fl. 6 e mídia de fl. 324).

Thiago Meneghetti de Souza, Policial Militar que efetivamente vistoriou o veículo dirigido pelo acusado, afirma que havia uma nota de R$100,00 (cem reais) aparentando ser falsa no meio de outras autênticas, no console do automóvel, e, na carteira do Jhonatham, encontrada no banco de trás, localizava-se outra nota de R$100,00 (cem reais) juntamente com uma nota de R$20,00 (vinte reais). Confirmou que foram avisados, via COPOM, da tentativa de introdução de notas falsas em outros estabelecimentos comerciais (fl. 3 e mídia de fl. 324).

Paula Stefany Bicahlo de Almeida, proprietária do estabelecimento Mercado Família, afirmou que duas jovens entraram em seu comércio e adquiriram algumas mercadorias, como refrigerantes e cigarros, pagando-os com uma nota de R$100,00 (cem reais), pelo que deu cerca de R$80,00 (oitenta reais) com troco. Disse que somente tomou conhecimento da falsidade da cédula quando policiais militares, em procura do acusado, entraram em seu estabelecimento e a indagaram sobre possível prática do delito de moeda falsa. A declarante explicou que, no momento da compra das mercadorias, as duas jovens insistiram no diálogo com o intuito de distrair sua atenção (fl. 12 e mídia de fl. 324).

Com efeito, os elementos de prova dos autos convergem no sentido de que João Gabriel, ao contrário do que alega a defesa, praticou a conduta de introduzir em circulação moeda falsa, em coautoria delitiva, tendo conhecimento da inautenticidade da cédula entregue à vítima e daquelas encontradas no interior do automóvel que conduzia.

As circunstâncias fáticas evidenciam o dolo da prática delitiva e a versão apresentada pelo réu para se deslocar de Santos até Piracicaba não foi provada, sendo, na verdade, infirmada pelas provas coligidas.

O réu foi preso em flagrante ao serem localizadas cédulas falsas de R$100,00 (cem reais) no veículo que conduzia, o qual disse ser de um amigo e cujas placas pertenciam a outro veículo. João Gabriel admitiu a propriedade das notas encontradas no veículo, abordado após duas integrantes do grupo terem realizado compras em um comércio local, pagas com uma cédula falsa de R$100,00 (cem reais).

O réu disse que se deslocou até Piracicaba para visitar uns amigos, juntamente com a namorada Juliana, a irmã desta Bianca e o namorado Jhonatan, fato que não foi provado. Não há menção sequer do nome de tais amigos e onde residiam de fato.

A versão do réu de que tinha dúvida quanto à idoneidade de algumas das cédulas apreendidas mostrou-se se tratar de uma tentativa de afastar sua responsabilidade pelo cometimento dos delitos.

O modus operandi evidencia, outrossim, o dolo. Em tais crimes, como ocorreu no caso, o agente introduz no comércio cédulas falsas de expressivo valor para a compra de mercadorias de valor pequeno com a finalidade de receber numerário verdadeiro como troco.

A circunstância de ter sido encontrada uma das cédulas falsas no console do veículo, a qual não estava escondida, não tem o condão de afastar a autoria delitiva. Observo que o réu não esperava a abordagem policial quando a cédula contrafeita foi encontrada.

Acrescento que, conforme os relatos da proprietária do mercado no qual uma das cédulas foi usada, a atitude de Juliana e Bianca de entreterem a comerciante no momento do pagamento das compras demonstra o prévio conhecimento da contrafação da cédula apresentada e a vontade de cometer o delito do art. 289, § 1º, do Código Penal.

Não restou provada, ademais, a origem lícita do numerário falso apreendido e que o réu o tivesse recebido de boa-fé, de modo que é incabível a desclassificação do delito para aquele do § 2º do art. 289 do Código Penal.

Não há que falar em crime impossível ao argumento de se tratar de falsificação grosseira, na medida em que a prova pericial é conclusiva de que a contrafação reunia atributos suficientes para que as cédulas fossem colocadas no meio circulante, de modo a enganar terceiros.

Assim, comprovadas a materialidade e a autoria delitiva, a manutenção da condenação é de rigor.

Dosimetria. Art. 289, § 1º, do Código Penal. O Juízo a quo, nos termos do art. 59 do Código Penal, fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, ao fundamento de que o acusado apresenta maus antecedentes em razão da condenação transitada em julgado pelo cometimento de semelhante crime (cfr. certidão de fls. 304/305), bem como em razão das circunstâncias do delito.

Foi reconhecida a agravante prevista no art. 62, I, do Código Penal, dada a influência que o acusado demonstrou sobre os demais coautores para a prática do crime, fixando a pena em 7 (sete) anos e 1 (um) mês de reclusão.

A pena foi aumentada em 1/6 (um sexto) em razão da continuidade delitiva, para 8 (oito) anos e 3 (três) meses de reclusão, tendo em vista a realização de comportamentos diversos como a guarda e a introdução em circulação de moeda falsa, tornada definitiva.

Foi fixado o regime fechado de cumprimento da pena, com fundamento no art. 33, § 2º, "a", do Código Penal.

A pena de multa foi estabelecida em 247 (duzentos e quarenta e sete) dias-multa, considerando o aumento incidente da continuidade delitiva, sendo arbitrado o valor do dia-multa em 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente.

Foi obstada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direito.

Apela a defesa e requer o afastamento da continuidade delitiva, prevista no art. 71 do Código Penal.

Assiste razão a defesa.

O delito previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal é de conduta múltipla alternativa, razão pela qual a prática de mais de uma ação nuclear, como no caso, de guardar e introduzir em circulação cédulas falsas, caracteriza crime único, não configurando a continuidade delitiva.

Assim, cabe expurgar da pena o acréscimo indevido de 1/6 (um sexto) pela continuidade delitiva e fixar a pena em 6 (seis) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 205 (duzentos e cinco) dias-multa, valor unitário em 1/10 (um décimo) do salário mínimo ao tempo dos fatos, devidamente corrigido.

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para fixar a pena de João Gabriel Fernandes da Silva pelo delito do art. 289, § 1º, do Código Penal em 6 (seis) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 205 (duzentos e cinco) dias-multa, valor unitário em 1/10 (um décimo) do salário mínimo ao tempo dos fatos, devidamente reajustado. Mantenho, no mais, a respeitável sentença.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): Andre Custodio Nekatschalow:10050
Nº de Série do Certificado: 6FF489872CB26B896143FFEC7333ABCE
Data e Hora: 24/02/2015 17:42:05