Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/03/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004420-08.2003.4.03.6181/SP
2003.61.81.004420-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MARCELO SARAIVA
APELANTE : ALEXSANDRA DE JESUS SANTOS
ADVOGADO : SP039824 JOSE REVANILDO OLIVEIRA MARTINS e outro
APELADO(A) : Justica Publica
CONDENADO : BONG KEUN PARK
REU ABSOLVIDO : JUNG SUP CHOI

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOAS PARA FIM DE EXPLORAÇÃO SEXUAL (art. 231 do CP). MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO CONFIGURADO. TIPICIDADE DA CONDUTA. CARACTERIZADO. CONCURSO MATERIAL. OCORRÊNCIA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1- Materialidade delitiva incontestável pelo Auto de Exibição e Apreensão, bem como pela farta documentação apreendida, tais como: passaportes em nome das vítimas; passagens aéreas com destino à Coréia do Sul; notas de hospedagens de hotéis e despesas.
2- Autoria inquestionável, comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, pelas declarações das vítimas e depoimentos dos policiais que efetivaram o flagrante.
3- Dolo configurado uma vez que a ré, de forma plena e consciente, tentou facilitar a saída das garotas do território nacional para o exterior (Coréia do Sul).
4- A figura do tipo penal (art. 231do CP), se subsume às condutas "promover, intermediar, ou facilitar" a entrada ou saída de alguém que vá exercer a prostituição portanto, eventual ciência da finalidade para qual se está indo, não descaracteriza a tipicidade da conduta.
5- Não há como afastar o concurso material quando restou comprovado que a apelante tinha a intenção de facilitar a saída de três pessoas para o exterior, cuja conduta não está isolada, devido à pluralidade de ações.
6- Apelação improvida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 03 de março de 2015.
MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 05/03/2015 18:19:35



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004420-08.2003.4.03.6181/SP
2003.61.81.004420-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MARCELO SARAIVA
APELANTE : ALEXSANDRA DE JESUS SANTOS
ADVOGADO : SP039824 JOSE REVANILDO OLIVEIRA MARTINS e outro
APELADO(A) : Justica Publica
CONDENADO : BONG KEUN PARK
REU ABSOLVIDO : JUNG SUP CHOI

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por ALEXSANDRA DE JESUS SANTOS contra a r. sentença de fls. 495/517, proferida pelo MM. Juiz da 9ª Vara Federal de São Paulo/SP, que a condenou como incursa no artigo 231, "caput, c.c. art. 14, II, ambos do Código Penal, por 3 vezes, em concurso material, à pena de 7 (sete) anos de reclusão, em regime inicial aberto".


Consta da denúncia (fls. 02/04), em síntese, que no dia 04.06.2003, na cidade de São Paulo/SP, agentes da Polícia Civil encontraram no Braston Hotel, três mulheres prestes a embarcar para a Coréia do Sul, onde exerceriam a prostituição. As mulheres foram aliciadas pela ré ALEXSANDRA e pelo também condenado BONG KEUN PARK, tendo este arcado com todas as despesas referentes à estadia e passagem aérea das garotas.


A denúncia foi oferecida em 20.06.2003 (fls. 02/04) e recebida em 24.06.2003 (fls. 125/126). Transcorrida a regular instrução criminal, sobreveio a sentença condenatória, publicada em 19.03.2007(fls. 518).


A ré interpôs apelação às fls. 574, com razões às fls. 575/577, argumentando que sua conduta é atípica, tendo em vista que as três garotas que iriam para a Coréia do Sul tinham ciência de que lá exerceriam a prostituição, o que já vinham praticando no Brasil. Além disso, pleiteia a não aplicação do concurso material, sob alegação de que praticou uma só conduta.


Com as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.


Nesta instância, a i. representante do Ministério Público Federal opina pelo desprovimento do recurso, mantendo-se a sentença recorrida e a condenação da ré.


É o relatório.


À Revisão.


MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 12/02/2015 14:24:52



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0004420-08.2003.4.03.6181/SP
2003.61.81.004420-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MARCELO SARAIVA
APELANTE : ALEXSANDRA DE JESUS SANTOS
ADVOGADO : SP039824 JOSE REVANILDO OLIVEIRA MARTINS e outro
APELADO(A) : Justica Publica
CONDENADO : BONG KEUN PARK
REU ABSOLVIDO : JUNG SUP CHOI

VOTO


Apela a ré Alexsandra de Jesus Santos da r. sentença proferida pelo MM. Juiz da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo S/P, que a condenou a pena de 7 (sete) anos de reclusão, por infração ao artigo 231, "caput", c.c.14, II, ambos do Código Penal, por 3 vezes, em concurso material, pugnando em suas razões de recurso pela atipicidade da conduta, ou caso não seja este o entendimento, pela não aplicação do concurso material.


Da materialidade.


A materialidade delitiva é incontestável, conforme demonstra o Auto de Exibição e Apreensão (fls. 23), bem como a farta documentação apreendida, tais como: passagens aéreas datadas de 25.03.2003 de Foz de Iguaçu para São Paulo, em nome da ré Alexsandra Santos e de Isabel Reis Santos, Elisangela Maciel e Tatiane Martins (fls. 30/33); passaportes em nome das mesmas, bem como as passagens para a Coréia do Sul, datadas para 04 de junho de 2003 (fls. 35/41). Além destes documentos, vieram para os autos notas hospedagem de hotéis e despesas as quais eram todas custeadas pelo corréu Bong Keun Park (fls. 42/47, 51/57 e 65/70).


Da autoria.


A autoria, com relação a apelante Alexsandra de Jesus Santos, é inquestionável porquanto se verifica dos autos que a mesma juntamente com os demais corréus foram presos em flagrante por investigadores da Policia Civil de São Paulo, por conta uma denúncia anônima dando conta que nos apartamentos 1705 e 1706, no "Braston Hotel", situado na Rua Martins Fontes nº 330, haviam garotas que estavam sendo aliciadas e que iriam viajar para Coréia do Sul e lá chegando lograram êxito em identificar as vítimas e a acusada Alexsandra, a qual declarou, perante a autoridade policial, que vive maritalmente com o coreano Jon Jin, residente na cidade de Seul, Coréia do Sul e que a pedido do corréu Bong Keu Park, viajou para o Brasil, chegando em 18.05.2003, no intuito de aliciar meninas para trabalhar como garotas de programa no estabelecimento de BONG, para cuja tarefa receberia US$3.000,00 (três mil dólares) (fls. 12/13).


Em Juízo, a ré deu nova versão dos fatos, afirmando que tinha ido para a Coréia do Sul por duas vezes para trabalhar como garota de programa, sendo que na primeira vez, ficou lá quatro meses, voltou para o Brasil, ficou três meses aqui, foi de novo em fevereiro de 2003 e retornou em maio deste mesmo ano, sem trabalhar em local fixo. Disse conhecer Jon Jin e teve com ele um relacionamento, alegando para sua família que ele era seu marido, para não ter que revelar suas atividades na Coréia do Sul. Nega conhecer o corréu Bong Keun Park e tampouco Jung Sup Choi. Afirma conhecer as garotas Tatiane, Elisângela e Isabela e que morou com Isabela em Foz de Iguaçu, nos últimos 3 meses. Finaliza seu interrogatório, salientando que não tinha nenhum relacionamento com o acusado Bong e que não sabia quem comprou as passagens para Seul, apesar de confirmar que foi junto com Tatiane, Elisangela e Isabela para tirar os passaportes. Menciona uma pessoa de nome Roberto responsável pelo pagamento das despesas nos hotéis, afastando por completo qualquer ligação com o corréu Bong Keun Park (fls. 240/244).


O policial Rogério Thomazine, ouvido em juízo na condição de testemunha de acusação (fls. 295/299), confirmou as declarações prestadas perante a autoridade policial, sustentando que: "(...) Chegando ao Hotel Braston, perguntou ao gerente se as moças estavam hospedadas lá. Ele disse que sim e acompanhou os policiais até os dois quartos ocupados por elas. Alexsandra estava com uma das moças num quarto e as outras duas estavam em outro. Alexsandra disse que estava acompanhando as moças, cuidando da manutenção delas até que embarcassem para a Coréia do Sul (...) Alexsandra comentou com o depoente que Bong era o dono do karaokê onde as meninas iam trabalhar lá. Alexsandra disse também que tinha conhecido Bong numa viagem que tinha feito para a Coréia do Sul para trabalhar lá, como garota de programa. Recorda-se que Alexandra disse também que quem ia recebê-las na Coréia do Sul era Jon Jin. (...)"

Foi ouvida a vítima Elisângela Dinat Maciel, que declarou em juízo que: "(...) a gente foi convidada pela Alexsandra, e, eu e mais duas amiga minha, né, pra gente trabalhar num karaokê que o, ela diz que o marido dela trabalhava lá em, na Coréia, dai a gente pegamo, a gente foi, a gente sabia, né, que ia ir pra Coréia e tudo mais, só que dai a gente chegou em São Paulo e ela, e a gente ficou hospedada num hotel lá, daí tinha uma, a Tatiana ficou no quarto com a Alexsandra, e ela escutou ela conversando com o marido dela pelo telefone, da Coréia, dizendo, né, que ela tava trabalhando com nós ali, e ela falou que ia vender a gente, né, por cinco mil dólar, acho que era, foi isso que Tatiana escutou pelo telefone, daí ela ficou desesperada e falou pra mim, né, falou pra mãe dela, daí foi que a mãe dela pegou e denunciou, daqui, né, lá em São Paulo (...)" (fls. 335/336).


Já, Tatiane de Souza Martins, declarou perante o MM. Juiz às fls. 337/341 que:

"Quando ela procurou nós aqui em Foz de Iguaçu, ela teria dito exatamente que era para nós trabalhar, na noite, mas até o momento ela não teria insinuado assim que nos levaria para outro estado, né, chegando lá em São Paulo, que ela levou nós em São Paulo, ai ela levou nós pra receita Federal, fomo fazê passaporte e tudo, aí ela comentou, mas ai eu já tava, nós já tava lá, e eu teria pegado o dinheiro da mão dela, eu teria deixado esse dinheiro aqui em Foz do Iguaçu com minha mãe, ai não tinha o que a gente fazer, 'tudo bem vamo', aí nós ficamos no hotel, dentro de onze dias, porque o passaporte demorou para sair, demorou uma semana, e nesse tempo dessa uma semana eu escutei uma conversa dela, às quatro da manhã, no telefone, que eu fiquei no quarto com ela no hotel, alguém ligou pra ela, não sei quem foi que ligou pra ela e conversou com ela, e na conversa dela, ela disse assim "eu aqui Brasil, eu aqui Brasil não brincadeira, eu aqui Brasil trabalha", e ai eu não sei o que a pessoa voltou a falar com ela, ela falou assim "não, são três meninas, são quinze mil" o que deu a entender que ela estava vendendo a gente, que ela não estaria levando nós pra trabalhar, ela estava vendendo. Eu levantei pela manhã, fui ao quarto da outra ao lado das outras duas, e comentei com uma das outras, cheguei a comentar com ela que estaria vendendo, que deu para entender, dai ela, certamente a outra não acreditou, e eu fiquei apavorada, a única coisa, ai eu peguei e liguei pra minha mãe, contei pra minha mãe o que teria ouvido, ai minha mãe entrou com pedido na autoridade, pedindo ajuda, mas as autoridades aqui de Foz de Iguaçu se negaram a aceitar, ai foi onde ela entrou em contato com o Cidade Alerta de São Paulo, e daí foi onde eles invadiram o hotel e pegaram nós, mas até o momento nós conhecia só um coreano, nós não conhecíamos os outros (...)."


Antônio Renato Dos Santos, investigador da polícia civil, inquirido pelo MM. Juiz, respondeu que: " (...) estava na DEATUR no dia dos fatos, quando recebeu um telefonema de uma reportagem, comunicando o caso. Parece que a mãe de uma das garotas tinha telefonado para essa reportagem, contando o que estava acontecendo, deu o nome das moças e disse que elas estavam no BRASTON HOTEL. O depoente e outro policiais da DEATUR foram até lá. Encontraram as moças e a acusada Alexsandra. Conversaram com Alexsandra que disse que estava prestes a viajar com as meninas para Seul, na Coréia do Sul, onde elas iriam trabalhar como garotas de programa. Alexsandra disse nessa ocasião o nome da pessoa que estava financiando a operação. Era um coreano, mas o depoente não se lembra o nome (...)"(fls. 359/361)


Destarte, em que pese a negativa da autoria por parte da apelante, sua participação efetiva na prática delituosa restou devidamente comprovada, uma vez que as provas carreadas para os autos evidenciaram seu forte envolvimento no aliciamento das vítimas Isabela Reis Santos, Tatiane Souza Martins e Elisângela Dinat Maciel.



Do dolo.


Configurado o dolo na conduta da ré Alexsandra de Jesus Santos, que de forma plena e consciente, tentou facilitar a saída das garotas do Brasil para o exterior com o fito de exercer a prostituição, mediante obtenção de benefício econômico, pois segundo afirmou em suas declarações perante a autoridade policial que receberia US$ 3.000,00 (três mil dólares), pela vinda ao Brasil e receberia US$ 2.000,00 (dois mil dólares) mensais pela administração das garotas.


Da tipicidade da conduta.


O art. 231 do Código Penal, assim dispõe:

"Promover, intermediar ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou saída de alguém que vá exercê-lo no estrangeiro".

Com efeito, a figura do tipo penal se subsume às condutas "promover, intermediar ou facilitar" a entrada ou saída de alguém que vá exercer a prostituição, ou seja, o tipo penal não exige qualquer outro requisito, basta tão somente os elencados na figura do tipo penal. Portanto, eventual ciência da finalidade para qual se está indo, não descaracteriza a tipicidade da conduta, como bem assinalou a i. representante do Ministério Público Federal em seu parecer nesta instância: "Ao contrário de que alega a apelante, o fato de as vítimas, supostamente, já exercerem a prostituição no Brasil e terem solicitado à recorrente que as colocasse em território estrangeiro não torna atípico o comportamento nem a exime tais elementos para se consumar, bastando facilitar (ajudar, auxiliar) a saída da pessoa do país. Tem-se que o consentimento da vítima é irrelevante para a caracterização do delito".


Do concurso material


No caso, não há como afastar o concurso material imposto à ré considerando que as provas constantes dos autos são plenas e eficazes a comprovar que a apelante, efetivamente, tinha a intenção de facilitar a saída de três pessoas do território nacional, cuja conduta, não foi isolada, devido a pluralidade de ações tipificadas no artigo 231 do CP: "promover, intermediar e facilitar". Segundo Fernando Capez, discorrendo sobre o concurso material, ensina que: "É a prática de duas ou mais condutas, dolosas ou culposas, omissivas ou comissivas, produzindo dois ou mais resultados, idênticos ou não, mas todas vinculadas pela identidade do agente, não importando se os fatos ocorreram na mesma ocasião ou em dias diferentes". (Código Penal Comentado 3ª Edição, 2012, pág. 165 /165Vº).


Assim sendo, não há como imputar a apelante o cometimento de uma só conduta, como quer fazer valer a defesa da ré.


Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.


É o relatório.


À revisão.


MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCELO MESQUITA SARAIVA:10071
Nº de Série do Certificado: 45AC01C590943FBB
Data e Hora: 05/03/2015 18:19:39