Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 11/03/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007930-45.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.007930-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : ROGERIO LUIZ DE OLIVEIRA
ADVOGADO : FERNANDO DE SOUZA CARVALHO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EXCLUIDO : IZAIAS VIANA NETO (desmembramento)
: MAURILIO EDUARDO ARAUJO (desmembramento)
: BRUNO MARTINS DIAS (desmembramento)
: SEBASTIAO ANTONIO LUCAS (desmembramento)
: JOSE CARLOS DIAS (desmembramento)
No. ORIG. : 00079304520084036119 6 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. VISTO CONSULAR ESTRANGEIRO FALSIFICADO. AUTORIA, MATERIALIDADE E DOLO COMPROVADOS. TIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO PROVIDO.
1. Apelação interposta pela Acusação contra sentença que absolveu o réu da imputada prática do crime do artigo 304, c.c. o artigo 297, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, III do Código de Processo Penal.
2. Materialidade comprovada pelo laudo de exame documentoscópico que atesta ser autêntico o passaporte, o qual contém visto consular mexicano falso.
3. A autoria e o dolo igualmente restaram comprovados pelo auto de prisão em flagrante, bem como pelo interrogatório do réu nas fases policial e judicial, que confirmou que tinha ciência de que utilizara visto consular falso para embarcar ao exterior.
4. Não há que se falar que a utilização de passaporte nacional verdadeiro com visto consular estrangeiro inautêntico seja considerada como conduta atípica, ao argumento que a falsidade do visto afeta apenas autoridades estrangeiras.
5. Ainda que a falsidade recaia apenas no visto consular estrangeiro, foi aposto em passaporte nacional, passando a integrar o documento. Assim, ao apresentar o passaporte com a inserção de dados falsos às autoridades alfandegárias, o acusado incorreu no crime de uso de documento falso na forma consumada, uma vez que sua conduta atinge a fé pública e o interesse da União na veracidade dos documentos públicos. Precedentes.
6. Dosimetria da pena. Atenuante da confissão configurada. Contudo, diante da fixação da pena-base em seu mínimo legal, resta inviabilizado o cômputo da atenuante, tendo em vista o disposto na Súmula nº 231 do STJ: "A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal".
7. Recurso provido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, para condenar o réu como incurso no artigo 297, c.c. o artigo 304 do Código Penal, à pena de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direito, na forma especificada, e 10 dias-multa, no valor unitário mínimo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 03 de março de 2015.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007930-45.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.007930-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : ROGERIO LUIZ DE OLIVEIRA
ADVOGADO : FERNANDO DE SOUZA CARVALHO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EXCLUIDO : IZAIAS VIANA NETO (desmembramento)
: MAURILIO EDUARDO ARAUJO (desmembramento)
: BRUNO MARTINS DIAS (desmembramento)
: SEBASTIAO ANTONIO LUCAS (desmembramento)
: JOSE CARLOS DIAS (desmembramento)
No. ORIG. : 00079304520084036119 6 Vr GUARULHOS/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator): O Ministério Público Federal, em 14/11/2000, nos autos da ação penal n. 1999.61.81.006177-3, denunciou JOSÉ CARLOS DIAS, ROGÉRIO LUIZ DE OLIVEIRA, BRUNO MARTINS DIAS, SEBASTIÃO ANTONIO LUCAS, MAURÍLIO EDUARDO ARAUJO e IZAIAS VIANA NETO, qualificados nos autos, como incursos no artigo 304, c.c. o artigo 297 e artigo 29, todos do Código Penal. Consta da denúncia:


Consta que no dia 30/09/1999, no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, os ora denunciados, previamente ajustados e com unidade de desígnios, inclusive com terceira pessoa denominada "João", fizeram uso de documento público falso, quando se preparavam para embarcar com destino final na cidade de Cancun/México.
Apurou-se que os denunciados apresentaram seus passaportes, no momento em que realizaram o check-in. Tais documentos foram vistoriados pelo APF Carlos César, que desconfiou da autenticidade do visto consular mexicano. Dessa forma, juntamente com o APF Renato, entraram em contato com o Consulado Mexicano, do qual obtiveram a informação de que os vistos eram falsos, conforme fax de fls. 19.
Inquiridos em sede policial, todos alegaram que pretendiam, tão logo chegassem ao México, ingressar nos Estados Unidos da América. Narraram, ainda, José, Bruno e Rogério que pagaram a terceira pessoa denominada "João" certa quantia em dólares, a fim de que fosse aposto visto consular mexicano em seus próprios passaportes. No que tange a Sebastião, Maurílio e Izaias "compraram" não somente o visto, mas também o próprio passaporte, sendo que os documentos em tela estavam, ainda, em nome de outras pessoas, a saber:
Denunciado Nº Passaporte Proprietário
Sebastião Antônio Lucas CF 206759 Márcio Soares Maciel (fls. 121/122)
Maurilio Eduardo Araújo CK 014002 Paulo César de Miranda (fls.132/133)
Izaías Viana Neto CK 197860 Geovane Soares Nunes (fl. 128)
Realizado o laudo pericial pelo Instituto de Criminalística, restou comprovada a materialidade delitiva, atestando serem falsos todos os vistos apostos nos supracitados documentos, bem como ter ocorrido substituição de fotografia nos passaportes utilizados por Sebastião, Maurilio e Izaias.

A denúncia foi recebida em 17/11/2000 (fls. 191).

Às fls. 581/582 foi decretada extinta a punibilidade do réu Bruno Martins Dias, com fundamento no artigo 107, I, do Código Penal.

Foi decretada a suspensão do processo e do lapso prescricional em relação aos corréus Maurílio (fl. 294), Izaías (fl. 345) e Rogério (18/10/2007, fls. 620/621), nos termos do artigo 366 do CPP, uma vez que, citados por edital, não compareceram em juízo para serem interrogados, nem constituíram advogados, tendo sido determinado o desmembramento do feito em relação a eles (fls. 641), originando-se os autos 2008.61.19.003402-6 (fl. 711).

À vista do comparecimento aos autos dos réus Maurílio e Izaías, o feito foi novamente desmembrado em relação a Rogério, tendo em vista que para ele o processo permaneceu suspenso (CPP, art. 366), originando-se os presentes autos (fls. 801/802 e 803).

Em 26/03/2010, houve a citação pessoal de Rogério (fls. 821v), tendo sido determinado o prosseguimento do feito em 05/05/2010 (fls. 826/826v)

Após instrução, sobreveio sentença, registrada em 29/09/2011 (fls. 923/926 e 927), julgando improcedente a denúncia para absolver Rogério Luiz de Oliveira, da imputação contida na denúncia, com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.

Apela o Ministério Público Federal (fls. 931/936) pugnando pela condenação de Rogério, ao argumento que restou comprovado nos autos a materialidade e autoria delitivas e o dolo. Sustenta que a conduta do acusado de apresentar documento inautêntico ao tentar sair do País, efetivamente ofendeu o bem jurídico tutelado, restando caracterizada conduta típica prevista no artigo 304, c.c. o artigo 297 do CP, não se podendo compreender o visto e o passaporte como dois documentos distintos.

Contrarrazões do acusado, representado pela Defensoria Pública da União, postulando a manutenção da sentença absolutória (fls. 939/942).

A Procuradoria Regional da República, pelo parecer de fls. 944/948, opinou pelo provimento do recurso para que Rogério seja condenado nos termos do artigo 304, c.c. o artigo 297, c.c. o artigo 29, todos do Código Penal.

É o relatório.

Ao MM. Revisor.



HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007930-45.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.007930-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : ROGERIO LUIZ DE OLIVEIRA
ADVOGADO : FERNANDO DE SOUZA CARVALHO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EXCLUIDO : IZAIAS VIANA NETO (desmembramento)
: MAURILIO EDUARDO ARAUJO (desmembramento)
: BRUNO MARTINS DIAS (desmembramento)
: SEBASTIAO ANTONIO LUCAS (desmembramento)
: JOSE CARLOS DIAS (desmembramento)
No. ORIG. : 00079304520084036119 6 Vr GUARULHOS/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator): ROGERIO LUIZ DE OLIVEIRA foi denunciado como incurso no artigo 304, c.c. o artigo 297 do Código Penal, por fazer uso de documento público falso, quando se preparava para embarcar para o México, apresentando no check in do Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP passaporte nacional com visto consular mexicano falso.

A MM. Juíza a quo absolveu o réu por atipicidade da conduta, ao fundamento que não se exige a apresentação do visto consular estrangeiro para deixar o território nacional, "não tendo logrado êxito em embarcar para o México, local em que ocorreria a consumação do delito, quando então o documento produziria os efeitos juridicamente relevantes".

Apela o Ministério Público Federal postulando a condenação de Rogério, ao argumento que, ainda que o falso recaia apenas no visto consular, foi aposto em documento expedido pela União, não se podendo compreender visto e passaporte como dois documentos distintos.

Passo à análise do recurso.

O recurso comporta acolhimento.

A materialidade delitiva encontra-se demonstrada pelo Laudo de Exame Documentoscópico fls. 95/98, que atesta ser autêntico o passaporte n. CK 466101, em nome de Rogério Luiz de Oliveira, o qual contém visto consular mexicano falso à página 09 do passaporte. Do laudo ainda constou:

... os Peritos verificaram que a reação dos vistos à incidência de luz ultravioleta, diverge da obtida em documentos da mesma natureza, bem como a impressão dos motivos foram produzidas por impressora do tipo jato de tinta, levando a concluírem que se trata de vistos falsos.

A autoria e o dolo igualmente restaram comprovados pelo auto de prisão em flagrante, bem como pelo interrogatório do réu nas fases policial e judicial, que confirmou que tinha ciência de que utilizara visto consular falso para embarcar ao exterior:


Que há aproximadamente um mês, nas proximidades do consulado dos EUA, no Rio de Janeiro/RJ, foi abordado por um rapaz moreno de nome João, com sotaque de carioca, que lhe ofereceu um visto mexicano, dizendo que seria assim mais fácil de chegar ao EUA; Que, entregou então seu passaporte, que veio receber com visto mexicano na tarde de ontem, antes da tentativa de embarque, pagando então a João US$ 300,00 (trezentos dólares americanos),mais o preço da passagem; Que, tem consciência de ter cometido um crime ao fazer uso de documento falso, embora acredite ter sido iludido. (interrogatório do réu na fase policial, fls. 10/11)

Que há cerca de onze anos o declarante tentou viajar para os EUA, onde pretendia trabalhar; que o declarante obteve passaporte brasileiro junto a Polícia Federal na cidade do Rio de Janeiro;que foi sozinho para obter tal documento; que acredita que na época não era fornecido passaporte na cidade de Governador Valadares, onde foi procurado posteriormente por uma pessoa de nome "José Carlos", seu conhecido, que lhe ofereceu um visto mexicano, para conseguir ingressar nos EUA pela fronteira com o México; que "José Carlos" nada lhe cobrou por tal serviço, pedindo-lhe apenas que entregasse o passaporte; que algum tempo depois "José Carlos" lhe entregou tal documento com visto do consulado mexicano; que não tentou obter visto no Consulado americano porque sabia que tal autorização para ingresso em solo americano era negado às pessoas desta região; que não sabe informar o endereço do citado "José Carlos"; que no dia em que foi marcada a viagem para o México acabou sendo preso pela Polícia Federal no aeroporto de Guarulhos/SP, após apresentar o seu passaporte para embarque, ocasião em que foi informado de que seu visto mexicano era falsificado; que ficou preso por dez a doze dias, sendo que após sua soltura retornou para esta cidade, onde continuou a sua vida. . (interrogatório do réu na fase judicial, fls. 864/865).

Da tipicidade da conduta. Não há que se falar que a utilização de passaporte nacional verdadeiro com visto consular estrangeiro inautêntico seja considerada como conduta atípica, ao argumento que a falsidade do visto afeta apenas autoridades estrangeiras.

Ainda que a falsidade recaia apenas no visto consular estrangeiro, foi aposto em passaporte nacional, passando a integrar o documento pátrio.

Assim, ao apresentar o passaporte com a inserção de dados falsos às autoridades alfandegárias, o acusado incorreu no crime de uso de documento falso na forma consumada, uma vez que sua conduta atingiu a fé pública e o interesse da União na veracidade dos documentos por ela emitidos.

Nesse sentido, situa-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal:


PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 297 DO CP. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM PASSAPORTE. TIPICIDADE.
Configura o crime do art. 297 do CP a inserção de dados falsos (visto consular falsificado) em passaporte nacional (Precedente).
Recurso especial provido.
(STJ, REsp 1160651/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 26/08/2010, DJe 27/09/2010)
PENAL - PROCESSUAL PENAL - USO DE PASSAPORTE AUTÊNTICO COM VISTO CONSULAR FALSO - EXISTÊNCIA DE LESÃO AOS INTERESSES NACIONAIS - DOCUMENTO PÚBLICO DE CUNHO FEDERAL - TIPICIDADE DA CONDUTA - MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO - COMPROVAÇÃO - CONDENAÇÃO DO RÉU - MANUTENÇÃO - PENA PECUNIÁRIA MANTIDA - DIFICULDADES FINANCEIRAS - NÃO DEMONSTRAÇÃO - PODER DE COERÇÃO DA REPRIMENDA - PARCELAMENTO DA PENA NA EXECUÇÃO - POSSIBILIDADE - IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Acusado que viajou aos Estados Unidos com passaporte brasileiro autêntico e visto americano pertencente a outra pessoa e que foi denunciado e condenado como incurso no art. 304, c/c. 297, do Código Penal. 2. O visto americano falso aposto no passaporte brasileiro causa impacto na ordem jurídica brasileira em face da exigência de visto para estrangeiros que intentam adentrar em outro país. Sobre o visto aposto no documento público federal recai controle das autoridades brasileiras que examinam o documento de passaporte para a saída do país. 3. Materialidade delitiva demonstrada pelo ofício emitido pelo Consulado que constatou a falsidade. 4. Autoria admitida pelo próprio réu que admitiu ter saído do Brasil apresentando o documento de passaporte, tendo sido deportado ao ingressar nos Estados Unidos. 5. Conduta dolosa comprovada pela consciência da necessidade de submeter-se ao procedimento consular para a obtenção de visto para adentrar em outro país. 6. Pena pecuniária substitutiva que se mantém, em face da não comprovação de dificuldades financeiras, poder de coerção da pena e possibilidade de parcelamento pelo Juízo das Execuções Penais, se comprovada a impossibilidade de pagamento. 7. Improvimento do recurso.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR 0002260-02.2003.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 15/04/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/04/2013)

DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. PASSAPORTE AUTÊNTICO COM VISTO CONSULAR FALSO. ART. 297 E 304 DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. TIPICIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE DOLO. ABSOLVIÇÃO. 1. A materialidade do crime previsto no art. 304 (c.c. o art. 297) do Código Penal está comprovada através da resposta do Consulado Geral dos Estados Unidos no Rio de Janeiro a ofício expedido pela Polícia Federal, em que se solicitaram informações sobre a autenticidade do visto americano aposto no passaporte do réu. 2. A autoria foi comprovada por meio de ofício expedido pelo Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos da América à Polícia Federal, em que a informou sobre a apreensão de 28 (vinte e oito) passaportes brasileiros em diversos portos de entrada dos EUA, por terem sido utilizados de forma fraudulenta por pessoas que tentavam ingressar no país. Entre tais passaportes se encontrava o do acusado. Em seu interrogatório, o réu confirmou ter viajado aos EUA, pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, e ter sido detido e posteriormente deportado por autoridades estadunidenses em Miami/EUA, em razão de irregularidades em seu passaporte. 3. Os fatos denunciados são típicos. Os artigos 304 e 297 do Código Penal não fazem distinção entre documentos públicos nacionais e estrangeiros. Para que se constate a tipicidade da conduta perpetrada pelo agente, basta tão somente a contrafação de qualquer documento público, assim entendido como qualquer documento lavrado por autoridades públicas nacionais ou de estados estrangeiros, reconhecidos diplomaticamente pelo Brasil. O estado brasileiro se encontra adstrito pelo princípio da cooperação e seus compromissos internacionais. Tratando-se de documento público estrangeiro análogo a documento expedido pelo próprio estado brasileiro, condizente com os princípios e valores sociais e jurídicos nacionais, não há razão de se negar igual proteção à fé pública de tal documento. A aposição de um único visto falso em um passaporte autêntico é o suficiente para inquinar sua idoneidade. É impróprio afirmar que se trata se conduta penalmente irrelevante e, portanto, materialmente atípica, a utilização de passaporte com visto falsificado, sob o argumento de "não produz[ir] efeito jurídico nem ofende[r] a fé pública brasileira". Há de se lembrar ser interesse do estado brasileiro que se mantenha a fiabilidade de seus documentos públicos perante estados estrangeiros e a utilização de passaporte genuíno com qualquer tipo de contrafação vilipendia a fé pública tutelada pelo Código Penal. 4. Não é crível a versão do réu, de que não suspeitasse da ilegalidade da transação de que participava, ao contratar pessoa estranha na rua para renovar visto consular. O acusado é proveniente de família com suficientes recursos financeiros para ter arcado com uma viagem sua para os EUA anteriormente, conforme seu próprio relato em juízo, assim como com seus estudos em uma universidade privada. Não se trata de pessoa ingênua, sem recursos ou instrução. Deduz-se que o réu possui conhecimentos suficientes, ou teve plena possibilidade de acercar-se deles, para deduzir que a obtenção de um visto consular é um procedimento formal revestido de determinadas cautelas. 5. Conclui-se que o réu, apresentando seu passaporte com visto consular estrangeiro falso à fiscalização aeroportuária, para viajar para o exterior, livre e conscientemente fez uso de documento público falso. 6. Apelação do Ministério Público Federal provida.
(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ACR 0008036-70.2009.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 20/03/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/03/2012)
PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO. VISTO CONSULAR JAPONÊS ADULTERADO. CRIME CONTRA A FÉ PÚBLICA. JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA NÃO CARACTERIZADA. RECURSO PROVIDO. 1-Sob o viés das formalidades exigidas pelo Art. 41 do CPP, não há óbice que impeça o reconhecimento da higidez da peça acusatória, a qual bem relata a autoria e os fatos, com suas circunstâncias de tempo, modo e lugar, de ordem a permitir aos acusados que exerçam, de fato, a ampla defesa e o contraditório. 2-O visto consular falsificado viola bem jurídico nacional, no caso, a fé pública, porque não é um documento que subsiste fora do passaporte, documento de identificação, de propriedade da União, exigível de todos os que pretendam realizar viagem internacional, nos termos do Art. 2º do Decreto 1.983/96. 3-Embora expedido por autoridade estrangeira, o visto, que nada mais é do que uma autorização de ingresso do estrangeiro no país que o exige, inserido que está num documento público nacional, quando falso, representa uma contrafação do passaporte e, por isso, não deve ser tido como um ato cometido apenas contra outro país. 4-Nem se diga, outrossim, que seus efeitos serão lá produzidos. A uma, porquanto para a tipificação da conduta pouco importa o local dos efeitos e, a duas, porque está o país de origem obrigado a permitir o embarque ao exterior apenas quando presente o visto consular, o que confirma a produção de efeitos deste documento também aqui. 5-É de se registrar que, pelo princípio da territorialidade, aplica-se ao caso a lei penal do local do crime, pouco importando a nacionalidade da vítima ou do bem jurídico lesado. 6-Impende lembrar que a prática delituosa insculpida no art. 297 do CP trata de crime de natureza formal e por isso se consuma com o simples ato de falsificar documento público, perdendo relevância o fato de ter, ou não, o agente logrado êxito em sua empreitada causando dano a terceiros, haja vista que a potencialidade é suficiente à configuração do crime, classificado como sendo de dano abstrato. 7-Em relação ao crime de uso, por sua vez, não há falar-se em conduta atípica pela inexistência de ofensa à fé pública. O documento contrafeito foi utilizado no Brasil para que os denunciados pudessem embarcar ao Japão, razão pela qual se aplica também em relação a esta figura delitiva o princípio da territorialidade. 8-Também pelo princípio da extraterritorialidade incondicionada, porque ofendido interesse da União, resulta aplicável a lei brasileira. Logo, por quaisquer ângulos que se examine a questão, afigura-se incorreto afirmar que eventual punição dos acusados deveria ter sido perseguida pelo Japão, único interessado. 9-Rejeitadas as hipóteses de atipicidade da conduta, e observado que indícios suficientes de dolo se encontram presentes à persecução criminal, haja vista que ninguém pagaria mais de R$ 10.000,00 para obter um visto consular em outro Estado da federação sem, ao menos, desconfiar da ilicitude do ato, a denúncia deve ser recebida.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, RSE 0003125-93.2001.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA, julgado em 25/05/2009, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/06/2009 PÁGINA: 772)

Não há dúvida, portanto, que o acusado cometeu o crime do artigo 297 c/c artigo 304 do Código Penal, sendo de rigor a sua condenação.

Passo à dosimetria da pena.

Fixo a pena-base no mínimo legal, em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa, em razão da ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis (art. 59 do CP).

Na segunda fase não se observam circunstâncias agravantes.

No tocante as circunstâncias atenuantes há que se ponderar que o acusado confessou a prática delitiva, o que faria incidir a redução do art. 65, inc, III, "d" do CP.

Contudo, diante da fixação da pena-base em seu mínimo legal, resta inviabilizado o cômputo da atenuante, tendo em vista o disposto na Súmula nº 231 do STJ: "A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal".

Portanto, permanece a pena em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa, que se torna definitiva, ante a ausência de causas de aumento ou diminuição de pena.

O valor do dia-multa é de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, tendo-se em vista a ausência elementos acerca da atual condição econômica do réu.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c" e §3º do Código Penal.

Presentes os requisitos do artigo 44, incisos I, II e III, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em: a) prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo, destinada à União Federal e, b) prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da Execução, pelo mesmo prazo da segregação.

Pelo exposto, dou provimento à apelação para condenar o réu ROGÉRIO LUIZ DE OLIVEIRA como incurso no artigo 297 c/c artigo 304 do Código Penal, ambos do Código Penal, à pena de 02 anos de reclusão, no regime inicial aberto, e 10 dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, na forma especificada.

É o voto.



HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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Data e Hora: 14/01/2015 19:34:29