D.E. Publicado em 22/04/2015 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Andre Custodio Nekatschalow:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 6FF489872CB26B896143FFEC7333ABCE |
Data e Hora: | 14/04/2015 14:12:54 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta por José Diogo Flores contra a sentença que o condenou a 2 (dois) anos de reclusão e a 30 (trinta) dias-multa, no valor mínimo legal, pelo delito do art. 89 da Lei n. 8.666/93 e para o crime do art. 1º, I, do Decreto Lei n. 201/67 a 3 (três) anos e 9 (nove) meses de detenção e 10 (dez) dias-multa, no valor mínimo legal. As penas foram unificadas, nos termos do art. 70 do Código Penal, e fixado o regime semiaberto de cumprimento de pena (fls. 278/288).
José Diogo apela com as seguintes razões:
a) o apelante exerceu mandato de prefeito no Município de Altair até 2008, sendo que nesse ano o Governo Federal liberou recursos por intermédio de convênio com o Ministério da Cultura para a construção de um centro cultural, tendo o apelante autorizado o início da execução do projeto;
b) foi realizada a aquisição de 2.700 blocos de tijolos sem licitação com base em documentação de exclusividade apresentada pela empresa vendedora, a qual foi analisada pela sua assessoria;
c) o apelante sempre confiou na atuação de seus secretários e assessores e não agiu com dolo, o qual não foi provado;
d) o réu não agiu com má fé, o que obsta sua responsabilização;
e) não restou provado o dolo das práticas delitivas, o que afasta a tipicidade delitiva;
f) "Inclusive, o Apelante só autorizou a licitação por ter sido autorizado e induzido por sua assessoria jurídica e de engenharia, bem como pelo fato do fornecedor dos blocos de tijolos de isopor, ter apresentado documento idôneo que autorizaria a sua dispensa. (grifos nossos)";
g) se o Administrador contrata conforme critérios adotados pela Administração Pública e conforme orientações de seus assessores e documentos emitidos por terceiros, ainda que ilegais, não pode ser apenado criminalmente, se não agiu de má-fé (fls. 293/300).
Contrarrazões às fls. 302/307.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento da apelação.
Feito sujeito à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Andre Custodio Nekatschalow:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 6FF489872CB26B896143FFEC7333ABCE |
Data e Hora: | 20/02/2015 14:04:38 |
|
|
|
|
|
VOTO
Denúncia. José Diogo Flores foi denunciado pelos crimes do art. 89 da Lei n. 8.666/93 e do art. 1º, I, do Decreto-lei n. 201/67, nos seguintes termos:
Materialidade. A materialidade dos crimes do art. 89 da Lei n. 8.666/93 e do art. 1º, I, do Decreto Lei n. 201/67 restou provada com base nos seguintes elementos de convicção:
a) nota de empenho da Prefeitura Municipal de Altair (SP), emitida em 23.07.08 no valor de R$ 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos reais), relativa à aquisição de 2.700 (dois mil e setecentos) blocos para construção civil, destinados à obra de construção do centro de eventos municipal (fl. 76);
b) Nota Fiscal Fatura n. 000010 emitida pela empresa ISOCRET Ltda. em 23.07.08, no valor de R$ 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos reais), relativa à venda para a Prefeitura Municipal de Altair de 2.700 (dois mil e setecentos) "BLOCOS PARA CONSTRUÇÃO CIVIL FEITO EM EPS - NAS MEDIDAS DE 1.19X0.30X0.14" (fl. 10 do apenso I);
c) comprovante de pagamento à empresa ISOCRET do valor de R$ 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos reais) (fl. 78);
d) declaração do Sindicato do Comércio Varejista de Material de Construção - SINCOMAVI, de exclusividade da empresa ISOCRET na comercialização de blocos de isopor com dimensões 1,19 x 0,30 x 0,14, tipo F, com densidade de 25,00 kg/m3 (fl. 79);
e) Convênio de Cooperação n. 517/2007 celebrado entre a União, por intermédio do Ministério da Cultura, e o Munícipio de Altair para a construção de um centro cultural nesse município (fls. 145/151 do Apenso I).
Autoria. A autoria dos crimes foi suficientemente provada.
É dos autos que o réu, então prefeito do Munícipio de Altair (administração 2005/2008), celebrou convênio com o Ministério da Cultura para a construção de um centro cultural, tendo sido repassado ao município a quantia de R$ 388.020,00 (trezentos e oitenta e oito mil e vinte centavos), conforme nota de empenho de fl. 89 do apenso I. Para tanto, foi apresentado e aprovado o Plano de Trabalho, Projeto e Engenharia e nele o orçamento geral da obra. Quanto à construção de paredes e painéis, mediante o uso de tijolos e outros materiais, o custo foi orçado em R$ 39.538,83 (trinta e nove mil, quinhentos e trinta e oito reais e oitenta e três centavos) (fls. 44/49 do apenso I).
Após o repasse do recurso federal, o réu alterou unilateralmente a execução do convênio nos termos apresentados, infringindo as cláusulas terceira e décima terceira do contrato, ao dispensar irregularmente licitação com o fundamento de sua inexigibilidade. Assim, adquiriu junto à empresa ISOCRET do Brasil Comércio de Materiais em Polipropileno e Serviços de Construção Ltda., 2.700 (dois mil e setecentos) blocos de isopor (poliestireno expandido - EPS) para a construção das paredes do centro cultural, pelo valor de R$ 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos reais). A obra não foi realizada, tendo sido devolvido à União o valor do repasse, excetuado o valor utilizado para a compra do material dos blocos de isopor.
A dispensa de licitação mostrou-se irregular, na medida em que realizada com descumprimento do procedimento legal específico, arts. 25 e 26 da Lei n. 8.666/93, não se mostrando inexigível a licitação. A conduta do réu subsumiu-se, assim, ao tipo previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/93:
Com efeito, o então prefeito justificou a desnecessidade de licitação para adquirir blocos de isopor da empresa ISOCRET por meio da declaração de exclusividade da referida empresa na comercialização de blocos de EPS com as dimensões de 1,19 x 0,30 x 0,14, auto extinguível (tipo F), com densidade de 25,00 kg/m3, documento emitido pelo Sindicato do Comércio Varejista de São Paulo (fl. 79).
Registro nesse particular que a declaração de exclusividade afirmou atender à solicitação da empresa ISOCRET, tendo sido realizada tão somente com base nos documentos por ela fornecidos, o que enfraquece a idoneidade do conteúdo declarado.
A nota fiscal de compra do material não faz alusão à densidade dos blocos adquiridos, referida na declaração de exclusividade para justificar o afastamento da licitação.
Os blocos adquiridos foram periciados pelo Departamento de Engenharia do Município de Altair (fl. 307 do apenso II), sendo constatado que a densidade era efetivamente menor (13,7 kg/m3), a evidenciar a compra de material distinto e de menor valor àquele pago pela Prefeitura (R$ 67.500,00). Tal fato indica, outrossim, o dolo da prática delitiva.
Acrescente-se que não há exclusividade da empresa ISOCRET nem na produção nem da comercialização de blocos de EPS, conforme se constata dos orçamentos de três empresas distintas que fornecem semelhante material, a preços significativamente menores, conforme se verifica às fls. 45/46, 47/48 e 49, bem como da informação técnica de perito criminal federal (fls. 42/44), a demonstrar a inidoneidade das informações prestadas na declaração de exclusividade e, portanto, a necessidade de licitação.
Registre-se que os 2.700 (dois mil e setecentos) blocos foram produzidos pela empresa ISOTERM, ao custo total de R$ 9.963,00 (nove mil, novecentos e sessenta e três reais), e vendidas à empresa ISOCRET, conforme notas fiscais de fls. 35/41, que os forneceu à Prefeitura de Altair.
A conduta do réu configurou, ademais, crime de responsabilidade de Prefeito, haja vista que houve desvio de renda pública, o que se comprovou pelo valor original do material proposto para ser usado na alvenaria da obra (R$ 39.535,38), aquele pago pela Prefeitura (R$ 67.500,00) e os valores obtidos no mercado e apresentados pelas empresas Construtor (R$ 54.351,00, material puro, fl. 45), Igapó (R$ 17.550,00, material puro, fl. 47) e Isoluma (R$ 27.000,00, fl. 49).
Note-se que, no caso da conveniência de utilização de blocos de isopor, poder-se-ia inclusive adquirir tal produto reciclado, cujo valor seria extremante vantajoso à Prefeitura (orçado em R$ 14.850,00 pela empresa Igapó, fl. 47). A possibilidade de uso de material reciclado é informada pelo perito federal às fls. 42/44.
O delito do art. 1º, I, do Decreto Lei n. 201/67 é assim descrito:
O favorecimento à empresa ISOCRET é patente, à consideração principal da falta de apresentação de justificativa técnica para a alteração do material inicialmente aprovado e que seria utilizado na construção das paredes do centro cultural.
Não prospera a alegação da defesa de que não foi provado o dolo do cometimento dos crimes.
O réu, em suas declarações, procurou afastar sua responsabilidade ao afirmar inicialmente que realizou a troca do material por indicação de José Eudes, representante da empresa Lopes Engenharia, responsável pelo projeto e sua execução. José Eudes teria informado que não haveria alteração do valor disposto no cronograma. Disse que o Ministério da Cultura foi consultado verbalmente, sendo informado que não haveria problema caso não houvesse alteração dos valores para a realização da obra. Admitiu que não encaminhou ao departamento jurídico da Prefeitura a declaração de exclusividade da empresa ISOCRET, usada para justificar a não realização de licitação dos blocos de EPS. Asseverou não ter conhecimento do procedimento legal previsto na Lei n. 8.666/93 para os casos de dispensa/inexigibilidade de licitação em obras públicas. Posteriormente, aduziu ter recebido o aval da advogada da Prefeitura para realizar a compra, o que não logrou comprovar (fls. 95/96 e 243).
O ato da compra foi realizado pelo filho do réu, Flávio Rogério Flores, funcionário da Prefeitura, encarregado à época da compra de materiais.
Flávio disse que fora a Brasília com José Eudes, onde se reuniram no Ministério da Cultura para tratar da troca do material, tendo sido informado que não haveria problema caso fosse mantido o valor inicial da obra. Mencionou que não houve consulta formal ao Ministério da Cultura nem ao departamento jurídico da Prefeitura, não se recordando da data em que esteve em Brasília e com quem haviam se reunido (fls. 68/90). Tal versão não foi provada.
Nelson Mariano de Souza, engenheiro concursado da Prefeitura de Altair, esclareceu que sempre opinava no que se referia à parte técnica das obras do município, inclusive na fiscalização dos cronogramas, sendo que não foi consultado sobre o projeto de construção do centro cultural e dos materiais a serem utilizados. Salientou que faz parte de suas atribuições a manifestação em obras e licitações (fls. 6/7 e 243).
Francisco Orlando, funcionário da Prefeitura, dirigia o setor de licitações durante os anos de 2007 a 2008, na gestão do réu como Prefeito de Altair, tendo afirmado que durante sua presidência na comissão de licitação não havia chegado às suas mãos procedimento formal de dispensa ou inexigibilidade de licitação (fls. 93/94 e 243).
A prova documental e testemunhal reunida é clara no sentido de que a troca do material a ser utilizado na construção das paredes do centro cultural foi realizada exclusivamente pelo réu, com a ajuda de seu filho, sem a participação dos órgãos da Prefeitura responsáveis pela execução e fiscalização de obras municipais e em claro descumprimento dos procedimentos legais específicos.
A compra do material ocorreu em 23.07.08, no último ano do mandato do réu como prefeito de Altair, de modo que não se mostra razoável a alegação de que desconhecia os procedimentos para a realização da compra de matérias para obras no município.
A responsabilidade do réu exsurge cristalina do material coligido no feito, não sendo produzida nenhuma prova em sentido contrário.
Veja-se que, nos termos do convênio assinado pelo réu com o Ministério da Cultura, dispõe a cláusula terceira competir ao convenente, itens c e d, observar nas aquisições os procedimentos estabelecidos para as licitações, previstos na Lei n. 8.666/93, bem como executar fielmente o convênio de acordo com as cláusulas pactuadas, o que afasta a alegação da defesa de desconhecimento do réu acerca do procedimento regular a ser realizado no caso de alteração da execução da obra.
Portanto, comprovadas a materialidade e a autoria delitiva, a manutenção da condenação é de rigor.
A defesa não recorreu da dosimetria da pena, a qual, por essa razão, não comporta alteração.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação criminal.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Andre Custodio Nekatschalow:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 6FF489872CB26B896143FFEC7333ABCE |
Data e Hora: | 14/04/2015 14:12:57 |