Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 20/08/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006068-44.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.006068-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : ALEXANDRE VIEIRA DA SILVA
ADVOGADO : GO011502 MAURICIO PIRES DE BARROS e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00060684420094036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. DESCAMINHO. REITERAÇÃO DELITIVA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MEDICAMENTOS PROIBIDOS E FALSIFICADOS. AUTORIA. ARMAS. USO RESTRITO.
1. Revejo meu entendimento para acompanhar a jurisprudência predominante nos Tribunais Superiores e nesta Corte no sentido de que a reiteração delitiva obsta a incidência do princípio da insignificância ao delito de descaminho, independentemente do valor do tributo não recolhido (STF: HC n. 118686, Rel. Min. Luiz Fux, j. 19.11.13, HC n. 114675, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 13.11.12, HC n. 112597, Rel. Min. Carmem Lúcia, j. 18.09.12; STJ: AGARESP n. 329693, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 13.08.13, AGRESP n. 201200367950, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 17.04.12; TRF 3ª Região, ACR n. 00114957320054036102, Rel Des. Fed. José Lunardelli, j. 27.08.13).
2. Autoria e materialidade comprovadas quanto aos crimes de descaminho e de importação de armas, inclusive de uso restrito.
3. Autoria do delito do art. 273 do Código Penal não comprovada.
4. Apelação do réu não provido. Recurso da acusação parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso do réu e dar parcial provimento ao recurso da acusação para aplicar a causa de aumento do art. 19 da Lei n. 10.826/03, bem como para afastar a aplicação do princípio da insignificância e condenar o réu pela prática do crime do art. 334 do Código Penal, reconhecendo o concurso formal entre os delitos, para fixar a pena definitivamente em 7 (sete) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 17 (dezessete) dias-multa, no valor mínimo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 10 de agosto de 2015.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006068-44.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.006068-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : ALEXANDRE VIEIRA DA SILVA
ADVOGADO : GO011502 MAURICIO PIRES DE BARROS e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00060684420094036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas pela acusação e por Alexandre Vieira da Silva contra a sentença que o condenou pela prática do delito do art. 18 da Lei n. 10.826/03 e o absolveu da imputação referente ao art. 334 e ao art. 273, § 1º e § 1º-B, ambos do Código Penal, com fundamento no art. 386, III e VII, respectivamente, do Código de Processo Penal.

Recorre a acusação, aduzindo, em síntese, o seguinte:

a) é inaplicável o princípio da insignificância no que tange ao delito do art. 334 do Código Penal em razão da reiteração delitiva confessada pelo próprio réu;

b) quanto ao crime do art. 273 do Código Penal, restaram plenamente comprovadas a autoria e a materialidade delitivas;

c) deve incidir a causa de aumento prevista no art. 19 da Lei n. 10.826/03, pois parte da munição apreendida é de uso restrito (fls. 291/300v.).

Apela Alexandre Vieira Silva com os seguintes argumentos:

a) não foi comprovada a autoria delitiva, pois as mercadorias apreendidas pertenciam a outros passageiros;
b) o apelante é atirador com permissão do Exército Brasileiro para portar munições e armas, sendo que nenhum dos itens apreendidos é de uso proibido ou restrito;
c) o réu deve ser absolvido da prática do crime do art. 18 da Lei n. 10.826/03 (fls. 305/310).

Foram apresentadas contrarrazões pelo réu (fls. 316/323) e pela acusação (fls. 328/337).

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo não provimento da apelação do réu e pelo parcial provimento do recurso da acusação para que seja aplicada a causa de aumento prevista no art. 19 da Lei n. 10.826/03 (fls. 350/354).

Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006068-44.2009.4.03.6106/SP
2009.61.06.006068-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : ALEXANDRE VIEIRA DA SILVA
ADVOGADO : GO011502 MAURICIO PIRES DE BARROS e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00060684420094036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO



Imputação. Alexandre Vieira da Silva foi denunciado porque no dia 25.04.09 foi surpreendido quando transportava a bordo de um ônibus na Rodovia Assis Chateubriand mercadorias, munições e medicamentos de origem estrangeira sem a regular documentação legal.

Uma vez apurada a autoria e a materialidade, o réu foi denunciado pela prática dos crimes do art. 273, § 1º e § 1º-B, I e V, e do art. 334, ambos do Código Penal, e do delito do art. 18 da Lei n. 10.826/03 (fls. 131/133).

Do processo. Posto que tenha sido denunciado também pela prática dos crimes do art. 273, § 1º e § 1º-B, I e V, e do art. 334, ambos do Código Penal, o réu foi absolvido de tais imputações, sendo condenado somente pela prática do delito do art. 18 da Lei n. 10.826/03.

O MM. Juízo a quo entendeu aplicável, com relação ao crime de descaminho (CP, art. 334), o princípio da insignificância, uma vez que o valor total das mercadorias, excluindo-se o montante referente aos remédios e às munições, é inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Quanto ao crime referente aos medicamentos apreendidos (CP, art. 273), julgou insuficientes as provas com relação à autoria delitiva.

Recorre a acusação, requerendo seja afastado o princípio da insignificância no que tange ao delito do art. 334 do Código Penal em razão da reiteração delitiva, bem como seja o réu condenado pela prática do crime do art. 273 do Código Penal, pois plenamente comprovadas a autoria e a materialidade.

Descaminho. Reiteração delitiva. Princípio da insignificância. Revejo meu entendimento para acompanhar a jurisprudência predominante nos Tribunais Superiores e nesta Corte no sentido de que a reiteração delitiva obsta a incidência do princípio da insignificância ao delito de descaminho, independentemente do valor do tributo não recolhido:


PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DESCAMINHO (ART. 334, CAPU T, DO CP). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PACIENTE CONTUMAZ NA PRÁTICA DELITIVA. ORDEM DENEGADA. 1. O princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do comportamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. A aplicação do princípio da insignificância deve, contudo, ser precedida de criteriosa análise de cada caso, a fim de evitar que sua adoção indiscriminada constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais. 3. O princípio da insignificância no crime de descaminho é afastado quando comprova-se a contumácia na prática delitiva. Precedentes: HC 115.514, Segunda Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 10.04.13; HC 115.869, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffolli, DJ de 07.05.13; HC 114.548, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJ de 27.11.12; HC 110.841, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 14.12.12; HC 112.597, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 10.12.12; HC 100.367, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJ de 08.09.11. 4. A existência de outras ações penais em curso contra a paciente, embora não configure reincidência, é suficiente para caracterizar a contumácia na prática delitiva, afastando, por conseguinte, a aplicação do princípio da insignificância. 5. In casu, a paciente foi denunciada como incursa nas sanções do artigo 334, caput, do Código Penal, por ingressar no território nacional com mercadorias de procedência estrangeira - CDs, DVDs, cigarros, artigos de pesca, pilhas, rádios toca fitas, máquina de cortar cabelo, acessórios para videogames, baterias de telefones, calculadoras, aparelhos de telefones, maquiagens, isqueiros, brinquedos - desacompanhadas da documentação fiscal comprobatória do recolhimento dos respectivos tributos, no valor total de R$ 1.652,51 (um mil seiscentos e cinquenta e dois reais e cinquenta e um centavos). 6. Destarte, em que pese o valor do tributo sonegado ser inferior ao limite estabelecido no artigo 20 da Lei 10.522/02, na redação conferida pela Lei 11.0 33/04, não é possível aplicar-se o princípio da insignificância, porquanto trata-se de paciente contumaz na prática delitiva. 7. Ordem denegada.
(STF, HC n. 118686, Rel. Min. Luiz Fux, j. 19.11.13)
HABEAS CORPUS. PENAL. CONSTITUCIONAL. INFRAÇÃO DO ART. 344, § 1º, A LÍNEA D, DO CÓDIGO PENAL. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCI A: INVIABILIDADE. PRÁTICA REITERADA DE DESCAMINHO. PRECEDENTES. 1. A tipicidade penal não pode ser percebida como o exercício de mera adequação do fato concreto à norma abstrata. Além da correspondência formal, a configuração da tipicidade demandaria uma análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, para se verificar a ocorrência de alguma lesão grave, contundente e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 2. O princípio da insignificância reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por consequência, torna atípico o fato na seara penal, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal. 3. Existência de outros processos administrativos fiscais instaurados contra o Paciente em razão de práticas de descaminho. Elevado grau de reprovabilidade da conduta imputada evidenciado pela reiteração delitiva, o que afasta a aplicação do princípio da insignificância no caso. 4. O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema penal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considerados ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida. 5. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido à sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal. 6. Ordem denegada.
(STF, 2ª Turma, HC n. 112597, Rel. Min. Carmen Lúcia, j. 18.09.12)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE DESCAMINHO. DÉBITO TRIBUTÁRIO NO VALOR DE R$ 10.665,39. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. HABITUALIDADE NA PRÁTICA DA CONDUTA CRIMINOSA. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A despeito do débito tributário referente às mercadorias estrangeiras sem documentação fiscal ser de R$ 10.665,39 (dez mil seiscentos e sessenta e cinco reais e trinta e nove centavos), subsiste o interesse estatal à repressão do delito de descaminho praticado habitualmente pela Acusada. 2. A Suprema Corte firmou sua orientação no sentido de que "[o] princípio da insignificância não foi estruturado para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de condutas ínfimas, isoladas, sejam sancionados pelo direito penal, fazendo-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mesmo que insignificantes, quando constantes, devido a sua reprovabilidade, perdem a característica de bagatela e devem se submeter ao direito penal" (STF, HC 102.088/RS, 1.ª Turma, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, DJe de 21/05/2010). 3. De fato, constatada a conduta habitual do Agente, a lei seria inócua se fosse tolerada a prática criminosa ou, até mesmo, o cometimento do mesmo delito, seguidas vezes, em frações que, isoladamente, não superassem certo valor tido por insignificante, mas o excedesse na soma. A desconsideração dessas circunstâncias implicaria verdadeiro incentivo ao descumprimento da norma legal, mormente para aqueles que fazem da criminalidade um meio de vida. Precedentes da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e desta Turma. 4. A despeito de não configurar reincidência, a existência de outras ações penais em curso é suficiente para caracterizar a habitualidade delitiva e, consequentemente, afastar a incidência do princípio da insignificância. No caso, há comprovação da existência de outras ações penais em seu desfavor, inclusive da mesma atividade criminosa. 5. Agravo regimental desprovido.
(STJ, 5ª Turma, AGARESP n. 329693, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 13.08.13)
EMEN: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. TIPICIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. REITERAÇÃO DELITIVA. INAPLICABILIDADE. APRECIAÇÃO UNIPESSOAL. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A decisão está em harmonia com a jurisprudência pacífica desta Quinta Turma e da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a reincidência e a habitualidade criminosa específicas implicam maior reprovabilidade da conduta porque denotam profissionalismo delitivo, praticado em doses módicas, visando, assim, fintar a lei, livrando-se do seu alcance por meio da aplicação do princípio da insignificância. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. ..EMEN:(STJ, AGRESP n. 201200367950, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 17.04.12)
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 334, §1º, "c", DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. HABITUALIDADE DELITIVA. REPROVABILIDADE DA CONDUTA. (...) 7. Revejo meu posicionamento até então adotado sobre o tema, forte na jurisprudência da Suprema Corte, que também se modificou, sedimentando a visão de que, permanecendo o réu na prática delitiva do descaminho com habitualidade, deixa de ser aplicável o princípio da insignificância, independentemente do valor surrupiado aos cofres públicos. 8. É de todo recomendável considerar as diversas circunstâncias que cercam o delito, tais como a conduta social do agente, a reincidência e a habitualidade da conduta para sopesar a viabilidade da aplicação de citado princípio. 9. No caso dos autos, verifica-se a existência de outros inquéritos policiais e ação penal em andamento em razão do mesmo delito, razão pela qual não deve incidir o princípio da insignificância, restando mantida a sentença condenatória (...).
(TRF 3ª Região, ACR n. 00114957320054036102, Rel Des. Fed. José Lunardelli, j. 27.08.13)

Do caso dos autos. Assiste razão à acusação quanto à inaplicabilidade do princípio da insignificância, uma vez que há provas de reiteração delitiva.

Em seu depoimento perante o MM. Juízo a quo (mídias às fl. 227 e 239), o réu assumiu que realizou ao menos 3 (três) viagens ao Paraguai para adquirir mercadorias e internaliza-las sem o pagamento dos tributos devidos.

Desse modo, inaplicável o princípio da insignificância ao criminoso habitual, consoante a firme jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.

Materialidade. A materialidade delitiva está plenamente comprovada, conforme decorre dos seguintes elementos de convicção:

a) auto de apreensão e cédula de identidade do réu (fls. 8/9);
b) termo de retenção de mercadorias e de lacração de volumes (fls. 10/11)
c) auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal (fls. 22/30) e autos de apreensão (fls. 59 e 115);
d) laudo de exame de produto farmacêutico, o qual atesta que os remédios apreendidos compreendem substâncias anabolizantes e sujeitas a controle especial, bem como produtos sem registro na ANVISA, de importação e comercialização proibidas, e produtos que contam com o referido registro, mas são falsos ou adulterados (fls. 69/80);
e) laudo complementar de exame de produto farmacêutico, atestando tratar-se de medicamento sem registro na ANVISA (fls. 106/113);
f) laudo de exame de munição, concluindo tratar-se de luneta para tiro e de munição para arma calibre .22 (vinte e dois centésimos de polegada), de uso permitido, e de cápsulas de espoletamento, de uso restrito, todos de origem estrangeira e aptos a serem detonados (fls. 116/119 e 125/126).

Insta apontar que, com autorização judicial, os medicamentos e a luneta para tiro foram destruídas (fls. 251/252) e a munição foi encaminhada ao Exército Brasileiro para destinação legal (fl. 264).

Autoria. Restou comprovada a autoria delitiva quanto aos crimes do art. 334 do Código Penal e do art. 18 da Lei n 10.826/03.

O réu foi surpreendido pela fiscalização e logrou evadir-se do local de modo a evitar sua prisão em flagrante. Contudo, seu documento de identidade havia sido recolhido, possibilitando a sua identificação bem como a das bagagens que lhe pertenciam e estavam no interior do ônibus (fls. 2/12).

Os depoimentos de Luiz Carlos da Silva, Auditor Fiscal da Receita Federal, e de Valdo Miguel da Silva, Policial Rodoviário Federal, são coerentes e harmônicos com relação às circunstâncias do crime. Na data dos fatos, foi realizada uma grande operação de fiscalização na estrada. Quando abordado o ônibus e constatada a presença de mercadorias, foi recolhido o documento de identificação dos ocupantes do veículo e foram todos encaminhados a um galpão da Receita Federal. Ao chegar ao local, o réu evadiu-se. As bagagens que lhe pertenciam foram lacradas e posteriormente abertas pela Receita Federal do Brasil para averiguação de seu conteúdo (fls. 2/7), tendo sido, então, encontradas as mercadorias, as munições e os medicamentos.

Ante a Autoridade Policial, o apelante assumiu apenas a propriedade de "dois DVD's LG portátil, uma câmera digital, um vídeo-game PlaySatation, e algumas bonecas" (sic, fls. 42/43).

Em depoimento perante o MM. Juízo a quo (mídias às fls. 227 e 239), admitiu que viajou ao Paraguai para adquirir mercadorias e, no retorno a Goiânia (GO), o ônibus em que estava foi abordado pela fiscalização. Alegou inicialmente ter declarado na fronteira as mercadorias que trazia, dentro do valor permitido de US$ 300,00 (trezentos dólares). Posteriormente, confessou que trazia bens acima da "cota". Assumiu a propriedade de diversas mercadorias, como câmera digital, brinquedos, roupas, perfumes, equipamento de som para carro, DVD portátil e pendrives. Confirmou também que as munições e a luneta lhe pertenciam, sendo que tem por atividades corriqueiras a pesca e a prática de tiro. Afirmou haver se evadido porque não trazia consigo os documentos para porte de munição e temia ser preso.

Restou, portanto, confessada a autoria delitiva quanto aos crimes do art. 334 do Código Penal e do art. 18 da Lei n. 10.826/03.

Não obstante, ao contrário do que pretende a acusação, não foi demonstrada a autoria delitiva quanto ao crime referente aos medicamentos.

É relativa a presunção de legitimidade de que gozam o termo de retenção de mercadoria e de lacração de volumes (fls. 10/11) e o auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal (fls. 22/30) e as testemunhas da acusação não afirmaram que as mercadorias estavam todas identificadas em nome do réu. A acusação não trouxe aos autos informações sobre as bagagens apreendidas com os outros ocupantes do ônibus, se estariam de fato todas nomeadas, e não arrolou como testemunhas o motorista ou outros passageiros, apesar de ser seu o ônus da prova da autoria delitiva.

É certo que o réu justificou satisfatoriamente a aquisição e o transporte das munições, ainda que irregular, bem como das mercadorias, e é sabido que em diversas ocasiões a fiscalização não logra identificar o real proprietário de bagagens transportadas em ônibus como aquele em que foi encontrado o réu, os quais são locados por determinadas pessoas com o intuito de realizar viagens às regiões de fronteira e, portanto, não pertencem a empresa de linha que obriga os passageiros a identificar toda e qualquer bagagem a bordo.

Observe-se que o réu é ex-policial e comprovou atuar na área de alimentos, proprietário de restaurante, e tem bons antecedentes, inexistindo qualquer indício de que comercialize medicamentos ou anabolizantes.

Colhe-se da prova produzida nos autos que Alexandre Vieira da Silva introduziu no País as mercadorias e as munições, sendo insuficientes as provas, contudo, quanto à autoria do crime referente aos medicamentos que foram apreendidos. Nesse sentido, a manifestação da Procuradoria Regional da República:


Contudo, em que pese restar comprovada a materialidade delitiva, no presente caso, verifica-se que as provas acerca da autoria delitiva são demasiadamente frágeis para ensejar a condenação pelo delito tipificado no artigo 273, § 1º, e § 1º-B, incisos I e IV, do Código Penal.
Em seu interrogatório, prestado perante a autoridade policial, ALEXANDRE VIEIRA SILVA (fls. 42/43), negou ser o proprietário de todas as mercadorias (...), reconhecendo como suas apenas "dois DVD's LG portátil, uma câmera digital, um vídeo-game PlaySatation, e algumas bonecas que comprou para sua filha", as quais, segundo o apelante, não excediam a cota permitida pela Receita Federal. (...)
Por sua vez, em seu interrogatório judicial (fls. 221/mídia audiovisual às fls. 228), o acusado reiterou as alegações prestadas durante a fase inquisitiva, confirmando a propriedade das mercadorias descaminhadas. Assumiu, ainda, a propriedade das munições e acessórios para armas de fogo, negando, todavia ter importado do Paraguai os medicamentos apreendidos, os quais, segundo o réu, não lhe pertenciam.
A testemunha Luiz Carlos da Silva (fls. 236/mídia digital às fls. 239), auditor da Receita Federal, presente durante a fiscalização de rotina que culminou na apreensão dos medicamentos proibidos, apesar de não recordar-se do caso específico dos autos, aduziu que, normalmente, a maioria das bagagens transportadas em ônibus de viagem estão desprovidas de identificação, sendo usual os passageiros, antes da separação e lacração das mercadorias, identificarem suas próprias bagagens, se responsabilizado por seu conteúdo.
Deduz-se dos autos que as bagagens não reconhecidas durante a diligência policial tiveram sua propriedade atribuída ao réu, único passageiro que, na ocasião, evadiu o local em fuga. Assim, não restou demonstrada a presença de elementos sólidos que indicassem que os medicamentos proibidos, encontrados durante a vistoria, e posteriormente retidos e lacrados, realmente foram introduzidos no país pelo acusado ALEXANDRE VIEIRA SILVA.
Ademais, deve-se levar em consideração o princípio in dubio pro reo, que é decorrência lógica dos princípios da reserva legal e da presunção de não culpabilidade, que exige do Juízo plena certeza para a prolação do juízo condenatório, de modo que qualquer dúvida acerca da autoria delitiva implicaria na absolvição do réu.
Conclui-se assim que não consta nos autos elementos robustos hábeis a ensejar o decreto condenatório, de modo que a manutenção da absolvição do réu pelo delito em comento deve ser mantida.

(fls. 352v./353)


De rigor, portanto, o provimento parcial do recurso ministerial, para que seja o réu condenado pela prática dos crimes do art. 334 do Código Penal, mantendo-se a condenação pelo delito do art. 18 da Lei n. 10.826/03 e a absolvição pelo crime do art. 273 do Código Penal.

Dosimetria da pena. Art. 18 da Lei n. 10.826/03. Observando os critérios do art. 59 do Código Penal, o MM. Juízo a quo fixou a pena-base de Alexandre Vieira da Silva no mínimo legal, em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Deixou de reduzir a pena em razão da confissão, em observância à Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, pois inadmissível a redução abaixo do mínimo legal. Ausentes outras circunstâncias agravantes ou atenuantes e causas de aumento ou diminuição da pena, tornou-a definitiva.

Fixou o regime inicial aberto para cumprimento da pena e substituiu a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor 1 (um) salário mínimo por mês, ambas pelo período da pena privativa.

A defesa não recorreu quanto à dosimetria da pena.

Requer a acusação a incidência da causa de aumento prevista no art. 19 da Lei n. 10.826/03, pois parte da munição apreendida é de uso restrito.

Assiste-lhe razão, pois restou comprovado que parte da munição objeto do crime (cápsulas de espoletamento) são de uso restrito (fls. 116/119 e 125/126).

Assim, deve a pena fixada ser aumentada na metade, nos termos do art. 19 da Lei n. 10.826/03, para ser fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, nos termos da manifestação da Procuradoria Regional da República (fls. 350/354).

Dosimetria da pena. Art. 334 do Código Penal. Considerando os critérios do art. 59 do Código Penal, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, em 1 (um) ano de reclusão, pena que condiz com a quantidade e a natureza das mercadorias descaminhadas, bem como com os meios utilizados para o crime e a personalidade e conduta do réu.

Incide a atenuante da confissão, mas a pena não pode ser reduzida abaixo do mínimo legal, em observância à Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

À míngua de outras circunstâncias atenuantes ou agravantes e causas de aumento ou diminuição da pena, torno-a definitiva em 1 (um) ano de reclusão.

Do concurso formal. Nos termos do art. 70 do Código Penal (ACR n. 2008.60.02.001116-5, 2ª Turma, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 13.07.10), aplico a pena mais grave, de 6 (seis) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa do crime do art. 18 da Lei n. 10.826/03, e aumento-a em 1/6 (um sexto), totalizando 7 (sete) anos de reclusão e 17 (dezessete) dias-multa, no valor mínimo legal.

Nos termos do art. 33, § 2º, a, do Código Penal, fixo o regime inicial semiaberto para cumprimento da pena.

Não estão preenchidos os requisitos do art. 44, I, do Código Penal, motivo pelo qual deixo de substituir a pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de Alexandre Vieira da Silva e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da acusação para aplicar a causa de aumento do art. 19 da Lei n. 10.826/03, bem como para afastar a aplicação do princípio da insignificância e condenar o réu pela prática do crime do art. 334 do Código Penal, reconhecendo o concurso formal entre os delitos, para fixar a pena definitivamente em 7 (sete) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 17 (dezessete) dias-multa, no valor mínimo legal.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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