D.E. Publicado em 06/08/2015 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso interposto por Paulo Viviani, para absolvê-lo do crime previsto no artigo 342, caput, do Código Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO
Consta dos autos que o réu, no dia 05 de março de 2007, prestou falso testemunho perante a Vara do Trabalho de Votuporanga/SP, em Reclamação Trabalhista ajuizada com o fim de obter prova destinada ao reconhecimento de vínculo trabalhista em processo em que figurou como reclamante Marcílio Lopes.
Segundo restou apurado, o apelante foi arrolado como testemunha pelo reclamante que intentava reconhecimento de vínculo trabalhista como guarda noturno do "Restaurante e Lanchonete Pão com Linguiça" e na audiência fez as seguintes afirmações falsas : "que passou a trabalhar numa empresa, ao lado do Posto Trevão e perto da lanchonete da reclamada no dia 04/02/07, e que após esta data encontrou-se com o reclamante no referido posto, data em que ocorreu dois disparos de alarme na empresa do reclamado, sendo que no segundo disparo o reclamado foi ao posto procurar o reclamante, momento em que ouviu o reclamado perguntar do guarda".
Apurou-se que tais afirmações eram falsas, pois o próprio reclamante Marcílio afirmou na Reclamação Trabalhista que trabalhou na função de guarda noturno no período de 13/4/2006 a 08/01/2007, o que não coaduna com o período declarado pelo acusado, pois o mesmo começou a trabalhar próximo ao local somente em 04/02/07.
Por tais razões, foi o apelante denunciado e, posteriormente, condenado nestes autos como incurso nas penas do artigo 342, caput, do Código Penal.
Pois bem, analisados os fatos, concluo que o caso é de absolvição do acusado.
A norma prevista no art. 342 do Código Penal tutela a administração da justiça e, acima de tudo, a sua credibilidade, não só em relação às partes, como também à sociedade, de modo que a sua violação põe em abalo a própria essência do Poder Judiciário, fadado a descrédito ao se valer, equivocadamente, de depoimento falso na prestação da tutela jurisdicional, conduzindo a erro judiciário.
Assim, para que se configure o crime de falso testemunho é imprescindível que o fato afirmado falsamente tenha o condão de produzir efeito à administração da justiça, isto é, que possa influir na decisão a ser prolatada pelo juiz do feito, induzindo-o a erro.
Nesse sentido, sobre a relevância jurídica do fato para o crime de falso testemunho, preleciona Guilherme de Souza Nucci que "é essencial que o fato falso (afirmado, negado ou silenciado) seja juridicamente relevante, isto é, de alguma forma seja levado em consideração pelo delegado ou juiz para qualquer finalidade útil ao inquérito ou ao processo, pois, ao contrário, tratar-se-ia de autêntica hipótese de crime impossível. ("Código Penal Comentado, 4ª edição, RT., fls. 940). (grifo nosso).
No caso dos autos, porém, verifico que as declarações do réu perante a Justiça trabalhista não tiveram qualquer relevância ao deslinde da ação penal trabalhista. pois não serviram de fundamento e, sequer, de consideração, à r. sentença proferida na reclamatória julgada improcedente, nos seguintes termos:
"(...)Assim, verifica-se que a reclamada se desfez de seu encargo probatório, valendo também observar que ninguém viu o autor receber ordens, ou sofrer fiscalização de horários por parte do réu.
Não há como reconhecer a existência de liame de emprego entre as partes, ficando indeferido o pedido de reconhecimento de liame de emprego e, via de consequência, todos os seus consectários.
Nada a deferir ao reclamante(...)". (fls.21/27)
O juiz do trabalho analisou quatro depoimentos de testemunhas colhidos naquela audiência trabalhista e em nenhum deles pode concluir pelo liame de emprego. Quanto ao depoimento do acusado consignou que de "nada valeu", uma vez que o próprio autor disse que deixou de trabalhar em 08/01/2007, de modo que em nada influiu ou teve potencialidade lesiva o depoimento do ora acusado que fez referência à data posterior de 4/2/2007, como requer o tipo penal em exame.
De todo modo, as declarações do réu na justiça trabalhista tampouco serviriam a demonstrar vínculo entre as partes, porquanto ouvir um disparo de alarme e ser o reclamante procurado em outro local pelo reclamado é episódio isolado que jamais serviria de elemento suficiente para liame trabalhista.
Mais não fosse, as provas destes autos são extremamente insuficientes e o pouco que foi colhido é de muita fragilidade.
Veja-se:
Instaurado o inquérito policial, o único elemento coligido foi o termo de declarações do acusado Paulo Viviani, no qual ele disse que "não fez afirmações falsas no seu depoimento na Justiça do Trabalho e também não afirmou que o encontro com Marcílio, no pátio do Auto Posto Trovão ocorreu em 04/02/2007, ou em data posterior, conforme registrado à fl.22, uma vez que, já àquela época, o declarante não se recordava da data de tal encontro; que no entendimento do declarante o Juízo do Trabalho confundiu a data do encontro do declarante Marcílio, com a data na qual o declarante iniciou seu trabalho como vigia no auto Posto Trevão; Que, em resumo, o declarante insiste em afirmar que não mentiu no ao juízo do Trabalho (...)". (fl.43)
Nenhuma outra prova foi colhida nessa fase investigatória, nem mesmo depoimentos testemunhais que o infirmassem.
O mesmo se deu em Juízo, tendo sido ouvido apenas o réu (fl.143/146) que disse "eu errei a data, mas essa palavra minha não é falsa".
Igualmente nessa fase judicial nenhuma testemunha de acusação não foi ouvida.
Enfim, somente restaram as declarações do réu que são confusas, não tendo sido produzida prova acusatória sob o crivo do contraditório, de modo que entendo não haver suporte suficiente para a manutenção da sentença condenatória.
A parca qualidade das provas, ausência de contraditório, aliadas ao fato de que o depoimento prestado pelo réu na justiça trabalhista foi inócuo em relação ao atingimento do bem jurídico protegido pela norma prevista no art. 342 do Código Penal, impõe-se a absolvição do acusado.
A respeito, trago à colação o seguinte julgado:
"Penal e Processual Penal. Apelação do Ministério Público Federal, atacando sentença que, calcada no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal, absolveu o acusado da prática do delito de falso testemunho (artigo 342, do Código Penal). Fato supostamente falso não revestido de relevância jurídica. Ausência de elementos probatórios suficientes para lastrear um decreto condenatório. Manutenção da sentença, em todos os seus termos.
I - O depoimento prestado pelo apelado, na condição de testemunha arrolada pelo reclamante em processo trabalhista, conquanto possa dar indícios de uma suposta falsidade, não constitui fato juridicamente relevante, uma vez que não houve o dolo específico de prejudicar a administração da justiça.
II - A esse respeito, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região já asseverou que a ação incriminada, prevista no art. 342 do Código Penal, objetiva tutelar a regular administração da Justiça, tendo-se em vista a veracidade das provas e a correta aplicação da lei. É essencial que o fato falso seja juridicamente relevante, isto é, de alguma forma seja levado em consideração pelo delegado ou juiz para qualquer finalidade útil ao inquérito ou ao processo, pois, ao contrário, tratar-se-ia de autêntica hipótese de crime impossível.(ACR 34311, Des. Luiz Stefanini, publicado em 16 de fevereiro de 2012).
III - Por outro lado, o Parquet não se desincumbiu de seu ônus probatório, pois não só deixou de arrolar como testemunhas as partes envolvidas no litígio trabalhista, como também não juntou aos autos nenhum outro documento - afora as cópias da ata de audiência e a respectiva sentença da justiça do trabalho - que desse suporte aos fatos alegados na denúncia.
IV- Apelação improvida. Veredicto absolutório mantido, em todos os seus termos".
(ACR 00011651620104058000 ACR - Apelação Criminal - 10466 Relator(a) Desembargador Federal Vladimir Carvalho Sigla do órgão TRF5 Órgão julgador Segunda Turma Fonte DJE - Data::10/10/2013 - Página::271).
Assim sendo, dou provimento ao recurso da defesa, para absolver Paulo Viviani da imputação prevista no art. 342, do Código Penal, com fulcro no art. 386, inc.VII, do Código de Processo Penal.
É como voto.
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Data e Hora: | 21/05/2015 15:58:10 |