Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/09/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002799-48.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.002799-4/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : VOLGRAN CARLOS DANTAS BEZERRA
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : BRUNA GONCALVES ARAUJO DE MELO
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
No. ORIG. : 00027994820144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PROCESSO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. DENÚNCIA. INÉPCIA. INOCORRÊNCIA. NULIDADE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. DOSIMETRIA.
1. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal.
2. A denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal preenche os requisitos formais do art. 41 do Código de Processo Penal. O fato criminoso está exposto com clareza, possibilitando o adequado exercício de defesa pelo acusado.
3. A decisão de fl. 186 recebeu a denúncia, considerando que essa preenchia os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, com a exposição do fato criminoso e a qualificação do réu. Foi observado que a peça acusatória decorria de prisão em flagrante e que havia laudo de exame toxicológico, com resultado positivo para cocaína. Ponderou-se que haveria necessidade de dilação probatória para se verificar a consumação do delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06. Concluiu a decisão que havia prova da materialidade e indícios de autoria e não estavam presentes as hipóteses do art. 395 e do art. 397, ambos do Código de Processo Penal. Foram analisadas todas as preliminares suscitadas pela defesa. Assim, está suficientemente fundamentada a decisão que recebeu a denúncia. Não se entrevê a alegada nulidade.
4. Materialidade e autoria demonstradas em relação ao acusado Volgran. Quanto a corré Bruna não há prova suficiente de que tivesse ciência da existência da droga, não havendo elementos de convicção suficiente para embasar sua condenação, razão pela qual é mantida a sentença absolutória da acusada. Por conseguinte, é mantida a absolvição dos réus quanto ao delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06.
5. É justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal, nos moldes procedidos na sentença, pena que se ajusta à natureza e à quantidade da droga apreendida. As parte não se insurgiram contra a pena-base aplicada na sentença, a qual se mantém.
6. Deve ser aplicada a atenuante genérica do art. 65, III, d, do Código Penal.
São irrelevantes os motivos pelos quais o agente teria sido levado a confessar o delito perante a autoridade para fazer jus à incidência da atenuante genérica (STJ, HC n. 159.854, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15.06.10; HC n. 117.764, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.05.10; HC n. 46.858, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.11.07; HC n. 79.381, Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.10.07). Assim, pouco importa que o réu tenha sido preso em flagrante, bastando o reconhecimento da prática do delito (STF, HC n. 69.479-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, unânime, DJ 18.12.02, p. 384).
7. Mantida a redução da pena em razão da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal admitem que a natureza e a quantidade de entorpecente sirvam para graduar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 (STF, HC n. 106.762, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 21.06.11; HC n. 104.195, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.04.11), reconhecendo ademais plena liberdade ou discricionariedade judicial (STF, HC n. 94.440, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 03.05.11; RHC n. 106.719, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 01.03.11). Não obstante, há precedentes também no sentido de que considerar essas circunstâncias do delito seria proibido bis in idem (STF, HC n. 108.264, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21.06.11; HC n. 106.313, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15.03.11). Assim, embora repute admissível apreciar tais circunstâncias com certa dose de discricionariedade (trata-se de disposição específica), convém que além delas sejam consideradas outras peculiaridades do caso concreto, à vista das provas dos autos, para resolver sobre a aplicabilidade e a gradação dessa causa de diminuição.
8. O acusado é primário e não tem antecedentes. Desse modo, os elementos fáticos da prática delitiva, em que o agente assume eventualmente a responsabilidade pelo transporte de substância entorpecente em viagens internacionais, com as despesas custeadas por terceiros, não evidenciam que réu integra organização criminosa voltada à prática de tráfico internacional de drogas ou que se dedica a atividades criminosas. De fato, as circunstâncias do delito recomendam a incidência da causa de diminuição de pena estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Não há nos autos elementos que autorizam a aplicação do benefício em fração acima do mínimo legal; aplico a redução da pena em 1/6 (um sexto).
9. Para a configuração da transnacionalidade do delito, não é necessário que o agente ou o entorpecente ultrapasse as fronteiras do País. O delito, com essa causa de aumento, pode ocorrer no território nacional, desde que haja elementos indicativos de que o fato se relacione com o estrangeiro.
Na espécie, a transnacionalidade do delito restou comprovada, sendo a droga proveniente do Paraguai, razão pela qual é mantido o aumento da pena em 1/6 (um sexto).
10. No caso de tráfico ilícito de entorpecentes, as circunstâncias, as consequências e a sua gravidade aconselham o início do cumprimento da pena em regime fechado, nos termos do art. 33, § 2º, c. c. o art. 59, caput, III, ambos do Código Penal, cabendo ao Juízo das Execuções Penais apreciar a progressão do regime de pena.
11. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da vedação à conversão das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos contida no § 4º do art. 33 e no art. 44 da Lei n. 11.343/06 (STF, Pleno, HC n. 97256, Rel. Min. Ayres Britto, j. 01.09.10), de modo que, nos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes cumpre resolver sobre a substituição à luz do disposto no art. 44 do Código Penal.
12. Afastada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, as quais não se mostram suficientes no caso dos autos e à míngua do preenchimento dos requisitos legais (art. 44, III, do Código Penal).
13. Apelação da defesa desprovida. Apelação da acusação parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa e dar parcial provimento à apelação da acusação para aplicar a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 na fração de 1/6 (um sexto) e elevar a pena do acusado Volgran Carlos Dantas Bezerra para 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, por conseguinte, aplicar o regime inicial de cumprimento de pena fechado e afastar a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de agosto de 2015.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002799-48.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.002799-4/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : VOLGRAN CARLOS DANTAS BEZERRA
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : BRUNA GONCALVES ARAUJO DE MELO
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
No. ORIG. : 00027994820144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e por Volgran Carlos Dantas Bezerra contra a sentença de fls. 474/481v., que absolveu a ré Bruna Gonçalves de Araújo de Melo, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, da prática do delito do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, da Lei n. 11.343/06 e condenou Volgran Carlos Dantas Bezerra a 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, regime inicial aberto, e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime do art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, da Lei n. 11.343/06.

Apela o Ministério Público Federal alegando, em síntese, o seguinte:

a) a sentença merece reforma quanto à absolvição pela prática do crime do art.35 da Lei n. 11.343/06, uma vez que o réu e a corré Bruna tinham desígnios comuns para a prática do crime de tráfico de drogas, o que está demonstrado nos autos;
b) não é aplicável a atenuante da confissão espontânea e a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06;
c) a confissão do réu, em sede policial, foi retratada em sede judicial, de modo que não serviu para embasar a condenação;
d) em razão da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, a pena foi reduzida em 1/3 (um terço), considerando equivocadamente como média a quantidade de droga apreendida;
e) a jurisprudência tem reconhecida como grande a quantidade inferior àquela apreendida nos autos, de maneira que não se justifica a aplicação da causa de diminuição acima da fração mínimo, de 1/6 (um sexto) (fls. 487/496).

Volgran Carlos Dantas Bezerra apela, em síntese, com os seguintes argumentos:

a) inépcia da denúncia, uma vez que não estão descritas pormenorizadamente as condutas;
b) o recebimento da denúncia não está fundamentado;
c) não foram analisadas todas as alegações da defesa, de maneira que há nulidade da decisão, por descumprimento do que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da República;
d) não há provas para sustentar a condenação do acusado;
e) não está comprovada a autoria do acusado, havendo dúvida quanto a participação do réu, a sua absolvição se impõe, em atenção ao princípio da presunção de inocência e do in dubio pro reo;
f) não há indícios do trafico interestadual ou internacional, de maneira que não se aplica a majorante do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, não há prova de que o réu tenha saído do Brasil;
g) incide a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, em sua fração máxima, de 2/3 (dois terços), e, por conseguinte, a pena privativa de liberdade deve ser substituída por penas restritivas de direitos;

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 517/534 e 565/568).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Eugênia Augusta Gonzaga, manifestou-se pelo parcial provimento da apelação da acusação apenas para aplicar a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 em fração menor e pelo desprovimento do apelo da defesa (fls. 570/576).

Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002799-48.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.002799-4/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : VOLGRAN CARLOS DANTAS BEZERRA
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
APELADO(A) : OS MESMOS
APELADO(A) : BRUNA GONCALVES ARAUJO DE MELO
ADVOGADO : PB003562 JOSE ALVES CARDOSO e outro
No. ORIG. : 00027994820144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO

Imputação. Volgran Carlos Dantas Bezerra e Bruna Gonçalves de Araújo de Melo foram denunciados pela prática dos crimes do art. 33 e 35, c. c. o art. 40, I, da Lei n. 11.343/06 porque em 18.01.14 foram presos em flagrante, no município de Sidrolândia (MS), por terem se associado para transportar aproximadamente 3 Kg (três quilogramas) de cocaína.

Em fiscalização de rotina, policiais rodoviários federais abordaram o veículo conduzido por Volgran Carlos Dantas Bezerra, que estava na companhia da corré Bruna Gonçalves de Araújo de Melo e em razão do nervosismo demonstrado por ambos foi feita uma vistoria do automóvel em que foram encontrados 4 (quatro) tabletes de substância análoga à cocaína, que estava no interior do para-choque traseiro do veículo.

Em sede policial o corréu Volgran Carlos Dantas Bezerra afirmou que havia adquirido a droga no Paraguai, pelo valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais).

Laudo preliminar de constatação confirmou que se tratava de cocaína, peso bruto de aproximadamente 3 Kg (três quilogramas).

Do processo. Em relação a acusada Bruna Gonçalves Araujo de Melo processo havia sido desmembrado nos Autos n. 0005886-12.2014.403.6000, o qual foi posteriormente remembrado (fl. 288).

Denúncia. Inépcia. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal:


AÇÃO PENAL. Denúncia. Aptidão formal. Reconhecimento. Apropriação indébita previdenciária. Descrição dos fatos que atende ao disposto no art. 41 do CPP.
(...).
Não é inepta a denúncia que descreve os fatos delituosos e lhes aponta os autores.
(STF, HC n. 90.749, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 07.08.07)
HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. PEDIDO INDEFERIDO.
A denúncia descreve os fatos imputados à paciente e aponta o fato típico criminal, atendendo ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal. Conduta suficientemente delineada e apta a proporcionar o exercício da defesa.
Habeas corpus indeferido.
(STF, HC n. 89.433, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 26.09.06)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES FALIMENTARES. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DENÚNCIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO ESTATUTO PROCESSUAL. CRIME SOCIETÁRIO. DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MINUCIOSA DA CONDUTA DE CADA DENUNCIADO. ORDEM DENEGADA.
(...).
2. Não há falar em inépcia da denúncia se a peça acusatória satisfaz todos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, sendo mister a elucidação dos fatos em tese delituosos descritos na peça inaugural à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.
(...)
4. Ordem denegada.
(STJ, 5a Turma - HC n. 55.770, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17.11.05)

Do caso dos autos. Verifica-se que a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (fls. 88/91) preenche os requisitos formais do art. 41 do Código de Processo Penal. O fato criminoso está exposto com clareza, possibilitando o adequado exercício de defesa pelo acusado.

Nulidade. Recebimento da denúncia. Inocorrência. A defesa afirma que há nulidade do processo, sob a alegação de que a decisão que recebeu a denúncia carece de fundamentação.

Entretanto, razão não lhe assiste.

A decisão de fl. 186 recebeu a denúncia, considerando que essa preenchia os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, com a exposição do fato criminoso e a qualificação do réu. Foi observado que a peça acusatória decorria de prisão em flagrante e que havia laudo de exame toxicológico, com resultado positivo para cocaína. Ponderou-se que haveria necessidade de dilação probatória para se verificar a consumação do delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06. Concluiu a decisão que havia prova da materialidade e indícios de autoria e não estavam presentes as hipóteses do art. 395 e do art. 397, ambos do Código de Processo Penal.

Foram analisadas todas as preliminares suscitadas pela defesa.

Assim, está suficientemente fundamentada a decisão que recebeu a denúncia. Não se entrevê a alegada nulidade.

Materialidade. A materialidade do delito de tráfico de drogas está demonstrada pelos seguintes elementos de convicção:

a) auto de prisão em flagrante (fls. 2/35).
b) auto de exibição e apreensão (fls. 36/40);
c) laudo de exame toxicológico, que concluiu que se tratava de cocaína (fls. 70/73).

Autoria. Há prova da autoria delitiva com relação ao acusado Volgran Carlos Dantas Bezerra.

As testemunhas Emerson Silva de Souza e André Gimenes Borges, Policiais Rodoviários Federais relataram que foi feita a abordagem do veículo em que estavam os acusados, que demonstraram nervosismo. Disseram que as placas do automóvel era do estado da Paraíba e os acusados estavam indo de Ponta Porã (MS) para João Pessoa. Foi feita vistoria do automóvel e encontrado um fundo falso no para-choque traseiro do carro onde estava escondida a droga. O corréu informou que havia comprado a substância por R$ 9.000,00 (nove mil reais). Ambos os acusados disseram que Bruna não tinha conhecimento da existência da droga. Justificaram a viagem, dizendo que teriam ido passear na cidade de Bonito e depois passaram por Ponta Porã (mídia eletrônica à fl. 292).

Veronica Cristina Dantas de Souza, mãe do acusado Volgran, ouvida como informante do Juízo, nada declarou quanto aos fatos. Disse que o réu era usuário de drogas e que se responsabilizaria por sua internação. Declarou que Bruna era namorada de Volgran e ela trabalhava em Banco (mídia eletrônica à fl. 292).

A testemunha Elcio José da Rocha não prestou declarações quanto aos fatos. Afirmou que conhecia os acusados, mas não sabia o motivo pelo qual foram viajar. Disse nada conhecer que desabonasse a conduta do corréu Volgran (mídia à fl. 292).

Herberth Dantas de Melo, pai da acusada Bruna, ouvido como informante do Juízo, disse que sua filha estudava e trabalhava. Esclareceu que Volgran era namorado de Bruna, a qual nunca teve conhecimento de que se envolvera com drogas (mídia eletrônica à fl. 292).

A testemunha Lauricea Maia da Silva Marques, em Juízo, nada declarou quanto aos fatos. Disse que trabalhara com a acusada Bruna e nada sabia informar que desabonasse sua conduta (mídia eletrônica à fl. 292).

A acusada Bruna Gonçalves Araujo de Melo afirmou em Juízo que tinha ciência da acusação. Acrescentou que viajara de férias com o acusado Volgran, com quem namorava, quando foi até Campo Grande (MS) e depois para Ponta Porã (MS), onde o veículo que estavam apresentou um defeito, razão pela qual o réu levara o automóvel a uma oficina mecânica, onde esse permanecera por um bom tempo. Disse que após, foram até o Paraguai efetuar algumas compras e depois voltariam para João Pessoa (PB), mas, no caminho, foram abordados em Sidrolândia, ocasião em que foi encontrada a droga no para-choque do automóvel do acusado. Declarou que desconhecia a existência da substância. Afirmou que o acusado foi com ela ao Paraguai, onde fizeram compras e voltaram. Asseverou desconhecer que o réu Volgran era usuário de drogas. Esclareceu que passou por diversas cidades, tendo ficado hospedados em alguns desses municípios, dentre os quais: Bonito (MS) e Ponta Porã (MS) (mídia eletrônica à fl. 292).

O réu Volgran Carlos Dantas Bezerra negou em Juízo que fosse usuário de drogas ou dependente químico. Confessou o crime, declarando que aceitara transportar drogas para um amigo, trazida de Ponta Porã (MS), que lhe daria parte do lucro obtido com substância e mais uma quantia. Foi dado a ele R$ 9.000,00 (nove mil reais) e mandaram que deixasse o carro em uma oficina, o qual buscou quando já estava preparado, com a droga, embora não soubesse o tipo de substância e a quantidade. Declarou que já havia sido lhe dada a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais). Esclareceu que disse para a acusada Bruna que iriam viajar de férias. Afirmou que aceitara a proposta, pois queria comprar uma casa e um carro. Negou que Bruna soubesse da existência da droga. Disse que Bruna ficou nervosa quando viu que foi encontrada a droga. Asseverou que a corré acreditava se tratar de viagem de férias. Declarou seu arrependimento. Afirmou que no estado do Mato Grosso do Sul esteve em Rio Verde, depois Ponta Porã, onde deixou o carro na oficina e foi até o Paraguai fazer compras. Esclareceu que estava indo para Campo Grande, quando houve a abordagem policial e foi encontrada a droga (mídia eletrônica à fl. 292).

O acusado confessou a prática delitiva em sede policial e judicial, quanto ao transporte da droga. A autoria delitiva restou comprovada pelas declarações do acusado e pelo depoimento da testemunha de acusação. Ao contrário da defesa, inexiste dúvida quanto à autoria delitiva, ante a confissão do próprio acusado e os demais elementos probatórios existentes nos autos.

Com relação à acusada Bruna, a acusação requer a reforma da sentença, de maneira a ser decretada sua condenação.

Entretanto, ambos os réus negaram que a acusada tivesse ciência da existência da droga. Além da indicação de que essa apresentava nervosismo quando houve a abordagem policial, conforme disseram as testemunhas de acusação, não há qualquer outra prova ou indício da participação da ré na prática delitiva. O fato de a acusada estar viajando com o réu e ter se mostrado nervosa não constituem indícios suficientes para embasar a sua condenação.

Por conseguinte, é mantida a absolvição dos réus quanto ao delito do art. 35 da Lei n. 11.343/06.

Nesse sentido o parecer da Ilustre Procuradora Regional da Republica:

O magistrado sentenciante fundamentou a absolvição da acusada na insuficiência do conjunto probatório.

De fato, apesar de haver indícios de seu conhecimento do transporte da droga, tais como o nervosismo no momento do flagrante ou mesmo o fato de não ter se afastado de VOLGRAN durante a maior parte do tempo da viagem, não há provas claras da sua eventual participação na empreitada.

O fator do nervosismo, apesar de ter sido frisado diversas vezes tanto no depoimento das testemunhas quanto no interrogatório dos réus, não é suficiente para motivar a condenação de BRUNA, considerando-se que, na situação de vistoria de um veículo por policiais rodoviários, somada ao possível cansaço físico das horas de viagem e a tensão provocada pelos agentes nesse tipo de parada, o nervosismo não é reação incomum, mas sim, ordinária.

Ademais, o mero fato de trabalhar em um banco público, demonstrando que a ré possui conhecimento e instrução, não tem o condão de presumir a sua participação no transporte da droga, haja vista que as habilidades e requisitos pessoais para a prática de cada uma dessas atividades em nada se assemelham. Da mesma foram, é fraco o indício de autoria relativo ao desígnio comum dos réus quanto aos recursos oriundos do tráfico.

Note-se que a droga estava escondida no para-choque do veículo, não sendo possível afirmar o conhecimento do fato pela acusada. Do mesmo modo, ainda que a acusada tenha declarado ter ficado a maior parte do tempo com o namorado, disso não se pode presumir que estava com ele no momento da aquisição do entorpecente. Ademais, ambos os acusados negam a ciência de BRUNA em relação a existência da droga.

Assim, tendo em vista que mesmo após a instrução do processo continuam mínimos indícios da participação da ré na empreitada, mister é a manutenção da sentença quanto a absolvição de BRUNA.

Logo, sem amparo a pretensão condenatória da acusação nesse tocante.

Consequentemente, também se mostra sem razão o pleito da acusação relativo a condenação de ambos os réus à pena do art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06. Isto é, não tendo sido satisfatoriamente comprovada a participação da ré na conduta delitiva, não é possível a configuração de uma associação para a prática de tráfico de drogas.

Desse modo, igualmente inviável a condenação de VOLGRAN, dado que o referido tipo exige a participação de duas ou mais pessoas para a sua incidência, requisito não preenchido no caso em tela.

Portanto, deve ser negado provimento ao recurso ministerial nestes pontos (fls. 572v./573).

Dosimetria. Com fundamento no art. 59 do Código Penal e de acordo com o art. 42 da Lei n. 11.343/06, o MM. Juízo a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão.

Presente a atenuante da confissão espontânea, a pena foi reduzida para 5 (cinco) anos de reclusão.

Em razão da transnacionalidade a pena foi exasperada 1/6 (um sexto), resultando 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão.

Aplicada a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, a pena foi reduzida 1/3 (um terço), perfazendo 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 388 (trezentos e oitenta e oito) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

Fixado o regime inicial de cumprimento de pena aberto.

Foi concedido o direito de apelar em liberdade, considerando que foi concedido o regime inicial de cumprimento de pena aberto.

A pena privativa de liberdade foi substituída por penas restritivas de direitos, consistente em prestação de serviços a comunidade ou a entidades públicas e 10 (dez) dias-multa.

O veículo utilizado na prática delitiva foi apreendido e determinado o confisco em favor da União.

A acusação recorre para que seja afastada a atenuante da confissão espontânea, aduzindo que as declarações do acusado não serviram para sua condenação. Requer, ainda, que a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 seja aplicada em sua fração mínima, ou seja, 1/6 (um sexto).

A defesa, por sua vez, pleiteia que não seja aplicada a causa de aumento do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, pois não estaria comprovada a internacionalidade do delito. Pede que a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 seja aplicada na fração máxima de 2/3 (dois terços).

Passo a rever a dosimetria da pena.

A natureza e a quantidade da droga são elementos importantes para aferir a quantidade da pena inicial a ser aplicada ao crime de tráfico, conforme expressa previsão legal no art. 42 da Lei n. 11.343/06.

Assim, é justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal, nos moldes procedidos na sentença, arbitrada em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Tal pena se ajusta à natureza e à quantidade da droga apreendida (3Kg de cocaína).

As parte não se insurgiram contra a pena-base aplicada na sentença, a qual se mantém.

Deve ser aplicada a atenuante genérica do art. 65, III, d, do Código Penal.

São irrelevantes os motivos pelos quais o agente teria sido levado a confessar o delito perante a autoridade para fazer jus à incidência da atenuante genérica (STJ, HC n. 159.854, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15.06.10; HC n. 117.764, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.05.10; HC n. 46.858, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.11.07; HC n. 79.381, Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.10.07). Assim, pouco importa que o réu tenha sido preso em flagrante, bastando o reconhecimento da prática do delito (STF, HC n. 69.479-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, unânime, DJ 18.12.02, p. 384).

Portanto, reduzida a pena em 1/6 (um sexto) e fixada em 5 (cinco) anos de reclusão, mantendo-se a sentença nesse ponto.

Mantida a redução da pena em razão da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06.

Alguns precedentes do Supremo Tribunal Federal admitem que a natureza e a quantidade de entorpecente sirvam para graduar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 (STF, HC n. 106.762, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 21.06.11; HC n. 104.195, Rel. Min. Luiz Fux, j. 26.04.11), reconhecendo ademais plena liberdade ou discricionariedade judicial (STF, HC n. 94.440, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 03.05.11; RHC n. 106.719, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 01.03.11). Não obstante, há precedentes também no sentido de que considerar essas circunstâncias do delito seria proibido bis in idem (STF, HC n. 108.264, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21.06.11; HC n. 106.313, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15.03.11). Assim, embora repute admissível apreciar tais circunstâncias com certa dose de discricionariedade (trata-se de disposição específica), convém que além delas sejam consideradas outras peculiaridades do caso concreto, à vista das provas dos autos, para resolver sobre a aplicabilidade e a gradação dessa causa de diminuição.

O acusado é primário e não tem antecedentes (fls. 54 e 100)

Desse modo, os elementos fáticos da prática delitiva, em que o agente assume eventualmente a responsabilidade pelo transporte de substância entorpecente em viagens internacionais, com as despesas custeadas por terceiros, não evidenciam que réu integra organização criminosa voltada à prática de tráfico internacional de drogas ou que se dedica a atividades criminosas.

De fato, as circunstâncias do delito recomendam a incidência da causa de diminuição de pena estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Não há nos autos elementos que autorizam a aplicação do benefício em fração acima do mínimo legal; aplico a redução da pena em 1/6 (um sexto), perfazendo 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 416 (quatrocentos e dezesseis) dias-multa.

Note-se que a droga foi escondida no para-choque do automóvel guiado pelo acusado, o qual levou o veículo para ser preparado por indivíduos que o auxiliaram para perpetração da prática delitiva, sendo encontrada apenas após minuciosa vistoria policial.

Mantenho o aumento em razão da transnacionalidade do delito (art. 40, III, da Lei n. 11.343/06).

Para a configuração da transnacionalidade do delito, não é necessário que o agente ou o entorpecente ultrapasse as fronteiras do País. O delito, com essa causa de aumento, pode ocorrer no território nacional, desde que haja elementos indicativos de que o fato se relacione com o estrangeiro.

Na espécie, a transnacionalidade do delito restou comprovada, sendo a droga proveniente do Paraguai, razão pela qual é mantido o aumento da pena em 1/6 (um sexto), totalizando a pena de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa.

No caso de tráfico ilícito de entorpecentes, as circunstâncias, as consequências e a sua gravidade aconselham o início do cumprimento da pena em regime fechado, nos termos do art. 33, § 2º, c. c. o art. 59, caput, III, ambos do Código Penal, cabendo ao Juízo das Execuções Penais apreciar a progressão do regime de pena.

Aplicado, por conseguinte, o regime inicial de cumprimento de pena fechado.

O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da vedação à conversão das penas privativas de liberdade em restritivas de direitos contida no § 4º do art. 33 e no art. 44 da Lei n. 11.343/06 (STF, Pleno, HC n. 97256, Rel. Min. Ayres Britto, j. 01.09.10), de modo que, nos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes cumpre resolver sobre a substituição à luz do disposto no art. 44 do Código Penal.

Afastada a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, as quais não se mostram suficientes no caso dos autos e à míngua do preenchimento dos requisitos legais (art. 44, III, do Código Penal).

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da defesa e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação da acusação para aplicar a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 na fração de 1/6 (um sexto) e elevar a pena do acusado Volgran Carlos Dantas Bezerra para 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, por conseguinte, aplicar o regime inicial de cumprimento de pena fechado e afastar a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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