D.E. Publicado em 08/09/2015 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, cuidando o Juízo a quo e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL de fiscalizar o implemento das medidas até agora propostas pelo Parquet; restando mantida as astreintes fixadas em desfavor da empresa no caso de atraso no cumprimento da determinação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO:10042 |
Nº de Série do Certificado: | 172FB228704EFD |
Data e Hora: | 27/08/2015 16:15:08 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de decisão que indeferiu medida liminar pleiteada em sede de ação civil pública.
A ação de origem foi proposta em face da Usina Santa Rita S/A - Açúcar e Álcool, objetivando a antecipação dos efeitos da tutela de mérito, nos termos do art. 12 da Lei 7.347/85, c/c arts. 273 e 461, 3º, ambos do CPC, para que a ré: a) recomponha o meio ambiente degradado, mediante elaboração, apresentação e execução de projeto específico, sob acompanhamento, orientação e aprovação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO)/Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Peixes Continentais (CEPTA) e b) implemente medidas de prevenção mediante acompanhamento, orientação e aprovação da CETESB, sob pena de incidência de multa diária de R$ 50.000,00.
O magistrado a quo indeferiu o pedido, nos seguintes termos (transcrição parcial):
Quanto ao primeiro requerimento, não faz sentido impor obrigação genérica, a liquidar, por liminar. Para antecipar a tutela, e proteger a urgência, a obrigação deve ser certa - único meio justificável de supressão do contraditório. Se a obrigação é incerta, in fieri, não se justifica a supressão do contraditório.
Quanto à última, embora as recomendações proviessem da CETESB - em resposta à correspondência eletrônica, diga-se - não há explicação da pertinência de cada uma das medidas com o risco ambiental. Por maior que seja a capacitação técnica da CETESB, o juízo não pode, liminarmente, sem contraditório, aceder às recomendações informais do órgão, sob pena de interferência indevida no exercício da empresa.
Sustenta a agravante que a verossimilhança das alegações expendidas encontra suporte nas provas documental e técnica instrutórias do inquérito civil.
Afirma que a primeira medida proporcionará, a médio prazo, o restabelecimento do equilíbrio e da dinâmica de existência e reprodução da ictiofauna do rio MOGI-GUAÇU, mais precisamente na localidade afetada pelo derramamento de toneladas de resíduos industriais.
Já a segunda medida postulada trará maior segurança à atividade econômica realizada pela empresa-agravada, eliminando ou reduzindo a possibilidade de um novo episódio de vazamento de poluentes no rio.
Assim, alega a agravante que se encontram presentes todos os requisitos necessários à concessão de tutela antecipada em sede de ação civil pública em que se pretende a reparação por dano ambiental.
Antecipação de tutela recursal deferida às fls. 339/341.
Contraminuta acostada às fls. 351/358.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pelo provimento do agravo (fls. 420/425).
É o relatório.
VOTO
Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de decisão que indeferiu medida liminar pleiteada em sede de ação civil pública.
Não foram apresentadas quaisquer argumentações que modificassem o entendimento deste Relator, exposto quando da prolação da decisão que analisou o pedido de efeito suspensivo do presente recurso.
Por esta razão, transcrevo os fundamentos daquela decisão, adotando-os como razão de decidir o mérito deste agravo.
" Na petição inicial da ação civil pública o Ministério Público Federal aduz que a USINA SANTA RITA S/A, em exploração de sua atividade econômica, provocou grave dano ambiental, consistente especificamente na lesão à fauna ictiológica do rio Mogi-Guaçu, mediante a ruptura de talude instalado em lagoa de decantação utilizada na lavagem da cana de açúcar e dos gases provenientes das caldeiras existentes na empresa, ocorrido no dia 04/10/2013, por volta das 19 horas.
Afirma que no Relatório de Inspeção confeccionado pela CETESB, instrutivo da Informação Técnica nº 153/2014, consta ter havido negligência por parte da ré ao deixar de providenciar manutenção periódica quanto à remoção de sedimentos de um dos tanques utilizados no armazenamento e recirculação de águas residuais, de modo que sobrecarregou o tanque de segurança contra extravasamento, tendo então havido o rompimento do talude e a consequente liberação da água residual e de sedimentos para o rio Mogi-Guaçu.
É certo que a proteção ao meio ambiente detém "status" constitucional, em face do que dispõe o artigo 225 da Constituição Federal, sujeitando os agentes infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções civis, penais e administrativas, as quais podem ser aplicadas de forma cumulativa, em face da independência das instâncias "in verbis":
"Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."
Destarte, essa disposição constitucional recepcionou a proteção anteriormente existente na esfera da legislação ordinária, destacando-se a Lei nº 6.938/1981, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente e suas posteriores alterações, ressaltando-se, ainda, a recente edição do Novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012).
Da Lei nº 6.938/81, infere-se a abrangência do conceito de poluição e agente poluidor, para fins da tutela ambiental:
"Artigo 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
(...)
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;
IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;"
No tocante a poluição da água, destaca-se que as alterações ambientais se configuram, na maioria das vezes, a partir do lançamento de substâncias tanto por descarga quanto por emissão, seja qual for o estado químico do poluente, sendo relevante a verificação do maléfico comprometimento direto ou indireto das propriedades naturais do ambiente atingido.
Destaco, ainda que se aplica na tutela ambiental a responsabilidade objetiva, conforme consignado no artigo 4º, inciso VII, c/c artigo 14, § 1º, ambos da referida Lei nº 6.938/81, conforme se vê da transcrição que faço a seguir:
"Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:
(...)
VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos."
"Art. 14 Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:
§ 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente." (negritei)
Deste comando legal advém, portanto, a obrigatoriedade de o agente causador do dano ambiental reparar ou indenizar pelos prejuízos sucedidos independentemente de culpa, bastando para tanto a comprovação de ação ou omissão do poluidor, a ocorrência do dano e o nexo causal entre ambos, sendo dispensável indagar-se a respeito da licitude da atividade originariamente desenvolvida, aplicando-se ao caso a Teoria do Risco Integral, consistente na responsabilidade objetiva lastreada no risco integral, não se admitindo excludentes de responsabilidade.
Anoto que o "acidente" narrado teve grande repercussão no noticiário local, conforme se vê das informações obtidas nos sites do G1/São Carlos, da Agência de Notícias de Direitos Animais - ANDA, do Instituto da Pesca - SP e Descalvado News e, ainda, das publicações juntadas pelo MPF.
À época dos fatos foi noticiado que milhares de peixes morreram na noite de sexta-feira (04 de outubro de 2013) após o rompimento de uma represa de resíduos da Usina Santa Rita, localizada entre Descalvado e Santa Rita do Passa Quatro (SP).
O evento causou o vazamento de poluentes no Rio Mogi Guaçu e afetou cidades vizinhas, como Rincão (SP).
Na mesma oportunidade o departamento de comunicação da usina explicou que, devido às fortes chuvas nos dias anteriores, uma represa de contenção não suportou a demanda e rompeu. A assessoria afirmou que na represa havia apenas água de chuva e de nascentes e que não tinha nenhum produto químico.
Ocorre que pescadores e rancheiros que se encontravam naquela região relataram que, pouco mais de uma hora após o acidente, uma enorme quantidade de peixes começou a "saltar para fora da água", tentando desesperadamente escapar da mancha preta que tomou conta do rio.
Constou, ainda, das reportagens que entre os peixes mortos analisados foram encontradas muitas fêmeas ovadas, já em período de piracema, o que deve afetar diretamente a demografia dos peixes no futuro do rio, além de algumas espécies raras e ameaçadas de extinção.
Ou seja, não passou de falácia a assertiva da empresa de que apenas água de chuva e de nascentes que não continham nenhum produto químico, foi o que vazou da lagoa rompida.
Com a falácia, o departamento de comunicação da empresa procurou iludir a sociedade, mas foi desmentido pela constatação visual da lesão ambiental, perdendo qualquer credibilidade a jura de inocência da empresa.
Da análise do acervo probatório até agora coligido, inclusive o exame de das imagens tiradas no local, o que se verifica é que houve o rompimento de uma das lagoas de contenção de resíduos da Usina Santa Rita e, na mesma ocasião, uma quantidade significativa de peixes de diversas espécies foi encontrada morta no rio Mogi-Guaçu e suas águas foram tomadas por uma mancha preta.
Assim, há fortes evidências de que a mortandade dos peixes do rio Mogi-Guaçu está relacionada com o rompimento do tanque de contenção da usina agravada, situação que coincide com a conclusão do relatório elaborado de modo complexo e detalhado pela CETESB.
Encontram-se presentes, portanto, a verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
Além do mais, o artigo 461, §3º, do Código de Processo Civil, estabelece que na ação que tenha objeto cumprimento de obrigação de fazer ou não-fazer, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final."
Pelo exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, cuidando o Juízo a quo e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL de fiscalizar o implemento das medidas até agora propostas pelo Parquet; restando mantida as astreintes fixadas em desfavor da empresa no caso de atraso no cumprimento da determinação.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO:10042 |
Nº de Série do Certificado: | 172FB228704EFD |
Data e Hora: | 27/08/2015 16:15:11 |