Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/12/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000125-51.2007.4.03.6127/SP
2007.61.27.000125-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MAURO FERREIRA ROSA
ADVOGADO : SP055051 PAULO EDUARDO SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001255120074036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ARTIGO 171, §3º, CP. PEDIDO DE PENSÃO POR MORTE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. AUSÊNCIA DE VÍNCULO DE UNIÃO ESTÁVEL COM A SEGURADA. FRAUDE. DOLO PRESENTE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Apelação da Defesa contra sentença que condenou Mauro Ferreira Rosa à pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, no regime aberto, e pagamento de 20 dias-multa, no valor unitário mínimo, pela prática do crime tipificado no artigo 171, §3º, do CP.

2. Consta dos autos o requerimento de pensão por morte perante o INSS, formulado pelo réu Mauro, indicando a condição de companheiro de Elizabeth Esther Nicholls, e a carta de concessão do benefício, assim como todos os valores pagos a título de pensão ao acusado. .

3. A primeira indicação de fraude no pedido do benefício previdenciário é sua instrução com a cópia do contrato de abertura de conta conjunta, supostamente firmado por Elizabeth, após sua morte.

4. Há outras provas documentais a infirmar a convivência marital entre o réu Mauro e Elizabeth: Elizabeth relata, em ação promovida perante a Vara Cível de Aguaí/SP, que vivia "na edícula nos fundos da casa do réu Mauro", sem relação de convivência, pagando-lhe aluguel de duzentos e cinquenta reais e, posteriormente, em 28.08.2001, mudou de endereço, consoante recibos de aluguel colacionados, demonstrando que Elizabeth residia à Rua Henrique Castello, nº 242, fundos, na época de sua morte.

5. Quem paga aluguéis para viver na edícula, no fundo da casa do réu, não pode ser tida como convivente, em união estável. Não comprovação da affectio maritatis, não se demonstrando a existência de união estável e dependência econômica, nos termos do art. 1723 do Código Civil.

6. As testemunhas ouvidas confirmam a inexistência de vínculo afetivo/união estável entre o réu e a Sra. Elizabeth. Somente uma das testemunhas inquiridas, ao contrário do afirmado pela Defesa, teve a contradita aceita pelo magistrado "a quo". Condenação que não se baseou apenas em prova testemunhal, mas também na farta prova documental coligida.

7. O dolo, vontade livre e consciente, é verificado da conduta do réu em requerer pensão por morte, afirmando falsamente ser companheiro da segurada Elizabeth Esther Nicholls, quando em verdade já haviam se separado judicialmente e não viviam mais maritalmente, nem mesmo como companheiros, à época do falecimento de Elizabeth.

8. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte do presente julgado.


São Paulo, 24 de novembro de 2015.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000125-51.2007.4.03.6127/SP
2007.61.27.000125-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MAURO FERREIRA ROSA
ADVOGADO : SP055051 PAULO EDUARDO SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001255120074036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

RELATÓRIO

O Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):

O Ministério Público Federal, em 26.05.2010, denunciou MAURO FERREIRA ROSA, qualificado nos autos, nascido aos 27.05.1953, como incurso no artigo 171, §3º, do Código Penal, porque, na cidade de São João da Boa Vista/SP, no período compreendido entre 26.11.2003 e 12.02.2007, o denunciado, mediante fraude, induziu e manteve em erro o INSS, obtendo vantagem ilícita, consistente no recebimento de benefício previdenciário (pensão por morte) na qualidade de dependente da segurada Elisabeth Esther Nicholls, alegando ter mantido união estável com esta.

A denúncia foi recebida em 02.06.2010 (fls. 188/191).

Processado o feito, sobreveio sentença da lavra da MM. Juíza Federal Luciana da Costa Aguiar Alves Henrique, publicada em 20.06.2012 (fls. 384/387), que julgou procedente a denúncia para condenar MAURO FERREIRA ROSA à pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, no regime aberto, e 20 dias-multa, no valor unitário mínimo, pela prática do crime tipificado no artigo 171, §3º, do CP. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 4 salários-mínimos.

Apela o réu (fls. 391/399 e 410 verso) pleiteando édito absolutório, por ausência de dolo e de prova suficiente para a condenação. Sustenta que "não obstante as provas e circunstâncias que vieram aos autos, favoráveis ao acusado, foi 'mantida' sua condenação, além da desconsideração de um casamento e de uma união estável, atestados por escritura pública, no maior absurdo jurídico e arbitrário de poder". Afirma que "demonstrou ser parte legítima para demandar os benefícios de sua companheira, eis que, basta verificar às fls. 72, pela Escritura Pública feita por Elizabeth Esther Nicholls, declarando sua união estável com o acusado". Alega que "as testemunhas de acusação, são, sem exceção, todas inimigas do acusado, não apresentando qualquer subsídio para a elucidação dos fatos". Aduz que o benefício previdenciário concedido não foi obtido mediante fraude, pois instruído por documentos legítimos, inexistindo prática criminosa.

Contrarrazões do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso (fls. 402/407).

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra da Dra. Samantha Chantal Dobrowolski, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 412/414).

É o relatório.

Ao MM. Revisor.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000125-51.2007.4.03.6127/SP
2007.61.27.000125-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MAURO FERREIRA ROSA
ADVOGADO : SP055051 PAULO EDUARDO SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001255120074036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

VOTO

O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

Trata-se de apelação interposta contra a sentença que condenou Mauro Ferreira Rosa à pena de 01 ano e 04 meses de reclusão, no regime aberto, e pagamento de 20 dias-multa, no valor unitário mínimo, pela prática do crime tipificado no artigo 171, §3º, do CP.

Postula a Defesa édito absolutório.

O recurso não merece provimento.

A materialidade e a autoria delitiva imputada ao réu Mauro encontram-se demonstradas pelo conjunto probatório produzido nos autos, especialmente pelo processo administrativo NB-21-130.672.076-9 (fls. 60/101), pela prova documental coligida e pela prova testemunhal.

Às fls. 61 consta o requerimento de pensão por morte perante o INSS, formulado pelo réu Mauro, indicando a condição de companheiro de Elizabeth Esther Nicholls, e às fls. 81 consta a carta de concessão do benefício. A informação de fls. 177/180 atesta os valores indevidamente pagos a título de pensão ao réu MAURO.

O óbito de Elizabeth Esther Nicholls ocorreu em 26.11.2003, tendo como causas atestadas na certidão de óbito: "a) falência de múltiplos órgãos e sistemas, b) septicemia, c) cirrose hepática, d) alcoolismo crônico" (fls. 62).

O pedido de pensão por morte foi pleiteado dois dias após o falecimento da beneficiária, em 28.11.2003 (fls. 61), instruído, dentre outros documentos, com cópia de contrato de abertura de conta corrente e poupança "conjunta" (fls. 70/71), firmados por Mauro Ferreira Rosa e Elizabeth Esther Nicholls, em 27.11.2003, a fim de comprovar a convivência marital.

Assim, a primeira indicação de fraude no pedido do benefício previdenciário é sua instrução com a cópia do contrato de abertura de conta conjunta, supostamente firmado por Elizabeth, após sua morte. De qualquer sorte, e para argumentar, como consignado na sentença hostilizada "o fato de existir conta conjunta, por si só, não significa que os proponentes moravam juntos e que havia dependência mútua (...)" (fls. 385).

Mas não é só.

A Defesa de Mauro afirma que ele, embora tivesse se divorciado de Elizabeth (em 06.09.89 - fls. 25/27 do Apenso), voltou a viver maritalmente com ela, sendo a união estável declarada por escritura pública (fls. 326 e 327), revelando a convivência "há mais de quatro (04) anos, ou seja, até esta data", em 20.09.2000.

No entanto, na ação nº 973/97, perante a Vara Distrital de Aguaí/SP, o réu Mauro declarou ao Juízo, em 15.03.1999, ser homossexual (fls. 06/09 do apenso):

J: Havia alguma inimizade entre o senhor e os demais irmãos?

D: Eles nunca me aceitaram porque tenho minha vida particular, sou homossexual, e sempre se afastaram por isso.

Nesse passo, a escritura pública perde efetivamente credibilidade sobre a relação de convivência de Mauro e Elizabeth em união estável, não se divisando, nos termos da revogada Lei nº 9.278/96 ou na atual dicção do art. 1723 do Código Civil, a convivência pública e duradoura, com o objetivo de constituir família.

Por outro lado, há outras provas documentais a infirmar a convivência marital entre o réu Mauro e Elizabeth.

Com efeito, Elizabeth ajuizou Ação de Anulação de Ato Jurídico contra Mauro, processo nº 891/2002, em 31.07.2002, na Vara Distrital de Aguaí (fls. 11/22 do apenso), pleiteando justamente a anulação da procuração pública outorgada ao réu Mauro e também a nota promissória emitida, no valor de sete mil reais, aduzindo que foi enganada por ele, quando estava em estado de embriaguez, tendo o réu Mauro pedido a ela para assinar documentos, e assim ela o fez, desconhecendo estar firmando mandato público e a nota promissória. Narra a autora Elizabeth que o réu Mauro, de posse da procuração pública, dirigiu-se à agência da Caixa Econômica Federal e efetuou saques de seu fundo de garantia, sem seu conhecimento e autorização.

Elizabeth revogou o mandato público, consoante escritura de fls. 43 do apenso, em 24.09.2001.

Na ação mencionada (nº 891/2002), Elizabeth relata que vivia "na edícula nos fundos da casa do réu Mauro", sem manter qualquer relacionamento íntimo com o increpado, pagando-lhe aluguel de duzentos e cinquenta reais e, posteriormente, em 28.08.2001, mudou de endereço, consoante recibos de aluguel (juntados às fls. 46/47 do apenso), demonstrando que Elizabeth, antes de falecer, residia à Rua Henrique Castello, nº 242, fundos.

Ora, quem paga aluguéis para viver na edícula, no fundo da casa do réu, não pode ser tida como convivente, em união estável, na forma da lei.

Por outro lado, diante da alegação de Elizabeth na ação nº 891/2002 de "dependência alcoólica e uso de medicamentos", foi submetida à perícia médica, cuja conclusão foi de que "a requerente é alcoólatra habitual" e "está apresentando quadro demencial devido ao uso habitual e abusivo de bebidas alcoólicas, sua capacidade e vontade estão extremamente prejudicadas" (fls. 108/115 do Apenso), sendo suasória sua versão de que acabou sendo ludibriada pelo acusado MAURO ao assinar documentos, entre les escrituta pública mencionada acima.

Veja-se que Elizabeth percebia aposentadoria por invalidez, em virtude de alcoolismo e um mês após a perícia realizada na ação nº 891/2002, constatando o alcoolismo e quadro demencial em virtude do abuso de álcool, veio a falecer, com a indicação no atestado de óbito das seguintes causas, entre outras: cirrose hepática e alcoolismo crônico (fls. 62).

Da análise das provas documentais acima coligidas, é indene de dúvidas a inexistência de relação afetiva em união estável entre o réu e a Sra. Elizabeth Esther Nicholls, dada a ausência de demonstração de convivência sob o mesmo teto, ausência de apresentação como casal, falta de confiança e zelo pelo outro, além de disputas judiciais, não se constatando, diante desse contexto, o exigível affectio maritatis , para configuração da chamada união estável.

As testemunhas ouvidas confirmam a inexistência de vínculo afetivo/união estável entre o réu e a Sra. Elizabeth, consoante depoimentos, colhidos sob o crivo garantidor do contraditório, conforme se constata dos testemunhos de Délcio Benedito Ferreira Rosa (fls. 314), Maria Helena Bulgarelli (fls. 315), José Ricardo Bulgarelli (fls.316), Ivone Bordim Ribeiro (fls. 317), Luis Cláudio Rosa (fls. 318). Ao revés do afirmado pelo defensor, das testemunhas mencionadas, apenas Délcio teve aceito sua contradita pelo magistrado, sendo certo que Ione Bordim Ribeiro, que ratificou as declarações prestadas na fase policial (fls. 133/135) teve a contradita formulada rejeitada e os demais testigos sequer foram, no devido tempo, contraditados pela Defesa.

Em verdade, não houve condenação baseada apenas em testemunhas contraditadas e suspeitas, e sim em farta prova documental e testemunhal, formando um quadro probatório francamente desfavorável ao réu, que autorizava a prolação de condenação.

O dolo, vontade livre e consciente, é verificado na conduta do réu em requerer pensão por morte, afirmando falsamente ser companheiro da segurada Elizabeth Esther Nicholls, quando de fato já haviam se separado judicialmente e não viviam mais maritalmente, nem mesmo como companheiros, à época do falecimento de Elizabeth.

Logo, a manutenção da condenação de Mauro Ferreira Rosa, como incurso no artigo 171, §3º, do CP, é de rigor.

Embora não tenha havido insurgência contra a pena aplicada, verifico que restou bem dosada, no mínimo legal, apenas com o acréscimo da causa de aumento do §3º do artigo 171 do CP. Houve a fixação do regime inicial aberto para o desconto da pena e a substituição da pena corporal por penas restritivas de direito.

Por estas razões, nego provimento à apelação.

É o voto.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 26/11/2015 18:29:06