Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/12/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0015863-14.2007.4.03.6181/SP
2007.61.81.015863-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : ALEXANDRE AMARASCO
: LUIS CARLOS KUBA
ADVOGADO : SP302617 DANILO DIAS TICAMI e outro(a)
CODINOME : LUIZ CARLOS KUBA
APELANTE : ANDRE LUIZ PONZINI
ADVOGADO : SP120797 CELSO SANCHEZ VILARDI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
EXTINTA A PUNIBILIDADE : PLINIO CERRI falecido(a)
No. ORIG. : 00158631420074036181 2P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ART. 16 DA LEI Nº 7.492/86. CRIME DE FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRELIMINAR: POSSIBILIDADE DE ÉDITO CONDENATÓRIO AINDA QUE O MINISTÉRIO PÚBLICO PUGNE PELA ABSOLVIÇÃO DO RÉU. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO: NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. CRIME DO ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE PROVAS DO VÍNCULO ASSOCIATIVO. PENA-BASE. MAJORAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME, vALORAÇÃO NEGATIVA. PENA PECUNIÁRIA. PROPORCIONALIDADE COM A PENA CORPORAL. REDUÇÃO DAS PENAS DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. ALTERAÇÃO DE OFÍCIO DO DESTINATÁRIO DAS PENAS.
1. Apelação interposta pela Defesa contra sentença que condenou os réus como incursos no artigo 16 da Lei 7.492/86 em concurso formal com o artigo 288 do Código Penal.
2. O juiz, consoante princípio do livre convencimento motivado ou persuasão racional e amparado no artigo 385 do CPP, está autorizado a proferir sentença condenatória ainda que o órgão acusatório tenha requerido a absolvição do réu, pautando-se no conjunto probatório coligido e mediante devida fundamentação.
3. Muito embora a pena mínima cominada pelo artigo 16 da Lei 7.492/86, seja igual a 1 (um) ano, os réus respondem ainda, em concurso formal, pela prática do delito descrito no artigo 288 do Código Penal, devendo ser considerada então a pena do primeiro crime, mais o acréscimo mínimo de 1/6 (um sexto) relativo ao concurso formal ultrapassando o limite estabelecido pelo artigo 89 da Lei 9.099/1995 para aplicação da suspensão condicional do processo. Assim, no momento do oferecimento da denúncia e da prolação da sentença, não cabia a proposta de suspensão condicional do processo, a teor da Súmula 243 do STJ.
4. Ademais, a suspensão do processo é pertinente antes do processamento do feito, porque visa justamente evitar levar adiante a persecução penal em juízo, desde que preenchidos os requisitos legais. Dessa forma, após todo o processado, inadequado requerer-se a suspensão do que já ocorreu, do que já se ultimou. Ainda que ocorra eventual modificação da imputação nesta sede recursal ou, ainda, absolvição de um dos crimes, resta inviabilizada a pretendida suspensão, ante a superação da fase apropriada.
5. Materialidade do crime do artigo 16 da lei 7.492/86 comprovada pelos documentos apreendidos na sede da empresa Ibirapuera Turismo quando da diligência policial, em especial pelos boletos de compra e venda de moeda estrangeira, caneta detectora de cédulas falsas, cartões de visita em nome de "Ibirapuera Câmbio Turismo Ltda", máquina de contagem de dinheiro, moeda nacional e estrangeira em grande quantidade, cheques de clientes. Consoante ofício do BACEN, a empresa Ibirapuera Turismo Ltda. iniciou suas atividades em 16/03/1992, mas esteve credenciada para operar no Mercado de Câmbio e de Taxas Flutuantes apenas no período de 09/11/1994 e 09/12/1994 e entre 01/03/1995 e 05/08/1997. Os próprios acusados confirmaram na fase policial que a empresa desenvolvia tal atividade sem autorização há 06 anos.
6. Autoria demonstrada. Ao contrário do sustentado pela defesa, o fato dos funcionários não terem poderes de gestão e administração na empresa não tem o condão de afastá-los da responsabilidade penal pelas infrações cometidas. Com efeito, todos os acusados tinham plena ciência da necessidade de autorização do Banco Central para efetuar transações de compra e venda de moeda estrangeira, sendo que a empresa em que trabalhavam atuava desprovida dessa autorização.
7. Denota-se, diante desse contexto, onde os acusados atuaram por longo período em empresa de pequeno porte, com exíguo quadro de funcionários, experientes na atividade que desenvolviam, que suas atuações extrapolam a simples função de operadores de câmbio.
8. Apesar de não possuírem poder de administração, aderiram, cônscios da situação de irregularidade que envolvia o negócio, à atividade ilícita ali desenvolvida, não lhes socorrendo a singela alegação de que eram apenas operadores de balcão, empregados do falecido corréu Plínio.
9. Não há que se falar em ausência de dolo em fraudar o Sistema Financeiro Nacional e por desconhecimento da ausência de autorização da empresa para realizar operações de câmbio, ocorrendo a excludente do erro de tipo (artigo 20, caput, do CP). Todos os acusados tinham ciência da necessidade da autorização do banco central para celebração de contratos de compra e venda de moeda estrangeira, bem como que a empresa em que trabalhavam não tinha essa autorização. Ademais, confirmaram nas fases policial e judicial que na maior parte das vezes não emitiam os boletos, e quando o faziam, emitam em nome da empresa Interpax.
10. Inaplicável ao caso a teoria do domínio do fato, ao argumento que os réus não detinham poder de decidir se e como seria executada a infração penal. Conforme demonstrado, os acusados, na qualidade de operadores de câmbio, atuaram juntamente com o corréu Plínio Cerri de modo a fazer operar irregularmente a instituição financeira.
11. O crime do artigo 16 da lei 7.492/86 é de natureza comum, podendo ser cometido por pessoas diversas daquelas relacionadas no artigo 25 da mesma Lei.
12. O crime de quadrilha ou bando, atualmente denominado associação criminosa, por sua natureza, é autônomo e se perfaz independentemente da prática dos crimes a que os agentes objetivam perpetrar a partir da união associativa, sendo prescindível a comprovação de que houve o cometimento de crimes por integrantes da associação.
13. Desnecessária a comprovação dos crimes que os integrantes da associação teriam praticado em unidade de desígnios e, ainda que o fim do grupo criminoso fosse a prática de crimes.
14. A sentença a quo fundamentou a condenação dos réus pelo crime do artigo 288 do Código Penal, sobretudo no período de tempo que os acusados trabalharam juntos, pela divisão de tarefas e organização dos agentes. Todavia, não é possível considerar tais elementos como prova do crime de quadrilha, pois não se pode concluir que os acusados se reuniram com o fim de cometer delitos. Embora os acusados tenham incorrido na prática do crime tipificado no art. 16 da Lei nº 7.492/86, não haviam se associado para o fim de cometer crimes.
15. Ademais, é imprescindível a prova do vínculo entre os indivíduos, o que não se dá com a simples reunião no ambiente de trabalho, sendo certo que a divisão de tarefas se dá pela própria estrutura da empresa.
16. No caso, não se comprovou a estabilidade e a permanência da associação dos corréus a ensejar a absolvição, nos termos do art. 386, inc. VII, do CPP.
17. Dosimetria da pena. É certo que o crime do artigo 16 da Lei 7.492/86 é considerado habitual impróprio, em que uma única ação tem relevância para configurar o crime. Sua reiteração, apesar de não configurar pluralidade de crimes, constitui circunstância que deve ser ponderada negativamente. Assim, sendo incontroverso que as condutas se estenderam por período superior a 6 anos, mostra-se justa e adequada a valoração negativa das circunstâncias do crime para majorar a pena-base.
18. O acusado Alexandre emprestou seu nome para figurar como sócio da empresa Interpax Turismo, empresa essa utilizada pela IBIRAPUERA TURISMO para dar aparência de legalidade nas operações de câmbio, de modo que é de se ponderar negativamente sua culpabilidade mais acentuada.
19. Para fixação da pena de multa deve ser observado o critério trifásico da dosimetria da pena e deve ser guardada proporcionalidade com a pena privativa de liberdade imposta. Precedentes
20. Apelações parcialmente provida. De ofício, reduzidas as penas de multa, de prestação pecuniária aplicada em substituição às penas privativas de liberdade e à destinação desta.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar parcial provimento à apelação da defesa para absolver os réus da imputada prática do delito do artigo 288 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, de modo que a pena resulta definitiva em 02 anos de reclusão para Alexandre Amarasco e em 01 ano e 06 meses de reclusão para Andre Luiz Ponzini e Luis Carlos Kuba pelo crime do artigo 16 da Lei 7.492/86; de ofício, reduzir a pena de multa de Alexandre para 20 dias-multa e de Luis e André para 15 dias-multa, cada um no piso legal e reduzir o valor da prestação pecuniária para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, e ainda, de ofício, alterar a destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de novembro de 2015.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0015863-14.2007.4.03.6181/SP
2007.61.81.015863-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : ALEXANDRE AMARASCO
: LUIS CARLOS KUBA
ADVOGADO : SP302617 DANILO DIAS TICAMI e outro(a)
CODINOME : LUIZ CARLOS KUBA
APELANTE : ANDRE LUIZ PONZINI
ADVOGADO : SP120797 CELSO SANCHEZ VILARDI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
EXTINTA A PUNIBILIDADE : PLINIO CERRI falecido(a)
No. ORIG. : 00158631420074036181 2P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA: O Ministério Público Federal denunciou PLÍNIO CERRI, ALEXANDRE AMARASCO, LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ PONZINI, qualificados nos autos, nascidos aos 31/07/1932, 30/12/1969, 03/04/1967 e 28/06/1969, respectivamente, como incursos nas sanções do artigo 16 c/c o artigo 1º, parágrafo único, inciso I, ambos da Lei n. 7.492/86 e artigo 288 do Código Penal. Consta da denúncia:

Os denunciados PLÍNIO CERRI, ALEXANDRE AMARASCO, ANDRÉ LUIZ POZINI e LUIS CARLOS KUBA, reunidos por prévio acordo de vontades e em comunhão de esforços, imbuídos dos mesmos desígnios e propósitos, na qualidade de sócio (primeiro) e funcionários (demais) da empresa IBIRAPUERA TURISMO LTDA (CNPJ n° 67.648.717/0001-15) - fls. 93 e 242 - conceberam associar-se em quadrilha visando, de maneira contumaz e habitual, a fim de atuar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes à margem da legalidade, operando instituição financeira sem a devida autorização, conforme fazem prova: (i) auto de prisão e flagrante e declarações fls. 02/18 e 70/72 -; (ii) objetos utilizados na atividade cambial fl. 107 dos autos principais e apenso II, volume 01; (iii) numerário em moeda nacional e estrangeira - fls. 74/82 -; (iv) extratos de conta corrente nº 10833-26, ag. 0912 do Banco HSBC, cuja titularidade é atribuída à referida pessoa jurídica - fls. 02/04 do apenso 01-; e (v) tabelas de anotações de movimentação financeira is 05/07 do apenso 01 -.
I - Da Desvelação da Atividade Criminosa
A "Operação Império" foi deflagrada pela polícia federal para desvendar atividade criminosa voltada ao tráfico internacional de estupefaciantes e substâncias psicotrópicas, após informações do Governo Belga acerca da apreensão de 305 Kg (trezentos e cinco quilogramas) de pasta de cocaína em contêiners embarcados via Porto de Santos, exportados pela empresa ART PACKING COMÉRCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA.
Durante as investigações (IPL 3-0583/2007) verificou-se que o sócio proprietário da referida empresa e mentor da organização criminosa era FRANCISCO DE CESARE FILHO.
Naqueles autos, como decorrência do oferecimento de denúncia, foi decretada a prisão preventiva do investigado ALEXANDRE AMARASCO. Consoante noticia a referida exordial acusatória, "ALEXANDRE era operador da casa de câmbio IBIRAPUERA TURISMO LTDA. Segundo escutas telefônicas era ele que sempre combinava com FRANCISCO a realização de câmbio do dinheiro obtido pela quadrilha. Sendo que, ele mesmo confessou que realizava o câmbio de moeda sem declarar ao Banco Central (fls. 40)".
Em 14/dez/2007, após expedição dos mandados de Busca e Apreensão na casa de câmbio IBIRAPUERA - fl. 29 - e de Prisão Preventiva (nº 57/200/To) em desfavor de AMARASACO, a polícia federal dirigiu-se à casa de câmbio IBIRAPUERA, situada à Avenida Ibirapuera, Shopping Ibirapuera, nº 3103, Loja 59, Bairro Moema - São Paulo/SP (fls. 02/18).
Na localidade, solicitando a presença de dois seguranças do Shopping Ibirapuera como testemunhas da ação, a força policial designada notou, durante o cumprimento das ordens judiciais, prática de atividade cambial pelo Sr. José Henrique Iorio Savaglia, consistente na troca de R$ 900,00 (novecentos reais) por US$ 475,00 (quatrocentos e setenta e cinco dólares). Diante de tal quadro, indagaram o detido AMARASCO acerca da existência de autorização para atividade de câmbio e, diante de resposta negativa, deram voz de prisão em flagrante ao mesmo e aos denunciados ANDRÉ e LUIS - que estavam operando mesas de balcão - pela prática dos delitos esculpidos no art. 16 da Lei n° 7.492/86 e 288 do C.P., conduzindo-os à Delegacia da Polícia Federal onde foi lavrado auto de prisão em flagrante (fls. 02/18).
Ainda, procedendo a buscas de eventuais produtos e instrumentos criminosos, os policiais apreenderam um cartão de visitas (fls. 107) - contendo a impressão "câmbio turismo ltda" -, diversos boletos preenchidos e não preenchidos de compra e venda de moeda estrangeira (apenso II - volume I), R$ 169.497,00 (cento e sessenta e nove mil, quatrocentos e noventa e sete reais) em espécie (fls. 74), R$ 112.835,00 (cento e doze mil, oitocentos e trinta e cinco reais) em cheques (fls. 75/84), US$ 34.785,00 (trinta e quatro mil, setecentos e oitenta e cinco dólares) em espécie, ? 28.925,00 (vinte e oito mil, novecentos e vinte e cinco euros), Y 97.000,00 (noventa e sete mil yenes), £ 620,00 (seiscentos e vinte libras) Fr 500,00 (quinhentos francos suíços), $ 1.000,00 (um mil) GUARANIS, extrato de conta corrente e tabelas apontando valores movimentados pela empresa "IBIRAPUERA" (fls. 02/07 do apenso 01), um contrato de compra e venda de imóveis, acompanhado de notas promissórias, e um contrato de compra e venda de embarcação (fls. 12/21 do apenso 01), ambos em nome de PLÍNIO, e, por fim, uma caneta detectora de cédulas falsas, além de maquina de contagem de valores.
Diante de farto material probatório atestando a materialidade de delito contra o sistema financeiro nacional (art. 16 da Lei nº 7.492/86), as autoridades policias interrogaram os detidos, sendo por todos afirmado que a casa de câmbio IBIRAPUERA estava atuando intensa e irregularmente no mercado cambial, transacionando expressivos valores, sendo que grande parte das operações não estavam acompanhadas de boletos bancários - cerca de 80 à 85% - e, quando contrário, eram gerados em nome da pessoa jurídica INTERPAX TURISMO, cujos sócios são AMARASCO e o Sr. Izaac Coelho (fls. 08/14 e 70/73).
No decorrer das investigações, o Banco Central, em resposta ao ofício nº 54.674/07 - DELEFIN/DRCOR/SR/DPF/SP (fls. 92), noticiou que a pessoa jurídica sob exame esteve autorizada a operar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes somente no período de 09/11/1994 a 09/12/1994 e 01/03/1995 a 05/08/1997.
Dessa forma, a empresa "IBIRAPUERA", durante pelo menos 06 (seis) anos, funcionou de forma irregular, ilícita e ocultando-se da atividade estatal fiscalizadora, sem a devida autorização legal, à margem do mercado cambial em operações não registradas ou registradas irregularmente, além de ter movimentado valores expressivos (fls. 08/14, 70/72 dos autos principais, 02/07 do apenso 01 e apenso 02 - volume I) lesando diretamente a credibilidade e higidez do sistema financeiro nacional.
Observe-se que as atividades realizadas pelos denunciados, utilizando-se da estrutura da referida casa de câmbio, iniciaram há pelo menos 06 (seis) anos - considerando-se a data da prisão em flagrante -, quando do ingresso de seu último componente, sempre ressaltando que conforme as declarações destes (fls. 08/14) e do Sr. Izaac Coelho, além das anotações constantes nos boletos e cheques apreendidos, a atividade cambial desenvolvia-se de maneira habitual, reiterada e contumaz (fls. 75/81 dos autos principais e apenso 02 - volume I), movimentando expressivos valores (fls. 02/07 do apenso 01).
Por fim, ressalte-se que, conforme Ordem de Missão Policial (nº 003/08), acostada às fls. 240/241, a casa de câmbio "sub examen", continua, aparentemente, a comercializar moeda estrangeira mesmo após as prisões em flagrantes ocorridas em 14/11/2007. Segundo os agentes policiais, um funcionário, localizado na entrada do estabelecimento, autoriza a entrada de terceiros e dois funcionários, que encontram-se no saguão da loja, atendem os clientes.
II - Da Autoria Delitiva
Os denunciados, livre e conscientemente, associaram-se em quadrilha para a prática de conduta delituosa prevista no art. 16 da Lei nº 7.492/86.
PLÍNIO CERRI, consoante pesquisas realizadas na Rede INFOSEG (fls. 93 e 242), declarações dos demais investigados (fl. 08/14) e declarações do Sr. Izaac Coelho (fls. 70/72), é sócio e proprietário da casa de câmbio "IBIRAPUERA", desde a época em que esta estava autorizada a atuar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes. Sendo que, destarte, tinha ciência de todas as irregularidades levadas a cabo sob seu comando. Por outro lado, ressalte-se que durante as buscas policiais foram apreendidos cheque, notas promissórias, e contratos de compra e venda em seu nome (fls. 84 dos autos principais e 12/21 do apenso 01).
ALEXANDRE ARAMASCO, era operador de balcão e administrador da empresa "IBIRAPUERA", exercia a atividade na casa de câmbio há aproximadamente 10 (dez) anos, embora não fosse registrado, sendo detido em flagrante frente as irregularidades ora mencionadas (fls. 02/18 e 70/72). Asseverou que a empresa em escopo não possuía autorização para operar com câmbio, sendo grande parte das transações efetuadas de forma irregular, sem a elaboração de boletos devido a inexistência de autorização para tanto, ou com o registro dos mesmos em nome da empresa INTERPAX TURISMO, onde era sócio juntamente com o Sr. Izaac Coelho (fls. 08/09 e 70/72). Tal fato demonstra o prévio conhecimento que possuía acerca da conduta delituosa que praticava.
LUIS CARLOS KUBA, era operador de balcão da casa de câmbio sob exame, exercendo tal atividade há aproximadamente 06 (seis) anos, embora não fosse registrado, sendo igualmente detido em flagrante como decorrência das ilicitudes apuradas (fls. 02/18). Segundo suas declarações, grande parte das transações efetuadas pela "IBIRAPUERA" eram irregulares, não havendo emissão de boletos ou com elaboração dos mesmos em nome da pessoa jurídica INTERPAX TURISMO (fls. 10/11). Tal afirmativa demonstra que o mesmo tinha plena ciência das irregularidades apontadas e de sua conduta criminosa..
ANDRÉ LUIZ PONZINI, era operador de câmbio da empresa em comento, exercendo tal atividade há cerca de 08 (oito) anos, sem registro na CTPS, também sendo detido em flagrante como decorrência das ilicitudes ora narradas (fls. 02/18). Como os outros integrantes da quadrilha, possuía plena ciência das irregularidades narradas e da conduta delituosa que perpetrava. Também afirmou a existência de falta de emissão de boletos ou elaboração irregular dos mesmos em nome da empresa INTERPAX (fls. 12/14).
Ressalte-se, neste ponto, que os denunciados tinham conhecimento acerca dos ilícitos que praticavam, quando deixavam, na maior parte das operações, de emitir documentação que necessariamente deveria acompanhar as operações cambiárias, dentre as quais deveria constar o número do registro no BACEN ou elaboravam boletos em nome da empresa INTERPAX.
Dessa forma, os denunciados, livre e conscientemente, de forma habitual o contumaz, associaram-se -estável e permanentemente - em quadrilha, de forma a atuar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes - à margem da legalidade - operando pessoa jurídica equiparada à instituição financeira sem a devida autorização legal.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia PLÍNIO CERRI, ALEXANDRE AMARASCO, LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ PONZINI como incurso nas sanções do art. 16 c/c o art. 1g, parágrafo único, inciso I, ambos da Lei IP 7.492/86 e art. 288 do Código Penal (...).

A denúncia foi recebida em 22/09/2009 (fls. 327/329).

À fl. 548 foi declarada extinta a punibilidade do acusado Plínio Cerri em razão de seu falecimento, com fundamento no artigo 107, I, do Código Penal e artigo 62 do Código de Processo Penal (fl. 548).

Após instrução, sobreveio sentença da lavra do MM. Juiz Federal Marcio Ferri Catapani e publicada em 22/02/2012 (fls. 732/754 e 755) julgando procedente o pedido para:

a) condenar ALEXANDRE AMARASCO à pena de 02 anos e 08 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 31 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 60 salários mínimos em favor de entidade pública ou privada com destinação social, pelo crime do artigo 16 da Lei nº 7.492/86, em concurso formal com o crime do artigo 288 do Código Penal;

b) condenar LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ POZINI à pena de 02 anos de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 20 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 40 salários mínimos em favor de entidade pública ou privada com destinação social, pelo crime do artigo 16 da Lei nº 7.492/86, em concurso formal com o crime do artigo 288 do Código Penal.

Foi decretado o perdimento do numerário em moeda nacional e moeda estrangeira apreendidos na empresa Ibirapuera Turismo por serem tanto instrumento como produto do crime cometido, com fundamento no artigo 91, II, do Código Penal.

A sentença transitou em julgado para a Acusação, conforme certificado à fl. 796.

Apela o réu ANDRÉ LUIS PONZINI (fls. 808/858) postulando a absolvição de todas as acusações formuladas pelos seguintes argumentos:

a) ausência de indícios de que tenha praticado o crime do artigo 16 da lei 7492/86, pois nunca exerceu qualquer ato gerencial na empresa, sendo apenas um mero atendente de balcão da Ibirapuera Turismo com a função de efetuar troca de moedas dos clientes da loja. Alega que sua conduta foi irrelevante, pois, como mero funcionário, se recusasse a fazer o serviço, outra pessoa seria contratada em seu lugar. Sustenta que sempre acreditou na regularidade das atividades que da empresa em que trabalhava e que não restou demonstrado qualquer ato de gestão praticado pelo acusado na empresa para demonstrar sua participação em atos de gestão;

b) ausência de elemento subjetivo do tipo, não tendo sido demonstrado que o apelante agiu com vontade livre e consciente de fazer operar instituição financeira não autorizada, tendo sido reconhecido indevidamente a responsabilização objetiva do apelante. Informa ter se distanciado da empresa após a descoberta das irregularidades, sendo reconhecido o vínculo empregatício na justiça trabalhista;

c) atipicidade dos fatos quanto ao delito de formação de quadrilha, por ausência da prévia associação dos acusados para cometer crimes, atuando o acusado apenas como funcionário da empresa;

d) conversão do julgamento em diligencia para que seja oferecida a suspensão condicional do processo, nos termos do artigo 89 da lei 9.099/95 (sumula 337 do STJ).

Apelam os réus LUIZ CARLOS KUBA (fls. 859/877) e ALEXANDRE AMARASCO (fls. 878/899) postulando a absolvição, sob os seguintes argumentos:

a) em preliminar, a nulidade da sentença por violação ao sistema acusatório, tendo o magistrado condenado os réus pelo crime de formação de quadrilha, apesar de o MPF posicionar-se contrariamente;

b) ausência e prova da autoria delitiva, tendo todas as testemunhas confirmado que eram simples funcionários subordinados ao proprietário Plínio Cerri, sem qualquer comando ou poder de decisão, tratando-se o delito do artigo 16 da lei 7492/86 de crime próprio;

c) ausência de dolo, pois não atuaram com animus de prejudicar o sistema financeiro nacional, não sabiam da ausência de autorização para realizar operações de cambio, ocorrendo a excludente do erro de tipo (artigo 20, caput, do CP);

d) aplicação da teoria do domínio do fato, sendo que os réus não detinham poder de decidir se e como seria executada a infração penal.

e) não caracterização do crime de quadrilha ou bando por não ter sido demonstrado o liame subjetivo entre os agentes para o cometimento de crimes

f) redução da pena para o patamar mínimo, diante da falta de importância dos acusados para a execução dos delitos, em consagração ao princípio da proporcionalidade das penas, considerado ainda a baixa hierarquia de Alexandre, que tal como Luis Kuba e Andre Pozzini, era subordinado de Plinio Cerri, não obstante constar no contrato social da Interpax.

O Ministério Público Federal, em contrarrazões e parecer da lavra do DD. Procurador Regional da República Dr. Jose Augusto Simões Vagos, opinou pelo desprovimento dos recursos (fls. 905/910).

É o relatório.

Ao MM. Revisor.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0015863-14.2007.4.03.6181/SP
2007.61.81.015863-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : ALEXANDRE AMARASCO
: LUIS CARLOS KUBA
ADVOGADO : SP302617 DANILO DIAS TICAMI e outro(a)
CODINOME : LUIZ CARLOS KUBA
APELANTE : ANDRE LUIZ PONZINI
ADVOGADO : SP120797 CELSO SANCHEZ VILARDI e outro(a)
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EXTINTA A PUNIBILIDADE : PLINIO CERRI falecido(a)
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VOTO

O DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

Consta dos autos que ALEXANDRE AMARASCO, LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ PONZINI foram denunciados e condenados como incursos nas sanções do artigo 16 c/c o artigo 1º, parágrafo único, inciso I, ambos da Lei n. 7.492/86, em concurso formal com o artigo 288 do Código Penal, por terem, na qualidade funcionários da empresa IBIRAPUERA TURISMO LTDA, se associado de maneira contumaz e habitual a fim de atuar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes à margem da legalidade, operando instituição financeira sem a devida autorização do Banco Central, ao operar contratos de compra e venda de moeda estrangeira, sendo que grande parte das operações não estavam acompanhadas de boletos bancários e, quando acompanhadas dos respectivos boletos, eram gerados em nome da pessoa jurídica INTERPAX TURISMO.

Apelam os réus sustentando, em suma, violação ao princípio do sistema acusatório, a ausência de comprovação da autoria e do dolo e postulando a redução da pena.

Os recursos defensivos comportam parcial provimento.

Da preliminar de nulidade por violação ao sistema acusatório.

Sustenta a defesa de Luis e Alexandre a ocorrência de violação ao princípio do sistema acusatório, ao argumento de que o magistrado sentenciante condenou os réus pelo crime de formação de quadrilha, apesar de o Ministério Público Federal posicionar-se pela absolvição, ao apresentar suas alegações finais.

A preliminar deve ser rejeitada.

O artigo 385 do Código de Processo Penal é expresso em dispor que "nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada".

Assim, consoante o princípio do livre convencimento motivado ou persuasão racional, e amparado no artigo 385 do CPP, o juiz está autorizado a proferir sentença condenatória ainda que o órgão acusatório tenha requerido a absolvição do réu, pautando-se no conjunto probatório coligido e mediante devida fundamentação.

Nesse sentido, colaciono a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, in "Código de Processo Penal Comentado", Editora Forense, 13ª edição, p. 792:


36. Independência do juiz para julgar: do mesmo modo que está o promotor livre para pedir a absolvição, demonstrando o seu convencimento, fruto da sua independência funcional, outra não poderia ser a postura do magistrado. Afinal, no processo penal, cuidamos da ação penal pública nos prismas da obrigatoriedade e da indisponibilidade, não podendo o órgão acusatório dela abrir mão, de modo que também não está fadado o juiz a absolver o réu, se as provas apontam em sentido diverso. Ademais, pelo princípio do impulso oficial, desde o recebimento da peça inicial acusatória, está o magistrado obrigado a conduzir o feito ao seu deslinde, proferindo-se decisão de mérito. E tudo isso a comprovar que o direito de punir do Estado não é regido pela oportunidade, mas pela necessidade de se produzir a acusação e, consequentemente, a condenação, desde que haja provas a sustentá-la. Em contrário, confira-se o disposto no art. 60, III, do CPP, cuidando da perempção, com consequente extinção da punibilidade do réu, caso o querelante não requeira, nas alegações finais, a sua condenação. Neste caso, regida que é a ação penal privada pelo princípio da oportunidade, outra não é a conclusão a ser extraída diante do desinteresse do ofendido na condenação do agressor.

No sentido da validade do referido dispositivo, registro os precedentes do STJ:

HABEAS CORPUS. ROUBO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO FORMULADO EM ALEGAÇÕES FINAIS, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONDENAÇÃO QUE NÃO CARACTERIZA COAÇÃO ILEGAL. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. ORDEM DENEGADA.
1. É verdade que o Ministério Público requereu, em alegações finais, a absolvição dos pacientes. E, nas contrarrazões do recurso de apelação criminal por eles interposto, também se manifestou pelo provimento, para absolvê-los.
2. No entanto, é pacífico o entendimento de que a condenação, em tais circunstâncias, não caracteriza coação ilegal, pois o julgador não está vinculado à manifestação do Ministério Público. Tem ele liberdade de decidir, de acordo com o seu livre convencimento.
3. Não procede a assertiva de que o artigo 385 do Código de Processo Penal não fora recepcionado pela Constituição Federal de 1988.
4. Ordem denegada.
(HC 137.322/DF, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 05/05/2011, DJe 23/05/2011)

HABEAS CORPUS - ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES - CONDENAÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA - ALEGAÇÕES FINAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELA ABSOLVIÇÃO - ARTIGO 385, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL RECEPCIONADO PELA CONSTITUIÇÃO - AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO JUIZ - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE - WRIT DENEGADO.
1- A decisão do Juiz não é vinculada pelas alegações finais apresentadas pelo Ministério Público, podendo ele condenar o réu, mesmo quando o Parquet opina pela absolvição.
2- Havendo provas para julgar o feito, condenando o réu, o Juiz não deve se atrelar à opinião do Ministério Público, quando este requer a absolvição.
3- O habeas corpus não é o meio adequado para análise de pedido de absolvição, posto que não é possível a incursão nas provas dos autos.
4- Writ denegado.
(HC 84.001/RJ, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), QUINTA TURMA, julgado em 11/12/2007, DJ 07/02/2008, p. 1)

Portanto, não há que se falar em violação ao sistema acusatório, devendo ser rejeitada a preliminar suscitada.

Do pedido de conversão do julgamento em diligência para proposta de suspensão condicional do processo.

Pleiteia a defesa do acusado Andre a conversão do julgamento em diligência, para que seja oferecida a suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da lei 9.099/95, a teor do disposto na Súmula 337 do STJ.

Não se apresentava cabível, quando do oferecimento da denúncia e da prolação da sentença, a suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da Lei 9.099/1995, haja vista que para esta o requisito objetivo é de que a pena mínima cominada pela lei seja igual ou inferior a 01 (um) ano.

Muito embora a pena mínima cominada pelo artigo 16 da Lei 7.492/86, seja igual a 01 (um) ano, os réus respondem ainda, em concurso formal, pela prática do delito descrito no artigo 288 do Código Penal, devendo ser considerada então a pena do primeiro crime, mais o acréscimo mínimo de 1/6 (um sexto) relativo ao concurso formal, ultrapassando o limite estabelecido pelo artigo 89 da Lei 9.099/1995 para aplicação da suspensão condicional do processo.

Neste sentido situa-se o entendimento consolidado na Súmula 243 do Superior Tribunal de Justiça:

O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano.

Assim, no momento do oferecimento da denúncia e da prolação da sentença condenatória, não cabia a proposta de suspensão condicional do processo, a teor da Súmula n. 243 do STJ.

Ademais, a suspensão do processo é pertinente antes do processamento do feito, porque visa justamente evitar levar adiante a persecução penal em juízo, desde que preenchidos os requisitos legais. Dessa forma, após todo o processado, inclusive sentenciado o feito, inadequado requerer-se a suspensão do que já ocorreu, do que já se ultimou.

Ainda que ocorra eventual modificação da imputação nesta sede recursal ou, ainda, absolvição de um dos crimes, resta inviabilizada a pretendida suspensão, ante a superação da fase apropriada.

Nesse sentido julgado desta Corte:

"(...)1. É descabida a alegação de que poderia ser deferido o benefício da suspensão condicional do processo. À época da propositura da denúncia, ao réu foram imputadas as condutas previstas no artigo 171 do Código Penal e 16 da Lei 7.492/86, cuja soma das penas é superior a 01 ano.
2. A oportunidade para a proposta da suspensão condicional do processo é no momento do oferecimento da denúncia, conforme textualmente prevê o artigo 89, caput, da Lei 9.099/95 (...)"
(TRF 3ªR., ACR 0000446-02.2000.403.6105, rel. Des. Ramza Tartuce, 5ª. T., j. 02/08/2010, DJe 17/08/2010)

Superada a preliminar cumpre apreciar o mérito recursal.

A materialidade delitiva do crime do artigo 16 da lei 7.492/86 (fazer operar, sem a devida autorização, instituição financeira, inclusive de câmbio) restou bem comprovada pelos documentos apreendidos na sede da empresa Ibirapuera Turismo, quando da diligência policial, em 14/12/2007, em especial pelos boletos de compra e venda de moeda estrangeira, caneta detectora de cédulas falsas, cartões de visita em nome de "Ibirapuera Câmbio Turismo Ltda", máquina de contagem de dinheiro, moeda nacional e estrangeira em grande quantidade e cheques de clientes (auto de apreensão - fls. 34/35).

Consoante ofício do BACEN, a empresa Ibirapuera Turismo Ltda. iniciou suas atividades em 16/03/1992, mas esteve credenciada para operar no Mercado de Câmbio e de Taxas Flutuantes apenas no período de 09/11/1994 e 09/12/1994 e entre 01/03/1995 e 05/08/1997 (fls. 92/93).

Os próprios acusados confirmaram na fase policial que a empresa desenvolvia tal atividade sem autorização do Banco Central do Brasil, a quem compete, diga-se, autorizar o funcionamento de instituições financeiras no país (art. 18 da Lei nº 4595/64).

A autoria delitiva também é inconteste.

Os apelantes Alexandre, Luis e Andre postulam a absolvição por ausência de provas de que tenham praticado o crime do artigo 16 da lei 7492/86, ao argumento que nunca exerceram qualquer ato gerencial na empresa, pois eram meros atendentes de balcão, com a função de efetuar troca de moedas dos clientes, sendo que estavam subordinados ao proprietário da empresa Plínio Cerri (já falecido). André ainda sustenta que sua conduta foi irrelevante, pois, como mero funcionário, se recusasse a fazer o serviço, outra pessoa seria contratada em seu lugar, e afirma que sempre acreditou na regularidade das atividades da empresa que laborava.

Dispõe o artigo 16 da lei 7.492/86:

Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio:
Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa

Inicialmente, observo que a empresa IBIRAPUERA TURISMO enquadra-se no conceito de instituição financeira por equiparação, a teor do que dispõe o artigo 1º, inciso I, da Lei nº 7.492/86.

E conforme interrogatórios judiciais dos acusados Alexandre, Andre e Luis, a empresa transacionava diariamente moedas estrangeiras (mídia de fl. 616).

É certo que Plínio Cerri, falecido, era o proprietário da empresa IBIRAPUERA TURISMO, conforme se verifica das alterações do contrato social (fls. 449/473), ao passo que os acusados ANDRE, LUIS e ALEXANDRE trabalhavam no balcão da empresa, como operadores de câmbio.

Contudo, ao contrário do sustentado pela defesa, o fato dos funcionários não possuírem formalmente poderes de gestão e administração na empresa não tem o condão de afastá-los da responsabilidade penal pelas infrações cometidas.

Com efeito, todos os acusados tinham plena ciência da necessidade de autorização do Banco Central para efetuar transações de compra e venda de moeda estrangeira, sendo que a empresa em que trabalhavam atuava desprovida dessa autorização.

Quanto ao ponto, convém registrar que Luis e Andre trabalharam na casa de câmbio por 06 e 08 anos, respectivamente (fls. 10/14 e mídia de fl. 616), confirmando que, na maioria das vezes, não emitiam os respectivos boletos dos contratos de câmbio, e quando solicitados, emitia-os em nome de outra empresa, a INTERPAX, o que demonstra claramente a ciência de que a Ibirapuera Turismo atuava na ilegalidade.

Alexandre Amarasco, por sua vez, trabalhou por 10 anos como gerente na IBIRAPUERA TURISMO, além de figurar como sócio da INTERPAX TURISMO, empresa utilizada pela Ibirapuera Turismo para emitir os boletos, quando solicitados pelos clientes, a fim de conferir aparente legalidade ao negócio (conforme por ele admitido às fls. 8/10). Alexandre ainda afirmou aos policiais que a autorização para funcionamento da empresa Ibirapuera havia sido cassada (fl. 03).

Assim, resta demonstrado que os acusados, apesar de não possuírem formalmente poderes de gestão e administração na empresa, sabiam das ilegalidades das operações cambiais, da necessidade de outorga do Banco Central e da situação de irregularidade da empresa em que trabalhavam por muitos anos.

Os próprios acusados Luis e Andre afirmaram, na fase judicial, que a única atividade da empresa Ibirapuera Turismo era a realização de operações de câmbio e que somente emitiam boletos da empresa Interpax quando solicitados pelos clientes, o que por si só já demonstra a irregularidade nas transações.

Em juízo, o réu Luis confirmou que sabia que a empresa não estava regularizada e que emitiam boletos em nome da Interpax. André afirmou que a empresa Ibirapuera emitia boletos em nome da Interpax há aproximadamente 08 anos.

Denota-se, diante desse contexto, onde os acusados atuaram por longo período em empresa de pequeno porte, com exíguo quadro de funcionários, experientes na atividade que então desenvolviam, que suas atuações extrapolaram a simples função de operadores de câmbio, não estando distantes, como que se quer fazer crer, da administração central do estabelecimento.

Apesar de não possuírem poder de administração, aderiram, cônscios da situação de irregularidade que envolvia o negócio, à atividade ilícita ali desenvolvida, não lhes socorrendo a singela alegação de que eram apenas operadores de balcão, empregados do falecido corréu Plínio.

As alegações apresentadas pelos réus em seus interrogatórios são inverossímeis e não encontram o mínimo amparo probatório nos autos.

Ora, os apelantes trabalharam por longo período no estabelecimento, não sendo razoável a afirmação que desconheciam a situação irregular vivenciada, o que mais se acentua com o fato de que os boletos, quando emitidos, eram feitos em nome de outra empresa, a INTERPAX.

Em que pese o esforço dos apelantes em apontar como único responsável pela empreitada criminosa o falecido corréu Plinio, os elementos dos autos demonstram que todos participavam efetivamente da prática do crime em foco.

Haure-se dos depoimentos prestados pelos apelantes quando da prisão em flagrante delito, que Plínio não era o único responsável pelo funcionamento do negócio irregular, tanto que o réu Alexandre foi apontado como o responsável pela administração nas ausências de Plínio, sendo que este, segundo declarou Andre (fls. 13), comparecia à empresa de 2ª à 5ª feira. Aliás, no próprio dia da diligência policial na empresa, Plinio não se encontrava no estabelecimento. A testemunha de acusação Sérgio Vieira Araújo (mídia de fls. 547), segurança do shopping, declarou que Plinio não era visto constantemente no local do estabelecimento.

E mais, o mesmo Andre, que em Juízo buscou eximir-se de qualquer responsabilidade criminal, questionado na fase policial sobre as orientações acerca dos trabalhos realizados, asseverou: "é natural da empresa ... não teve ninguém que disse, faz assim ou do outro jeito... fui trabalhando de acordo com a norma da casa. Se a pessoa quer comprar sem boleto, vende assim... se quer com, vende com boleto" (fls. 13).

Como se nota, o grau de liberdade na atuação dos apelantes não condiz com a alegada estrutura rígida de subordinação ao proprietário Plínio.

Não há que se falar em ausência de dolo em fraudar o Sistema Financeiro Nacional por desconhecimento da ausência de autorização da empresa para realizar operações de câmbio, ocorrendo a excludente do erro de tipo (artigo 20, caput, do CP). Todos os acusados tinham ciência da necessidade da autorização do Banco Central para celebração de contratos de compra e venda de moeda estrangeira, bem como estavam cônscios que a empresa em que trabalhavam não tinha essa autorização. Ademais, confirmaram nas fases policial e judicial que na maior parte das vezes não emitiam os boletos de câmbio, e quando o faziam, emitam em nome de outra empresa.

Inaplicável ao caso a teoria do domínio do fato, ao argumento que os réus não detinham poder de decidir se e como seria executada a infração penal. Conforme demonstrado, os acusados, na qualidade de operadores de câmbio, atuaram juntamente com o corréu Plínio Cerri de modo a fazer operar irregularmente a instituição financeira. Nesse ponto, andou bem a sentença em sua fundamentação:


"55. Cabe apenas tecer ainda algumas considerações acerca da alegação de que não seria possível a condenação em virtude da aplicação da teoria do domínio do fato. A aplicação dessa teoria pode levar à responsabilização do autor indireto, mas não é suficiente para afastar a punição criminal daqueles que, de modo direto, consciente e indispensável, contribuíram para a prática do delito. No presente caso, conforme já verificado, os acusados atuavam diretamente junto a Plínio Cerri, fazendo com que as orientações deste viessem a ser postas em prática e, destarte, que a instituição financeira viesse a operar.
56. Alargar de modo excessivo a aplicação da dita teoria do domínio do fato levaria a que apenas os chefes de quadrilhas, ou os agentes que coordenam as atividades dos demais, fossem punidos. Mas essa não é a sistemática adotada pelo Código Penal brasileiro, segundo o qual essa circunstância específica é mera agravante - o que conduz à conclusão de que também os demais agentes, aqueles que obedecem a ordens, devem ser punidos" (fls. 745/746).

Por seu turno, o crime do artigo 16 da lei 7.492/86 é de natureza comum, podendo ser cometido por pessoas diversas daquelas relacionadas no artigo 25 da mesma Lei.

Nesta senda:

"(...) 10. Segundo abalizada doutrina, a conduta prevista no artigo 16 da Lei nº 7.492/86 pode ser praticada por pessoa física ou jurídica, e não apenas por aquelas elencadas no artigo 25 do mesmo diploma, sob pena de esvaziar-se o conteúdo da norma e contrariar a lógica mais elementar. Se o núcleo do tipo é realizar operações financeiras sem autorização, por óbvio é passível de cometer o crime quem não exerce regularmente qualquer atividade no âmbito do SFN.
(ACR 200004011087092, ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO, TRF4 - OITAVA TURMA, DJ 10/08/2005 PÁGINA: 826.)

Destarte, restou demonstrado nos autos que os acusados Alexandre, Andre e Luis concorreram eficazmente para que o proprietário da empresa Plínio Cerri lograsse êxito na prática do crime previsto no artigo 16 da Lei 7.4492/86, na medida em que efetuavam as transações cambiais e que sabiam da necessidade de autorização do Banco Central para tanto, e, nos termos do artigo 29 do Código Penal, "quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade".

Desarrazoada a alegação do acusado Andre de ter sido usado por Plínio. Como ficou bem delineado nos autos, Andre não era simples funcionário. O longo tempo em que desempenhou suas atividades no estabelecimento, mais de 08 anos, o grau de liberdade de atuação, a ciência de situação irregular do estabelecimento, tudo está a denotar sua adesão voluntária e consciente na empreitada delitiva.

Da mesma forma, não prospera a tese de que se não fosse Andre, seria outra a pessoa que estaria em seu lugar, posto que isso não é suficiente para afastar sua responsabilidade criminal e, tivesse sido outro, por óbvio, seria este que estaria a responder a presente ação penal.

Improcede, a seu turno, a alegação defensiva de que o depoimento do proprietário da empresa Interpax conferiria guarida às alegações de Andre, uma vez que referida testemunha, além de confirmar que a Ibirapuera Turismo utilizava-se da Interpax para realização de contratos de câmbio - o que confere mais subsídios para a demonstração da ilícita atuação da empresa em que trabalhavam os apelantes - afirma desconhecer a função de cada um dos réus, limitando-se a declarar conhecê-los por trabalharem na Ibirapuera Turismo.

Não há dúvida, portanto, que os apelantes concorreram para a prática do crime do artigo 16 da Lei 7.492/86, sendo de rigor a manutenção do decreto condenatório, afastando qualquer alegação de responsabilização objetiva sustentada pela defesa de Andre.

Do crime de quadrilha ou bando: o crime de quadrilha ou bando (art. 288 do CP), atualmente denominado associação criminosa, por sua natureza, é autônomo e se perfaz independentemente da prática dos crimes a que os agentes objetivam perpetrar a partir da união associativa, sendo prescindível a comprovação de que houve o cometimento de crimes por integrantes da associação.

Nesse sentido situa-se o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, v.g.:


EMENTA: AÇÃO PENAL. Crime de quadrilha ou bando. Delito formal contra a paz pública. Circunstâncias elementares do tipo. Concurso de, pelo menos, quatro pessoas, finalidade específica dos agentes e estabilidade do consórcio. Exigência da prática ulterior de delito compreendido no projeto criminoso. Desnecessidade. Figura autônoma. Descrição suficiente dos fatos elementares. Denúncia apta. Impossibilidade de aprofundar a cognição dos fatos à luz da prova. HC denegado. Inteligência do art. 288 do Código Penal. Precedentes. Crime formal, o delito de quadrilha ou bando consuma-se tanto que aperfeiçoada a convergência de vontade dos agentes e, como tal, independe da prática ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas atividades criminosas.
(STF, 2ª Turma, HC 88978/DF, Rel. Min. Cesar Peluso, Dje 20.09.2007) (g.n.)
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. QUADRILHA OU BANDO ARMADO. (1) AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. FALTA DE JUSTA CAUSA. INVIABILIDADE. (2) PRISÃO PREVENTIVA. RISCO PARA A ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA. SOFISTICADO GRUPO ARMADO. ESPECIALIZADO EM EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. CONSTRANGIMENTO. AUSÊNCIA. (...) 1. A ação penal pelo crime de quadrilha não se ressente de falta de justa causa, pois, apesar de não ter sido o paciente denunciado pelas infrações penais planejadas pelo bando, tem-se a narrativa de sua contribuição para o concerto sceleris. Pontue-se que o delito do art. 288 do CP compõe-se de comportamento típico autônomo, que não depende, portanto, do advento da prática das ações idealizadas. (...)
(STJ, 6ª Turma, HC 122617, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 08.09.2009.) (g.n.)

Dessa forma, desnecessária a comprovação dos crimes que os integrantes da associação teriam praticado em unidade de desígnios e, ainda que o fim do grupo criminoso fosse a prática de crimes.

É de se registrar que, com o advento da Lei n. 12.850/2013, que deu nova redação ao artigo 288 do Código Penal, para a configuração do delito é necessária que a associação tenha o "fim específico de cometer crimes". Ou seja, os integrantes da associação devem pretender a realização de delitos determinados. Nesse sentido anota Guilherme de Souza Nucci, in "Código Penal Comentado", Ed.RT, 14a ed., 2014, pg.1195/1196:

23. Finalidade específica: a reforma introduzida pela Lei 12.850/2013 incluiu, no tipo penal, o termo específico, referindo-se ao fim dos agentes. Nada mais fez o legislador que consagrar a orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de se exigir a finalidade especial de cometer crimes, o que configura o caráter de durabilidade e estabilidade da associação, diferenciando-se do mero concurso de agentes. Por outro lado, é preciso ressaltar devam tais delitos, visados pelo agrupamento, ser determinados, vale dizer, não basta um singelo ajuntamento de pessoas que não têm a menor noção do que fazer. Por outro lado, para se concretizar a estabilidade e a permanência, devem os integrantes da associação pretender realizar mais de um delito. Não fosse assim e tratar-se-ia de concurso de agentes, como já mencionado. Acrescentem-se, ainda, serem fatos atípicos o agrupamento de pessoas com outras finalidades especiais, sem o objetivo de conturbar a paz pública, mas, sim, com a meta de chamar a atenção para a solução de algum problema. Conferir: TJSP: "Não caracterização de quadrilha ou bando [hoje, associação criminosa] - Movimento dos Sem Terra - Associação para a prática de crimes não comprovada - Invasão de propriedades com a finalidade de pressionar autoridades - Expediente que, apesar de perturbar a ordem pública, importa ilícito civil - Absolvição mantida" (Ap. 272.550-3-Andradina, 5.a C., rel. Dante Busana, 26.10.2000, v. u., JUBI 54/01).

Quanto ao ponto, a sentença a quo fundamentou a condenação dos réus pelo crime do artigo 288 do Código Penal, sobretudo no período de tempo que os acusados trabalharam juntos, pela divisão de tarefas e organização dos agentes. Veja a transcrição:


51. Com efeito, a estabilidade exigida pelo crime de quadrilha estava presente, na medida em que as mesmas quatro pessoas - Plínio Cerri e os acusados Alexandre Amarasco, Luís Carlos Kuba e André Luiz Ponzini - atuavam juntas há pelo menos 6 anos.
52. Ademais, havia a divisão de tarefas típica de uma quadrilha, sendo que Plínio Cerri cuidava de questões administrativas e os acusados efetuavam as operações de câmbio em contato direto com os clientes. Aliás, a estrutura da Ibirapuera, tipicamente empresarial, demonstra a organização dos agentes.

Todavia, não é possível considerar tais elementos como prova do crime de quadrilha, pois não se pode concluir que os acusados se reuniram com o fim de cometer delitos. Embora os acusados tenham incorrido na prática do crime tipificado no art. 16 da Lei nº 7.492/86, não haviam se associado para o fim de cometer crimes.

É imprescindível a prova do vínculo entre os indivíduos, o que não se dá com a simples reunião no ambiente de trabalho, sendo certo que a divisão de tarefas se dá pela própria estrutura da empresa.

Destarte, no caso, não se comprovou a estabilidade e a permanência da associação dos corréus a ensejar a absolvição, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.

Passo, por conseguinte, à análise da dosimetria da pena.

Os acusados LUIS e ALEXANDRE pugnam pela redução da pena, diante da falta de importância de suas atuações para a execução dos delitos, em consagração ao princípio da proporcionalidade das sanções, considerando, ainda, a baixa hierarquia de Alexandre, que tal como Luis e Andre, era subordinado à Plinio Cerri, não obstante constar no contrato social da Interpax.

Não assiste razão à defesa.

O magistrado a quo fixou acertadamente as penas-bases dos acusados acima do mínimo legal, consideradas as circunstâncias do crime, ponderando ainda pela maior culpabilidade de Alexandre, por emprestar seu nome para atuar como sócio da empresa Interpax, utilizada para dar aparência de legalidade nas operações de câmbio (fls. 746/747 e 750).

Justifica-se ainda a exasperação da pena-base em razão das circunstâncias do crime, praticado por mais de 06 anos, tal como consignado na sentença. É certo que o crime do artigo 16 da lei 7.492/86 é considerado habitual impróprio, em que uma única ação tem relevância para configurar o crime. Sua reiteração, apesar de não configurar pluralidade de crimes, constitui circunstância que deve ser ponderada negativamente. Assim, sendo incontroverso que as condutas se estenderam por período superior a 06 anos, mostra-se justa e adequada a sua valoração negativa para majorar a pena-base.

Sobre o tema, já decidiu este Tribunal Regional Federal:


PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ARTIGOS 21 E 16 DA LEI 7.492/86. ARTIGO 1º, INCISOI DA LEI 9.613/98. NULIDADE DAS INTERCEPTAÇÕES. INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE DESCREVE SUFICIENTEMENTE AS CONDUTAS ATRIBUÍVEIS AOS RÉUS. PERÍCIA. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO EM MOMENTO OPORTUNO. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS. RECURSO DA DEFESA DESPROVIDO. RECURSO DA ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO.
18.No que tange ao crime previsto no artigo 16 da Lei 7.492/86, relativamente ao réu Daniel, as circunstâncias judiciais também são parcialmente desfavoráveis ao acusado. Além do já mencionado com relação ao delito anterior, deve-se acrescentar que o crime previsto no art. 16 da Lei n. 7.492/86 é habitual impróprio. Dessa forma, esse crime não dá ensejo à continuidade delitiva, mas a reiteração dos atos criminosos, como circunstância e consequência do crime, exige uma reprimenda mais severa. Pena-base estabelecida um pouco acima do mínimo legal. (...)
(ACR 00141498220084036181, JUÍZA CONVOCADA TÂNIA MARANGONI, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/03/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Dessa forma, a pena-base de Alexandre resta mantida em 02 anos de reclusão e dos acusados Andre e Luis em 01 ano e 06 meses de reclusão, que se tornam definitivas, à míngua de agravantes e atenuantes e de causas de aumento e de diminuição da pena.

Para fixação da pena de multa deve ser observado o critério trifásico da dosimetria da pena e deve ser guardada proporcionalidade com a pena privativa de liberdade imposta ao réu. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:


HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO DA PENA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. CONSIDERÁVEL MONTANTE SONEGADO (R$ 3.473.851,33 - TRÊS MILHÕES, QUATROCENTOS E SETENTA E TRÊS MIL, OITOCENTOS E CINQUENTA E UM REAIS E TRINTA E TRÊS CENTAVOS). MAJORAÇÃO JUSTIFICADA. FIXAÇÃO DA PENA DE MULTA PROPORCIONAL AO CRITÉRIO TRIFÁSICO UTILIZADO PARA COMINAR A SANÇÃO SEGREGATIVA. REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA. VIA INADEQUADA. NECESSIDADE DE EXAME DE PROVAS. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONHECIDO E NESSA PARTE DENEGADO. (...) 3. Não há qualquer ilegalidade no quantum da pena pecuniária estabelecido, pois, in casu, foi consentâneo com o critério trifásico, respeitando-se, ainda, o parâmetro legal de no mínimo 10 e no máximo de 360 dias-multa. (...)
(STJ, HC 187.498/GO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 07/05/2013, DJe 15/05/2013)
APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 333 DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. OFERECIMENTO DE VANTAGEM INDEVIDA A POLICIAIS RODOVIÁRIOS FEDERAIS PARA DETERMINÁ-LOS A OMITIR ATO DE OFÍCIO. DOSIMETRIA. CULPABILIDADE REPROVÁVEL. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. APELAÇÃO IMPROVIDA. QUANTIDADE DE DIAS MULTA REDUZIDA DE OFÍCIO. (...)
No tocante à fixação da pena de multa, de ofício, reduzo-a para 15 (quinze) dias, tendo em vista que a quantidade de dias multa deve ser fixada de acordo com o sistema trifásico. Apelação improvida. Pena de multa, de ofício, reduzida para 15 (quinze) dias.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR 0002208-56.2009.4.03.6002, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 09/12/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/12/2014)

Dessa forma, considerados os mesmos critérios da fixação da pena privativa de liberdade, na primeira fase da fixação da pena, fixo a pena-base de Alexandre em 20 dias-multa e as penas de Luiz e André em 15 dias-multa, que restam definitivas, à míngua de agravantes, atenuantes, causas de aumento e de diminuição da pena.

O valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos resta mantido, tendo em vista a ausência elementos acerca da atual condição econômica dos réus.

Foi fixado o regime aberto para o início do cumprimento de pena, que deve ser mantido, a teor do disposto no artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal.

Mantenho ainda a substituição da pena privativa de liberdade de cada acusado por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária.

No entanto, entendo por bem reduzir o valor da prestação pecuniária para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, patamar que reputo adequado e suficiente para a repressão e prevenção do delito.

Quanto à destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, a sentença comporta reparo, posto que a mesma deve ser revertida em favor da entidade lesada com a ação criminosa, nos termos do artigo 45, §1° do Código Penal, no caso, a União.

Diante de todo o exposto:

a) rejeito as questões preliminares;

b) dou parcial provimento à apelação da defesa para absolver os réus da imputada prática do delito do artigo 288 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, de modo que a pena resulta definitiva em 02 anos de reclusão para Alexandre Amarasco e em 01 ano e 06 meses de reclusão para André Luiz Ponzini e Luis Carlos Kuba, por violação à norma do artigo 16 da Lei 7.492/86;

c) de ofício, reduzo a pena de multa de Alexandre para 20 dias-multa e de Luis e André para 15 dias-multa, cada um no piso legal;

d) de ofício, reduzo o valor da prestação pecuniária aplicada em substituição à pena privativa de liberdade para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, e altero a destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, em favor da União.

É o voto.



HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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