D.E. Publicado em 02/12/2015 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares, dar parcial provimento à apelação da defesa para absolver os réus da imputada prática do delito do artigo 288 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, de modo que a pena resulta definitiva em 02 anos de reclusão para Alexandre Amarasco e em 01 ano e 06 meses de reclusão para Andre Luiz Ponzini e Luis Carlos Kuba pelo crime do artigo 16 da Lei 7.492/86; de ofício, reduzir a pena de multa de Alexandre para 20 dias-multa e de Luis e André para 15 dias-multa, cada um no piso legal e reduzir o valor da prestação pecuniária para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, e ainda, de ofício, alterar a destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, em favor da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA: O Ministério Público Federal denunciou PLÍNIO CERRI, ALEXANDRE AMARASCO, LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ PONZINI, qualificados nos autos, nascidos aos 31/07/1932, 30/12/1969, 03/04/1967 e 28/06/1969, respectivamente, como incursos nas sanções do artigo 16 c/c o artigo 1º, parágrafo único, inciso I, ambos da Lei n. 7.492/86 e artigo 288 do Código Penal. Consta da denúncia:
A denúncia foi recebida em 22/09/2009 (fls. 327/329).
À fl. 548 foi declarada extinta a punibilidade do acusado Plínio Cerri em razão de seu falecimento, com fundamento no artigo 107, I, do Código Penal e artigo 62 do Código de Processo Penal (fl. 548).
Após instrução, sobreveio sentença da lavra do MM. Juiz Federal Marcio Ferri Catapani e publicada em 22/02/2012 (fls. 732/754 e 755) julgando procedente o pedido para:
a) condenar ALEXANDRE AMARASCO à pena de 02 anos e 08 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 31 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 60 salários mínimos em favor de entidade pública ou privada com destinação social, pelo crime do artigo 16 da Lei nº 7.492/86, em concurso formal com o crime do artigo 288 do Código Penal;
b) condenar LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ POZINI à pena de 02 anos de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 20 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 40 salários mínimos em favor de entidade pública ou privada com destinação social, pelo crime do artigo 16 da Lei nº 7.492/86, em concurso formal com o crime do artigo 288 do Código Penal.
Foi decretado o perdimento do numerário em moeda nacional e moeda estrangeira apreendidos na empresa Ibirapuera Turismo por serem tanto instrumento como produto do crime cometido, com fundamento no artigo 91, II, do Código Penal.
A sentença transitou em julgado para a Acusação, conforme certificado à fl. 796.
Apela o réu ANDRÉ LUIS PONZINI (fls. 808/858) postulando a absolvição de todas as acusações formuladas pelos seguintes argumentos:
a) ausência de indícios de que tenha praticado o crime do artigo 16 da lei 7492/86, pois nunca exerceu qualquer ato gerencial na empresa, sendo apenas um mero atendente de balcão da Ibirapuera Turismo com a função de efetuar troca de moedas dos clientes da loja. Alega que sua conduta foi irrelevante, pois, como mero funcionário, se recusasse a fazer o serviço, outra pessoa seria contratada em seu lugar. Sustenta que sempre acreditou na regularidade das atividades que da empresa em que trabalhava e que não restou demonstrado qualquer ato de gestão praticado pelo acusado na empresa para demonstrar sua participação em atos de gestão;
b) ausência de elemento subjetivo do tipo, não tendo sido demonstrado que o apelante agiu com vontade livre e consciente de fazer operar instituição financeira não autorizada, tendo sido reconhecido indevidamente a responsabilização objetiva do apelante. Informa ter se distanciado da empresa após a descoberta das irregularidades, sendo reconhecido o vínculo empregatício na justiça trabalhista;
c) atipicidade dos fatos quanto ao delito de formação de quadrilha, por ausência da prévia associação dos acusados para cometer crimes, atuando o acusado apenas como funcionário da empresa;
d) conversão do julgamento em diligencia para que seja oferecida a suspensão condicional do processo, nos termos do artigo 89 da lei 9.099/95 (sumula 337 do STJ).
Apelam os réus LUIZ CARLOS KUBA (fls. 859/877) e ALEXANDRE AMARASCO (fls. 878/899) postulando a absolvição, sob os seguintes argumentos:
a) em preliminar, a nulidade da sentença por violação ao sistema acusatório, tendo o magistrado condenado os réus pelo crime de formação de quadrilha, apesar de o MPF posicionar-se contrariamente;
b) ausência e prova da autoria delitiva, tendo todas as testemunhas confirmado que eram simples funcionários subordinados ao proprietário Plínio Cerri, sem qualquer comando ou poder de decisão, tratando-se o delito do artigo 16 da lei 7492/86 de crime próprio;
c) ausência de dolo, pois não atuaram com animus de prejudicar o sistema financeiro nacional, não sabiam da ausência de autorização para realizar operações de cambio, ocorrendo a excludente do erro de tipo (artigo 20, caput, do CP);
d) aplicação da teoria do domínio do fato, sendo que os réus não detinham poder de decidir se e como seria executada a infração penal.
e) não caracterização do crime de quadrilha ou bando por não ter sido demonstrado o liame subjetivo entre os agentes para o cometimento de crimes
f) redução da pena para o patamar mínimo, diante da falta de importância dos acusados para a execução dos delitos, em consagração ao princípio da proporcionalidade das penas, considerado ainda a baixa hierarquia de Alexandre, que tal como Luis Kuba e Andre Pozzini, era subordinado de Plinio Cerri, não obstante constar no contrato social da Interpax.
O Ministério Público Federal, em contrarrazões e parecer da lavra do DD. Procurador Regional da República Dr. Jose Augusto Simões Vagos, opinou pelo desprovimento dos recursos (fls. 905/910).
É o relatório.
Ao MM. Revisor.
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VOTO
O DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
Consta dos autos que ALEXANDRE AMARASCO, LUIS CARLOS KUBA e ANDRÉ LUIZ PONZINI foram denunciados e condenados como incursos nas sanções do artigo 16 c/c o artigo 1º, parágrafo único, inciso I, ambos da Lei n. 7.492/86, em concurso formal com o artigo 288 do Código Penal, por terem, na qualidade funcionários da empresa IBIRAPUERA TURISMO LTDA, se associado de maneira contumaz e habitual a fim de atuar no Mercado de Câmbio e Taxas Flutuantes à margem da legalidade, operando instituição financeira sem a devida autorização do Banco Central, ao operar contratos de compra e venda de moeda estrangeira, sendo que grande parte das operações não estavam acompanhadas de boletos bancários e, quando acompanhadas dos respectivos boletos, eram gerados em nome da pessoa jurídica INTERPAX TURISMO.
Apelam os réus sustentando, em suma, violação ao princípio do sistema acusatório, a ausência de comprovação da autoria e do dolo e postulando a redução da pena.
Os recursos defensivos comportam parcial provimento.
Da preliminar de nulidade por violação ao sistema acusatório.
Sustenta a defesa de Luis e Alexandre a ocorrência de violação ao princípio do sistema acusatório, ao argumento de que o magistrado sentenciante condenou os réus pelo crime de formação de quadrilha, apesar de o Ministério Público Federal posicionar-se pela absolvição, ao apresentar suas alegações finais.
A preliminar deve ser rejeitada.
O artigo 385 do Código de Processo Penal é expresso em dispor que "nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada".
Assim, consoante o princípio do livre convencimento motivado ou persuasão racional, e amparado no artigo 385 do CPP, o juiz está autorizado a proferir sentença condenatória ainda que o órgão acusatório tenha requerido a absolvição do réu, pautando-se no conjunto probatório coligido e mediante devida fundamentação.
Nesse sentido, colaciono a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, in "Código de Processo Penal Comentado", Editora Forense, 13ª edição, p. 792:
No sentido da validade do referido dispositivo, registro os precedentes do STJ:
Portanto, não há que se falar em violação ao sistema acusatório, devendo ser rejeitada a preliminar suscitada.
Do pedido de conversão do julgamento em diligência para proposta de suspensão condicional do processo.
Pleiteia a defesa do acusado Andre a conversão do julgamento em diligência, para que seja oferecida a suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da lei 9.099/95, a teor do disposto na Súmula 337 do STJ.
Não se apresentava cabível, quando do oferecimento da denúncia e da prolação da sentença, a suspensão condicional do processo, prevista no artigo 89 da Lei 9.099/1995, haja vista que para esta o requisito objetivo é de que a pena mínima cominada pela lei seja igual ou inferior a 01 (um) ano.
Muito embora a pena mínima cominada pelo artigo 16 da Lei 7.492/86, seja igual a 01 (um) ano, os réus respondem ainda, em concurso formal, pela prática do delito descrito no artigo 288 do Código Penal, devendo ser considerada então a pena do primeiro crime, mais o acréscimo mínimo de 1/6 (um sexto) relativo ao concurso formal, ultrapassando o limite estabelecido pelo artigo 89 da Lei 9.099/1995 para aplicação da suspensão condicional do processo.
Neste sentido situa-se o entendimento consolidado na Súmula 243 do Superior Tribunal de Justiça:
Assim, no momento do oferecimento da denúncia e da prolação da sentença condenatória, não cabia a proposta de suspensão condicional do processo, a teor da Súmula n. 243 do STJ.
Ademais, a suspensão do processo é pertinente antes do processamento do feito, porque visa justamente evitar levar adiante a persecução penal em juízo, desde que preenchidos os requisitos legais. Dessa forma, após todo o processado, inclusive sentenciado o feito, inadequado requerer-se a suspensão do que já ocorreu, do que já se ultimou.
Ainda que ocorra eventual modificação da imputação nesta sede recursal ou, ainda, absolvição de um dos crimes, resta inviabilizada a pretendida suspensão, ante a superação da fase apropriada.
Nesse sentido julgado desta Corte:
Superada a preliminar cumpre apreciar o mérito recursal.
A materialidade delitiva do crime do artigo 16 da lei 7.492/86 (fazer operar, sem a devida autorização, instituição financeira, inclusive de câmbio) restou bem comprovada pelos documentos apreendidos na sede da empresa Ibirapuera Turismo, quando da diligência policial, em 14/12/2007, em especial pelos boletos de compra e venda de moeda estrangeira, caneta detectora de cédulas falsas, cartões de visita em nome de "Ibirapuera Câmbio Turismo Ltda", máquina de contagem de dinheiro, moeda nacional e estrangeira em grande quantidade e cheques de clientes (auto de apreensão - fls. 34/35).
Consoante ofício do BACEN, a empresa Ibirapuera Turismo Ltda. iniciou suas atividades em 16/03/1992, mas esteve credenciada para operar no Mercado de Câmbio e de Taxas Flutuantes apenas no período de 09/11/1994 e 09/12/1994 e entre 01/03/1995 e 05/08/1997 (fls. 92/93).
Os próprios acusados confirmaram na fase policial que a empresa desenvolvia tal atividade sem autorização do Banco Central do Brasil, a quem compete, diga-se, autorizar o funcionamento de instituições financeiras no país (art. 18 da Lei nº 4595/64).
A autoria delitiva também é inconteste.
Os apelantes Alexandre, Luis e Andre postulam a absolvição por ausência de provas de que tenham praticado o crime do artigo 16 da lei 7492/86, ao argumento que nunca exerceram qualquer ato gerencial na empresa, pois eram meros atendentes de balcão, com a função de efetuar troca de moedas dos clientes, sendo que estavam subordinados ao proprietário da empresa Plínio Cerri (já falecido). André ainda sustenta que sua conduta foi irrelevante, pois, como mero funcionário, se recusasse a fazer o serviço, outra pessoa seria contratada em seu lugar, e afirma que sempre acreditou na regularidade das atividades da empresa que laborava.
Dispõe o artigo 16 da lei 7.492/86:
Inicialmente, observo que a empresa IBIRAPUERA TURISMO enquadra-se no conceito de instituição financeira por equiparação, a teor do que dispõe o artigo 1º, inciso I, da Lei nº 7.492/86.
E conforme interrogatórios judiciais dos acusados Alexandre, Andre e Luis, a empresa transacionava diariamente moedas estrangeiras (mídia de fl. 616).
É certo que Plínio Cerri, falecido, era o proprietário da empresa IBIRAPUERA TURISMO, conforme se verifica das alterações do contrato social (fls. 449/473), ao passo que os acusados ANDRE, LUIS e ALEXANDRE trabalhavam no balcão da empresa, como operadores de câmbio.
Contudo, ao contrário do sustentado pela defesa, o fato dos funcionários não possuírem formalmente poderes de gestão e administração na empresa não tem o condão de afastá-los da responsabilidade penal pelas infrações cometidas.
Com efeito, todos os acusados tinham plena ciência da necessidade de autorização do Banco Central para efetuar transações de compra e venda de moeda estrangeira, sendo que a empresa em que trabalhavam atuava desprovida dessa autorização.
Quanto ao ponto, convém registrar que Luis e Andre trabalharam na casa de câmbio por 06 e 08 anos, respectivamente (fls. 10/14 e mídia de fl. 616), confirmando que, na maioria das vezes, não emitiam os respectivos boletos dos contratos de câmbio, e quando solicitados, emitia-os em nome de outra empresa, a INTERPAX, o que demonstra claramente a ciência de que a Ibirapuera Turismo atuava na ilegalidade.
Alexandre Amarasco, por sua vez, trabalhou por 10 anos como gerente na IBIRAPUERA TURISMO, além de figurar como sócio da INTERPAX TURISMO, empresa utilizada pela Ibirapuera Turismo para emitir os boletos, quando solicitados pelos clientes, a fim de conferir aparente legalidade ao negócio (conforme por ele admitido às fls. 8/10). Alexandre ainda afirmou aos policiais que a autorização para funcionamento da empresa Ibirapuera havia sido cassada (fl. 03).
Assim, resta demonstrado que os acusados, apesar de não possuírem formalmente poderes de gestão e administração na empresa, sabiam das ilegalidades das operações cambiais, da necessidade de outorga do Banco Central e da situação de irregularidade da empresa em que trabalhavam por muitos anos.
Os próprios acusados Luis e Andre afirmaram, na fase judicial, que a única atividade da empresa Ibirapuera Turismo era a realização de operações de câmbio e que somente emitiam boletos da empresa Interpax quando solicitados pelos clientes, o que por si só já demonstra a irregularidade nas transações.
Em juízo, o réu Luis confirmou que sabia que a empresa não estava regularizada e que emitiam boletos em nome da Interpax. André afirmou que a empresa Ibirapuera emitia boletos em nome da Interpax há aproximadamente 08 anos.
Denota-se, diante desse contexto, onde os acusados atuaram por longo período em empresa de pequeno porte, com exíguo quadro de funcionários, experientes na atividade que então desenvolviam, que suas atuações extrapolaram a simples função de operadores de câmbio, não estando distantes, como que se quer fazer crer, da administração central do estabelecimento.
Apesar de não possuírem poder de administração, aderiram, cônscios da situação de irregularidade que envolvia o negócio, à atividade ilícita ali desenvolvida, não lhes socorrendo a singela alegação de que eram apenas operadores de balcão, empregados do falecido corréu Plínio.
As alegações apresentadas pelos réus em seus interrogatórios são inverossímeis e não encontram o mínimo amparo probatório nos autos.
Ora, os apelantes trabalharam por longo período no estabelecimento, não sendo razoável a afirmação que desconheciam a situação irregular vivenciada, o que mais se acentua com o fato de que os boletos, quando emitidos, eram feitos em nome de outra empresa, a INTERPAX.
Em que pese o esforço dos apelantes em apontar como único responsável pela empreitada criminosa o falecido corréu Plinio, os elementos dos autos demonstram que todos participavam efetivamente da prática do crime em foco.
Haure-se dos depoimentos prestados pelos apelantes quando da prisão em flagrante delito, que Plínio não era o único responsável pelo funcionamento do negócio irregular, tanto que o réu Alexandre foi apontado como o responsável pela administração nas ausências de Plínio, sendo que este, segundo declarou Andre (fls. 13), comparecia à empresa de 2ª à 5ª feira. Aliás, no próprio dia da diligência policial na empresa, Plinio não se encontrava no estabelecimento. A testemunha de acusação Sérgio Vieira Araújo (mídia de fls. 547), segurança do shopping, declarou que Plinio não era visto constantemente no local do estabelecimento.
E mais, o mesmo Andre, que em Juízo buscou eximir-se de qualquer responsabilidade criminal, questionado na fase policial sobre as orientações acerca dos trabalhos realizados, asseverou: "é natural da empresa ... não teve ninguém que disse, faz assim ou do outro jeito... fui trabalhando de acordo com a norma da casa. Se a pessoa quer comprar sem boleto, vende assim... se quer com, vende com boleto" (fls. 13).
Como se nota, o grau de liberdade na atuação dos apelantes não condiz com a alegada estrutura rígida de subordinação ao proprietário Plínio.
Não há que se falar em ausência de dolo em fraudar o Sistema Financeiro Nacional por desconhecimento da ausência de autorização da empresa para realizar operações de câmbio, ocorrendo a excludente do erro de tipo (artigo 20, caput, do CP). Todos os acusados tinham ciência da necessidade da autorização do Banco Central para celebração de contratos de compra e venda de moeda estrangeira, bem como estavam cônscios que a empresa em que trabalhavam não tinha essa autorização. Ademais, confirmaram nas fases policial e judicial que na maior parte das vezes não emitiam os boletos de câmbio, e quando o faziam, emitam em nome de outra empresa.
Inaplicável ao caso a teoria do domínio do fato, ao argumento que os réus não detinham poder de decidir se e como seria executada a infração penal. Conforme demonstrado, os acusados, na qualidade de operadores de câmbio, atuaram juntamente com o corréu Plínio Cerri de modo a fazer operar irregularmente a instituição financeira. Nesse ponto, andou bem a sentença em sua fundamentação:
Por seu turno, o crime do artigo 16 da lei 7.492/86 é de natureza comum, podendo ser cometido por pessoas diversas daquelas relacionadas no artigo 25 da mesma Lei.
Nesta senda:
Destarte, restou demonstrado nos autos que os acusados Alexandre, Andre e Luis concorreram eficazmente para que o proprietário da empresa Plínio Cerri lograsse êxito na prática do crime previsto no artigo 16 da Lei 7.4492/86, na medida em que efetuavam as transações cambiais e que sabiam da necessidade de autorização do Banco Central para tanto, e, nos termos do artigo 29 do Código Penal, "quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Desarrazoada a alegação do acusado Andre de ter sido usado por Plínio. Como ficou bem delineado nos autos, Andre não era simples funcionário. O longo tempo em que desempenhou suas atividades no estabelecimento, mais de 08 anos, o grau de liberdade de atuação, a ciência de situação irregular do estabelecimento, tudo está a denotar sua adesão voluntária e consciente na empreitada delitiva.
Da mesma forma, não prospera a tese de que se não fosse Andre, seria outra a pessoa que estaria em seu lugar, posto que isso não é suficiente para afastar sua responsabilidade criminal e, tivesse sido outro, por óbvio, seria este que estaria a responder a presente ação penal.
Improcede, a seu turno, a alegação defensiva de que o depoimento do proprietário da empresa Interpax conferiria guarida às alegações de Andre, uma vez que referida testemunha, além de confirmar que a Ibirapuera Turismo utilizava-se da Interpax para realização de contratos de câmbio - o que confere mais subsídios para a demonstração da ilícita atuação da empresa em que trabalhavam os apelantes - afirma desconhecer a função de cada um dos réus, limitando-se a declarar conhecê-los por trabalharem na Ibirapuera Turismo.
Não há dúvida, portanto, que os apelantes concorreram para a prática do crime do artigo 16 da Lei 7.492/86, sendo de rigor a manutenção do decreto condenatório, afastando qualquer alegação de responsabilização objetiva sustentada pela defesa de Andre.
Do crime de quadrilha ou bando: o crime de quadrilha ou bando (art. 288 do CP), atualmente denominado associação criminosa, por sua natureza, é autônomo e se perfaz independentemente da prática dos crimes a que os agentes objetivam perpetrar a partir da união associativa, sendo prescindível a comprovação de que houve o cometimento de crimes por integrantes da associação.
Nesse sentido situa-se o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, v.g.:
Dessa forma, desnecessária a comprovação dos crimes que os integrantes da associação teriam praticado em unidade de desígnios e, ainda que o fim do grupo criminoso fosse a prática de crimes.
É de se registrar que, com o advento da Lei n. 12.850/2013, que deu nova redação ao artigo 288 do Código Penal, para a configuração do delito é necessária que a associação tenha o "fim específico de cometer crimes". Ou seja, os integrantes da associação devem pretender a realização de delitos determinados. Nesse sentido anota Guilherme de Souza Nucci, in "Código Penal Comentado", Ed.RT, 14a ed., 2014, pg.1195/1196:
Quanto ao ponto, a sentença a quo fundamentou a condenação dos réus pelo crime do artigo 288 do Código Penal, sobretudo no período de tempo que os acusados trabalharam juntos, pela divisão de tarefas e organização dos agentes. Veja a transcrição:
Todavia, não é possível considerar tais elementos como prova do crime de quadrilha, pois não se pode concluir que os acusados se reuniram com o fim de cometer delitos. Embora os acusados tenham incorrido na prática do crime tipificado no art. 16 da Lei nº 7.492/86, não haviam se associado para o fim de cometer crimes.
É imprescindível a prova do vínculo entre os indivíduos, o que não se dá com a simples reunião no ambiente de trabalho, sendo certo que a divisão de tarefas se dá pela própria estrutura da empresa.
Destarte, no caso, não se comprovou a estabilidade e a permanência da associação dos corréus a ensejar a absolvição, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
Passo, por conseguinte, à análise da dosimetria da pena.
Os acusados LUIS e ALEXANDRE pugnam pela redução da pena, diante da falta de importância de suas atuações para a execução dos delitos, em consagração ao princípio da proporcionalidade das sanções, considerando, ainda, a baixa hierarquia de Alexandre, que tal como Luis e Andre, era subordinado à Plinio Cerri, não obstante constar no contrato social da Interpax.
Não assiste razão à defesa.
O magistrado a quo fixou acertadamente as penas-bases dos acusados acima do mínimo legal, consideradas as circunstâncias do crime, ponderando ainda pela maior culpabilidade de Alexandre, por emprestar seu nome para atuar como sócio da empresa Interpax, utilizada para dar aparência de legalidade nas operações de câmbio (fls. 746/747 e 750).
Justifica-se ainda a exasperação da pena-base em razão das circunstâncias do crime, praticado por mais de 06 anos, tal como consignado na sentença. É certo que o crime do artigo 16 da lei 7.492/86 é considerado habitual impróprio, em que uma única ação tem relevância para configurar o crime. Sua reiteração, apesar de não configurar pluralidade de crimes, constitui circunstância que deve ser ponderada negativamente. Assim, sendo incontroverso que as condutas se estenderam por período superior a 06 anos, mostra-se justa e adequada a sua valoração negativa para majorar a pena-base.
Sobre o tema, já decidiu este Tribunal Regional Federal:
Dessa forma, a pena-base de Alexandre resta mantida em 02 anos de reclusão e dos acusados Andre e Luis em 01 ano e 06 meses de reclusão, que se tornam definitivas, à míngua de agravantes e atenuantes e de causas de aumento e de diminuição da pena.
Para fixação da pena de multa deve ser observado o critério trifásico da dosimetria da pena e deve ser guardada proporcionalidade com a pena privativa de liberdade imposta ao réu. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Dessa forma, considerados os mesmos critérios da fixação da pena privativa de liberdade, na primeira fase da fixação da pena, fixo a pena-base de Alexandre em 20 dias-multa e as penas de Luiz e André em 15 dias-multa, que restam definitivas, à míngua de agravantes, atenuantes, causas de aumento e de diminuição da pena.
O valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos resta mantido, tendo em vista a ausência elementos acerca da atual condição econômica dos réus.
Foi fixado o regime aberto para o início do cumprimento de pena, que deve ser mantido, a teor do disposto no artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal.
Mantenho ainda a substituição da pena privativa de liberdade de cada acusado por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária.
No entanto, entendo por bem reduzir o valor da prestação pecuniária para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, patamar que reputo adequado e suficiente para a repressão e prevenção do delito.
Quanto à destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, a sentença comporta reparo, posto que a mesma deve ser revertida em favor da entidade lesada com a ação criminosa, nos termos do artigo 45, §1° do Código Penal, no caso, a União.
Diante de todo o exposto:
a) rejeito as questões preliminares;
b) dou parcial provimento à apelação da defesa para absolver os réus da imputada prática do delito do artigo 288 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, de modo que a pena resulta definitiva em 02 anos de reclusão para Alexandre Amarasco e em 01 ano e 06 meses de reclusão para André Luiz Ponzini e Luis Carlos Kuba, por violação à norma do artigo 16 da Lei 7.492/86;
c) de ofício, reduzo a pena de multa de Alexandre para 20 dias-multa e de Luis e André para 15 dias-multa, cada um no piso legal;
d) de ofício, reduzo o valor da prestação pecuniária aplicada em substituição à pena privativa de liberdade para 15 salários mínimos para Alexandre e 10 salários mínimos para os réus Andre e Luis, e altero a destinação da pena de prestação pecuniária, substitutiva da pena privativa de liberdade, em favor da União.
É o voto.
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