Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/12/2015
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007518-12.2011.4.03.6119/SP
2011.61.19.007518-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : EDUARDO RAMOS DE MOURA
ADVOGADO : SP147979 GILMAR DA SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00075181220114036119 6 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 183 DA LEI 9.472/97. ATIVIDADE ILEGAL DE TELECOMUNICAÇÕES. MATERIALIADADE E AUTORIA COMPROVADAS. MULTA. INCONSTITUCIONALIDADE. SISTEMÁTICA DA PARTE GERAL DO CÓDIGO PENAL. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. A materialidade e autoria do delito estão devidamente comprovadas nos autos, através dos seguintes documentos: notitia criminis efetuada pela ANATEL em relação à conduta do réu (fls. 04/10); Relatório Técnico (fls. 13/14); Relatório de Fiscalização (fls. 38/41); Auto de Infração lavrado pela ANATEL (fl. 42); Termo de Apreensão (fls. 43/48); contrato de locação (fls. 49/50), além dos depoimentos prestados pelo réu e pelas testemunhas na esfera policial e perante o juízo.
2. Quanto à pena de multa, tenho que a dosimetria deve ser feita pelos critérios previstos na Parte Geral do Código Penal, já que sua fixação em valor fixo de R$ 10.000,00 (dez mil reais), conforme previsto no art. 183, da Lei 9.472/97, viola o princípio constitucional de individualização da pena. Precedentes desta E. Corte Regional.
3. Assim, deve ser revista, ex officio, a pena de multa aplicada ao réu para, fixando-a de modo proporcional ao cálculo realizado na r. sentença de primeiro grau para a determinação da pena privativa de liberdade, em 10 (dez) dias- multa, mantido o valor unitário do dia- multa no mínimo legal, à míngua de outros elementos nos autos que permitam sua majoração.
4. Por derradeiro, concedo ao réu a isenção do pagamento das custas processuais, vez que pobre na acepção jurídica do termo.
5. Recurso de apelação parcialmente provido, apenas para isentar o réu das custas processuais; de ofício, altera-se o modo de fixação da pena de multa, substituindo a multa prevista o art. 183, da Lei 9.472/97 pela sistemática prevista na Parte Geral do Código Penal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação, apenas para isentar o réu das custas processuais e, de ofício, alterar o modo de fixação da pena de multa, substituindo a multa prevista o art. 183, da Lei 9.472/97 pela sistemática prevista na Parte Geral do Código Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de novembro de 2015.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007518-12.2011.4.03.6119/SP
2011.61.19.007518-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : EDUARDO RAMOS DE MOURA
ADVOGADO : SP147979 GILMAR DA SILVA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00075181220114036119 6 Vr GUARULHOS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CRIMINAL interposta por EDUARDO RAMOS DE MOURA contra sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 6ª Vara Federal em Guarulhos/SP, que o condenou pela prática do crime previsto no artigo 183, da Lei 9.472/97, por exercer clandestinamente atividade de telecomunicação, à pena de 02 (dois) anos de detenção, em regime aberto, além do pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

A r. sentença substituiu a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, concernentes em prestação pecuniária de 04 (quatro) salários mínimos e multa de 100 (cem) dias-multa, fixado o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos. Outrossim, autorizou ao réu recorrer em liberdade.

Estão na denúncia os fatos que seguem:


"Em 24 de agosto de 2010, na R. Luiz Coladello, nº 65, bairro Parque Continental II, em Guarulhos/SP, EDUARDO RAMOS DE MOURA foi surpreendido ao manter e operar emissora de radiodifusão sonora autodenominada "RÁDIO CRISTAL FM", sem a devida outorga do Ministério das Comunicações e sem a competente autorização para uso de radiofrequência expedida pela ANATEL - agência reguladora.
No local, os agentes de fiscalização encontraram equipamentos de radiodifusão, os quais foram apreendidos (fl. 43/44) e devidamente analisados (fl. 46-48). Foi verificado que o transmissor operava na frequência de 102,9 Mhz e que tinha potência de 305 Watts.
Na data de 03.09.2009, no endereço supracitado, agentes de fiscalização da ANATEL haviam constatado o funcionamento de atividade clandestina de rádio, operando serviço de radiodifusão sonora em FM e utilizando radiofrequência sem autorização da agência reguladora. Naquela oportunidade, contudo, não foi possível efetuar a interrupção da atividade nem a apreensão dos equipamentos em razão de o imóvel encontrar-se fechado e vazio.
Diante de tais constatações, foram apreendidos os seguintes bens (fl. 43-44): um transmissor de FM sem identificação e sem modelo aparente; um receptor de link sem identificação e sem modelo aparente; uma antena dipolo de 2 elementos sem identificação e sem modelo aparente; e uma antena Yagi de 3 elementos sem identificação e sem modelo aparente."
(...)

(fls. 86/87, destaques no original)


A denúncia foi recebida em 20.10.2011 (fl. 88).

A resposta à acusação foi apresentada, fls. 106/108.

Rejeitada a absolvição sumária, fls. 110/111, foi designada audiência de instrução e determinado a oitiva das testemunhas e o interrogatório do acusado, os quais foram devidamente realizados (termos constantes de fls. 127/130 e 149/152).

Alegações finais às fls. 170/172 (parquet) e 175/178 (defesa).

A sentença condenatória foi proferida às fls. 180/187, na data de 01.04.2014.

Inconformada, a defesa de EDUARDO RAMOS DE MOURA interpôs recurso de apelação e em suas razões, fls. 202/207, requer sua absolvição, tendo em vista a ausência de provas de que os aparelhos de telecomunicação apreendidos eram de sua propriedade.

Por derradeiro, pretende obter a isenção do pagamento das custas processuais, vez que pobre na acepção jurídica do termo.

Com as contrarrazões do Ministério Público Federal às fls. 209/215, os autos subiram a esta E. Corte Regional.

Em parecer de lavra da Exma. Procuradora Regional da República, Dra. Sônia Maria Curvello, fls. 217/220, manifestou-se o parquet pelo desprovimento do recurso de apelação e aplicação, ex officio, do sistema de dias-multa previsto na Parte Geral do Código Penal em substituição à multa prevista no art. 183, da Lei 9.472/97.

Dispensada a revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.


VOTO

Autoria e materialidade.

A materialidade e autoria delitivas restaram demonstradas pelos seguintes documentos: notitia criminis efetuada pela ANATEL em relação à conduta do réu (fls. 04/10); Relatório Técnico (fls. 13/14); Relatório de Fiscalização (fls. 38/41); Auto de Infração lavrado pela ANATEL (fl. 42); Termo de Apreensão (fls. 43/48); contrato de locação (fls. 49/50), bem como através dos depoimentos prestados pelo réu e pelas testemunhas na esfera policial e perante o juízo.

O réu procura se isentar da responsabilidade penal decorrente de manter em funcionamento rádio ilegal ("RÁDIO CRISTAL FM") acusando que seria de propriedade de José Carlos Gusti, conhecido em Guarulhos/SP como J.J. Carlos, por ser radialista e músico popular.

Entretanto, não é esta a verdade que decorre do quadro probatório constante destes autos.

Em primeiro lugar, deve-se considerar que o contrato de locação do imóvel em que funcionava a referida rádio ilícita foi celebrado entre o proprietário do imóvel, Sr. Moacir Cícero dos Santos, e o réu, EDUARDO RAMOS DE MOURA, fls. 49/50.

O réu, quanto a esse ponto, alega em suas razões de recurso que o contrato se encontrava expirado, o que afastaria sua responsabilidade sobre a rádio pirata.

Entretanto, tem-se que o aludido contrato foi subscrito pelo réu em 26.12.2007, com prazo de doze meses, mas ainda se encontrava em vigor diante do disposto no art. 56, p. único, da Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato):


"Parágrafo único. Findo o prazo estipulado, se o locatário permanecer no imóvel por mais de trinta dias sem oposição do locador presumir-se-á prorrogada a locação nas condições ajustadas, mas sem prazo determinado."

Essa era a situação reinante na ocasião, em que, embora formalmente expirado o contrato de locação do imóvel em que funcionava a RÁDIO CRISTAL FM, esse negócio jurídico se encontrava vigente, pois o locatário permanecia utilizando regularmente o imóvel.

De outra parte, deve-se considerar o argumento trazido pelo parecer ministerial em segunda instância, no sentido de que as coisas que se encontram no imóvel presumem-se estejam na posse direta do locatário (art. 1.209, do Código Civil).

As testemunhas de acusação, MARCELLO SEGGIARO NAZARETH e HÉLIO LOPES DE CARVALHO FILHO, ambos técnicos da ANATEL, ouvidos em juízo, confirmaram essa versão dos fatos, indicando que EDUARDO RAMOS era o responsável pela rádio clandestina.

A testemunha de defesa, ALAÍDE BARROSO DE CARVALHO, também confirmou que EDUARDO RAMOS DE MOURA era responsável pela rádio clandestina e também ocupava algumas vezes na semana a função de locutor.

Frise-se também que no ano de 2000 o réu já fora processado pelo mesmo tipo penal (exercício ilegal de atividade de telecomunicações).

Em último lugar, a defesa não logrou carrear aos autos qualquer prova que indicasse ser propriedade de José Carlos Gusti a malfadada "RÁDIO CRISTAL FM".

Ante todos estes argumentos, a manutenção da sentença condenatória é medida que se impõe.

Dosimetria da pena.

Inexiste insurgência da defesa de EDUARDO RAMOS DE MOURA quanto à dosimetria da pena privativa de liberdade, devendo ser mantida integralmente como fixado na r. sentença recorrida, vez que atenta aos ditames legais e parâmetros jurisprudenciais aplicáveis à espécie.

A pena corporal foi substituída por duas restritivas de direitos, concernentes em prestação pecuniária de 04 (quatro) salários mínimos e multa de 100 (cem) dias-multa, fixado o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos.

Quanto à pena de multa, tenho que a dosimetria deve ser feita pelos critérios previstos no Código Penal, já que sua fixação em valor fixo de r$ 10.000,00 (dez mil reais) viola o princípio constitucional de individualização da pena, conforme já decidiu esta E. Corte Regional, in verbis:


"PENAL - PROCESSUAL PENAL - RADIODIFUSÃO - LEI 9472/97 - ARTIGO 183 - PENA PECUNIÁRIA - VALOR FIXO - ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - REDISTRIBUIÇÃO POR PREVENÇÃO - REGULARIDADE - QUESTÃO DE ORDEM REJEITADA - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA - ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE ACOLHIDA. 1. O juízo natural para decidir sobre a argüição de inconstitucionalidade é o Órgão Especial, não havendo irregularidade na redistribuição do presente feito por dependência, porquanto trata de matéria idêntica a do feito anteriormente distribuído a Relatora, ou seja, a arguição de inconstitucionalidade na fixação da multa prevista no preceito secundário do artigo 183, da Lei 9472/97. Questão de ordem rejeitada. 2. A norma contida no preceito secundário do artigo 183, da Lei 9.472/97, que prevê a pena pecuniária em valor fixo, viola o princípio da individualização da pena, previsto no artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal. 4.Argüição acolhida para declarar a inconstitucionalidade da expressão "de R$10.000,00", contida no preceito secundário do artigo 183, da Lei 9472/97." - Grifei.
(TRF3 - ACR 18163 (Proc. 0005455-18.2000.4.03.6113) - ORGÃO ESPECIAL - rel. Des. Fed. RAMZA TARTUCE, j. 29/06/2011, e-DJF3 Judicial 1 28/07/2011)

Assim, deve ser revista, ex officio, a pena de multa aplicada ao réu para, fixando-a de modo proporcional ao cálculo realizado na r. sentença de primeiro grau para a determinação da pena privativa de liberdade, em 10 (dez) dias- multa, mantido o valor unitário do dia- multa no mínimo legal, à míngua de outros elementos nos autos que permitam sua majoração.

Por derradeiro, concedo ao réu a isenção do pagamento das custas processuais, vez que pobre na acepção jurídica do termo.

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, apenas para isentar o réu do pagamento das custas processuais, e, ex officio, alterar o modo de fixação da pena de multa, substituindo a multa prevista o art. 183, da Lei 9.472/97 pela sistemática prevista na Parte Geral do Código Penal, conforme exposto no voto, mantendo, no restante, a r. sentença recorrida.

É COMO VOTO.


PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): Paulo Gustavo Guedes Fontes:10067
Nº de Série do Certificado: 55DD429704881053FA1DF33F8C7D3FAA
Data e Hora: 25/11/2015 14:30:32