D.E. Publicado em 02/12/2015 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a r. sentença de fls. 144/155, que recebeu parcialmente a denúncia oferecida contra Roberto Nei de Jesus Rocha e Raul Viana de Souza, rejeitando-a em relação aos crimes previstos nos artigos 180 e 311, do Código Penal (respectivamente, receptação e adulteração de sinal identificador de veículo automotor), com fulcro no art. 395, inciso I, do Código de Processo Penal, ao fundamento de que, em relação a estes, a inicial não descreveu o fato ilícito imputado com todas as suas circunstâncias, sendo manifestamente inepta.
Quanto ao delito tipificado no art. 157, § 2º, II, c.c. art. 14, II, do Código Penal, o MMº Juízo recebeu a denúncia, reputando presentes os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal.
Da parte em que rejeitada a denúncia, recorreu o "parquet" federal, na forma das razões de fls. 2/12, para o fim de recebê-la, ao argumento de que todas as circunstâncias relevantes à identificação do fato típico, antijurídico e culpável imputado aos denunciados encontram-se plenamente descritas na inicial, presente o quis (autores do crime), quomodo (por qual maneira) e ubi (quando).
Aduz que o acusado se defende dos fatos imputados e não de sua capitulação jurídica, pugnando pela reforma da sentença para o recebimento da inicial acusatória em sua integralidade.
O recurso foi recebido à fl. 165.
As contrarrazões de recurso em sentido estrito foram oferecidas pela Defensoria Pública da União às fls.167/170, representando o acusado Raul Viana de Souza, pelo desprovimento do recurso e pelo defensor de Roberto Nei de Jesus Rocha, no mesmo sentido (fls. 177/182).
A r. decisão recorrida foi mantida, pelos seus próprios fundamentos (fl. 183).
Parecer do Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso interposto pela acusação (fls. 185/188).
É o relatório.
Dispensada a revisão, na forma regimental.
VOTO
Consta da denúncia que no dia 02 de outubro de 2013, na Rua Hamilton Veloso da Silva, esquina com a Rua Colima, Jd. Cliper, na cidade de São Paulo, os denunciados foram surpreendidos em flagrante delito quando, agindo em concurso e unidade de desígnios, mediante grave ameaça consistente na simulação de emprego de arma de fogo, tentavam subtrair em proveito comum encomendas diversas do interior de veículo pertencente aos Correios, conduta tipificada no artigo 157, §2º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal. Ainda, nos termos da exordial acusatória, nesta mesma oportunidade, os acusados conduziam o veículo GM Vectra, placas EBM 4834/SP, que sabiam ser produto de roubo, utilizando-o na empreitada criminosa, conduta tipificada no art. 180, do Código Penal, sendo que as placas desse veículo foram adulteradas, por mão própria ou a mando dos acusados, em seu proveito, conduta descrita no art. 311 do Código Penal.
A decisão que não recebeu parte da denúncia veio fundamentada na ausência dos requisitos do art.41 do Código de Processo Penal, porquanto não descritos os fatos em todas as suas circunstâncias quanto aos dois tipos penais (artigos 180 e 311 do estatuto repressivo).
Passo, então ao exame da matéria.
De início, em relação aos crimes objeto de rejeição da denúncia, esta se reservou a descrevê-los na forma que ora transcrevo:
"Ainda, na mesma data e local, ROBERTO e RAUL conduziram o veículo GM VECTRA, placas EBM 4834/SP, que sabiam ser produto de roubo, utilizando-o na empreitada criminosa, conduta tipificada no artigo 180 do Código Penal. As placas desse veículo, de que se serviam os acusados, foram adulteradas, por mão própria ou a seu mando, em seu proveito, o que constitui a conduta típica descrita no art. 311 do Código Penal...O veículo GM Vectra conduzido pelos acusados fora roubado em 24 de maio de 2013, conforme se lê da cópia do Boletim de Ocorrência nº 1980/2013/48º DP, acostado à fls.19/20. Originalmente, o veículo tinha placas EBM 4834, porém, com o fito de ocultar o produto do roubo, tal signo foi adulterado após a subtração, feito irreconhecível por meio da utilização da placa dublê DRI 7040/SP".
Na r. decisão recorrida, o MMº Juiz salientou que a denúncia cingiu-se a mencionar, de passagem, a existência dos crimes de receptação e adulteração de sinal identificador de veículo, sem, contudo, descrever de forma circunstanciada as condutas praticadas pelos denunciados.
Por tais razões, a exordial inviabilizaria o direito de defesa, a violar também os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, garantias fundamentais inseridas na Constituição Federal (art. 5º, incisos LIV e LV).
Com efeito, dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal:
"Art.41 - A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as duas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais possa identifica-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas".
Do confronto dos termos da denúncia com a norma que rege seus requisitos de admissibilidade, verifico acertada a r. decisão recorrida.
Observa-se que a inicial acusatória apenas faz menção à existência dos dois crimes, receptação e adulteração de sinal identificador do veículo, sem detalhamento das condutas.
Assim, em relação ao crime de receptação, a inicial não descreve de quem ou em que circunstâncias os acusados receberam o veículo, não indicando o fundamento para a premissa de que sabiam ser o veículo produto de roubo.
Do mesmo modo, em relação ao crime de adulteração, a denúncia sequer indica como teria sido feita a adulteração, lançando mão de imputação alternativa, conforme bem observou a defesa, diante da assertiva: - "(adulteraram de mão própria OU determinaram que alguém o fizesse)" -.
De relevo a constatação do próprio Ministério Público Federal ao consignar em Parecer que a partir de superficial afirmação contida na denúncia, não se pode inferir que os réus receberam o veículo em tela e, tampouco se sabiam ser produto de crime. A circunstância sobreleva essencialmente porque o crime de receptação tem por elemento subjetivo o dolo direto, a ciência da origem ilícita do bem, faltando na acusação a elementar do tipo de receptação.
Já, em relação ao crime de adulteração não há a mínima demonstração da troca das placas do veículo e se tenha sido efetuada pelos denunciados, faltando à inicial substrato fático imprescindível ao acolhimento da denúncia.
As assertivas merecem reconhecimento.
A denúncia é peça que deve conter os requisitos mínimos para que o réu possa exercer a defesa da imputação que lhe é dirigida e para que o juiz avalie a justa causa que lhe embasa.
Ao exame da denúncia há dois tipos de circunstâncias que devem ser referidas: as elementares e as identificadoras.
As elementares são as circunstâncias de fato que correspondem aos elementos do tipo penal. A descrição dessas circunstâncias deve ser feita com dados fáticos da realidade, não bastando a repetição da descrição típica. Esta serve de modelo, que deve ser preenchido com os elementos do fato concreto. Assim, por exemplo, na denúncia por estelionato não basta referir que houve meio fraudulento; há necessidade de descrevê-lo (...).A imputação do fato deve ser sempre afirmativa e positiva (...). Na denúncia a dúvida é impertinente.
O órgão acusatório não pode jamais apresentar ao juiz duas versões contra o mesmo réu, deixando que uma delas prevaleça ao final. Tal medida impossibilita a ideal e ampla defesa pelo acusado, que seria obrigado a apresentar argumentos em vários sentidos, sem saber, afinal, contra qual conduta se volta o Estado-acusação. (in Código de Processo Penal Comentado, Nucci Guilherme de Souza, 10ª ed.pág.163).
Tais questões estão umbilicalmente ligadas à justa causa para a acolhida e prosseguimento da ação penal.
Ante tais fundamentos, comungando com entendimento externado na r. sentença recorrida, nego provimento ao recurso.
É como voto.
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