D.E. Publicado em 02/03/2016 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos recursos de apelação do Ministério Público Federal e da defesa da acusada Silviane Isidorio, mantendo-se integralmente a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e por Silviane Isidorio contra a sentença que:
Recorre o Ministério Público Federal com os seguintes argumentos:
A seu turno, a defesa recorre com os seguintes argumentos:
a) não é possível considerar a acusada como sujeito ativo do delito do art. 5º da Lei n. 7.492/86, pois era, à época, técnica bancária, que "exercia eventualmente e/ou por designação não efetiva a função de gerente de atendimento" (fl. 191), sem nenhum poder concreto de gestão na Caixa Econômica Federal, impondo-se sua absolvição, ou a desclassificação para o delito do art. 168 do Código Penal, com o declínio da competência para a Justiça Estadual;
b) objetiva-se o prequestionamento da matéria (fls. 179 e 183/197).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 198/208 e 210/219).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Sonia Maria Cuvello, manifestou-se pelo desprovimento dos recursos de apelação da defesa e da acusação (fls. 222/228).
Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
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VOTO
Imputação. Silviane Isidorio foi denunciada porque, entre janeiro e dezembro de 2010, na condição de gerente substituta na agência Granja Julieta da Caixa Econômica Federal, geriu fraudulentamente a instituição financeira, com o objetivo de apropriar-se de valores, ou de desviá-los em proveito próprio ou alheio, tendo realizado centenas de transferências indevidas que resultaram nos débitos de R$ 105.319,07 (cento e cinco mil, trezentos e dezenove reais e sete centavos) na conta corrente da Nova Interinvest Regularização de Loteamentos, de R$ 21.866,00 (vinte e um mil, oitocentos e sessenta e seis reais) na conta corrente da Fundação Dorival de Abreu, de R$ 6.700,00 (seis mil e setecentos reais) na conta corrente da Ju's Perfumes Ltda., de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) na conta corrente de Rosa Sacciotto Machado, de R$ 2.250,00 (dois mil, duzentos e cinquenta reais) na conta corrente de Júlio de Castro, e de R$ 700,00 (setecentos reais) na conta corrente de Ana Lúcia Vieira de Castro, e no crédito de R$ 131.223,00 (cento e trinta e um mil, duzentos e vinte e três reais) em conta poupança de sua filha Tatiana Lopes, com R$ 69.416,00 (sessenta e nove mil, quatrocentos e dezesseis reais) transferidos para conta corrente de sua titularidade.
A denúncia relata que parte do valor transferido para a conta de Tatiana retornou aos correntistas que tiveram suas contas correntes fraudulentamente movimentadas, a saber R$ 1.470,00 (um mil, quatrocentos e setenta reais) para a Nova Interinvest Regularização de Loteamentos e R$ 765,00 (setecentos e sessenta e cinco reais) para a Ju's Perfumes Ltda., cifras irrisórias quando comparadas às que foram apropriadas das empresas.
Narra, ainda, que, realizando transferência de sua conta corrente, Silviane ainda creditou na conta corrente de Rosa Sacciotto Machado o valor de R$ 25.521,21(vinte e cinco mil, quinhentos e vinte e um reais e vinte e um centavos), praticamente o mesmo valor por ela apropriado indevidamente dessa cliente do banco.
De acordo com a denúncia, os valores devolvidos às contas de origem, como nos casos dos clientes Nova Interinvest, Ju's Perfumes Ltda. e Rosa Saciotto, visavam cobrir saldos devedores e procurar garantir a continuidade das transferências realizadas sem o conhecimento dos titulares das contas.
Alude também ao uso das transferências indevidas a débito de clientes do banco para crédito em contas de alguns de seus colegas, relativamente a pagamento de parcelas de empréstimos, almoços e rateios de churrascos e bolões de loterias.
Refere, ainda, que Silviane, segundo apurado pela comissão processante da Caixa Econômica Federal, elaborou extratos falsos que omitiam as movimentações indevidas realizadas.
Assim, a denúncia sintetiza que:
Materialidade. A materialidade delitiva encontra-se suficientemente comprovada no Processo de Apuração de Responsabilidade Disciplinar e Civil n. SP1816.2011.A.000134, instaurado pela Caixa Econômica Federal, notadamente por intermédio dos seguintes documentos:
Autoria. A prova da autoria é satisfatória.
Interrogada na Polícia e em Juízo, Silviane Isidorio confessou a prática das condutas narradas na denúncia (fls. 31/33 e 107 e mídia à fl. 108), o que se coaduna com a versão dos fatos que apresentou no âmbito do processo disciplinar supramencionado, instaurado na Caixa Econômica Federal (Apenso I).
A testemunha Fernando Pires Anastácio, ouvida na fase judicial, confirmou a responsabilidade da acusada pela prática das condutas delitivas (fl. 106 e mídia à fl. 108).
Não obstante a acusada tenha informado que se encontrou afastada de suas atividades profissionais por diversos meses ao longo do ano de 2011 por motivo de tratamento de saúde e que não tomou conhecimento da existência do processo disciplinar referido até seu retorno ao trabalho, no fim daquele ano, quando já havia sido prolatada decisão desfavorável, apesar de o seu endereço residencial, à época, constar dos cadastros da Caixa Econômica Federal, fato é que submeteu suas alegações à consideração do Conselho Disciplinar da CEF, por intermédio de recurso, que decidiu, por maioria, negar-lhe provimento, mantendo a penalidade administrativa de rescisão do contrato de trabalho por justa causa "pelo enquadramento de sua conduta nos subitens 11.2.1.11 - 'descumprir leis, regulamentos, normas e atos da Administração', 11.3.1.4 - 'improbidade' e 11.3.1.11 - 'ato de indisciplina ou de insubordinação', do Regulamento de Pessoal da CAIXA, MN RH 053", bem como a responsabilidade civil reconhecida em primeira instância (Resolução n. 002/2010, fevereiro de 2012, Apenso I).
Malgrado a acusada tenha aduzido que a apropriação dos valores das contas das pessoas físicas e jurídicas indicadas na denúncia se deu pelo fato de a sua filha Maiara ter se envolvido com drogas, sendo destinados ao pagamento de quantias diárias exigidas pelos traficantes, que sabiam que era bancária e chantagearam-na constantemente por todo o ano de 2011, nada há nos autos em relação a registros policiais das ameaças recebidas, pela acusada, de traficantes, nem demonstrativos médicos de internações, ou tratamentos para dependência química relacionados a sua filha Maiara. Tampouco foram inquiridas testemunhas que pudessem corroborar tais alegações.
Os delitos dos arts. 4º e 5º, ambos da Lei n. 7.492/86 imputados à acusada são formais, sendo desnecessária a efetiva ocorrência de dano para sua consumação, sendo que, na hipótese vertente, foi apurado prejuízo de R$ 161.835,07 (cento e sessenta e um mil, oitocentos e trinta e cinco reais e sete centavos) (cfr. Relatório Conclusivo Processo Disciplinar n. SP1816.2011.A.000134, Apenso I).
A reparação parcial desse prejuízo, no valor de R$ 26.000,00 (vinte e seis mil reais), declarada pela acusada e mencionada na denúncia, não tem o condão de isentar sua responsabilidade pelo cometimento desses delitos.
Sujeito Ativo. Art. 5º da Lei n. 7.492/86 (Apropriação Indébita Financeira). A defesa sustenta que não é possível considerar a acusada como sujeito ativo do delito do art. 5º da Lei n. 7.492/86, pois era, à época, técnica bancária, que "exercia eventualmente e/ou por designação não efetiva a função de gerente de atendimento" (fl. 191), sem nenhum poder concreto de gestão na Caixa Econômica Federal e pleiteia sua absolvição, ou a desclassificação para o delito do art. 168 do Código Penal, com o declínio da competência para a Justiça Estadual.
Não lhe assiste razão.
O art. 5º da Lei n. 7.492/86 tutela as relações de confiança, inerentes ao sistema financeiro e os patrimônios da empresa e dos investidores. É nitidamente inspirado no crime de peculato (CP, art. 312) e no crime de apropriação indébita (CP, art. 168), diferenciando-se de ambos pela especificidade de seu objeto material. Os sujeitos ativos do crime em questão são as pessoas mencionadas no art. 25 da mencionada Lei, tendo em vista o disposto no aludido art. 5º da Lei n. 7.492/86:
É nesse sentido a lição da doutrina:
Relativamente às pessoas mencionadas no art. 25, referidas no art. 5º, ambos da Lei em comento, convém esclarecer que são o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os diretores e gerentes e, por equiparação aos administradores de instituição inanceira, o interventor, o liquidante ou o síndico, consoante dispõe o art. 25, caput, e o seu § 1º, da Lei n. 7.492/86, do seguinte teor:
Assim, o gerente de agência bancária pode ser sujeito ativo do crime previsto no art. 5º da Lei n. 7.492/86, dado que está incluído no rol das pessoas mencionadas no art. 25 da Lei n. 7.492/86.
In casu, a testemunha Fernando Pires Anastácio esclareceu que a acusada ocupava o cargo de gerente pessoa jurídica, com designação não efetiva, por tempo indeterminado, como se fosse gerente em efetivo exercício (11:00min) (fl. 106 e mídia à fl. 108).
Ademais, o Relatório Conclusivo da Comissão Apuradora instalada no âmbito da Caixa Econômica Federal registrou que a acusada, valendo-se da função de gerente que exercia eventualmente e da confiança conquistada junto aos clientes, debitou valores de contas correntes de terceiros, em proveito próprio ou alheio, em descumprimento aos normativos internos:
Caso entendesse que a conduta da acusada Silviane não configura o delito do art. 5º da Lei n. 7.492/86, como ela se apropriou de numerário de que tinha a posse em razão do cargo que ocupava em empresa pública (CEF), o que a equipara a funcionário público para fins penais (CP, art. 327), não seria caso de desclassificação para o tipo penal do art. 168 do Código Penal (apropriação indébita), mas sim para o do art. 312 do Código Penal (peculato), que, como bem assinalou a Ilustre Procuradora Regional da República, contém previsão de pena máxima mais gravosa em relação ao delito do art. 5º da Lei n. 7.492/86, o que representaria indevida reformatio in pejus (cfr. fl. 226/226v.).
Tipicidade. Art. 4º, caput, da Lei n. 7.492/86 (Gestão Fraudulenta). O Ministério Público Federal requer a condenação da acusada pela prática do delito do art. 4º, caput, da Lei n. 7.492/86.
Não procede seu pleito.
A denúncia foi rejeitada quanto à imputação relacionada à prática do delito do art. 1º, VI, da Lei n. 9.613/98, sendo recebida apenas quanto à imputação relacionada à prática do delito do art. 4º, caput, da Lei n. 7.492/86 (fls. 60/61 e 65).
Em alegações finais, o Ministério Público Federal requereu a condenação da acusada pela prática dos delitos dos arts. 4º, caput, e 5º, ambos da Lei n. 7.492/86, c. c. os arts. 70 e 71, ambos do Código Penal, com fundamento no art. 383 do Código de Processo Penal (fls. 111/134).
Na sentença, a acusada foi condenada apenas pela prática do delito do art. 5º da Lei n. 7.492/86 (fls. 155/160), tendo a MM. Magistrada a quo entendido pela não configuração do delito do art. 4º, caput, da Lei n. 7.492/86, pelos seguintes fundamentos:
Nesse mesmo sentido manifestou-se a Ilustre Procuradora Regional da República:
Com a conduta da acusada, restou demonstrada a afetação à confiança nos negócios jurídicos praticados no âmbito da Caixa Econômica Federal, tutelada pelo art. 5º da Lei n. 8.137/90, como a própria Comissão Apuradora consignou em Relatório Conclusivo. Porém, não se sustenta que tenha vulnerado a higidez e a regularidade do Sistema Financeiro Nacional como um todo, tutelada no art. 4º da Lei n. 7.492/86, pois não se credita que as sucessivas transferências dos valores debitados de contas de terceiros com o objetivo de apropriação ou desvio, em proveito próprio ou alheio, estivessem inseridas num conjunto de atos típicos de gestão relativos às operações financeiras da agência bancária.
Dosimetria. Consideradas as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, a MMa. Magistrada a quo fixou a pena-base no mínimo legal, em 2 (dois) anos de reclusão. Ausentes circunstâncias atenuantes, agravantes, ou causas de diminuição, fez incidir a causa de aumento de pena relativa à continuidade delitiva, à razão de 2/3 (dois terços), o que resultou em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, que tornou definitivo.
Estabeleceu o regime inicial aberto.
Arbitrou a pena de multa em 16 (dezesseis) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
Substituiu a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e em limitação de fim de semana, ambas pelo mesmo período, conforme definido pelo Juízo das Execuções Criminais.
O Ministério Público Federal recorreu apenas para a majoração do valor do dia-multa para próximo do valor integral de 1 (um) salário mínimo, mais compatível com a situação econômica da acusada.
A defesa não se insurge contra a dosimetria das penas.
Não merece provimento o recurso de apelação do Parquet.
Silviane declarou, em Juízo, que é divorciada e é mãe de 4 (quatro) filhos, sendo que 3 (três) deles residem com ela e 1 (um) deles é menor de idade, não recebe pensão alimentícia, reside em casa alugada, paga aluguel mensal de R$ 1.870,00 (um mil, oitocentos e setenta reais) e aufere de R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais) mensais como vendedora (fl. 107 e mídia à fl. 108), o que indica que a elevação do valor do dia-multa poderia comprometer sua capacidade financeira para o sustento da família, sendo irreparável a sentença neste aspecto.
A defesa de Silviane objetiva o prequestionamento da matéria.
Nesse contexto, ressalte-se que é desnecessária a menção explícita a todos os dispositivos legais citados pela defesa, considerando-se indispensável, para efeito de prequestionamento, a menção implícita às questões impugnadas, conforme entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, também adotado por esta 5ª Turma (TRF da 3ª Região, EDeclACr n. 200761810019846, Rel. Des. Fed. André Nekastchalow, unânime, j. 03.11.09, EDeclACr n. 200061110081767, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, unânime, j. 08.03.10; EDeclACr n. 200661190059361, Rel. Des. Fed. Peixoto Junior, j. 19.05.08).
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos de apelação do Ministério Público Federal e da defesa da acusada Silviane Isidorio, mantendo-se integralmente a sentença.
É o voto.
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Data e Hora: | 24/02/2016 15:23:50 |