D.E. Publicado em 15/03/2016 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal WILSON ZAUHY (Relator):
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia em 16/09/2010 (fls. 46/48) em face de WANDERLEY ALEXANDRE MACARI, brasileiro, nascido em 13/03/1963, qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do delito previsto no artigo 183 da Lei 9.472/97, pelo uso de transceptor portátil FM, ajustado para operar na frequência 144 e 148 MHz, com potência estimada em 5 Watts, sem autorização estatal.
Consta da exordial acusatória que no dia em 08/10/2009, em decorrência de fiscalização empreendida pela ANATEL deflagrada por solicitação da Polícia Militar a fim de que fosse apurada interferência na frequência utilizada pela Polícia na cidade de Taquaritinga, o acusado foi flagrado operando um transceptor portátil FM não homologado, na frequência 144 a 148 MHz, sem autorização.
O TRF deu provimento ao recurso em sentido estrito determinando o recebimento da denúncia inicialmente rejeitada (fls. 100/102), que com isto foi recebida em 04/06/2012 (fl. 111).
Citado, na fase do artigo 396, do CPP (Lei 11.719/08), o acusado apresentou defesa preliminar e foram ouvidas duas testemunhas da acusação por carta precatória (fls. 160/163) e foi feito o interrogatório do acusado (fls. 171/173).
O MPF apresentou suas alegações finais requerendo a procedência da ação (fls. 175/184) e o acusado apresentou suas alegações finais requerendo a improcedência da ação (fls. 187/189) aduzindo em síntese que não explorava serviços de telecomunicações, mas apenas o uso da radiofrequência para comunicação entre os amigos moto taxistas, e que não tinha conhecimento de que o uso do referido aparelho fosse ilegal ou que pudesse causar qualquer dano.
Após regular instrução do feito, respeitada as garantias do contraditório e da ampla defesa, sobreveio a r. sentença reconhecendo a insignificância da conduta posto que a potência do aparelho era inferior a 25W, medida que o § 1º do artigo 1º da Lei 9.612/98 identifica como baixa potência, e incapaz de interferir no sistema e telecomunicações.
Por fim, entendendo não estar comprovado que as interferências percebidas na frequência utilizada pela Força Policial de Taquaritinga foram causadas pelo aparelho apreendido, afastou a tipicidade da conduta e absolveu o réu nos termos do artigo 386, III, do CPP.
Apela o Ministério Público Federal defendendo que a tese esposada na sentença não merece prosperar visto não ser aplicável à conduta do apelado o princípio da insignificância por se tratar de crime de perigo abstrato/presumido (fls. 218/228).
Apresentada as contrarrazões (235/238), subiram os autos a este E. Tribunal.
Em parecer, nesta instância, o i. representante do Ministério Público Federal opina pelo provimento do recurso (fls. 240/243).
É o relatório.
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VOTO
O Juiz Federal Convocado WILSON ZAUHY (Relator):
A sentença recorrida julgou IMPROCEDENTE a denúncia, para o fim de absolver o réu WANDERLEY ALEXANDRE MACARI, com fulcro no art. 386, III do CPP, nos seguintes termos que passo a destacar:
"(...) No caso concreto, foi apreendido com o réu um Transceptor Portátil FM, da marca ICOM, modelo IC-V10, operando na frequência de 144,00 MHz a 148,00 MHz, com potência estimada em 5 Watts. |
O auto de apreensão comprova, portanto, a materialidade delitiva. |
A autoria é incontroversa, uma vez que o próprio acusado admite que adquiriu e fez uso do aparelho apreendido, embora afirme que o rádio era utilizado somente para contato com os colegas mototaxistas. |
Todavia, em que pese o enquadramento formal da conduta do réu no artigo 183 da Lei n. 9.472/1997, a baixíssima potência nominal de transmissão do aparelho apreendido (apenas 5 Watts) é incapaz de prejudicar ou expor a perigo o sistema de telecomunicações, bem jurídico tutelado pela norma penal em comento, de modo que deve ser reconhecida a ausência de tipicidade material em razão da insignificância da conduta. |
Com efeito, deve ser reconhecida a insignificância da conduta quando a potência do aparelho é inferior a 25W, medida que o art. 1º, 1º da Lei nº 9.612/1998 identifica como baixa potência. |
Nesse sentido, os precedentes que seguem: (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ACR 0003910-82.2005.4.03.6000, rel. Desª. Federal Vesna Kolmar, j. 23/10/2012); (TRF4, INQ 2005.04.01.023784-5, Quarta Seção, Relator Des. Federal Tadaaqui Hirose, j. 06/05/2010); (TRF 5ª Região, 2ª Turma, RSE 00064532420104058200, Rel. Des. Federal Paulo Gadelha, j. 21/07/2011). |
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Vale lembrar que no caso dos autos a potência do equipamento apreendido era de apenas 5W, ou seja, muito inferior à potência capaz de interferir no sistema de telecomunicações. |
Cumpre anotar que a fiscalização empreendida pela ANATEL foi deflagrada por solicitação da Polícia Militar em Taquaritinga, a fim de que fosse apurada a interferência na frequência utilizada pela força policial na Cidade, possivelmente causada pelas comunicações entre mototaxistas (fls. 17/18). Todavia, não restou comprovado que as alegadas interferências foram causadas pelo aparelho apreendido com o réu. |
Tudo somado, impõe-se a absolvição do réu nos termos do art. 386, III do CPP.III (...)". |
Materialidade e autoria
Materialidade e a autoria delitiva restaram comprovadas nos autos pelo IPL 17-0136/2010, contendo representação da ANATEL, termo de representação, parecer técnico, auto de infração, termo de apreensão, relatório da fiscalização (fls. 03/16), laudo de exame de equipamento eletroeletrônico (fls. 27/28), interrogatório e indiciamento formal do acusado (fls. 34/38) e o relatório da autoridade policial (fls. 41/42).
Tipificação legal.
Sendo incontroverso que o réu utilizava rádio transmissor/receptor (transceptor) para estabelecer comunicação entre outros usuários, a conduta se amolda ao artigo 183 da Lei 9.472/1997, pois operado sem a devida licença da ANATEL, a configurar a atividade clandestina de telecomunicação.
Ressalte-se, por oportuno, que o artigo 158, a Lei nº 9.472/1997 faz nítida distinção entre o que se chama de "serviços de telecomunicações" e o que é chamado de "serviços de radiodifusão". Assim, o crime tipificado no artigo 183 da Lei 9.472/97 compreende a operação clandestina de serviços de telecomunicação que não se enquadrem como sendo de radiodifusão.
Portanto, o caso dos autos não se trata de estação de radiodifusão clandestina, mas sim de operação clandestina de radiocomunicação através de aparelho transmissor e receptor e assim a conduta enquadra-se no artigo 183 da Lei nº 9.472/1997.
Nesse sentido:
"PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RÁDIO TRANSCEPTOR SEM AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. ARTIGO 183 DA LEI 9.472/97. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AFASTADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA MANTIDA. APELO DA DEFESA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. |
1. Inaplicabilidade do princípio da insignificância. Precedentes. |
2. É típica a conduta de desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação. O uso de equipamento de estação de serviço limitado privado configura atividade de telecomunicação, na medida em que se trata de instrumento hábil a transmitir, emitir ou receber sons por processo eletromagnético. Por conseguinte, o desenvolvimento clandestino de Serviço Limitado Privado tipifica o delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97. |
3. A materialidade restou demonstrada pelo Auto Circunstanciado de Busca e Apreensão, que registrou a apreensão de 02 Transceptores VHF Motorola. Comprovam ainda a materialidade o Auto de Apresentação e Apreensão o Laudo de Exame em Equipamento. |
(...) 14. Apelação da defesa a que se nega provimento.(ACR 00109325220114036140, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/12/2014 e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/01/2015.) |
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Princípio da insignificância
Não é cabível a aplicação do princípio da insignificância uma vez que a norma do artigo 183 da referida Lei 9.472/1997 protege não só a regularidade dos serviços de telecomunicações, mas também o monopólio, constitucionalmente atribuído à União, na exploração desses serviços.
"Artigo 21, inciso XI, da CF/88 - compete à União: explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais".
Por tal motivo, a aplicação do princípio da insignificância em casos de aparelhos de baixa potência resultaria na descriminalizando da conduta e resultaria na quebra do monopólio constitucional da União.
Ademais, em se tratando de crime formal e de perigo abstrato, não se exige para a sua consumação a ocorrência de dano concreto causado pela conduta do agente.
Este é o entendimento sedimentado no STJ:
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO ARESP. TRANCAMENTO DA AÇÃO. ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÃO. SERVIÇO DE RADIODIFUSÃO COMUNITÁRIA. APARELHO DE BAIXA POTÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. |
1. Esta Corte de Justiça pacificou o entendimento de que não se aplica o princípio da bagatela ao delito previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997, ainda que o aparelho de radiodifusão seja de baixa potência ou pequeno alcance, ao fundamento de que se trata de crime formal e de perigo abstrato, não exigindo, para a sua consumação, a ocorrência de dano concreto causado pela conduta do agente. |
2. Agravo regimental desprovido. |
(AgRg no AREsp 739.046/PA, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 05/11/2015, DJe 20/11/2015). |
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DOSIMETRIA DA PENA
Primeira fase
Reconhecida a autoria, a materialidade e a tipificação delitiva prevista no artigo 183 da Lei 9.472/97, passo à fixação da dosimetria da pena.
O citado texto legal imputa detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a quem desenvolve clandestinamente atividades de telecomunicação.
Atento às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, observo que não houve prova de qualquer lesão a bens de terceiros, e, em face das demais circunstâncias judiciais a circundar a espécie, tenho que a pena-base deva ser fixada no mínimo legal de 02 (dois) anos de detenção.
Quanto à pena de multa no valor fixo de R$ 10.000,00 prevista na indigitada legislação, esta deve ser afastada sob o fundamento da inconstitucionalidade parcial do preceito secundário da norma do artigo 183 da Lei 9.472/97.
Tal entendimento está em consonância com o decidido pelo órgão especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, na Arguição de Inconstitucionalidade Criminal nº 0005455-18.2000.403.6113, de Relatoria da E. Des. Federal Ramza Tartuce, que declarou a inconstitucionalidade da expressão "de R$ 10.000,00" contida no preceito secundário do artigo 183 da Lei 9.472/97.
Com isto, condeno o réu ao pagamento de 10 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.
Segunda fase
Em segunda fase, verifico que não há circunstâncias agravantes.
Muito embora deva ser considerada a circunstância atenuante da confissão (art. 65, III, "d" do CP), uma vez que o acusado admitiu a propriedade e o uso do equipamento, o que, inclusive, fundamentou o tópico concernente à materialidade e autoria, deixo de aplicá-la em razão da impossibilidade de se reduzir a pena restritiva de liberdade aquém do mínimo abstratamente cominado no tipo, aplicável a Súmula 231 do STJ.
Terceira fase
Na terceira fase da dosimetria, procede a pretensão de aplicação da causa de diminuição prevista no artigo 21 do Código Penal, pois o conjunto probatório constante dos autos nos conduz à plausibilidade na tese de que o réu desconhecia a proibição de operação, sem a autorização do poder competente, de equipamento de rádio frequência para estabelecer mera comunicação entre os colegas de profissão.
Diante disso, no caso concreto, reconhecido o erro (evitável) sobre a ilicitude do fato (artigo 21 do CP), de rigor a redução da pena à razão de 1/3, o que resulta na pena definitiva de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de detenção e 6 (seis) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.
Regime inicial de cumprimento da pena.
Estabeleço o regime aberto para o início de cumprimento, na forma do art. 33, 2º, alínea c do CP.
Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
Considerando a conduta praticada, bem como suas consequências e a inexistência de prejuízo material, considero preenchidos os requisitos para substituição da pena privativa de liberdade aplicada, o que faço aplicando as seguintes penas restritivas de direito: 1º) PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU A ENTIDADES PÚBLICAS, nos termos do art. 46 do CP, podendo o apenado optar pelo cumprimento em período equivalente à metade da pena privativa de liberdade a ser substituída, em condições a serem estabelecidas pelo Juízo das Execuções Penais, principalmente quanto à entidade para a prestação de serviços (artigos 46, 4º e 55); 2º) PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA, prevista no art. 45, 1º e 2º, do CP, que estabeleço em 01 (um) salário-mínimo, a ser atualizado monetariamente até o recolhimento, a ser destinada à União Federal.
Do exposto, e considerando o mais que dos autos consta, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO para CONDENAR o acusado WANDERLEY ALEXANDRE MACARI, devidamente qualificado nos autos, como incurso no art. 183, e seu parágrafo único, da Lei n. 9.472/97, aplicando-lhe a pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de detenção, em regime inicial aberto e 6 (seis) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente. SUBSTITUO a pena restritiva de liberdade aqui mencionada pelas penas restritivas de direitos indicadas no corpo do voto.
Com o trânsito, lancem-se o nome do réu no rol dos culpados, comunicando-se aos órgãos de competentes.
É o voto.
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