D.E. Publicado em 08/05/2017 |
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EMENTA
PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. LAVAGEM DE DINHEIRO. ABSOLVIÇÃO. CRIME ANTECEDENTE NÃO DESCRITO NA DENÚNCIA. EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, DAR PROVIMENTO aos embargos infringentes, para que prevaleça o voto vencido, mantendo a absolvição do embargante da imputação do crime previsto no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, vencidos os Desembargadores Federais Maurício Kato e André Nekatschalow que rejeitavam os embargos.
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RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de embargos infringentes opostos por MARCÍLIO PINHEIRO GUIMARÃES (fls. 1640/1653) em face de acórdão proferido pela Primeira Turma desta Corte Regional que, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso da defesa e, por maioria, deu parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal para condenar o acusado pela prática do crime tipificado no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, à pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa e aumentar as penas dos crimes tipificados nos arts. 16 e 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, nos termos do voto do Relator, então Juiz Federal Convocado Hélio Nogueira, acompanhado pelo voto do então Juiz Federal Convocado Paulo Domingues.
A ementa do acórdão é a seguinte:
Restou vencido o Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita que dava provimento à apelação do Ministério Público Federal em menor extensão, mantendo a absolvição da imputação do crime tipificado no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98.
Pretende o embargante a prevalência do voto vencido, que considerou não ser possível a condenação do réu pelo crime de lavagem fundado em delito antecedente diverso daquele descrito na denúncia. Argumenta que o voto vencedor considerou dois crimes como antecedentes ao delito de lavagem: a gestão fraudulenta, cuja condenação em primeira instância foi anulada pelo próprio acórdão em razão da ausência de descrição de suas elementares pela denúncia, e a manutenção de instituição financeira sem autorização (art. 16 da Lei nº 7.492/86), que também não foi apontado na denúncia como delito antecedente ao crime de lavagem. Sustenta que a condenação do embargante por lavagem de dinheiro representou séria violação das garantias do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. Pede, assim, o provimento dos embargos, para que seja mantida a absolvição do embargante da imputação prevista no art. 1º, V e VI, da Lei nº 9.613/98.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento dos embargos infringentes (fls. 1717/1720v).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): MARCÍLIO PINHEIRO GUIMARÃES foi absolvido pela 2ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP da imputação do crime previsto no art. 1º, V e VI, da Lei nº 9.613/98, com fundamento no art. 386, II, do Código de Processo Penal, por não estar provada a materialidade delitiva.
O Ministério Público Federal e a defesa apelaram, tendo a Primeira Turma desta Corte, por unanimidade, dado parcial provimento à apelação da defesa. Por maioria, a Turma também deu parcial provimento ao recurso ministerial para condenar o acusado pela prática do crime tipificado no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, à pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa e aumentar as penas dos crimes tipificados nos arts. 16 e 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, nos termos do voto do Relator, então Juiz Federal Convocado Hélio Nogueira, que foi acompanhado pelo então Juiz Federal Convocado Paulo Domingues.
O voto vencido, proferido pelo Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita, também deu parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, porém em menor extensão, apenas para aumentar as penas dos crimes tipificados nos arts. 16 e 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, mantendo a absolvição da imputação do crime tipificado no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98.
O voto condutor considerou demonstrada a ocorrência do delito, nos seguintes termos:
De outro lado, o voto vencido manteve a sentença que absolveu o acusado da prática do delito previsto no art. 1º, V, e VI, da Lei nº 9.613/98, pelos seguintes fundamentos:
É importante destacar que não há necessidade, para a configuração do crime de lavagem, de sentença condenatória em processo que trate do crime antecedente, dado que são autônomos os delitos (antecedente e lavagem). O art. 2º, I, da Lei nº 9.613/98, em sua redação original, dispunha que o processo e julgamento dos crimes previstos nessa Lei independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país. Na redação dada pela Lei nº 12.683/2012, essa independência foi mantida, explicitando-se, no inciso I, que o processo e julgamento dos crimes de lavagem "independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento".
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, "[p]or definição legal, a lavagem de dinheiro constitui crime acessório e derivado, mas autônomo em relação ao crime antecedente, não constituindo post factum impunível, nem dependendo da comprovação da participação do agente no crime antecedente para restar caracterizado" (REsp 1342710/PR, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 22.04.2014, DJe 02.05.2014).
No caso em exame, a questão controvertida está relacionada à correspondência entre o crime antecedente descrito na denúncia e aquele efetivamente praticado pelo acusado, porquanto, embora não seja necessária condenação prévia ou concomitante do crime antecedente para a tipificação do delito de lavagem de dinheiro, é necessário que haja ao menos indícios suficientes da sua existência, isto é, deve ser demonstrada pelo órgão acusador a proveniência dos valores a serem "lavados" ou "branqueados".
Com efeito, a denúncia descreve da seguinte maneira a conduta dos acusados, relativamente ao crime de lavagem de dinheiro:
Resta claro, do exposto, que a denúncia descreve como antecedentes ao delito de lavagem os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (evasão de divisas ocorrida no período de 20.04.98 a 14.05.98 através das contas de "laranjas") e contra a Administração Pública (contrabando e descaminho).
A sentença, por sua vez, entendeu que "os recursos que foram objeto dos crimes contra o sistema financeiro nacional verificados nos presentes autos (ou seja, os recursos enviados ao exterior ou objeto de contratos de câmbio não registrados no Sisbacen) não se contaminaram em virtude de tais delitos. A origem desses recursos não foi esmiuçada ou discutida nos autos, motivo pelo qual não se pode simplesmente tomá-los como produtos de crimes." (fls. 1434). No que diz respeito ao crime de contrabando/descaminho, a sentença, de igual modo, considerou não haver prova da sua prática efetiva e, por isso, absolveu o embargante da imputação do crime previsto no art. 1º, V e VI, da Lei nº 9.613/98.
O acórdão embargado, por outro lado, entendeu configurado o delito tipificado no art. art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, sob o fundamento de que o réu, ao utilizar-se de "laranjas" para a remessa de valores ao exterior, num primeiro momento ocultou a origem desses valores e, num segundo momento, dissimulou o proveito obtido com a prática do crime antecedente, promovendo, com tal remessa, o distanciamento do bem de sua origem.
Ocorre que, para que ocorra a condenação pelo crime de lavagem, é necessária não só a descrição fática do crime antecedente, como indícios suficientes da sua existência. No caso, como bem ressaltou o voto vencido, não é possível a condenação pela prática do delito do art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, apontando como crime antecedente o crime de gestão fraudulenta (art. 4º da Lei nº 7.492/86), pois a prática desse delito não foi narrada na denúncia. Ademais, é importante ressaltar que a acusação não conseguiu demonstrar a origem ilícita dos valores depositados nas contas de terceiros.
Desse modo, não poderia o acórdão condenar o embargante pelo delito de lavagem de valores se não restou demonstrada ao menos a existência de indícios suficientes da prática do crime antecedente, conforme descrito na denúncia.
Posto isso, DOU PROVIMENTO aos embargos infringentes, para que prevaleça o voto vencido, mantendo a absolvição do embargante da imputação do crime previsto no art. 1º, VI, da Lei nº 9.613/98, nos termos da fundamentação supra.
É o voto.
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