Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 03/08/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0011027-50.2008.4.03.6120/SP
2008.61.20.011027-5/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : CETESB CIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL
ADVOGADO : SP209293 MARCELA BENTES ALVES
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELANTE : Estado de Sao Paulo
ADVOGADO : SP057222 JAQUES LAMAC e outro(a)
APELANTE : SINDICATO DA IND/ DA FABRICAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA IND/ DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
: UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO UNICA
: ASSOCIACAO DOS FORNECEDORES DE CANA DE ARARAQUARA CANASOL
ADVOGADO : SP194984 CRISTIANO SCORVO CONCEIÇÃO e outro(a)
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : ANDREY BORGES DE MENDONCA e outro(a)
EXCLUIDO(A) : DEPRN DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTECAO DE RECURSOS NATURAIS
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE ARARAQUARA - 20ª SSJ - SP
No. ORIG. : 00110275020084036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

EMENTA

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÕES E REEXAME NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. QUEIMA CONTROLADA DA PALHA DE CANA DE AÇÚCAR. LICENÇA AMBIENTAL PELO ÓRGÃO ESTADUAL. ATIVIDADE DOTADA DE RISCOS À SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE. PRÉVIA ELABORAÇÃO DE EIA/RIMA. NECESSIDADE. RESPEITO À NORMATIZAÇÃO IMPOSTA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. ATRIBUIÇÃO SUPLETIVA DO IBAMA. RECONHECIMENTO. PRECEDENTES DA E. SEXTA TURMA.
- Caso de não conhecimento da apelação da CETESB, eis que interposta na pendência de embargos declaratórios, não sendo reiterada após o correspondente julgamento, bem como porque o seu preparo foi recolhido em desconformidade à Lei 9.289/96. Precedentes.
- A apelação da União não foi recebida pelo MM. Juízo a quo, decisão não combatida pelo recurso próprio, tendo sido, dessa forma, alcançada pela preclusão, razão pela qual também não se conhecesse desse recurso.
- O autor e ora recorrido Ministério Público Federal, órgão da União, é legitimado ativo para a propositura de ação civil pública (arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III da LC 75/93 e art. 5º, I, da Lei 7.347/85), o que se mostra determinante para a fixação da competência da Justiça Federal neste caso, aliada à presença do IBAMA no polo passivo, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. Jurisprudência do C. STF.
- O IBAMA detém atribuição supletiva em matéria de licenciamento ambiental, nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), razão pela qual, se lhe é imputada omissão ou desídia em relação às licenças concedidas pelos Estados-membros, exsurge a respectiva legitimidade passiva ad causam para figurar nas ações em que essas condutas são discutidas.
- A ação civil pública constitui instrumento processual adequado para que veiculadas as pretensões ora deduzidas, pois, a apontada inconstitucionalidade das leis estaduais, na parte em que dispõem sobre a queima da palha de cana-de-açúcar, não consubstanciou objeto principal do feito - o que, decerto, não seria possível, sob pena de usurpação da competência exclusiva do C. STF - mas, isso sim, pleito incidental, sob forma de controle difuso de constitucionalidade "incidenter tantum", perfeitamente cabível no âmbito das ações desta espécie. Entendimento pacificado no C. STF.
- Mérito: verifica-se que a questão ora debatida, com todas as suas minúcias, já foi objeto de diversas análises e decisões nesta E. Sexta Turma, sem que houvesse substanciais divergências quanto aos desfechos anunciados.
- A proteção do meio ambiente foi erigida pela Constituição da República como condicionante à atividade econômica e à função social da propriedade, todos tendo direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, sendo que as condutas e atividades consideradas lesivas sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (arts. 23, VI, 186, II e 225).
- Incumbe à Administração exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente (ou seja, como condicionante ao licenciamento), estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade, bem como controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente (CFR, art. 225, § 1º, IV e V).
- A competência direta para o licenciamento de atividades cujo desenvolvimento se mostra apto a propiciar riscos ao meio ambiente é, inicialmente, do órgão estadual responsável, cabendo ao IBAMA a possibilidade de intervenção supletiva, nos casos de inércia ou negligência do Estado-membro (art. 10, § 3º, da Lei 6.938/81 na redação anterior à LC 140/2011).
- Quanto ao uso do fogo nas florestas e demais formas de vegetação, observa-se que o art. 27 da Lei 4.771/65 (Código Florestal vigente na época do ajuizamento) proibia tal prática, mas de forma relativa, pois o respectivo parágrafo único preconizava que se peculiaridades locais ou regionais a justificassem em métodos agropastoris ou florestais, a permissão poderia ser concedida pelo poder Público, desde que devidamente delimitadas as áreas e estabelecidas normas de precaução.
- O Decreto 2.661/98 regulamentava o supracitado art. 27 do antigo Código Florestal, determinando que o emprego do fogo, como método "despalhador" e facilitador do corte de cana-de-açúcar em áreas passíveis de mecanização da colheita, seria gradativamente eliminado..
- A Resolução CONAMA 237/97, editada nos parâmetros do poder normativo conferido ao Órgão pela Lei 6.938/81, além de ratificar a competência supletiva do IBAMA para o licenciamento de atividades na hipótese em que os impactos ambientais dela decorrentes ultrapassarem os limites da localidade (art. 4º, III, § 2º), definiu, no respectivo Anexo "1", as atividades ou empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental, não englobando a prática da queima da palha de cana-de-açúcar.
- No Estado de São Paulo, foram editadas as Leis Estaduais 10.547/2000 e 11.241/02 que, dentre outras disposições, proibiram o emprego do fogo nas florestas e demais formas de vegetação, excetuadas as atividades agrícolas, pastoris ou florestais, dentre as quais se insere a queima controlada da palha de cana-de-açúcar, técnica que, por outro lado, deveria ser eliminada de forma gradativa, impondo-se, inclusive, um calendário de extinção.
- Regulamentando essa legislação Paulista, veio à baila o Decreto Estadual 45.869/01, pelo qual definidos procedimentos, proibições e regras de execução e medidas de precaução a serem obedecidas quando do emprego do fogo no corte de açúcar, a serem estipuladas mediante requerimento detalhado do interessado junto ao órgão responsável.
- Ocorre que a prática da queima da palha de cana de açúcar, se procedida sem as necessárias cautelas, pode acarretar ou incrementar reais e graves riscos à saúde humana e ao meio ambiente, pelo lançamento de partículas de fuligem (material particulado) na atmosfera, composta também por gases tóxicos que, entre o mais, agravam os efeitos decorrentes do efeito estufa e induzem doenças respiratórias, havendo estudos que, inclusive, apontam consequências mais gravosas, como a potencialização de doenças cancerígenas. Jurisprudência do C. STJ e do E. STF.
- Mesmo que não houvesse prova cabal desses riscos ou danos, o princípio da prevenção, extraível da proteção integral que constitucionalmente recai sobre o meio ambiente (art. 225 CFR), impõe a realização de EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais, ainda que a constatação dessa lesividade advenha de probabilidade e não seja certa a sua ocorrência.
- Tratando-se de atividade com significante impacto ambiental, com potencial de extrapolar os limites da localidade em que praticada, se mostra correta e afinada com os ditames da Carta Magna e da Política Nacional do Meio Ambiente a condenação da CETESB e do Estado de São Paulo para que se abstenham a conceder novas licenças de queima controlada da palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela Subseção Judiciária de Araraquara, sem prévio EIA/RIMA. Nessa esteira, impõe-se reconhecer, na mesma medida, o acerto da condenação do IBAMA para que fiscalize a exigência de licenciamento e prévio EIA/RIMA para as atividades da espécie desenvolvidas no território da referida Subseção.
- Os danos morais difusos, segundo a jurisprudência da E. Corte Superior de Justiça, têm como pressupostos (1) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física ou jurídica; (2) a ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria ou classe de pessoas); (3) a intolerabilidade da ilicitude, diante da realidade apreendida e da sua repercussão social; (4) o nexo causal observado entre a conduta e o dano correspondente à violação do interesse coletivo ("lato sensu").
- Patente a conduta antijurídica dos órgãos públicos que, atrelados às correspondentes atribuições, deveriam zelar pela preservação do meio ambiente e, especificamente, exigirem a elaboração do EIA/RIMA para que, eventualmente, fosse concedida licença para a atividade de queima da cana, sendo que a violação a esses deveres configurou afronta direta ao art. 225, caput, § 1º, incisos IV e V, da Constituição da República.
- Conduta que, no mais, consubstanciou ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma coletividade latu sensu, que inegavelmente foram expostas a todos os malefícios que a atividade pode acarretar, tanto os potenciais como os já comprovados. Descabe falar-se em tolerabilidade desse comportamento em razão do que dispõe a legislação estadual, eis que a Carta Magna não deixa dúvidas sobre a necessidade de licenciamento para as atividades da espécie, bem como a obrigação de efetivo controle sobre técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
- Precedentes análogos desta E. Sexta Turma citados: AC 0000264-06.2011.4.03.6113, Rel. Des. Fed. Consuelo Yoshida, j. em 28.04.2016; AC 0002726-51.2011.4.03.6107, Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, j. em 18.02.2016; AI 0023504-59.2013.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, j. em 13.08.2015; AI 0024973-43.2013.4.03.0000; Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, j. em 13.08.2015.
- Apelos da CETESB e da União não conhecidos, bem como desprovidos o reexame necessário e as demais apelações.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer dos apelos da União Federal e da CETESB, bem como negar provimento ao reexame necessário e demais apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 21 de julho de 2016.
LEILA PAIVA MORRISON
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LEILA PAIVA MORRISON:10143
Nº de Série do Certificado: 52F62CB48C7918C7
Data e Hora: 21/07/2016 17:06:08



APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0011027-50.2008.4.03.6120/SP
2008.61.20.011027-5/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : CETESB CIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL
ADVOGADO : SP209293 MARCELA BENTES ALVES
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELANTE : Estado de Sao Paulo
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APELANTE : SINDICATO DA IND/ DA FABRICAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA IND/ DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
: UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO UNICA
: ASSOCIACAO DOS FORNECEDORES DE CANA DE ARARAQUARA CANASOL
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APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : ANDREY BORGES DE MENDONCA e outro(a)
EXCLUIDO(A) : DEPRN DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTECAO DE RECURSOS NATURAIS
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE ARARAQUARA - 20ª SSJ - SP
No. ORIG. : 00110275020084036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

RELATÓRIO

A SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LEILA PAIVA MORRISON (RELATORA): - Trata-se de reexame necessário e apelações interpostas pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO - CETESB, UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SÃO PAULO, SINDICATO DA INDÚSTRIA DA FABRICAÇÃO DO ÁLCOOL NO ESTADO DE SÃO PAULO e outros em face da r. sentença de improcedência proferida nesta ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, com pedido de tutela antecipada.

Na petição inicial, alegou-se, em síntese, o seguinte: a) a denominada queima controlada da palha de cana-de-açúcar possui aptidão para lançar na atmosfera grandes quantidades de poluentes danosos à saúde, fato esse agravado quando a correspondente realização coincide com os meses de menores índices de umidade na região englobada pela Subseção Judiciária de Araraquara; b) a legislação estadual Paulista, que autoriza tais queimadas, está eivada pelo vício da inconstitucionalidade, pois é complacente com a degradação ambiental; c) ser ilegal a não exigência de estudo ambiental e relatório de impacto ambiental - EIA/RIMA - para o desenvolvimento dessa atividade; d) pertencer ao IBAMA a atribuição supletiva constitucional para a realização do licenciamento ambiental nesses casos, diante da patente omissão do Estado de São Paulo, CETESB e DEPRN na proteção dos direitos ambientais envolvidos; e) logo, ser necessário que se anulem todas as licenças ambientais concedidas pelo Estado Bandeirante, CETESB e DEPRN que tenham por objeto a autorização para a queima controlada da palha da cana de açúcar na área compreendida pela 20ª Subseção Judiciária, bem como que tais órgãos sejam compelidos a absterem-se de outorgar novas licenças e autorizações da espécie e, ainda, ser de rigor que os aludidos atos administrativos passem à atribuição do IBAMA, respeitados os trâmites legais; f) ser também imperiosa a condenação dos réus em danos morais, a serem revertidos ao Fundo Federal de Direitos Difusos.

A exordial foi instruída com cópia do procedimento administrativo instaurado no âmbito do Parquet para a averiguação dos fatos ora alegados (fls. 83/1.160).

Houve manifestação acerca do requerimento de tutela antecipada (fls. 1.164/1.184 - CETESB; fls. 1.189/1.193-v - IBAMA; fls. 1.195/1.222 - Estado de São Paulo).

O Sindicato da Indústria da Fabricação do Álcool do Estado de São Paulo - SIAFESP e o Sindicato da Indústria do Açúcar no Estado de São Paulo - SIAESP requereram o ingresso na lide como assistentes litisconsorciais do Estado de São Paulo.

O pedido de tutela antecipada foi deferido, sendo determinado: i) a ilegitimidade passiva do Departamento Estadual de Proteção aos Recursos Naturais - DPRN, com a respectiva exclusão do polo passivo; ii) o reconhecimento da legitimidade ativa do IBAMA e a competência da Justiça Federal para o julgamento da causa; iii) a suspensão da validade das autorizações já concedidas pelo Estado de São Paulo, por meio da CETESB, obstando a prática das queimadas na região; iv) abstenção quanto à concessão de novas autorizações similares; v) que o IBAMA promovesse, com exclusividade, o procedimento de licenciamento ambiental para a prática da queima da cana-de-açúcar (fls. 1.477/1.479).

Contra a decisão antecipatória foi interposto agravo de instrumento pelo SIFAESP e pelo SIAESP (fls. 1.525/1.577), cujo efeito suspensivo foi negado (fls. 1.589/1.591-v).

O IBAMA e o Estado de São Paulo também interpuseram agravo de instrumento, sendo o decisum antecipatório suspenso, mas por força de decisão prolatada pela E. Presidência desta Corte diante de pedido formulado pelo Estado Paulista com fulcro no art. 4º da Lei 8.437/1992.

Contestações do IBAMA às fls. 1.602/1.619, do SIFAESP às fls. 1.932/1.996 e do Estado de São Paulo às fls. 2.009/2.148. A CETESB não apresentou defesa e, por isso, foi considerada revel (fls. 2.203).

A Associação dos Fornecedores de Cana de Araraquara requereu o seu ingresso na qualidade de assistente litisconsorcial do Estado de São Paulo (fls. 2.156/2.201).

Intimadas sobre o interesse na produção de provas, as partes declinaram (fls. 2.261; 2.262; 2.270; 2.273 e 2.275).

Todos os requerimento de intervenção na demanda foram deferidos (fls. 2.282).

Contestação da Associação dos Fornecedores de Cana de Araraquara às fls. 2.287/2.364.

Réplica do Ministério Público Federal às fls. 2.225/2.260, pela qual, em suma, insistiu na procedência dos pedidos iniciais, rechaçando todo o argumentado nas contestações.

Sobreveio a r. sentença (fls. 2.374/2.394) pela qual, consoante adiantado, julgados procedentes os pedidos, nos termos do dispositivo redigido na seguinte conformidade:

"[...]
Dispositivo: Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados pelo Ministério Público Federal, com fundamento no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para:
a) Determinar à CETESB e ao ESTADO DE SÃO PAULO, por meio de sua Secretaria do Estado do Meio Ambiente, mais precisamente da Coordenadoria de Licenciamento Ambiental e de Proteção de Recursos Naturais, que se abstenham de conceder novas autorizações e licenças ambientais para a queima controlada da palha da cana-de-açúcar na área compreendida nesta Subseção, sob pena de multa de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) para cada licença ou autorização concedida;
b) Declarar nulas todas as licenças e autorizações já expedidas, em razão da ausência de prévio estudo de impacto ambiental e de licenciamento pautado nas normas constitucionais, princípios de direito ambiental e normas federais, vedando a utilização de fogo na cultura canavieira, nas áreas abrangidas por esta 20ª Subseção Judiciária de Araraquara, a partir da próxima safra (ano de 2011), sob pena de multa diária no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a ser imposta aos órgãos estaduais e federais responsáveis, em razão da omissão ou ineficácia da fiscalização;
c) Declara a atribuição subsidiária do IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis para efetuar o licenciamento ambiental para as atividades que tenham como objeto a queima da palha da cana-de-açúcar, na área compreendida por esta 20ª Subseção Judiciária, seguindo os trâmites da legislação nacional pertinente, notadamente a Lei n.º 6.938/1981 e a Resolução n.º 237/1997 do CONAMA;
d) Determinar ao IBAMA a assunção imediata da atividade de licenciamento da queima da palha ou de fiscalização do licenciamento a ser efetivado pelos órgãos estaduais responsáveis, tendo em vista a competência supletiva da autarquia, nos termos do artigo 23 da Constituição Federal e da presente sentença;
e) Declarar obrigatória a prévia exigência de EIA/RIMA como condição para o licenciamento, devendo o EIA/RIMA ser abrangente e considerar as consequências para a saúde humana, para os remanescentes florestais, para a flora e fauna, bem como a vedação da queima em áreas mecanizáveis;
f) Determinar ao IBAMA que cadastre todas as propriedades rurais ocupadas com a cultura canavieira e verifique o cumprimento das determinações impostas por meio do julgamento da presente;
g) Condenar os réus ao pagamento de danos morais, revertidos ao Fundo Federal de Direitos Difusos, arbitrados em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
Deixo de condenar os réus ao pagamento de custas e honorários advocatícios em razão do disposto no artigo 4º, inciso III, da Lei n.º 9.289/1966 e do artigo 18 da Lei n.º 7.347/1985. Expeça-se oficio à ilustríssima Desembargadora Federal Regina Costa, relatora dos agravos de instrumento n.º 2009.03.00.022838-3, 2009.03.00.013734-1, 2009.03.00.013606-3, 2009.03.00.012694-0 e 2009.03.00.009500-0, comunicando-a acerca da prolação da presente sentença e instruindo o ofício com cópia de seu inteiro teor. Oficie-se à Polícia Federal e à Polícia Ambiental para que fiscalizem a eventual ocorrência de queimadas em culturas canavieiras a partir da próxima safra. Sentença sujeita ao reexame necessário, por força do artigo 475, inciso I, do Código de Processo Civil, com efeitos devolutivo e parcialmente suspensivo, consoante já decidido na presente. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oficie-se.
[...]".

Foram opostos embargos de declaração pelo SIFAESP, SIAESP, pela União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo e pela Associação dos Fornecedores de Cana de Araraquara (fls. 2.405/2.411). Também interpôs aclaratórios o Estado de São Paulo (fls. 2.412/2.415).

Apelou o IBAMA (fls. 2.421/2.435-v), sustentado, em resumo, que a atividade consistente em queima controlada da palha de cana-de-açúcar prescinde de licenciamento ambiental e, mesmo que assim não fosse, tal ato administrativo não seria de atribuição da Autarquia Federal, dada a ausência de previsão legal ou constitucional a respeito. Apontou, ainda, a desnecessidade de elaboração de EIA/RIMA no caso, bem como ser descabida a pretensão do Parquet em adentrar na discricionariedade administrativa dos órgãos públicos responsáveis.

Nas razões de apelação da CETESB (fls. 2.436/2.474) argumentou-se, preliminarmente, a inviabilidade de, mediante ação civil pública, se impugnar lei em tese, razão pela qual o Ministério Público Federal seria carecedor da ação na modalidade inadequação da via eleita. No mérito, em suma, afirmou que tanto as normas estaduais como as federais a respeito do tema queima controlada são constitucionais, sendo os órgãos estaduais os responsáveis pela emissão das correspondentes licenças. Aduz que, no caso do Estado de São Paulo, a extinção dessa queima tem sido alcançada de forma gradativa, exatamente como previsto na legislação estadual. Alega que a atividade em baila não acarreta impacto ambiental suficiente a amparar a obrigatoriedade de elaboração de EIA/RIMA. Por fim, impugna a condenação por danos morais, dada a inexistência de responsabilidade civil que justificasse a respectiva imposição.

Apelou a União Federal (fls. 2.481/2.498) na qualidade de terceira interessada, alegando, em síntese, que a r. sentença é nula por ser extra petita, no capítulo em que determina à Polícia Federal que fiscalize a queima da palha de cana-de-açúcar na região, o que não foi objeto de pedido formulado pelo Parquet na petição inicial. Aponta, ademais, incompetência da Justiça Federal para a resolução da causa e impossibilidade de que sofra qualquer espécie de condenação, ainda que por via reflexa, uma vez que não figurou como parte no processo.

Todos os embargos de declaração foram rejeitados, tendo o MM. Juízo a quo esclarecido, de ofício, que "A Polícia Ambiental não estão sujeitas às penalidades cominadas na sentença [...], pois não integraram a relação processual, apenas foram oficiadas para que tomassem ciência acerca do conteúdo da sentença, com o fim de auxiliar os órgãos competentes na fiscalização de eventuais queimadas" (fls. 2.499/2.501-v).

Intimado da decisão que julgou os aclaratórios, o IBAMA reiterou suas razões de apelação (fls. 2.506).

Nas razões de apelação do Estado de São Paulo (fls. 2.507/2.550), afirmou-se, em resumo, o seguinte: a) preliminarmente, ser necessário o reconhecimento da ilegitimidade passiva do IBAMA e, da mesma forma, a incompetência da Justiça Federal; b) ainda em sede de preliminar, requereu a extinção do processo sem resolução do mérito, dada a impossibilidade jurídica dos pedidos principais de reconhecimento da inconstitucionalidade da legislação estadual que disciplina a queima da cana-de-açúcar; c) no que tange ao mérito, afirma que há previsão de eliminação da queima da cana-de-açúcar, que não pode ocorrer de imediato, a fim de que sejam preservados os interesses de todos os envolvidos; d) serem razoáveis os prazos previstos em lei para a eliminação dessa queima, que, ademais, é fundamental para que atendidos também os interesses dos trabalhadores envolvidos no processo de corte; e) se considerado o processo produtivo como um todo, possível concluir que, ao contrário do afirmado pelo Ministério Público, ele colabora com a manutenção do meio ambiente; f) não há meios disponíveis para que a cultura da cana-de-açúcar seja feita de forma mecanizada; g) são constitucionais e legais as normas estaduais que tratam da queima da palha de cana-de-açúcar, assim como de sua eliminação, sendo prescindível a prévia elaboração de EIA/RIMA para o desenvolvimento dessa atividade. Destarte, requereu a inversão do julgado.

Apelação conjunta do SIFAESP, SIAESP, União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo - UNICA e da Associação dos Fornecedores de Cana de Araraquara (fls. 2.553/2.609), sustentando, resumidamente, nulidade da r. sentença pela inexistência de lide a ser dirimida, vez que incabível o controle de constitucionalidade das Leis Estaduais 10.547/2000 e 11.547/2002 mediante ação civil pública, bem como a incompetência do IBAMA para conceder autorizações no caso ora sob exame. No que diz respeito ao mérito, alegou a impossibilidade de anulação de ato vinculado à Lei - no caso, a autorização da queima controlada -, sem a prévia declaração de inconstitucionalidade, irrealizável nesta demanda, bem como a inviabilidade de se pretender condenação por danos morais sem que também se ultrapasse o crivo da constitucionalidade da legislação estadual aplicável. Afirmou, ainda, serem inconsistentes as provas que apontam supostos malefícios da queima controlada da palha de cana-de-açúcar. Por fim, ponderou que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça e do C. Tribunal de Justiça do estado de São Paulo não amparam os pedidos deduzidos pelo Parquet.

Os apelos foram recebidos no efeito devolutivo (fls. 2.613) e subiram a esta E. Corte também por força de reexame necessário.

Às fls. 2.817/2.835, o Estado de São Paulo apresentou, com fulcro no art. 558, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973, pedido de suspensão do cumprimento da sentença até o respectivo trânsito em julgado, indeferida pelo E. Relator, consoante decisão prolatada às fls. 2.850/2.855-v.

O Ministério Público Federal oficiante nesta instância, em parecer de lavra da E. Procuradora Regional da República Fátima Aparecida de Souza Borghi, manifestou-se pelo não conhecimento do recurso da CETESB e pelo desprovimento das demais apelações (fls. 2.864/2.873).

Às fls. 2.881/2.919, foram juntadas cópias das decisões proferidas por esta E. Corte Regional no Incidente de Suspensão de Execução de Sentença 0036669-81.2010.4.03.0000, interposto pelo IBAMA, pelas quais, em suma, restou determinado que os efeitos da r. sentença ficariam suspensos até o trânsito em julgado, unicamente em relação à colheita da safra de 2011.

É o relatório.

À Douta Revisão.





LEILA PAIVA MORRISON
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 07/06/2016 12:33:50



APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0011027-50.2008.4.03.6120/SP
2008.61.20.011027-5/SP
RELATORA : Desembargadora Federal DIVA MALERBI
APELANTE : Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovaveis IBAMA
ADVOGADO : SP179488B ISABELLA MARIANA SAMPAIO PINHEIRO DE CASTRO e outro(a)
APELANTE : CETESB CIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL
ADVOGADO : SP209293 MARCELA BENTES ALVES
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
APELANTE : Estado de Sao Paulo
ADVOGADO : SP057222 JAQUES LAMAC e outro(a)
APELANTE : SINDICATO DA IND/ DA FABRICAO DO ALCOOL NO ESTADO DE SAO PAULO SIFAESP e outros(as)
: SINDICATO DA IND/ DO ACUCAR NO ESTADO DE SAO PAULO SIAESP
: UNIAO DA AGROINDUSTRIA CANAVIEIRA DO ESTADO DE SAO PAULO UNICA
: ASSOCIACAO DOS FORNECEDORES DE CANA DE ARARAQUARA CANASOL
ADVOGADO : SP194984 CRISTIANO SCORVO CONCEIÇÃO e outro(a)
APELADO(A) : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : ANDREY BORGES DE MENDONCA e outro(a)
EXCLUIDO(A) : DEPRN DEPARTAMENTO ESTADUAL DE PROTECAO DE RECURSOS NATURAIS
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE ARARAQUARA - 20ª SSJ - SP
No. ORIG. : 00110275020084036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

VOTO

A SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LEILA PAIVA MORRISON (RELATORA): - Inicialmente, ainda que a ampla devolutividade do exame da causa esteja assegurada pela remessa necessária, é caso de não conhecimento da apelação interposta pela CETESB, eis que interposta na pendência de embargos declaratórios, não sendo reiterada após o correspondente julgamento. Nesse sentido:


"ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. APELAÇÃO DA AUTORA NÃO CONHECIDA. NÃO REITERAÇÃO APÓS JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRECEDENTES DO C. STJ. INCLUSÃO EX OFFICIO DO PAI DA VÍTIMA NO POLO ATIVO DA DEMANDA. IMPOSSIBILIDADE. DANOS MORAIS COLETIVOS. JULGAMENTO EXTRA PETITA CONFIGURADO. DANOS MATERIAS E MORAIS NÃO CONFIGURADOS. AFOGAMENTO DE MENOR EM LAGOA EXISTENTE EM TERRENO DA CONCESSIONÁRIA. DESNECESSIDADE DE VIGILÂNCIA. SITUAÇÃO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO DE CAUSALIDADE COM A RESPONSABILIDADE PELO SERVIÇO PRESTADO. SITUAÇÃO DE PERIGO CRIADA PELA PRÓPRIA VÍTIMA. CULPA IN VIGILANDO DA MÃE. INVERSÃO DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. ARTIGO 12 DA LEI Nº 1.060/50. 1. Preliminarmente não se conhece da apelação da autora, pois interposta antes da sentença de fls. 346/347v, deixando o recurso de ser devidamente ratificado após a publicação da sentença que julgou os embargos de declaração opostos pela ALL - América Latina Logística Malha Paulista S.A, consoante entendimento firmado pelo STJ. [...] Na hipótese dos autos, não se pode esquecer que a própria vítima colocou-se na situação de risco de vida ao adentrar na lagoa, tanto que era de conhecimento público que o local era perigoso, inclusive com afogamento registrado anteriormente, de modo que a frequência por crianças e adolescentes não se mostra suficiente para caracterizar a responsabilidade da ré ALL, mas a completa irresponsabilidade dos pais no dever legal de orientação e acompanhamento dos filhos, configurando, in casu, a culpa in vigilando da autora. 13. Apelações das rés e remessa oficial providas. Reforma integral da sentença. Improcedência dos pedidos. Inversão dos ônus da sucumbência, aplicando-se o artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
(TRF-3 - APELREEX: 00085924220084036108 SP 0008592-42.2008.4.03.6108, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, Data de Julgamento: 16/12/2015, QUARTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/01/2016)
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. SÚMULA 418/STJ. ENUNCIADO EM VIGOR. INEXISTÊNCIA DE DISSENSO ATUAL SOBRE O TEMA. SÚMULA 168/STJ.
1. O acórdão embargado encontra-se fundamentado na Súmula 418/STJ, de modo que os Embargos de Divergência esbarram no óbice da Súmula 168/STJ:"Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado".
2. Destaque-se que, recentemente, a Corte Especial se pronunciou nesse mesmo sentido, em hipótese na qual o acórdão embargado encontrava-se fundamentado na Súmula 418/STJ, enunciado que se encontra vigente e eficaz (AgRg nos EREsp 1.174.159/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, DJe 2/2/2015).
3. Em se tratando especificamente do tema da admissibilidade da Apelação interposta antes da apreciação dos Embargos de Declaração da sentença, sem posterior ratificação, não se verifica divergência atual no âmbito do STJ. Precedentes: AgRg no AREsp 437.843/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 8/4/2014; AgRg no AREsp 251.735/MG, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, Dje 29/11/2013; AgRg no AREsp 618.284/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, DJe 26/5/2015; AgRg no REsp 1.476.689/GO, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 13/5/2015; AgRg no REsp 1.252.008/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 17/10/2011).
4. Agravo Regimental não provido."
(AgRg nos EAREsp 672867/GO - Relator Ministro HERMAN BENJAMIN - Corte Especial - j. 19/08/2015 - DJe 14/09/2015 - destaquei)
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO INTERPOSTA NA PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NECESSIDADE DE RATIFICAÇÃO. SÚMULA 418/STJ. APLICAÇÃO.
1. A jurisprudência deste Superior Tribunal firmou-se no sentido de ser extemporânea a apelação interposta na pendência de julgamento dos embargos de declaração, ainda que apresentados pela parte contrária ou rejeitados, sem que ocorra a posterior e necessária ratificação, dentro do prazo legal.
2. Diante disso, aplica-se, por analogia, o enunciado da Súmula 418/STJ, que assim dispõe:"É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação".
3. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no AREsp 251735/MG - Relator Ministro OG FERNANDES - Segunda Turma - j. 19/11/2013 - DJe 29/11/2013 - destaquei).

Por sinal, não tem aplicação à hipótese o disposto no art. 1.024, § 5º, do Código de Processo Civil de 2015 ("Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração será processado e julgado independentemente de ratificação") uma vez que a análise do presente recurso será realizada nos moldes do CPC de 1973, que regia o procedimento recursal à época de sua interposição. Observa-se, portanto, o entendimento pacificado pela E. Corte Especial do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.144.079/SP, submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC de 1973, no sentido de que a aplicação da regra do artigo 1.211 do CPC de 1973, que tratava do princípio "tempus regit actum", impunha respeito aos atos praticados sob a égide da lei revogada, não havendo que se falar em retroação da lei nova, eis que deve prevalecer a incidência da lei vigente na data da prolação dos recursos cabíveis contra decisão ou sentença.

Esse é o juízo de valor utilizado no presente caso, sob a vigência do novo diploma processual, para identificar, topicamente, uma hipótese excepcional de ultratividade do CPC de 1973, que autoriza a sua aplicação ao julgamento do presente recurso, amparada nos precedentes jurisprudenciais que o cercava e pela norma do artigo 14 do CPC de 2015, nos seguintes termos: "A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".

Veja-se, nesse sentido, o magistério de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in verbis:


"7. Lei processual sobre recursos. No que tange aos recursos, é preciso particularizar-se a regra do comentário anterior. Duas são as situações para a lei nova processual em matéria de recursos: a) rege o cabimento e a admissibilidade do recurso a lei vigente à época da prolação da decisão da qual se pretende recorrer; b) rege o procedimento do recurso a lei vigente à época da efetiva interposição do recurso. Neste sentido: Nery. Recursos7, n. 3.7, p. 470; Stein-Jonas-Schlosser. Kommentar21, v. 7, t. II, coment. n. 2, 4, b ao § 1º da EGZPO, p. 584; Rosenberg-Schwab-Gottwald. ZPR17, § 6º, I, p. 30; Chiovenda. Istituzioni2, v.1, n. 27, p. 86; Gabba. Retroattività3, v. 4, pp. 539/541; Roubier. Conflits, v. 2, n. 144, pp. 728/730; Roubier. Droit transitoire2, n. 105, pp. 563/565; Valladão. Coment., n. 24. p. 89 et seq.; Pimentel. Causas pendentes2, p. 24; Lacerda. Feitos pendentes, pp. 68/69; Rosas. Direito intertemporal processual (RT 559 [1982], 5, p. 11); Maximiliano. Dir. Intertemporal2, n. 238, pp. 278/279. Em sentido contrário, propondo que se aplique ao recurso a lei vigente no "dia da sentença": Wambier-Alvim Wambier-Medina. Reformas2, capítulo "direito intertemporal", nota 12, p. 321. Se, como aponta essa corrente para justificar seu entendimento, seria difícil identificar o que é procedimento, é simples e objetivo identificar o que é cabimento e admissibilidade do recurso, de modo que, até mesmo por exclusão ou por via indireta, pode-se, com extrema facilidade, chegar ao entendimento do que seria procedimento do recurso".
(...) 12. Recurso já interposto. Superveniência de lei nova. Quando o recurso já tiver sido interposto e sobrevier lei que altere o seu regime jurídico, manter-se-á eficaz a lei antiga quanto ao cabimento e ao procedimento do recurso. A este fenômeno dá-se o nome de ultratividade (Cardozo. Retroatividade, p. 296 et seq) ou sobrevigência (Cruz. Aplicação, n. 78, p. 298 et seq) da lei anterior. V. Nery. Recursos7, n. 37, pp. 470/471. Em sentido contrário: Se não se suprimiu o recurso, não há razão para que prevaleçam as regras anteriores do seu procedimento" (Sálvio de Figueiredo Teixeira. A Lei 9756/98 e suas inovações [Alvim Walmbier-Nery. Recursos II, p. 546]) (Comentários ao Código de Processo Civil / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, pp. 2235 e 2236)

Nesse diapasão, acrescente-se que, no atual contexto, o Plenário do Colendo Superior Tribunal de Justiça fez editar, em 9.3.2016, por meio de sessão, cuja ata foi publicada em 11.3.2016, o enunciado administrativo, nos seguintes termos: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2, E. Plenário do C. STJ, em 9/3/2016).

Registre-se a manifestação da Colenda Corte Superior de Justiça admitindo a aplicação da lei vigente à época da decisão impugnada, no que toca à interposição e ao julgamento do recurso, conforme a seguinte ementa, in verbis:


"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. RECURSO ESPECIAL. ENTRADA EM VIGOR DA LEI 11.352/01. JUNTADA DOS VOTOS AOS AUTOS EM MOMENTO POSTERIOR. DIREITO INTERTEMPORAL. LEI APLICÁVEL. VIGENTE À ÉPOCA DA PUBLICAÇÃO. INCIDÊNCIA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 530 DO CPC. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA.
1. Na ocorrência de sessão de julgamento em data anterior à entrada em vigor da Lei 11.352/01, mas tendo o teor dos votos sido juntado aos autos em data posterior, não caracteriza supressão de instância a não interposição de embargos infringentes, porquanto, na hipótese, a lei vigente à época da publicação rege a interposição do recurso.
2. Embargos de divergência providos.
(EREsp 740.530/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/12/2010, DJe 03/06/2011)

Isso não bastasse, verifico, ainda, que o preparo da apelação interposta pela CETESB foi recolhido de forma irregular, haja vista que o pagamento efetivou-se no Banco do Brasil e não na Caixa Econômica Federal (fls. 2.475/2.477), consoante determina o art. 2º da Lei 9.289/1996, que apenas excetua tal obrigação caso na localidade não exista agência da CEF disponível, o que, à toda evidência, não é o caso da Subseção Judiciária de Araraquara. Trata-se de outro óbice para o conhecimento desse apelo, para além da ausência de reiteração supracitada. Veja-se, a propósito do tema, a jurisprudência:


"1. Inviável o trâmite do recurso extraordinário se foi adotado procedimento que não se coaduna com o estabelecido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região por meio da Resolução 169/2000, órgão a quem compete estabelecer o banco e a agência em que deve ser realizado o recolhimento do preparo. 2. Agravo regimental improvido".(AI 504185 AgR, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 29/11/2005, DJ 03-02-2006 PP-00048 EMENT VOL-02219-04 PP-02871)
"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUSTAS PROCESSUAIS. RECOLHIMENTO EM INSTITUIÇÃO DIVERSA DAQUELA INDICADA EM LEI. RECURSO DESERTO. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. "O pagamento das custas processuais, na Justiça Federal, deve ser efetuado nos moldes determinados pela Lei n. 9.289/96, não sendo dado à parte efetuar o recolhimento em instituição diversa daquela determinada, taxativamente, pelo legislador" (AgRg no Ag 573.395/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, Quarta Turma, DJ 13/12/04) 2. Agravo regimental não provido".
(AgRg no AREsp 81.824/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/12/2012, DJe 04/02/2013)

Outrossim, esclarece-se que a apelação da União Federal não foi recebida pelo MM. Juízo a quo, decisão não combatida pelo recurso próprio, tendo sido, dessa forma, alcançada pela preclusão, razão pela qual esse apelo também não será conhecido.

Prosseguindo, não merece acolhida a alegação acerca de incompetência da Justiça Federal para o julgamento da causa.

Isso porque o autor e ora recorrido Ministério Público Federal, órgão da União, é legitimado ativo para a propositura de ação civil pública (arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III da Lei Complementar nº 75/93 e art. 5º, I, da Lei 7.347/85), o que se mostra determinante para a fixação da competência da Justiça Federal in casu, independentemente da natureza da relação litigiosa travada. Nesse diapasão, vide aresto do C. Superior Tribunal de Justiça:


"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DISSÍDIO NOTÓRIO.
1. Os arts. 8º, inc. III e art. 26, § 3º da Lei n. 6.385/1976, arts. 10, IX e 11, VII, da Lei n. 4.595/1964; e art. 81, parágrafo único, inc. I, da Lei 8.078/1990, tidos por violados, não possuem aptidão suficiente para infirmar o fundamento central do acórdão recorrido - a competência para apreciação da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal - , o que atrai a incidência analógica da Súmula 284 do STF, do seguinte teor: É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia.
2. A ação civil pública, como as demais, submete-se, quanto à competência, à regra estabelecida no art. 109, I, da Constituição, segundo a qual cabe aos juízes federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho". Assim, figurando como autor da ação o Ministério Público Federal, que é órgão da União, a competência para a causa é da Justiça Federal.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e nesta parte provido para determinar o prosseguimento do julgamento da presente ação civil pública na Justiça Federal".
(REsp 1283737/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe 25/03/2014)

Ademais, a presença do IBAMA - Autarquia Federal (art. 2º da Lei 7.735/89) - no polo passivo constituiu outro fator a, mais uma vez nos termos do art. 109, I, da Constituição da República, assentar a competência da Justiça Federal para a resolução deste feito.

Nessa esteira, também não prospera o argumento segundo o qual o IBAMA não seria parte legítima para figurar no polo passivo desta demanda.

Com efeito, busca o Parquet, em essência, um provimento judicial que imponha ao IBAMA o dever de atuar supletivamente na fiscalização e combate à queima da palha de cana-de-açúcar em São Paulo, mormente em relação à ausência de EIA/RIMA para a concessão das licenças ambientais, tendo em vista uma indigitada omissão da Autarquia quanto ao cumprimento de suas obrigações nessa seara.

Ora, o IBAMA, como órgão executor da Política Nacional do Meio Ambiente, possui como atribuições, segundo os ditames da Lei 6.938/81 e Resolução CONAMA 237/97, entre outras, os deveres de promover a preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos ambientais. Aliás, o art. 4º da Resolução CONAMA 237/97 dispõe, in verbis:

[...]
Art. 4º - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber:
I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União.
II - localizadas ou desenvolvidas em dois ou mais Estados;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do País ou de um ou mais Estados;

E não há dúvidas de que, potencialmente, a atividade consistente em queima de palha de cana-de-açúcar pode acarretar significativos impactos ambientais que ultrapassam os limites da localidade em que praticado, destacando-se, consoante narrado pelo Ministério Público ao longo dos autos, os respectivos efeitos no aquecimento global pela liberação de dióxido de carbono, dispersão de material particulado (causando danos às funções e estruturas do aparelho respiratório) ou de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos ou HPA's (substâncias mutagênicas). A efetiva ocorrência, ou não, desses danos, constituiu matéria que ultrapassa os limites possíveis para a aferição das condições da ação, inserindo-se no mérito da lide.

Outrossim, um dos pontos destacados pelo Parquet nesta ação consiste exatamente na inadequação da legislação estadual Paulista ao não prever a exigência de EIA/RIMA no procedimento de expedição de licença para a queima da palha de cana-de-açúcar, fato esse que, nos temos na norma supraexposta, reclama uma atuação supletiva do IBAMA.

Logo, considerado todo esse quadro fático a atrair, nos termos da legislação incidente, um efetivo desempenho do IBAMA, ainda que de forma indireta, esta C. Corte Regional, com supedâneo em jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, vem decidindo que essa Autarquia Federal possui legitimidade passiva nas causas de responsabilização civil por danos ambientais, mormente quando lhe é imputada omissão no seu dever administrativo-fiscalizatório. Confira-se:


"AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÕES. REMESSA OFICIAL INTERPOSTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DANO AMBIENTAL EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ENTORNO DE RESERVATÓRIO ARTIFICIAL. IMPRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE POLUIDORES DIRETOS E INDIRETOS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA.
1. Conhecimento ex officio da remessa oficial, vez que o artigo 19 da Lei nº 4.717/65 aplica-se analogicamente às ações civis públicas, vez que tanto estas quanto as ações populares visam tutelar o patrimônio público lato sensu, estando ambas regidas pelo microssistema processual da tutela coletiva.
2. Danos ambientais supostamente causados pela construção e manutenção de rancho em área de preservação permanente situada às margens do reservatório UHE de Água Vermelha/SP, formado em razão de represamento das águas do Rio Grande, rio federal e bem da União, razão pela qual esse ente federativo possui interesse direto na causa, atraindo a competência da Justiça Federal para processar e julgá-la, mormente pelo fato do IBAMA, autarquia federal, estar inserido no pólo passivo. Preliminar arguida pelo Município de Cardoso/SP em suas contrarrazões rejeitada.
3. Não é o caso de extinguir o feito, sem resolução do mérito, por superveniência perda de objeto, vez que tal pedido formulado pela AES Tietê S.A. carece de fundamento, já que seria necessária perícia técnica para constatar que a cota máxima de operação e a cota máxima maximorum de fato são iguais, sendo insuficiente o documento elaborado pela CETESB, em razão deste não ser o órgão responsável pelo licenciamento do reservatório da UHE Água Vermelha.
4. A responsabilidade objetiva e solidária por danos ambientais enseja o litisconsórcio passivo facultativo entre os vários poluidores, diretos ou indiretos, cabendo ao autor demandar contra qualquer um deles, isoladamente ou em conjunto, sendo perfeitamente cabível requerer a condenação do IBAMA à "obrigação de fazer consistente na fiscalização e acompanhamento técnico ambiental até a completa recuperação da área de preservação permanente", pois, muito embora se inclua entre suas atribuições institucionais, tal providência visa evitar a deficiência e omissão no seu exercício de poder de polícia, conferindo plena utilidade e eficácia à prestação jurisdicional.
5. Ocorrência de cerceamento de direito de ação e defesa, vez que a causa demanda a realização de exame pericial para ser dirimida, seja por versar sobre matéria fática controvertida, seja pelo fato de tanto a parte autora quanto a ré terem postulado tal prova, em especial para constatar a existência e extensão da degradação ambiental, a possibilidade de restauração integral da área degradada, se as edificações e demais formas que impedem a regeneração da vegetação nativa estão situadas em área de preservação permanente e se o espaço territorial em tela foi objeto de eventual inundação.
6. Pedido formulado pela AES Tietê S.A. de extinção do processo por perda superveniente de objeto indeferido, preliminar arguida pelo Município de Cardoso/SP em contrarrazões rejeitada, remessa oficial, tida por interposta, e apelação do Ministério Público Federal providas para anular a r. sentença, devendo os autos retornarem à Vara de Origem para que seja realizada prova pericial, e parte da apelação do IBAMA não conhecida e, na parte conhecida, improvida".
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC 0008726-75.2008.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 10/12/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015, grifei).

Ademais, conquanto não existisse à época do ajuizamento da ação a Lei Complementar 140/2011 - que fixou normas para a cooperação entre os entes federados no exercício da competência constitucional comum relativa à proteção do meio ambiente -, tem-se que a aludida norma sedimentou todo o entendimento supraexposto acerca da atribuição supletiva do IBAMA em matéria de licenciamento ambiental (art. 3º, I; art. 13, § 3º e art. 15), reforçando toda a fundamentação a respeito.

No mais, também não prospera a alegação de que a ação civil pública constituiria instrumento processual inadequado para que veiculadas as pretensões ora deduzidas.

De fato, a apontada inconstitucionalidade das leis estaduais, na parte em que dispõem sobre a queima da palha de cana-de-açúcar, não consubstanciou objeto principal deste feito - o que, decerto, não seria possível, sob pena de usurpação da competência exclusiva do C. Supremo Tribunal Federal - mas, isso sim, pleito incidental, sob forma de controle difuso de constitucionalidade incidenter tantum, perfeitamente cabível no âmbito da ação civil pública. Por sinal, esse o entendimento consolidado no Pretório Excelso:


EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA: POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(RE 645508 AgR, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 22/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-235 DIVULG 12-12-2011 PUBLIC 13-12-2011)
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO DE LOGRADOUROS PÚBLICOS. LEI 754/1994 DO DISTRITO FEDERAL. PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM. 1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para propor ação civil pública com fundamento na inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, desde que incidenter tantum. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 438328 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 24/06/2008, DJe-152 DIVULG 14-08-2008 PUBLIC 15-08-2008 EMENT VOL-02328-05 PP-00971 RT v. 97, n. 877, 2008, p. 107-109 LEXSTF v. 30, n. 360, 2008, p. 165-169)

No que diz respeito ao mérito, verifica-se que a questão ora debatida, com todas as suas minúcias, já foi objeto de diversas análises e decisões neste E. Tribunal, inclusive nesta C. Sexta Turma, sem que houvesse substanciais divergências quanto aos desfechos anunciados.

Inicialmente, e para que se possa compreender, ainda que de modo sucinto, o tema em debate, anoto que a prática da queima da palha da cana tem como principal mote a periodicidade desse cultivo e o escopo econômico, sendo verificada antes da colheita e tendo por objetivo principal eliminar, por combustão, folhas secas ("palhas") e vegetações localizadas nas adjacências da plantação.

Assim se procede, segundo os defensores desse método, porque a matéria vegetal alheia à cana não possui qualquer utilidade, sendo que a respectiva eliminação antes da colheita desonera o custo do transporte entre o canavial e a usina ou outra unidade de destino (pois a carga torna-se menos pesada). Essa queima também auxilia o corte manual da cana, tanto porque afasta os animais que comumente são encontrados nos canaviais (abelhas, aranhas, cobras, etc), como também porque colabora na atenuação do esforço físico dos trabalhadores, propiciando uma melhor visualização da área e reduzindo os riscos de acidente de trabalho, comumente ocasionados pelo uso de "facão" associado à fadiga.

Pois bem. Destaca-se que a proteção do meio ambiente foi erigida pela Constituição da República como condicionante à atividade econômica e à função social da propriedade, todos tendo direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, sendo que as condutas e atividades consideradas lesivas sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (arts. 23, VI, 186, II e 225).

Outrossim, incumbe à Administração exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente (ou seja, como condicionante ao licenciamento), estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade, bem como controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente (CFR, art. 225, § 1º, IV e V).

Daí porque, ainda segundo os precedentes desta E. Corte, a falta de EIA/RIMA no procedimento de licenciamento de queima controlada em canavial, em princípio, não é inconstitucional, devendo-se analisar se a atividade imporá riscos à saúde e ao meio ambiente.

Isso posto, tem-se que a competência direta para o licenciamento de atividades cujo desenvolvimento se mostra apto a propiciar riscos ao meio ambiente é, inicialmente, do órgão estadual responsável, cabendo ao IBAMA a possibilidade de intervenção supletiva, nos casos de inércia ou negligência do Estado-membro (art. 10, § 3º, da Lei 6.938/81 na redação anterior à LC 140/2011).

No que tange especificamente ao uso do fogo nas florestas e demais formas de vegetação, observa-se que o art. 27 da Lei 4.771/65 (Código Florestal vigente na época do ajuizamento) proibia tal prática, mas de forma relativa, pois o respectivo parágrafo único preconizava que se peculiaridades locais ou regionais justificassem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, a permissão poderia ser concedida pelo poder Público, desde que devidamente delimitadas as áreas e estabelecidas normas de precaução.

A seu turno, o Decreto 2.661/98 regulamentava o supracitado art. 27 do antigo Código Florestal, determinando que o emprego do fogo, como método despalhador e facilitador do corte de cana-de-açúcar em áreas passíveis de mecanização da colheita, seria eliminado de forma gradativa (art. 16 e ss.).

Por sua vez, a Resolução CONAMA 237/97, editada nos parâmetros do poder normativo conferido ao Órgão pela Lei 6.938/81, além de ratificar a competência supletiva do IBAMA para o licenciamento de atividades na hipótese em que os impactos ambientais dela decorrentes ultrapassarem os limites da localidade (art. 4º, III, § 2º), definiu no respectivo Anexo "1" as atividades ou empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental, não englobando a prática da queima da palha de cana-de-açúcar.

No âmbito do Estado de São Paulo, foram editadas as Leis Estaduais 10.547/2000 e 11.241/02 que, dentre outras disposições, proibiram o emprego do fogo nas florestas e demais formas de vegetação, excetuadas as atividades agrícolas, pastoris ou florestais, dentre as quais se insere a queima controlada da palha de cana-de-açúcar, técnica que, por outro lado, e de acordo com essa mesma legislação, deveria ser eliminada de forma gradativa, impondo-se, inclusive, um calendário de extinção.

Regulamentando essa legislação Paulista, veio à baila o Decreto Estadual 45.869/01, pelo qual definidos procedimentos, proibições e regras de execução e medidas de precaução a serem obedecidas quando do emprego do fogo no corte de açúcar, a serem estipuladas mediante requerimento detalhado do interessado junto ao órgão responsável.

Ocorre que, como já adiantado, tanto pela jurisprudência, como pelos dados concretos extraídos da prova coligida nos autos, a prática da queima da palha de cana de açúcar, se procedida sem as necessárias cautelas, pode acarretar ou incrementar reais e graves riscos à saúde humana e ao meio ambiente, pelo lançamento de partículas de fuligem (material particulado) na atmosfera, composta também por gases tóxicos que, entre o mais, agravam os efeitos decorrentes do efeito estufa e induzem a doenças respiratórias, havendo estudos que, inclusive, apontam consequências mais gravosas, como a potencialização de doenças cancerígenas.

A respeito dos danos que a queima da cana provoca ao meio ambiente, já se pronunciou o C. Superior Tribunal de Justiça:


"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. QUEIMA DA PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. EXISTÊNCIA DE REGRA EXPRESSA PROIBITIVA. EXCEÇÃO EXISTENTE SOMENTE PARA PRESERVAR PECULIARIDADES LOCAIS OU REGIONAIS RELACIONADAS À IDENTIDADE CULTURAL. REANÁLISE DE AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE EXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
1. O procedimento de queima de palha de cana-de-açúcar possui caráter prejudicial ao meio ambiente. Esta Corte já possui entendimento firmado no sentido de se considerar que tal atividade é possível excepcionalmente, desde que não seja danosa ao meio ambiente e haja a respectiva de autorização do órgão competente.
2. A partir da leitura do acórdão de origem, depreende-se que não há nos autos elementos capazes de confirmar a ilegalidade da prática de queima exercida no caso concreto. Desse modo, modificar o acórdão recorrido ensejará uma revisão do acervo fático probatório, inadmitido em sede de Recurso Especial, conforme orientação firmada pela Súmula 7/STJ.
Agravo regimental improvido".
(AgRg no REsp 1413767/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/10/2015, DJe 27/10/2015)
"PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. QUEIMADA DA PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. PROIBIÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 27 DO CÓDIGO FLORESTAL.
1. "Segundo a disposição do art. 27 da Lei n. 4.771/85, é proibido o uso de fogo nas florestas e nas demais formas de vegetação, as quais abrangem todas as espécies, independentemente de serem culturas permanentes ou renováveis. Isso ainda vem corroborado no parágrafo único do mencionado artigo, que ressalva a possibilidade de se obter permissão do Poder Público para a prática de queimadas em atividades agropastoris, se as peculiaridades regionais assim indicarem" (REsp 439.456/SP, 2ª T., Min. João Otávio de Noronha, DJ de 26/03/2007). Indispensável considerar que "[as] queimadas, sobretudo nas atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas ou empresariais, são incompatíveis com os objetivos de proteção do meio ambiente estabelecidos na Constituição Federal e nas normas ambientais infraconstitucionais. Em época de mudanças climáticas, qualquer exceção a essa proibição geral, além de prevista expressamente em lei federal, deve ser interpretada restritivamente pelo administrador e juiz" (REsp 1000731, 2a. Turma, Min.Herman Benjamin, DJ de 08.09.09).
2. Assim, a palha da cana-de-açúcar está sujeita ao regime do art. 27 e seu parágrafo do Código Florestal, razão pela qual sua queimada somente é admitida mediante prévia autorização dos órgãos ambientais competentes, nos termos do parágrafo único do mesmo artigo e do disposto no Decreto 2.661/98, sem prejuízo de outras exigências constitucionais e legais inerentes à tutela ambiental, bem como da responsabilidade civil por eventuais danos de qualquer natureza causados ao meio ambiente e a terceiros.
3. Embargos de Divergência improvidos.
(EREsp 418.565/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 29/09/2010, DJe 13/10/2010)
"AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMA DE PALHA DA CANA-DE-AÇÚCAR. IMPOSSIBILIDADE. DANO AO MEIO AMBIENTE.
1. A Segunda Turma do STJ reconheceu a ilegalidade da queima de palha de cana-de-açúcar, por se tratar de atividade vedada, como regra, pela legislação federal, em virtude dos danos que provoca ao meio ambiente.
2. De tão notórios e evidentes, os males causados pelas queimadas à saúde e ao patrimônio das pessoas, bem como ao meio ambiente, independem de comprovação de nexo de causalidade, pois entender diversamente seria atentar contra o senso comum. Insistir no argumento da inofensividade das queimadas, sobretudo em época de mudanças climáticas, ou exigir a elaboração de laudos técnicos impossíveis, aproxima-se do burlesco e da denegação de jurisdição, pecha que certamente não se aplica ao Judiciário brasileiro.
3. O acórdão recorrido viola o art. 27 da Lei 4.771/1965 ao interpretá-lo de forma restritiva e incompatível com a Constituição da República (arts. 225, 170, VI, e 186, II)). Para a consecução do mandamento constitucional e do princípio da precaução, forçoso afastar, como regra geral, a queima de palha da cana-de-açúcar, sobretudo por haver instrumentos e tecnologias que podem substituir essa prática, sem inviabilizar a atividade econômica.
4. Caberá à autoridade ambiental estadual expedir autorizações - específicas, excepcionais, individualizadas e por prazo certo - para uso de fogo, nos termos legais, sem a perda da exigência de elaboração, às expensas dos empreendedores, de Estudo Prévio de Impacto Ambiental, na hipótese de prática massificada, e do dever de reparar eventuais danos (patrimoniais e morais, individuais e coletivos) causados às pessoas e ao meio ambiente, com base no princípio poluidor-pagador.
5. Recurso Especial provido.
(REsp 965.078/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/08/2009, DJe 27/04/2011)

As consequências potencialmente danosas da queima da cana já foram também reconhecidas pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 586224/SP, Relator  Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 05/03/2015, com repercussão geral. Com efeito, nesse julgamento, discorreu-se, obter dictum, sobre os aspectos negativos da queima e mecanização da cana-de-açúcar, muito embora a questão principal tratasse de tema parcialmente diverso do ora deduzido, qual seja, os limites da competência dos municípios para legislar sobre o meio ambiente junto com a União e Estado-membro.

Os corréus, por outro lado, ao longo da instrução, insistiram que os efeitos supostamente nocivos da queima da cana não estão devidamente comprovados, razão pela qual não haveria óbice para que a respectiva prática seguisse na forma cautelosa imposta pela legislação Paulista, até que finalmente se consumasse a sua eliminação.

Sucede que, como bem assinalado na r. sentença, o princípio da prevenção, extraível da proteção integral que constitucionalmente recai sobre o meio ambiente (art. 225 CRF), impõe a realização de EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais, ainda que a constatação dessa lesividade advenha de probabilidade e não seja certa a sua ocorrência.

Dessa forma, tratando-se de atividade com significante impacto ambiental, com potencial de extrapolar os limites da localidade em que praticada, se mostra correta e afinada com os ditames da Carta Magna e da Política Nacional do Meio Ambiente a condenação da CETESB e do Estado de São Paulo para que se abstenham a conceder novas licenças de queima controlada da palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela Subseção Judiciária de Araraquara, sem prévio EIA/RIMA. Nessa esteira, impõe-se reconhecer, na mesma medida, o acerto da condenação do IBAMA para que fiscalize a exigência de licenciamento e prévio EIA/RIMA para as atividades da espécie desenvolvidas no território da referida Subseção.

Em relação à condenação acerca de danos morais difusos, mais uma vez se vislumbra o acerto da r. sentença.

Com efeito, tem-se caracterizado o dano moral difuso, passível de ser pleiteado mediante ação civil pública, quando o fato transgressor seja de razoável significância que desborde os limites da tolerabilidade, sendo grave o suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva. Nesse sentido: REsp 1221756/RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ªT, DJe 10/02/2012; REsp 1291213/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ªT, DJe 25/09/2012.

Em substancioso voto condutor proferido no REsp 1057274/RS, julgado em 01.12.2009, a Exma. Ministra Eliana Calmon, do C. Superior Tribunal de Justiça, não bastasse esmiuçar com precisão todos os requisitos necessários para a configuração do dano coletivo latu sensu, pontuou que a respectiva caracterização prescindiria até de comprovação de dor, sofrimento e de abalo psicológico. Assim explicou Sua Excelência (verbis):


"[...]
1. O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base.
2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos.
[...]
Como constata Xisto Tiago de Medeiros Neto:
Dessa maneira, o alargamento da proteção jurídica à esfera moral ou extrapatrimonial dos indivíduos e também aos interesses de dimensão coletiva veio a significar destacado e necessário passo no processo de valorização e tutela dos ireitos fundamentais. Tal evolução, sem dúvida, apresentou-se como resposta às modernas e imperativas demandas da cidadania. Ora, desde o último século que a compreesnão da dignidade humana tem sido referida a novas e relevantíssimas projeções, concebendo-se o indivíduo em sua integralidade e plenitude, de modo a ensejar um sensível incremento no que tange às perspectivas de sua proteção jurídica no plano individual, e, também, na órbita coletiva. É inegável, pois, o reconhecimento e a expansão de novas esferas de proteção à pessoa humana, diante das realidades e interesses emergentes na sociedade, que são acompanhadas de novas violações de
direitos. (Dano moral coletivo. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 121).
O mesmo autor sintetiza os requisitos para configuração do dano moral coletivo:
Em suma, pode-se elencar como pressupostos necessários à configuração do dano moral coletivo, de maneira a ensejar a sua respectiva reparação, (1) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física ou jurídica; (2) a ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria ou classe de pessoas); (3) a intolerabilidade da ilicitude, diante da realidade apreendida e da sua repercussão social; (4) o nexo causal observado entre a conduta e o dano correspondente à violação do interesse coletivo (lato sensu). (idem, p. 136)
O dano moral extrapatrimonial deve ser averiguado de acordo com as
características próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõem determinada coletividade ou grupo determinado ou indeterminado de pessoas, sem olvidar que é a confluência dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo.
[..]"

No caso ora sob apreciação, resta patente a conduta antijurídica dos órgãos públicos que, atrelados às correspondentes atribuições, deveriam zelar pela preservação do meio ambiente e, especificamente, exigirem a elaboração do EIA/RIMA para que, eventualmente, fosse concedida licença para a atividade de queima da cana, sendo que a violação a esses deveres configurou afronta direta ao art. 225, caput, § 1º, incisos IV e V, da Constituição da República.

Tal conduta, no mais, consubstanciou ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma coletividade latu sensu, que inegavelmente foram expostas a todos os malefícios que a prática da queima da palha de cana-de-açúcar pode acarretar, tanto os potenciais como os já comprovados. E descabe falar-se em tolerabilidade desse comportamento em razão do que dispõe a legislação estadual, eis que a Carta Magna não deixa dúvidas sobre a necessidade de licenciamento para as atividades da espécie, bem como a obrigação de controle sobre técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.

Derradeiramente, no que tange ao dano moral difuso, desnecessária a aferição de culpa dos entes públicos envolvidos, em razão da responsabilidade objetiva a que estão submetidos pelo disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, sendo que o valor fixado na r. sentença - R$ 500.000,00 - a ser revertido ao Fundo Federal de Direitos Difusos, não representou exagero ou demasia, sendo esse montante, inclusive, inferior ao arbitrado em outro caso análogo julgado nesta E. Sexta Turma, como se verá a seguir.

Repisa-se que todo o entendimento supraexposto, tanto no que diz respeito às questões prejudiciais, como as de mérito, bem como em relação ao dano moral difuso, sintetizam o entendimento desta E. Sexta Turma sobre o tema, pelo que, a seguir, passo a transcrever as correspondentes ementas:


"PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. AMBIENTAL. AGRAVO RETIDO REITERAÇÃO INOCORRÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRESENÇA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E DO IBAMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POSSIBILIDADE. QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. NECESSIDADE DE PRÉVIO ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA CONCESSÃO DE LICENÇA. APLICAÇÃO DA MULTA DIÁRIA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA SENTENÇA. POSSIBILIDADE. INDENIZAÇÃO AO FUNDO FEDERAL DE DIREITOS DIFUSOS POR DANOS MORAIS COLETIVOS. CABIMENTO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Não conhecido o agravo retido interposto pelo Sindicato da Indústria da Fabricação do Álcool do Estado de São Paulo (SIAFESP), Sindicato da Indústria do Açúcar no Estado de São Paulo (SIAESP) e pela União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo (ÚNICA), tendo em vista a homologação do pedido de desistência do recurso de apelação interposto pelas partes, que deixaram, consequentemente, de reiterá-lo expressamente nas razões ou na resposta de apelação, conforme disposição do art. 523, § 1º do CPC/73.
2. A participação do Ministério Público Federal no polo ativo, cuja legitimidade exsurge dos arts. 6º, VII, "b" e 39, II e III, da Lei Complementar n.º 75/93, foi o fator determinante para a fixação da competência da Justiça Federal para a apreciação da causa, nos termos do art. 109, I, da Constituição.
3. Também não prospera a alegação de ilegitimidade passiva ad causam do IBAMA, órgão executor da Política Nacional do Meio Ambiente que promove a preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos ambientais, nos termos do disposto na Lei n.º 6.938/81, regulamentada pela Resolução CONAMA n.º 237/97, cujo art. 4º, III, prescreve competir ao IBAMA o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do País ou de um ou mais Estados.
4. Como se sabe, a queima da palha de cana-de-açúcar não pode ser considerada uma atividade com impacto exclusivamente local, haja vista as inegáveis repercussões, sobretudo no âmbito regional.
5. É possível a análise da inconstitucionalidade das leis estaduais ora discutidas, visto que, in casu, se opera o controle difuso ou incidenter tantum de constitucionalidade, porquanto o pedido principal objetiva que a CETESB e o Estado de São Paulo abstenham-se de conceder novas licenças e autorizações ambientais para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar da área compreendida pela Subseção de Franca, decretando-se a nulidade das já expedias.
6. O art. 27, da Lei n.º 4.771/1965, proibia, por regra, a queima de vegetação, a permitindo apenas excepcionalmente, de acordo com as peculiaridades regionais, após prévio licenciamento do ente ambiental, o que foi regulamentado pelo Decreto n.º 2.661/1998, ainda em vigor, que definiu a queima controlada como sendo o emprego do fogo como fator de produção e manejo em atividades agropastoris ou florestais, e para fins de pesquisa científica e tecnológica, em áreas com limites físicos previamente definidos (art. 2º, parágrafo único).
7. De acordo com a Lei n.º 12.651/2012, é proibido o uso de fogo na vegetação, exceto nas seguintes situações (...) em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle (art. 38, I).
8. Embora seja indubitável que a atividade de queima da vegetação cause significativa degradação do meio ambiente, razão pela qual, em regra, deve ser proibida, a própria lei excepciona casos em que as peculiaridades regionais justifiquem o emprego do fogo para práticas agropastoris, mediante prévia aprovação do órgão estadual, para hipóteses individualizadas, por prazo certo e sem prejuízo da eventual responsabilização civil do proprietário por eventuais danos causados ao meio ambiente e a terceiros, em homenagem, inclusive, ao princípio do poluidor-pagador.
9. Mostra-se, assim, adequada a r. sentença que determinou à CETESB e ao Estado de São Paulo, que se abstenham de conceder novas licenças ambientais, tendo como objeto autorização para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela Subseção de Franca, decretando nulas todas as licenças e autorizações já expedidas e determinando a paralisação das atividades de queima, em razão da ausência de estudo de impacto ambiental prévio, ausência de licenciamento com base nas normas válidas e inexistência de estudo prévio de levantamento de fauna e propostas concretas de sua proteção e retirada das áreas pretendidas para a queima.
10. Da mesma forma, haja vista a competência supletiva do IBAMA, também agiu corretamente o r. Juízo de origem ao determinar que a autarquia ambiental assuma o exercício imediato de sua competência, ante a omissão da CETESB e do Estado de São Paulo em exigir licenciamento específico e de prévio estudo de impacto ambiental ou estudo prévio de levantamento de fauna e propostas concretas de sua proteção e retirada das áreas pretendidas para a queima, bem como que, em havendo pedido de autorização para a prática da referida atividade, que o IBAMA sempre exija EIA/RIMA como condição para a autorização e realize o cadastramento de todas as propriedades rurais ocupadas com a cultura canavieira, verificando se estão sendo cumpridas as prescrições deferidas pelo Juízo, podendo, para tanto, celebrar convênio com a Polícia Ambiental da região, determinando desde já que a CETESB lhe forneça todos os arquivos desse cadastramento.
11. No que concerne à específica alegação de que o cadastramento de propriedades rurais criaria obrigação ao IBAMA sem previsão legal, como bem justificou o r. Juízo a quo, o pedido de que o IBAMA cadastre as propriedades canavieiras para verificar se estão cumprindo o comando desta sentença não foge ao âmbito legal. É corolário da atividade fiscalizadora saber quem está sendo fiscalizado. Por isso, o próprio cumprimento das demais determinações desta sentença somente será levado a cabo se o IBAMA estiver de posse de relação de todas as produções de cana desta subseção judiciária e, para tanto, o cadastro é essencial.
12. Igualmente correta a determinação de aplicação da multa diária para o caso de descumprimento da sentença, cuja função é exatamente compelir as partes ao cumprimento das obrigações que lhe foram impostas.
13. Para o E. STJ, o dano moral coletivo atinge direitos de personalidade de um grupo massificado, sendo despicienda a demonstração de que a coletividade sinta a mesma dor ou repulsa de um indivíduo isolado. Assim, o dano moral extrapatrimonial deve ser averiguado de acordo com as características próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõem determinada coletividade ou grupo determinado ou indeterminado de pessoas, sem olvidar que é a confluência dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo, decorrendo a possibilidade de indenização em virtude de dano moral coletivo causado ao meio ambiente, no âmbito de ação civil pública, também de expressa previsão na Lei n.º 7.347/85 (art. 1º, I e art. 3º).
14. Para a caracterização da responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos ensejadora da indenização por dano moral é essencial a ocorrência de três fatores: o dano, a ação do agente e o nexo causal.
15. No presente caso, existe demonstração inequívoca da alegada ofensa à coletividade, sendo possível concluir que das condutas praticadas, quais sejam, das expedições de licenças e autorizações para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar sem o necessário EIA/RIMA, resultou efetivo prejuízo de ordem moral à coletividade, configurado conduta capaz de ensejar indenização a título de danos morais.
16. Diante das condições das partes e da repercussão da ofensa em comento, tanto para os seres humanos, quanto para a flora e fauna, deve ser mantido o montante indenizatório fixado em R$ 923.408,00, valor este a ser revertido ao Fundo Federal de Direitos Difusos e que se mostra adequado à finalidade de reprimir a prática da conduta danosa, não caracterizando valor irrisório, nem abusivo.
17. Não há que se falar em condenação ao pagamento de honorários advocatícios em sede de ação civil pública, tendo em vista o que dispõe o art. 18, da Lei n.º 7.347/93, razão pela qual deve ser acolhido pedido subsidiário formulado pelo Estado de São Paulo para que seja afastada a sua condenação na referida verba. Haja a vista a remessa oficial, também deve ser afastada a condenação do IBAMA ao pagamento de honorários advocatícios. Contudo, à mingua de impugnação da CETESB, do SIAFESP, do SIAESP e da UNICA, deve ser mantida a condenação destes na verba honorária, conforme arbitrada na r. sentença, a ser igualmente repartida entre referidas partes.
18. Destaque-se, ainda, que, não obstante o pedido de desistência de apelação do SIAFESP, do SIAESP e da ÚNICA tenha sido homologado, nos termos do art. 52, caput, do CPC/73 o assistente atuará como auxiliar da parte principal, exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido.
19. Agravo retido não conhecido. Remessa oficial, tida por interposta, e à apelação do Estado de São Paulo, providas. Apelações da CETESB e do IBAMA improvidas".
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0000264-06.2011.4.03.6113, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 28/04/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/05/2016)
"APELAÇÕES EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL OBJETIVANDO A OBRIGATORIEDADE DE PRÉVIO EIA/RIMA PARA A CONCESSÃO DE LICENÇA DE QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. PRESENÇA DE DANO OBJETIVO E CONSUMADO. A QUEIMA DA PALHA DE CANAVIAIS CAUSA A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE, DA SAÚDE HUMANA E DE OUTRAS ATIVIDADES ECONÔMICAS. NECESSIDADE DE CAUTELAS DESTINADAS À MINORAÇÃO DOS SEUS MALEFÍCIOS. COMPETENCIA SUPLETIVA DO IBAMA SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDENCIA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA DESPROVIDA.
1. Apelações contra a sentença de parcial procedência de ação civil pública ambiental interposta pelo Ministério Público Federal, objetivando a obrigatoriedade de realização de prévio Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/RIMA) para a concessão de licença de queima controlada de palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela 7ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo.
2. O IBAMA possui competência supletiva, nos termos da Lei nº 6.938/81 e da Resolução CONAMA n.º 237/97, na medida em que a legislação estadual paulista acerca da matéria, com especial destaque às Leis Estaduais nº 10.547/2000 e nº 11.241/2002, não prevê a exigência de EIA/RIMA no procedimento de licenciamento de queima controlada de palha de cana-de-açúcar.
3. No exame do mérito, observa-se que esta Corte já se pronunciou em caso semelhante, assegurando que a falta de EIA/RIMA no procedimento de licenciamento de queima controlada em canavial, em princípio, não é inconstitucional. Também, que a legislação estadual paulista vem se desenvolvendo no sentido da gradativa eliminação do uso do fogo como método facilitador do corte da cana-de-açúcar, numa tentativa de contrabalancear os impactos ambientais e socioeconômicos que envolvem a questão (AI 00272884920104030000, Desembargador Federal CARLOS MUTA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 5/7/2012).
4. No entanto, não merecem descuido as graves consequências do uso do fogo nas plantações de cana-de-açúcar, prática que remonta à época das capitanias hereditárias e que de há muito já deveria ter sido abolida em favor da moderna tecnologia agrícola. Deveras, qualquer pessoa que percorra a extensa zona canavieira no interior do Estado de São Paulo, facilmente constata - pela visão e olfato - os danos infligidos ao meio ambiente e, também, à saúde humana, sendo as crianças e os idosos as maiores vítimas das moléstias respiratórias que lotam os serviços de pronto-socorro da região, causadas pela fumaça negra e particulada oriunda das queimadas. 5. Os supostos prejuízos econômicos dos produtores de cana - que, aliás, são questionáveis - não podem se sobrepor ao bem estar de um número indeterminável de paulistas e tampouco justificar o sacrifício de animais inocentes que habitam as áreas lindeiras dos canaviais e, menos ainda, o malefício ao meio ambiente como um todo. A liturgia devida ao "bezerro de ouro" há de ter limites, e a Constituição Federal não pode ser o escudo dos que defendem o lucro a qualquer custo.
6. Embora o artigo 225, § 1º, IV, da Constituição Federal, em tese, sirva para condicionar a exigência legal de prévio estudo de impacto ambiental, depreende-se da sua correta interpretação que essa exigência legal está intrinsecamente ligada à ...instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente... Evidentemente, a queima da palha da cana-de-açúcar causa a degradação do meio ambiente, da saúde humana e de outras atividades econômicas. Não se trata de mero risco, mas de dano objetivo e consumado.
7. Com efeito, têm-se duas situações diametralmente opostas. De um lado está a atividade que ostenta na sua essência a possibilidade de ofensa ao meio ambiente. Nesse caso, a exigência de prévio estudo de impacto ambiental deve ser condicionada à lei, porque a atividade não pode ser vista, a priori, como degradadora. Tome-se, por exemplo, a instalação de uma nova unidade portuária no estuário de Santos/SP, que pode ou não piorar a degradação local. De outro lado está atividade que ostenta na sua essência a efetiva ofensa ao meio ambiente, que é o que ocorre na queimada de canavial. Ou seja, cuida-se de atividade essencialmente degradadora, motivo pelo qual seu desempenho deve ser cercado de cautelas destinadas à minoração dos malefícios. Essa distinção deve ser feita à luz da dicção constitucional, sob a pena de se igualar atividades desiguais.
8. Nesse cenário não é absurdo que o Judiciário seja compelido a ditar - ainda que excepcionalmente - uma política pública de salvaguarda do meio ambiente, com manifesto reflexo na proteção do direito social à saúde, nos termos do artigo 6º da Constituição Federal.
9. Correta a condenação do Estado de São Paulo, por intermédio da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a abster-se de conceder novas licenças de queima controlada da palha de cana-de-açúcar, na área compreendida pela 7ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo, sem prévio EIA/RIMA.
10. Sem reparo, também, a condenação do IBAMA a fiscalizar a exigência de licenciamento e prévio EIA/RIMA. O dever fiscalizatório que emana da competência supletiva não implica em violação do pacto federativo e que a alegada falta de estrutura física não exime o IBAMA da obrigação imposta.
11. Legítimo o arbitramento de multa diária em caso de descumprimento da medida judicial, com fulcro no artigo 461, §4º, do Código de Processo Civil. Não se cuida de meio de coação, mas de garantia do cumprimento das obrigações impostas. Precedentes do C. STJ (REsp 1360305/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, Segunda Turma, julgado em 28/5/2013, DJe 13/6/2013; AgRg no Ag 1247323/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 8/6/2010, DJe 1/7/2010).
12. Recursos das defesas desprovidos. Remessa oficial tida por interposta desprovida".
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0002726-51.2011.4.03.6107, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 18/02/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/03/2016)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA CONCESSÃO DE LICENÇA. NECESSIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Insurge-se o ESTADO DE SÃO PAULO contra o condicionamento da concessão de licença/autorização para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar à realização de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).
2. Esta Corte já se pronunciou em caso semelhante, assegurando que a falta de estudo prévio de impacto ambiental na concessão de licença/autorização para a queima controlada em canavial - em princípio - não é inconstitucional. Também, que a legislação estadual paulista vem se desenvolvendo no sentido da gradativa eliminação do uso do fogo como método facilitador do corte da cana-de-açúcar, numa tentativa de contrabalancear os impactos ambientais e socioeconômicos que envolvem a questão.
3. Os supostos prejuízos econômicos dos produtores de cana (aliás, muito questionável) não pode se sobrepor ao bem estar de um número indeterminável - mas que atinge milhões - de paulistas, tampouco justifica o sacrifício de animais inocentes que habitam as áreas lindeiras das culturas de cana, e menos ainda o malefício ao meio ambiente como um todo.
4. Embora o artigo 225, § 1º, IV em tese sirva para condicionar o estudo de impacto ambiental a prévia exigência legal, de outro lado deve-se ler o dispositivo constitucional de modo correto; ele prescreve a prévia exigência legal para atividades potencialmente causadoras de degradação do meio ambiente. No caso, a queima da palha de cana é atividade EVIDENTEMENTE degradadora da saúde humana, do meio ambiente e de outras atividades econômicas; não é um mero risco: é um dano objetivo e consumado e isso ninguém pode em sã consciência negar ou sequer tentar esconder (as imensas nuvens de fumaça negra que cobrem o interior do Estado não deixam que se tente ocultar esse sinistro).
5. Nesse cenário não é absurdo que o Judiciário seja compelido a ditar - ainda que excepcionalmente - uma política pública de salvaguarda do meio ambiente, que têm evidente reflexo na proteção de um direito social como a saúde (art. 6º da Constituição Federal).
6. Assim, não se pode dizer que o ESTADO DE SÃO PAULO está provido de integral razão, diante da bem fundamentada decisão a qua que não tem foros de inconstitucionalidade.
7. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AI 0023504-59.2013.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 13/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2015)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA CONCESSÃO DE LICENÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Ao IBAMA cabe, apenas, a fiscalização da concessão de novas licenças ambientais e autorizações para a queima controlada da palha de cana-de-açúcar pela CETESB e pelo Estado de São Paulo, com prévia realização de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA). Tal ônus decorre da competência supletiva da autarquia federal, nos termos da Lei nº 6.938/81 e da Lei Complementar nº 140/2011, na medida em que a legislação estadual paulista acerca da matéria, com especial destaque às Leis Estaduais nº 10.547/2000 e nº 11.241/2002, não prevê a exigência de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).
2. Esta Corte já se pronunciou assegurando que a falta de estudo prévio de impacto ambiental na concessão de licença/autorização para a queima controlada em canavial - em princípio - não é inconstitucional. Também, que a legislação estadual paulista vem se desenvolvendo no sentido da gradativa eliminação do uso do fogo como método facilitador do corte da cana-de-açúcar, numa tentativa de contrabalancear os impactos ambientais e socioeconômicos que envolvem a questão.
3. Os supostos prejuízos econômicos dos produtores de cana (aliás, muito questionável) não pode se sobrepor ao bem estar de um número indeterminável - mas que atinge milhões - de paulistas, tampouco justifica o sacrifício de animais inocentes que habitam as áreas lindeiras das culturas de cana, e menos ainda o malefício ao meio ambiente como um todo.
4. Embora o artigo 225, § 1º, IV em tese sirva para condicionar o estudo de impacto ambiental a prévia exigência legal, de outro lado deve-se ler o dispositivo constitucional de modo correto; ele prescreve a prévia exigência legal para atividades potencialmente causadoras de degradação do meio ambiente. No caso, a queima da palha de cana é atividade EVIDENTEMENTE degradadora da saúde humana, do meio ambiente e de outras atividades econômicas; não é um mero risco: é um dano objetivo e consumado e isso ninguém pode em sã consciência negar ou sequer tentar esconder (as imensas nuvens de fumaça negra que cobrem o interior do Estado não deixam que se tente ocultar esse sinistro).
5. Nesse cenário não é absurdo que o Judiciário seja compelido a ditar - ainda que excepcionalmente - uma política pública de salvaguarda do meio ambiente, que têm evidente reflexo na proteção de um direito social como a saúde (art. 6º da Constituição Federal).
6. Assim, não se pode dizer que o IBAMA está provido de integral razão, diante da bem fundamentada decisão a qua que não tem foros de inconstitucionalidade.
7. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AI 0024973-43.2013.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 13/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2015)

Logo, é o caso de se manter a r. sentença, também pelos respectivos fundamentos, acolhido o parecer do Ministério Público Federal com atribuição nesta instância.

Isto posto, não conheço dos apelos da União e da CETESB, bem como nego provimento à remessa necessária e às demais apelações.

É como voto.






















LEILA PAIVA MORRISON
Juíza Federal Convocada


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Data e Hora: 21/07/2016 17:06:05