Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 20/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009326-07.2014.4.03.6100/SP
2014.61.00.009326-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : ANDREIA CRISTINA DE PAULA -ME
ADVOGADO : SP303338 FABIO QUINTILHANO GOMES e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
No. ORIG. : 00093260720144036100 8P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CONSTATAÇÃO DE PLANO. NECESSIDADE. PROCESSUAL PENAL. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. FALSO TESTEMUNHO. PEDIDO INDEFERIDO PELA AUTORIDADE POLICIAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. SEGURANÇA DENEGADA. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Para fazer jus à ordem de segurança, o impetrante deve demonstrar a presença dos seus pressupostos específicos, que em última análise se resolvem na existência de direito líquido e certo.
2. A Autoridade Policial indeferiu o requerimento de abertura de inquérito policial para investigar a suposta prática do crime de falso testemunho, por falta de justa causa, tendo sido indeferido o recurso administrativo interposto.
3. O crime de falso testemunho é de ação pública incondicionada, mas não está a autoridade policial obrigada à instauração de inquérito policial com base em mero requerimento do ofendido ou de qualquer pessoa do povo, sem a demonstração da existência de indícios mínimos da prática delitiva.
4. O art. 5º, caput e parágrafos, do Código de Processo Penal, denota a possibilidade de indeferimento do pedido de instauração do inquérito policial, havendo, para tanto, previsão de recurso administrativo para eventual revisão do despacho.
5. O Juízo do Trabalho indeferiu o pedido de expedição de ofícios quanto ao alegado cometimento de falso testemunho, esclarecendo "não vislumbrar irregularidades que os justifiquem" (fl. 38). Por sua vez, o Ministério Público Federal, em 1º e 2º grau de jurisdição, manifestou-se contrariamente à instauração de inquérito policial (fls. 73/76 e 118/120).
6. Ressalte-se que ligeiras contradições são comuns na colheita da prova testemunhal e, na espécie, não está demonstrada a existência de eventual afirmação falsa proferida pela testemunha, dotada de potencialidade lesiva, a justificar a instauração de inquérito policial.
7. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 12 de setembro de 2016.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009326-07.2014.4.03.6100/SP
2014.61.00.009326-9/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : ANDREIA CRISTINA DE PAULA -ME
ADVOGADO : SP303338 FABIO QUINTILHANO GOMES e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal
ADVOGADO : SP000019 LUIZ CARLOS DE FREITAS
No. ORIG. : 00093260720144036100 8P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação em mandado de segurança interposta por Andreia Cristina de Paula - ME contra a sentença de fls. 88/90, que denegou a segurança, extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil de 1973, em que se pretendia que o Superintendente Regional da Polícia Federal em São Paulo (SP), autoridade impetrada, determinasse a instauração de inquérito policial para apurar a suposta prática do crime de falso testemunho.

Alega a impetrante, em síntese, o quanto segue:

a) no dia 20.03.13, em audiência relativa à Reclamação Trabalhista n. 00024978-72.2012.5.02.0631, em que a impetrante foi reclamada, o reclamante arrolou a testemunha José Dias de Oliveira, que prestou depoimento contraditório e inverídico, motivo pelo qual a impetrante requereu a instauração de inquérito policial para apurar a suposta prática do crime de falso testemunho;
b) o requerimento para instauração do inquérito policial foi indeferido pela Corregedoria da Polícia Federal, sendo mantido o indeferimento em recurso interposto perante a Superintendência da Polícia Federal;
c) não deve prevalecer o indeferimento do pedido de instauração do inquérito policial, por ser o crime de falso testemunho de ação penal pública incondicionada e não se sustentar a fundamentação do indeferimento do pedido;
d) a não instauração do inquérito policial causará grande prejuízo à impetrante, pois foi condenada, no processo trabalhista, ao pagamento de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), sendo parte desse valor exorbitante decorrente do testemunho contestado;
e) o fato de o juiz do trabalho ter considerado válido o depoimento e não ter cogitado a possibilidade de instauração do inquérito não são motivos suficientes a obstar a investigação policial;
f) presentes fortes indícios da falsidade do depoimento da testemunha, é dever da Autoridade Policial instaurar o inquérito policial;
g) é ilegal o indeferimento do pedido de instauração de inquérito policial, sendo hipótese de concessão da segurança (fls. 93/100).

A União apresentou contrarrazões (fls. 109/116).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Auristela Oliveira Reis, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 118/120).

É o relatório.


VOTO

Direito líquido e certo. Para fazer jus à ordem de segurança, o impetrante deve demonstrar a presença dos seus pressupostos específicos, que em última análise se resolvem na existência de direito líquido e certo, cujo conceito amplamente aceito é o seguinte:


Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.
Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança. Evidentemente, o conceito de liquidez e certeza adotado pelo legislador do mandado de segurança não é o mesmo do legislador civil (...). É um conceito impróprio - e mal-expresso - alusivo a precisão e comprovação do direito quando deveria aludir a precisão e comprovação dos fatos e situações que ensejam o exercício desse direito.
Por se exigir situações e fatos comprovados de plano é que não há instrução probatória no mandado de segurança. Há, apenas, uma dilação para informações do impetrado sobre as alegações e provas oferecidas pelo impetrante, com subseqüente manifestação do Ministério Público sobre a pretensão do postulante. Fixada a lide nestes termos, advirá a sentença considerando unicamente o direito e os fatos comprovados com a inicial e as informações.
(MEIRELLES, Hely Lopes, Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, "habeas data", 16ª ed., São Paulo, Malheiros, 1995, p. 28-29, n. 4)

Assim, a segurança somente será concedida quando comprovado de plano o direito líquido e certo, não se admitindo dilação probatória:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. (...)
3. O mandado de segurança, previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, com procedimento regulado pela Lei 1.533/51, é ação de natureza sumária, indicado para a proteção de direito líquido e certo ameaçado ou violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade, que deve ser comprovado de plano, não se permitindo dilação probatória. Para que o impetrante obtenha êxito em sede de mandamus é essencial que traga aos autos as provas pré-constituídas necessárias para demonstrar a existência de seu direito líquido e certo. Todos os fatos devem estar documentalmente comprovados no momento da impetração, ou seja, com a inicial devem estar presentes os elementos necessários para o exame das alegações apresentadas na petição inicial pelo impetrante (...).
(STJ, EDcl no RMS n. 24137-RS, Rel. Min. Denise Arruda, j. 06.08.09)

Do caso dos autos. Alega a impetrante, ora apelante, ter direito líquido e certo à instauração de inquérito policial para investigar a suposta prática do crime de falso testemunho em ação trabalhista na qual foi reclamada.

Não lhe assiste razão.

A Autoridade Policial indeferiu o requerimento de abertura de inquérito policial para investigar a suposta prática do crime de falso testemunho, na Reclamação Trabalhista n. 0002497-72.2012.5.02.0361, em trâmite na 1ª Vara do Trabalho de Mauá (SP), por falta de justa causa, tendo sido indeferido o recurso administrativo interposto (fls. 11/20).

Em que pese tratar-se o falso testemunho de crime de ação pública incondicionada, não está a autoridade policial obrigada à instauração de inquérito policial com base em mero requerimento do ofendido ou de qualquer pessoa do povo, sem a demonstração da existência de indícios mínimos da prática delitiva.

O art. 5º, caput e parágrafos, do Código de Processo Penal, denota a possibilidade de indeferimento do pedido de instauração do inquérito policial, havendo, para tanto, previsão de recurso administrativo para eventual revisão do despacho.

A impetrante alega que o depoimento prestado pela testemunha José Dias de Oliveira, arrolada pelo reclamante na Reclamação Trabalhista n. 0002497-72.2012.5.02.0361, em trâmite na 1ª Vara do Trabalho de Mauá (SP), apresenta contradições que indicam o cometimento do delito de falso testemunho.

No entanto, na reclamação trabalhista, o Juízo do Trabalho indeferiu o pedido de expedição de ofícios quanto ao alegado cometimento de falso testemunho, esclarecendo "não vislumbrar irregularidades que os justifiquem" (fl. 38).

Por sua vez, o Ministério Público Federal, em 1º e 2º grau de jurisdição, manifestou-se contrariamente à instauração de inquérito policial (fls. 73/76 e 118/120).

Da análise dos autos, não se verificam elementos mínimos a ensejar a investigação criminal.

É sabido que o delito de falso testemunho é de natureza formal, prescindindo de resultado naturalístico para a sua configuração. Sequer é exigível que tenha influenciado o juiz quando do julgamento. Não obstante, a falsidade há de incidir sobre fato juridicamente relevante, isto é, que gere consequências jurídicas para qualquer dos interessados. Não se conceberia a tipificação do delito quanto a fatos desprovidos de significado jurídico, malgrado não corresponderem com exatidão à realidade. Por outro lado, cumpre verificar, caso a caso, se o conteúdo do testemunho seria potencialmente lesivo (FRAGOSO, Heleno Cláudio, Lições de Direito Penal, parte especial, 5ª ed., Rio de janeiro, Forense, 1986, v. II, p. 516, n. 1.190).

A reclamação trabalhista foi julgada parcialmente procedente, estando a sentença fundamentada na documentação apresentada naquela lide e, também, nos depoimentos das testemunhas arroladas pelo reclamante e pela reclamada, tendo o Juízo desconsiderado, em parte, os depoimentos prestados (fls. 30/41).

Ressalte-se que ligeiras contradições são comuns na colheita da prova testemunhal e, na espécie, não está demonstrada a existência de eventual afirmação falsa proferida pela testemunha José Dias de Oliveira, dotada de potencialidade lesiva, a justificar a instauração de inquérito policial.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): Andre Custodio Nekatschalow:10050
Nº de Série do Certificado: 6FF489872CB26B896143FFEC7333ABCE
Data e Hora: 14/09/2016 13:52:53