Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/12/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005764-15.2004.4.03.6108/SP
2004.61.08.005764-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : APARECIDO CACIATORE
ADVOGADO : SP059376 MARCOS APARECIDO DE TOLEDO e outro(a)
EXTINTA A PUNIBILIDADE : ANESIA MOMO CASALI falecido(a)
No. ORIG. : 00057641520044036108 3 Vr BAURU/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO PENAL NÃO DEMONSTRADO. IN DUBIO PRO REO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Acusado denunciado como incurso nas sanções do artigo 171, §3º, 299 e 304 c/c artigo 29 todos do Código Penal.
2. Materialidade delitiva restou bem demonstrada nos autos do Processo Administrativo nº 35378.000712/2003-86, uma vez que foi identificado pela auditoria da autarquia previdenciária a concessão indevida de aposentadoria por idade em regime especial à segurada e codenunciada, diante da não comprovação de atividade rural em regime de economia familiar, durante todo o período informado na Declaração de Exercício de Atividade Rural que embasou a concessão do referido benefício, qual seja, entre 16/03/1966 e 10/06/1998 (fl.18).
3. Autoria e dolo. O conjunto probatório constante dos autos não aponta, de maneira segura, que o apelado tenha agido dolosamente. Possibilidade, ainda que diminuta, do acusado ter, de fato, preenchido a documentação de acordo com que lhe foi repassado pela então segurada, sem a intenção pessoal de engodo e obtenção de vantagem indevida, que pode ter sido exclusiva da codenunciada em questão. A incerteza favorece o acusado e o édito condenatório não pode ser lastreado em probabilidades ou meros indícios. In dúbio pro reo.
4. Mantida a r. sentença absolutória, nos termos do artigo 386, VII, do Código Penal.
5. Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso da acusação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 28 de novembro de 2017.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005764-15.2004.4.03.6108/SP
2004.61.08.005764-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : APARECIDO CACIATORE
ADVOGADO : SP059376 MARCOS APARECIDO DE TOLEDO e outro(a)
EXTINTA A PUNIBILIDADE : ANESIA MOMO CASALI falecido(a)
No. ORIG. : 00057641520044036108 3 Vr BAURU/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator): Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra a r. sentença (fls. 493/498) proferida pelo MM. Juiz Federal da 3ª Vara Federal de Bauru, que absolveu APARECIDO CACIATORE da prática do crime capitulado no artigo 171, §3º, c.c o artigo 299, ambos do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Narra a denúncia que, em apertada síntese, em auditoria realizada pelo INSS nos procedimentos de concessão de benefícios previdenciários da Agência da Previdência Social de Lençóis Paulista, apurou-se irregularidades em relação ao benefício de aposentadoria por idade, na modalidade especial, em nome da segurada e codenunciada ANÉSIA MOMO CASALI.

Constatou-se, em diligência fiscal, que a segurada em questão, na data da concessão do benefício, não exercia atividade rural em regime de economia familiar, pois o período nesta atividade, informado por ela, foi de 16/03/1966 a 10/06/1998, enquanto constatou-se de que as terras da Fazenda Faxinal haviam sido arrendadas durante o período de 01/09/1997 a 31/12/2003 e, portanto, a Declaração de Atividade Rural que instruiu o requerimento perante a autarquia continha elementos ideologicamente falsos.

O referido documento foi elaborado por APARECIDO CACIATORE (vulgo Pelé), então funcionário do Sindicato Rural de Lençóis Paulista, e assinada pelo presidente da entidade, já falecido.

A própria denúncia resume a conduta do acusado e da codenunciada ANÉSIA MOMO CASALI, nos seguintes termos:

(...) Assim, temos que:
ANÉSIA MOMO CASALI procurou APARECIDO CACIATORE para tentar aposentar-se por idade na modalidade segurado especial e concordou em requer o benefício nos moldes já tratados;
foi preenchida por APARECIDO CACAIATORE e assinada por JOSÉ BENEDITO DALBEM (falecido aos 30/12/1998), a declaração de atividade rural constando que ANÉSIA MOMO CASALI trabalhou na Fazenda Faxinal como rurícola em regime de economia familiar, durante período de 16/03/1966 à 10/06/1998, sendo que, em verdade, na referida fazenda produzia-se leite em grande quantidade e, posteriormente, funcionou um laticínio com utilização de empregados, conforme Notas Fiscais às fls. 54/72, descaracterizando sobremaneira a alegada atividade rural em regime familiar;
c) O uso do documento falso (declaração de Exercício de Atividade Rural - fl. 10/11), deu-se aos 12/06/1998, quando do protocolo junto ao INSS (fl. 08);
d) a obtenção da vantagem indevida iniciou-se aos 12/06/1998 (data da concessão do benefício) e perdurou até 31/07/2003 (data da cessação do benefício), o que gerou um prejuízo no montante de R$ 15.669,96 (quinze mil, novecentos e sessenta e nove reais e noventa e seis centavos) aos cofres do INSS, consoante planilha de fls. 75/76 e 83. (...)

APARECIDO CACIATORE e ANÉSIA MOMO CASALI foram denunciados pela prática dos delitos previstos no artigo 171, §3º, 299 e 304 c/c artigo 29 todos do Código Penal (fls. 02/08).

A denúncia foi recebida em 07/02/2006 (fl. 277) e, após processamento, foi prolatada sentença absolutória, publicada em 03/09/2010 (fl. 499).

Às fls. 432/433, declarou-se extinta a punibilidade da codenunciada ANÉSIA MOMO CASALLI em razão do seu falecimento (fl. 427).

Nas razões de recurso (fls. 493/496-v), o Ministério Público Federal pleiteia a condenação do apelado, pela prática do delito previsto no artigo 171, §3º (crime-fim), c.c o artigo 71, ambos do Código Penal, sob o fundamento de que há nos autos provas suficientes de autoria e materialidade, com dolo em fraudar o Instituto Nacional do Seguro Social.

Contrarrazões às fls. 518/527.

A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante, Dr. Marcelo Moscogliato, opinou desprovimento do recurso (fls. 529/531).

É o relatório.

À revisão.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005764-15.2004.4.03.6108/SP
2004.61.08.005764-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : APARECIDO CACIATORE
ADVOGADO : SP059376 MARCOS APARECIDO DE TOLEDO e outro(a)
EXTINTA A PUNIBILIDADE : ANESIA MOMO CASALI falecido(a)
No. ORIG. : 00057641520044036108 3 Vr BAURU/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator): Consta dos autos que o INSS, em auditoria realizada nos procedimentos de concessão de benefícios previdenciários da Agência da Previdência Social de Lençóis Paulista, apurou irregularidades na concessão do benefício de aposentadoria por idade de segurado especial, em nome de ANÉSIA MOMO CASALI.

Verificou-se, procedimento administrativo nº 35378.000712/2003-86 (fls. 13/95), que os documentos que instruíram o pedido, em especial, a Declaração de Atividade Rural continha elementos ideologicamente falsos e foi elaborado por APARECIDO CACIATORE (vulgo "Pelé'), então funcionário do Sindicato Rural da cidade, e assinada pelo presidente da entidade, já falecido

O prejuízo resultante à Autarquia totalizou o valor principal de R$ 10.884,18 (dez mil, oitocentos e oitenta e quatro reais e dezoito centavos), uma vez que o benefício foi pago indevidamente entre 12/06/1998 a 31/07/2003 (fl. 91).

Após a regular instrução do feito, o d. magistrado "a quo" absolveu o apelado, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Transcrevo trecho da fundamentação da r. sentença absolutória:

(...) Componentes estruturais do estelionato, como consagrado, o emprego de meio fraudulento, o induzimento em erro, a vantagem ilícita e o prejuízo alheio, todo o amplo conjunto probatório colhido impõe a absolvição do acusado Aparecido.
Realmente, embora a formal confecção do documento de fls. 18/19, reconhecida, pelo referido denunciado, como sendo de sua lavra, fls. 349, para então subscrição pelo Presidente do Sindicato rural de Lençóis Paulista (pessoa já falecida, fls. 07, item 20, "b"), denota o bojo das conversas orais atendia o mencionado acusado ali mesmo na sede daquela entidade, em ambiente aberto, em mesa junto a diversas outras mesas, fosse a sindicalizados ou não, em tema de viabilização de pedidos de aposentadoria, o que é inerente a um dos muitos misteres deste tipo de agremiação trabalhadora.
Desta forma, jamais tendo sido visto em atendimento a portas fechadas ou em lugares "escondidos" tanto quanto nunca ouvido se tenha referido réu orientado pessoas a mentirem perante a previdência, nenhum ilícito evidentemente a se constatar na paga, que se lhe tenha feito ou se faça por prestação de uma atividade realmente especializada, para o comum dos leigos, sindicalizados ou não.
Ou seja, procurado foi o ora réu, como muitos sempre o fizeram ou fazem, porém nem no ambiente da previdência social a desfrutar de mal cartaz ou de impressão dúbia, fls. 393 (testemunha arrolada pela acusação destaque-se).
De seu giro, a objetiva descrição da servidora autárquica Cássia marlei, sobre o modo de operar os pleitos de aposentadoria de então, fls. 117/121, por si já deflete data vênia, a precariedade dos mecanismos concessivos, em cuja narração não se constata fosse feita prévia checagem entre as afirmações formai e fatos, o que em si mui grave, evidentemente, aqui (nesta incursão) sem se despertar supeita ou duvida sobre qualquer ser, mas sim trazer à reflexão quão frágeis, já por seus contornos, os mecanismos concessórios á época.
Ou seja, sem sentido nem substância, "data vênia", assuma desfecho de êxito a intenção condenatória criminal ajuizada quanto ao denunciado Aparecido, pois a pecar já em sua estrutura a tipificação postulada, art. 171, CPB, seja porque não comprovado que o réu tenha empregado meio fraudulento, seja porque para si não evidenciada qualquer vantagem ilícita auferida, o que não resta tipificado como delito aos limites do debatido neste feito, afinal tudo a girar em torno da capitulação deflagrada com a r. peça acusatória, cujo arcabouço probante não se revelou consistente, em face do aqui reatado acusado.
É dizer, presto sim o presente feito, até aqui, palco de um devido processo legal, no bojo do qual a ampla defesa (valores tão caros no estado de Direito, incisos LIV e LV do art. 5º, lei Maior) culmina por assevera de rigor a absolvição por falta de provas, quanto ao aqui incriminado Aparecido.(...)

Desta decisão, o Ministério Público Federal interpôs o presente recurso, o qual passo a analisar.

Ao contrário do quanto consignado na r.sentença, a materialidade delitiva restou bem demonstrada nos autos do Processo Administrativo nº nº 35378.000712/2003-86 (fls. 13/95), uma vez que foi identificado pela auditoria da autarquia previdenciária a concessão indevida de aposentadoria por idade em regime especial à segurada e codenunciada ANÉSIA MOMO CASALI, diante da não comprovação de atividade rural em regime de economia familiar, durante todo o período informado na Declaração de Exercício de Atividade Rural, que embasou a concessão do referido benefício, qual seja, entre 16/03/1966 e 10/06/1998 (fl.18).

Do exame dos autos, verifica-se que o benefício previdenciário, em decorrência da fraude encetada, foi indevidamente concedido à segurada a partir de 12/06/1998, data do início do benefício - DIB (fl. 40) e que o recebimento da primeira prestação do benefício ocorreu após 22/06/1998, data do despacho do benefício - DDB (fl. 40), sendo suspenso em 07/2003 (fls. 84 e 91).

Cumpre, pois, analisar a autoria e a culpabilidade.

Não há dúvidas de que o apelado preencheu os documentos utilizados para instruir o pedido de aposentadoria por idade em regime especial, em nome da codenunciada ANÉSIA MOMO CASALI, como ele mesmo admitiu em Juízo (fls. 336/337).

Contudo, entendo que não há provas seguras bastantes de que APARECIDO CACIATORE tenha, voluntaria e conscientemente, neste caso, confeccionado documentos ideologicamente falsos com objetivo de obter benefício previdenciário em questão.

Compulsando os autos, verifica-se que a codenunciada, juntamente com o esposo, adquiriu a Fazenda Faxinal no ano de 1966 (fls.20/24-v) e lá desenvolveram atividades rurais, dentre elas a produção de leite, atividade que teria sido realizada até o ano de 1997, conforme cópias das notas fiscais de produtor rural acostadas às fls. 62/80.

Na fase investigativa, a segurada ANÉSIA MOMO CASALI (fls. 99/100), embora tenha informado que APARECIDO preencheu os documentos que embasaram o pedido de benefício, asseverou não ter pago ao apelado nenhum valor referente ao serviço. Informou, também, ter trabalhado diariamente na Fazenda Faxinal até parte da propriedade ser arrendada a uma usina de cana de açúcar e que a maior parte do que era produzido na fazenda destinava-se a consumo familiar, e que a sobra era vendida a terceiros.

Em Juízo, ANÉSIA MOMO CASALI (fl. 337), embora tenha alterado parcialmente o quanto declarado extrajudialmente, confirmou ter sido APARECIDO quem cuidou do pedido de aposentadoria e ter desenvolvido atividade rural na Fazenda Faxinal no período declarado.

O apelado, por sua vez, perante o magistrado a quo (fls. 336-336-v) confirmou ter preenchido a documentação atinente ao pedido de aposentadoria de ANÉSIA MOMO CASALI enquanto funcionário do Sindicato dos Empregadores Rurais com base na documentação por ela apresentada, sem lhe ter cobrado qualquer valor, como fazia habitualmente, cobrando daqueles que o procuravam, o valor de 01 (um) a 03 (três) salários mínimos para reunir a documentação pertinente.

No que se refere aos testemunhos de acusação, embora seja possível extrair que a conduta de ANTONIO CACIATORE não tenha sido retilínea em relação a outros pedidos de aposentadoria nas mesmas circunstâncias, o que se confirma por ter sido o réu condenado pela prática do mesmo delito (n. 2001.61.08.007857-0), tal fato, por si só, não determina que, no caso ora posto, tenha o réu agido dolosamente na intenção de ludibriar o INSS.

Isso porque, há possibilidade, ainda que diminuta, do acusado ter, de fato, preenchido a documentação de acordo com que lhe foi repassado pela então segurada, sem a intenção pessoal de engodo e obtenção de vantagem indevida, que pode ter sido exclusiva da codenunciada em questão.

Ademais, como bem registrou a Procuradoria Regional da República (fl. 530-v):

(...) 10. Não há comprovação de que o réu agiu com dolo de obter vantagem ilícita para outrem por meio de documento que confeccionara. Outrossim, não ficou comprovado que o acusado Aparecido Caciatore sabia que as informações prestadas por Anésia eram falsas, visto que ela realmente trabalhou na propriedade rural (fls. 17,28, 99/100 e 337) e que não cabia ao réu verificar em que condições se deu o trabalho. (...)

Dessa forma, à mingua de provas cabais de que tenha o acusado agido dolosamente e considerando que vigora no sistema penal brasileiro o princípio do in dubio pro reo, mantenho o decreto absolutório, nos termos do artigo 386, VII, do Código Penal.

Por esses fundamentos, nego provimento ao recurso ministerial.

É o voto.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 01/12/2017 10:34:10