Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0014478-94.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.014478-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
APELANTE : JOSE SEVERINO DE FREITAS
ADVOGADO : JULIANA BASTOS NOGUEIRA SOARES (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : DENILTON SANTOS
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : TIAGO DE FREITAS
: ROBERTO AMANCIO DE OLIVIERA
No. ORIG. : 00144789420084036181 1P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. TIPICIDADE. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA COMPROVADA. PRESENÇA DE DOLO. DOSIMETRIA.
1. Imputado à parte ré a prática de tentativa de estelionato previdenciário, tipificado nos artigos 171, caput e §3º e 14, II, todos do Código Penal.
2. Preliminares de inépcia da inicial, de crime impossível e de insignificância rejeitadas.
3. Devidamente comprovada nos autos a materialidade do delito atribuído à parte ré.
4. Devidamente comprovada nos autos a autoria do delito atribuído à parte ré.
5. Verifica-se que a parte ré teve deliberadamente a intenção de praticar o crime de estelionato previdenciário.
6. Deve ser observado o entendimento consignado na Súmula 444 do STJ: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base."
7. A redução pela tentativa deve ser feito em patamar mínimo.
8. A pena de multa deve ser reduzida para que fique proporcional à pena privativa de liberdade.
9. O regime inicial de cumprimento da pena deve ser o aberto, e é cabível a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.
10. Apelação parcialmente provida para reduzir a pena-base, fixar regime inicial de cumprimento de pena aberto, e substituir a pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. De ofício, reduzida a pena de multa.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para reduzir a pena-base, fixar regime inicial de cumprimento de pena aberto, e substituir a pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos e, de ofício, reduzir a pena de multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de janeiro de 2017.
WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): WILSON ZAUHY FILHO:10067
Nº de Série do Certificado: 54E0977545D2497B
Data e Hora: 30/01/2017 18:10:49



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0014478-94.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.014478-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
APELANTE : JOSE SEVERINO DE FREITAS
ADVOGADO : JULIANA BASTOS NOGUEIRA SOARES (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : DENILTON SANTOS
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : TIAGO DE FREITAS
: ROBERTO AMANCIO DE OLIVIERA
No. ORIG. : 00144789420084036181 1P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O Ministério Público Federal, em 17/08/2011, denunciou JOSÉ SEVERINO DE FREITAS, brasileiro, qualificado nos autos, nascido em 10/02/1953, e DENILTON SANTOS , brasileiro, qualificado nos autos, nascido em 17/02/1961, pela prática do delito tipificado no artigo 171, caput e §3º, c/c artigo 14, II, ambos do CP. Consta da denúncia:

"No dia 11 de outubro de 2005, neste cidade, os denunciados José Severino de Freitas e Denilton Santos, agindo em concurso de agentes com unidade de desígnios e divisão de tarefas, tentaram obter fraudulentamente benefício de aposentadoria em nome de Roberto Amâncio de Oliveira, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social, induzindo e mantendo em erro seus funcionários, mediante a inserção de informações falsas em sua Carteira de Trabalho da Previdência Social e uso de documentos inidôneos.

Consta dos autos que Denilton Santos, na qualidade de procurador de Roberto Amancio de Oliveira, requereu aposentadoria por tempo de contribuição perante a Agência Ermilino Matarazzo do Instituto Nacional do Seguro Social, apresentando, para tanto, Ficha de Registro de Empregados e Declaração da empresa "Prisma Industrial S/A", atestando período trabalhado de 20/02/1968 a 28/06/1971, e Carteira de Trabalho preenchida com falso vínculo empregatício na empresa "Constecca Construções SA", pelo período de 18/06/2000 a 29/07/2005 (fls. 17, 18 e 41).

Na instrução do processo de concessão do benefício, contudo, foi apurado que os vínculos com as empregadoras "Prisma lndustrial S/A" e 'Constecca Construções SA" não constavam do CNIS, e que em relação a tais empresas havia suspeitas de irregularidades, uma vez que eram utilizadas em vários processos protocolados pelos mesmos procuradores, a maioria perante a Agência Ermelino Matarazzo.

Realizadas diligências, referidas empresas não foram localizadas nos endereços indicados. Assim, em 07 de dezembro de 2005, o requerimento previdenciário foi indeferido (fl. 46).

Em sede policial, Roberto Amâncio de Oliveira declarou jamais ter trabalhado nas referidas empresas e que assinou alguns formulários em branco, dentre os quais a procuração de fl. 14, e os entregou, juntamente com suas duas Carteiras de Trabalho e carnês de contribuição, para José Severino de Freitas, vulgo TUPÃ. Este havia se apresentado como funcionário do INSS, oferecendo-se para ajudá-la a fazer os cálculos de tempo de serviço e eventuais pagamentos atrasados perante o INSS. Pelos serviços prestados, Roberto pagou a José Severino de Freitas a quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais), sendo R$ 2.000,00 (dois mil reais) em dinheiro e o restante em dois cheques de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) cada (fls. 59/62).

José Severino de Freitas, de posse dos documentos, providenciou a inserção dos falsos vínculos na Carteira de Trabalho de Roberto Amâncio de Oliveira, bem assim a confecção da Ficha de Registro de Empregados e da Declaração de fls. 11/12. Denilton Santos, por sua vez, com pleno conhecimento da fraude empregada e a mando do primeiro denunciado, atuou como procurador de Roberto Amâncio de Oliveira, dando entrada no requerimento do beneficio previdenciário, conforme se verifica a fls. 08.

Denilton Santos trabalhava para José Severino de Freitas, de quem recebia R$ 50,00 (cinquenta reais) por cada beneficio previdenciário protocolado. Tinha ele total conhecimento do esquema criminoso de que participava, tendo revelado que José Severino de Freitas estabelecia contato com um suposto "Auditor" (com quem ele dizia que "trabalhava e sabia da existência de empresas que deviam ao INSS), e providenciava a inserção de vínculos inidôneos na carteira de trabalho, bem assim os "recolhimentos retroativos" junto a empresas nas quais a pessoa nunca havia trabalhado.

A fraude empregada teve por fim alcançar o tempo de contribuição necessário para a obtenção do benefício de aposentadoria, uma vez quê, sem os vínculos empregatícios falsos, Roberto Amâncio de Oliveira perfazia apenas o período de 09 anos, 06 meses e 11 dias de serviço.

A materialidade delitiva restou comprovada pelo procedimento administrativo instaurado pelo INSS (fls. 06/51), em que se apurou a inidoneidade dos vínculos empregatícios declarados nos documentos que instruíram o requerimento do benefício (fls. 46), bem assim pelas declarações de Roberto Amâncio de Oliveira, ao afirmar nunca ter trabalhado nas mencionadas empresas (fls. 59/62).

A autoria delitiva está igualmente comprovada pelas declarações de Roberto Amâncio de Oliveira e da testemunha Homero Silva (fls. 112/114), aliadas ao interrogatório policial de Denilton Santos, que descreveram a atuação de José Severino de Freitas no crime e o indicam como autor dos fatos. Em relação a Denilton Santos, ele próprio confessou ter atuado como procurador no requerimento do benefício objeto dos autos, e que pelo serviço recebeu do primeiro denunciado o valor de R$ 50,00 (cinquenta reais) (fl. 85).

Ademais, esclareceu-se durante a persecução que alguns dos cheques entregues por Roberto a José Severino de Freitas foram compensados através da conta corrente de Thiago de Freitas, filho do referido denunciado (fls. 136/139)."


A denúncia foi recebida em 08/11/2011 (fls. 271).


Às fls. 451/451v foram decretadas a revelia e a prisão preventiva de José.


Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 09/04/2013 (fls. 618). Consignou a Juíza:

"Diante de todo o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia apresentada para:

- condenar José Severino de Freitas às sanções previstas no art. 171, caput e §3°, c.c. o art. 14, inciso II, do Código Penal.

- absolver Denilton dos Santos da acusação de ter praticado o mesmo crime, com fundamento no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal.

(...)

Assim, fixo a pena definitiva em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias, estabelecendo, ainda, o regime inicial fechado, nos termos do art. 33, caput, e §3°, do Código Penal, uma vez que são desfavoráveis as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do mesmo Código .

(...)

Considerando as causa de diminuição e de aumento de pena em que o acusado incidiu, fixo a pena de multa definitiva em 53 (cinquenta e três) dias multa. Arbitro o valor do dia-multa em uni trigésimo do salário mínimo vigente, corrigido monetariamente pelos índices oficiais quando do pagamento, desde a data do fato, uma vez que não há, nos autos, informações atualizadas acerca da situação financeira do réu.

(...)

Também não é o caso de ser a sanção substituída por pena restritiva de direitos, uma vez que não foram atendidas as exigências arroladas pelo art. 44, caput, do mesmo diploma legal.

(...)

Pelo que acima se apurou, apresenta o réu conduta social, personalidade e antecedentes extremamente desfavoráveis, não sendo socialmente recomendável a mencionada substituição.

(...)

mantenho a decisão que decretou a prisão preventiva e determino a expedição de mandado de prisão."


Apela a parte ré. Sustenta:

1- DA INÉPCIA DA INICIAL. Ora, a inicial acusatória não descreve qual o liame subjetivo da conduta do acusado, e a intenção de obter vantagem ilícita em detrimento de entidade de Direito Público. Dizer que o Apelante tentou obter vantagem ilícita é muito pouco para caracterizar o crime de estelionato, uma vez que resta sobejamente caracterizado nos autos que não era ele o responsável pela fraude tipificada, mas o escritório de Márcio Godoy, de quem era o Apelante subordinado.

2- DO CRIME IMPOSSÍVEL. Verifica-se dos autos que o pedido encaminhado ao INSS não foi acolhido, caracterizando s.m.j. O CRIME IMPOSSÍVEL, já que a ineficácia total dos meios empregados e a impropriedade absoluta do objeto material tornou-se impossível de consumar o delito. Ademais, ao que consta, o beneficiário não possuía condições de obter a aposentadoria, mesmo que as anotações conseguissem causar engodo ã Previdência.

3- DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. Uma suposta fraude que sequer foi praticada pelo Apelante, uma situação em que não houve prejuízo a ninguém, não pode ser considerada formalmente criminosa. Meros desconfortos não ensejam crimes. Uma conduta atípica, como trata-se no caso, não é sinônimo de conduta permitida. O fato penalmente relevante pode receber tratamento adequado, se necessário, em outros ramos do Direito (enquadrando-se como, por exemplo, ilícito civil ou administrativo), respeitando o caráter fragmentário e de intervenção mínimo do Direito Penal.

4- DA INCONSCIÊNCIA DA ILICITUDE. A ausência de robustez nas provas colhidas pela acusação limitam eventual alcance numa reprimenda gravosa em face do acusado. Não existe nenhuma prova de que o Apelante foi o autor da tentativa de estelionato contra O INSS. Afinal, como poderia alguém ser considerado culpado por ato que não tinha poderes de praticar, pois todas as propostas passavam pelas mãos de Márcio. Não pode o Apelante restar incurso em uma pena cujo crime não cometeu, pois tampouco tinha ciência da ação desenvolvida por outrem. Como já dito anteriormente, o Apelante era simples subordinado, e não houve provas suficientes para demonstrar que estava na posse do elemento subjetivo caracterizador do crime na hora da ação.

5- DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. Por tudo o quanto apurado nos autos, incerta foi a condenação do Apelante, já que impossível condenar alguém por meras suposições ou ilações, haja vista não ter nos autos elementos suficientes para ensejar uma condenação. De fato, não existe um documento sequer que comprova as inverdades ditas contra o Apelante, sequer o laudo pode ser considerado como prova, baseado unicamente em provas testemunhais. Assim, a acusação que pesa contra o Apelante deve recair na pessoa de Márcio, o verdadeiro coordenador da fraude contra o INSS.

6- DA FIXAÇÃO DA PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. Não há qualquer sentença condenatória transitada em julgado que enseje a reincidência do Apelante, o que impede o aumento da pena base. Também não há como interpretar as sentenças condenatórias ainda pendentes de recurso como maus antecedentes, justamente porque não há como se afirmar com certeza que fora comprovado qualquer ilícito realizado por parte do Apelante. Pelas razoes expostas, requer a Defesa que seja reformada a r. sentença, fixando a pena base no mínimo admitido legalmente.

7 - DO REGIME INICIAL. Fixou-se, na r. sentença de l° grau, o regime inicial fechado, que, no entanto, regime mostra-se mais gravoso do que o previsto para a quantidade de pena aplicada ao apelante.

8- DA NÃO SUBSTITUIÇÃO PELA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. Por fim, resta impugnar, pelas mesmas razões acima expostas, a não substituição da pena imposta de privativa de liberdade por restritiva de direitos. Faz jus o Apelante, por preencher os requisitos do artigo 44, do Código Penal, à substituição, direito que lhe deve ser assegurado, uma vez que sua pena não ultrapassou o limite de quatro anos.


Contrarrazões do MPF às fls. 641, requerendo o desprovimento da apelação.


A Procuradoria Regional da República, nesta instância, opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 651).


Às fls. 726, juntada informação a respeito do cumprimento do mandado de prisão em desfavor do réu em 23/08/2013 (fls. 727/v).


Informação do Banco Nacional de Mandados de Prisão às fls. 737, informando que o mandado de prisão tem situação "aguardando cumprimento".


É o relatório.


À revisão.



WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): WILSON ZAUHY FILHO:10067
Nº de Série do Certificado: 54E0977545D2497B
Data e Hora: 08/11/2016 18:21:04



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0014478-94.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.014478-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal WILSON ZAUHY
APELANTE : JOSE SEVERINO DE FREITAS
ADVOGADO : JULIANA BASTOS NOGUEIRA SOARES (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : DENILTON SANTOS
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : TIAGO DE FREITAS
: ROBERTO AMANCIO DE OLIVIERA
No. ORIG. : 00144789420084036181 1P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Consignou o MPF: "No dia 11 de outubro de 2005, neste cidade, os denunciados José Severino de Freitas e Denilton Santos, agindo em concurso de agentes com unidade de desígnios e divisão de tarefas, tentaram obter fraudulentamente benefício de aposentadoria em nome de Roberto Amâncio de Oliveira, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social, induzindo e mantendo em erro seus funcionários, mediante a inserção de informações falsas em sua Carteira de Trabalho da Previdência Social e uso de documentos inidôneos."

Consignou a Juíza: "Diante de todo o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia apresentada para:

- condenar José Severino de Freitas às sanções previstas no art. 171, caput e §3°, c.c. o art. 14, inciso II, do Código Penal.

- absolver Denilton dos Santos da acusação de ter praticado o mesmo crime, com fundamento no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal."

Apela o réu José Severino.



DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. TIPICIDADE.

ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO.

Os tipos penais imputados à parte ré são os seguintes:


Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
(...)
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.
Art. 14 - Diz-se o crime:
(...)
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Imputado à parte ré a prática de tentativa de estelionato previdenciário, tipificado nos artigos 171, caput e §3º e 14, II, todos do Código Penal.



PRELIMINARES

1- Alegou a apelante em primeiro lugar:

DA INÉPCIA DA INICIAL. Ora, a inicial acusatória não descreve qual o liame subjetivo da conduta do acusado, e a intenção de obter vantagem ilícita em detrimento de entidade de Direito Público. Dizer que o Apelante tentou obter vantagem ilícita é muito pouco para caracterizar o crime de estelionato, uma vez que resta sobejamente caracterizado nos autos que não era ele o responsável pela fraude tipificada, mas o escritório de Márcio Godoy, de quem era o Apelante subordinado.

Conclusão:

A denúncia descreve a conduta criminosa do réu José Severino, conforme destacado no seguinte trecho:

"Em sede policial, Roberto Amâncio de Oliveira declarou jamais ter trabalhado nas referidas empresas e que assinou alguns formulários em branco, dentre os quais a procuração de fl. 14, e os entregou, juntamente com suas duas Carteiras de Trabalho e carnês de contribuição, para José Severino de Freitas, vulgo TUPÃ. Este havia se apresentado como funcionário do INSS, oferecendo-se para ajudá-la a fazer os cálculos de tempo de serviço e eventuais pagamentos atrasados perante o INSS. Pelos serviços prestados, Roberto pagou a José Severino de Freitas a quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais), sendo R$ 2.000,00 (dois mil reais) em dinheiro e o restante em dois cheques de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) cada (fls. 59/62).

José Severino de Freitas, de posse dos documentos, providenciou a inserção dos falsos vínculos na Carteira de Trabalho de Roberto Amâncio de Oliveira, bem assim a confecção da Ficha de Registro de Empregados e da Declaração de fls. 11/12."


Descabe falar-se em inépcia da denúncia.


2- Alega o apelante em segundo lugar:

DO CRIME IMPOSSÍVEL. Verifica-se dos autos que o pedido encaminhado ao INSS não foi acolhido, caracterizando s.m.j. O CRIME IMPOSSÍVEL, já que a ineficácia total dos meios empregados e a impropriedade absoluta do objeto material tornou-se impossível de consumar o delito. Ademais, ao que consta, o beneficiário não possuía condições de obter a aposentadoria, mesmo que as anotações conseguissem causar engodo à Previdência.

Conclusão:

Conforme destacado na sentença, protocolizado o pedido, com a apresentação dos documentos correspondentes, a irregularidade foi descoberta, após o autor ter praticado todos os atos que lhe competiam para propiciar o resultado desejado.

Não há que se falar em crime impossível, pois o meio utilizado não pode ser considerado absolutamente ineficaz para lesionar o bem jurídico. O meio utilizado era apto para lesionar o bem jurídico, mas a autarquia identificou a irregularidade dos documentos.

Quanto à alegação de que o segurado não possuía condições de obter a aposentadoria mesmo que as anotações conseguissem enganar a Previdência, vale reproduzir os fundamentos utilizados na Apelação Criminal 2007.61.81.011376-0, julgado por unanimidade pela Quinta Turma deste Tribunal em 24/08/2015, na qual foi réu também José Severino de Freitas, denunciado também pela prática do delito previsto no art. 171, § 3º, c. c. o art. 14, II, ambos do Código Penal.

Lá ficou consignado o seguinte (o mesmo entendimento pode ser aplicado nestes autos):

"A defesa de José Severino de Freitas sustenta a atipicidade de sua conduta por ausência de potencialidade lesiva e ofensa concreta a bem jurídico, uma vez que não foram cumpridos todos os requisitos legais para o deferimento do benefício previdenciário pleiteado por Mário Augusto de Castro e, como consequência, o pedido seria indeferido independentemente da suposta falsificação dos documentos que instruíram o requerimento administrativo (fl. 654).

Tal argumento não prospera.

A falta de preenchimento dos requisitos legais para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição não torna atípica a conduta de tentar obtê-lo com a utilização de documentação contrafeita. Não obstante a Autarquia Previdenciária tenha o dever jurídico de verificar o preenchimento de todos os requisitos legais para a concessão do benefício, a verdade é que o agente do delito conta com a falha nos sistemas de controle para lograr o resultado almejado. Sendo assim, a conduta do agente encerra potencialidade lesiva consubstanciada nos documentos fraudulentos objetivamente aptos a iludir a fé pública, delito tal cuja sanção é absorvida pelo estelionato em decorrência da finalidade que animou o agente. Nesse sentido, não se trata de meio inidôneo (tentativa impossível), pois não há óbice natural à superveniência do resultado; a invalidade jurídica do benefício (fraudulento) não é argumento satisfatório para justificar a alegação de crime impossível."

Não há que se falar em crime impossível, portanto.


3- Alega o apelante em terceiro lugar:

DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. Uma suposta fraude que sequer foi praticada pelo Apelante, uma situação em que não houve prejuízo a ninguém, não pode ser considerada formalmente criminosa. Meros desconfortos não ensejam crimes. Uma conduta atípica, como trata-se no caso, não é sinônimo de conduta permitida. O fato penalmente relevante pode receber tratamento adequado, se necessário, em outros ramos do Direito (enquadrando-se como, por exemplo, ilícito civil ou administrativo), respeitando o caráter fragmentário e de intervenção mínimo do Direito Penal.

Conclusão:

A incidência do referido princípio deve atentar a alguns vetores (STF, HC 84.412, rel. Min, Celso de Mello): (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.

O delito de estelionato previdenciário, como é a hipótese dos autos, atinge sobremaneira as contas da previdência social, apresentando elevado grau de reprovação, não atendendo o requisito do reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento.


4- Alega o apelante em quarto lugar:

DA INCONSCIÊNCIA DA ILICITUDE. A ausência de robustez nas provas colhidas pela acusação limitam eventual alcance numa reprimenda gravosa em face do acusado. Não existe nenhuma prova de que o Apelante foi o autor da tentativa de estelionato contra o INSS. Afinal, como poderia alguém ser considerado culpado por ato que não tinha poderes de praticar, pois todas as propostas passavam pelas mãos de Márcio. Não pode o Apelante restar incurso em uma pena cujo crime não cometeu, pois tampouco tinha ciência da ação desenvolvida por outrem. Como já dito anteriormente, o Apelante era simples subordinado, e não houve provas suficientes para demonstrar que estava na posse do elemento subjetivo caracterizador do crime na hora da ação.

Conclusão:

A questão da autoria será apreciada adiante.



MATERIALIDADE COMPROVADA.

Consignou a Juíza a respeito da materialidade:

"Tenho que a materialidade delitiva da infração prevista no art. 171, caput e §3°, c.c. o art. 14, II, do Código Penal, ficou demonstrada pelas provas contidas nos autos.

Iniciando pelo procedimento instaurado no âmbito da autarquia previdenciária, observo que o pedido de aposentadoria foi instruído com ficha de registro de empregado, assim como declaração que teria sido subscrita por representante da mesma empresa (fls. 17 e 18) e, ainda, com CTPS, da qual constava vínculo com a empresa Constecca Construções S /A. (fl. 26).

Todavia, realizada pesquisa no CNIS, referidos vínculos não ficaram comprovados (fl. 22), o que gerou o indeferimento do pedido (fls. 35/36).

No que tange à prova oral, o próprio segurado Roberto Amâncio de, tanto na fase inquisitorial (fls. 59/62), quanto em Juízo (mídia de fl. 451), afirmou peremptoriamente que nunca trabalhou nas empresas citadas, o que constitui contundente evidência de que os documentos usados para instruir o pedido são falsos.

Fixada a premissa de que se caracterizou a falsidade, observo que os referidos documentos foram efetivamente utilizados para possibilitar a obtenção do benefício, já que constam do processo administrativo aberto no âmbito da autarquia previdenciária e que deu origem ao inquérito policial.

Friso, nesse ponto, que, muito embora não tenha sido obtida a aposentadoria almejada, sua eventual concessão, se tivesse ocorrido, teria sido indevida, já que, uma vez descontado o período discriminado nos citados documentos, não contaria o segurado com tempo de serviço suficiente para possibilitar a aposentação.

Nem se argumente, noutro giro, no sentido de não possuir a referida documentação aptidão para convencer acerca de sua veracidade, pelo fato de ter sido constatada a irregularidade ainda no âmbito da autarquia previdenciária.

De fato, para que exista estelionato, ainda que sob a forma tentada, ao contrário do que ocorre com os crimes contra a fé pública, basta que o artifício, ardil ou meio fraudulento empregado, induza ou mantenha em erro aquele de quem se pretende auferir a vantagem econômica, independentemente das impressões do chamado "homem médio".

Nessa linha de raciocínio, verifico, no caso dos autos, que o pleito foi processado e acaso regularizada a documentação faltante, que deu ensejo ao indeferimento do pedido, havia a possibilidade de ser deferido o benefício.

Em função disso, tenho que a execução do crime se iniciou (o que ocorreu com a protocolização do requerimento), não tendo havido consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Por todos esses motivos, afasto a alegação de crime impossível sustentada pela defesa e considero comprovada a materialidade delitiva."


Conclusão:

Devidamente comprovada nos autos a materialidade do delito atribuído à parte ré.



AUTORIA

Alega a parte ré a respeito da autoria:

DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. Por tudo o quanto apurado nos autos, incerta foi a condenação do Apelante, já que impossível condenar alguém por meras suposições ou ilações, haja vista não ter nos autos elementos suficientes para ensejar uma condenação. De fato, não existe um documento sequer que comprova as inverdades ditas contra o Apelante, sequer o laudo pode ser considerado como prova, baseado unicamente em provas testemunhais. Assim, a acusação que pesa contra o Apelante deve recair na pessoa de Márcio, o verdadeiro coordenador da fraude contra o INSS.

Conclusão:

AUTORIA COMPROVADA.

As alegações do apelante não são suficientes para afastar as conclusões contidas na sentença.

Consignou a Juíza a respeito da autoria:

"A prova colhida durante a instrução fornece elementos suficientes para atribuir ao réu a autoria do crime previsto no art. 171, §3°, do Código Penal.

Referida conclusão decorre das robustez da prova oral colhida no bojo do Inquérito e no decorrer da instrução, conjugada à fragilidade da versão apresentada pelo réu apenas na fase inquisitorial, já que não compareceu em Juízo para ser interrogado, embora insistentemente procurado em vários endereços e também citado por edital.

Iniciando pelas declarações prestadas pelo próprio segurado Roberto, já mencionadas no item anterior, esse confirmou em Juízo (mídia de fl. 451) que conheceu José por intermédio de um amigo e que lhe entregou a quantia de R$ 7.000,00 para que providenciasse o recolhimento de contribuições atrasadas junto ao INSS. Declarou, também, que lhe entregou suas carteiras profissionais e que assinou um documento em branco a seu pedido.

Também a testemunha de acusação José Lustosa Filho, dono de um lava rápido que o réu frequentava, declarou, em seu depoimento, que esse afirmava ser servidor do INSS. Disse, ainda, ter recebido reclamações de outros clientes do lava rápido que contrataram os "serviços" do acusado e tiveram seus benefícios indeferidos.

Finalmente, a testemunha Homero Silva confirmou que José Severino lhe foi apresentado por um terceiro como se fosse despachante e que pagou ao acusado a quantia de R$ 6.000,00 para que efetuasse recolhimento de contribuições atrasadas, tendo assinado procuração em branco e outros documentos. Confirmou tê-lo apresentado também ao segurado Roberto (mídia de fl. 451).

Já no que tange ao procedimento utilizado por José Severino para ingressar com os pleitos, o próprio corréu Denilton confirmou que protocolizou o requerimento, salientando que o acusado lhe pagava a quantia de R$ 50,00 por cada protocolo (mídia de fl. 451).

De outra parte, é de se reconhecer que, em face das sólidas evidências orais acima transcritas, não há como ser aceita, como prova da inocência, a versão apresentada pelo réu em outro Inquérito, cuja cópia foi acostada às fls. 123/124.

Em tais declarações, o acusado menciona pessoas cujos nomes seriam Flávia, Adriana, Elizangela e Márcio Godoy, não tendo a defesa trazido aos autos mínimo indício de sua efetiva existência.

Friso, ainda, que, por ter defensor constituído e em face da existência de várias ações em seu desfavor, é evidente que o acusado tem ciência do presente processo, tendo tentado, por diversas vezes, comprometer o andamento da instrução.

De fato, após ter sua prisão preventiva decretada em feito semelhante, foi apresentada aos autos petição pela defesa, informando novo endereço, circunstância que ensejou a revogação daquela decisão.

Todavia, mesmo após insistentes tentativas, não foi o réu localizado nos autos, não tendo a defesa, repita-se, produzido prova ou mesmo indício apto a desconstituir as evidências orais apresentadas pela acusação, as quais, pela minúcia dos depoimentos, apontam ser o réu quem providenciou os documentos falsos.

Diante disso, forçoso reconhecer que o acusado foi a pessoa responsável pela preparação dos documentos que instruíram o pedido de benefício do segurado Roberto, dos quais fez uso para requerer o benefício fraudulento.

Pelo que acima se expôs, considero ter José Severino de Freitas praticado a conduta descrita na denúncia."


Conclusão:

Devidamente comprovada nos autos a autoria do delito atribuído à parte ré.



PRESENÇA DE DOLO.

Sendo o dolo, na comum lição da doutrina, a vontade livre e consciente de praticar a conduta proibida pelo tipo penal, é inegável a sua presença na hipótese dos autos.

Conclusão:

Verifica-se que a parte ré teve deliberadamente a intenção de praticar o crime de estelionato previdenciário.



DOSIMETRIA.

Consignou a Juíza a respeito da dosimetria:

"a) Em relação às circunstâncias judiciais (art. 59 do Código Penal), o acusado é culpável, já que tinha conhecimento do caráter ilícito do fato e condições de autodeterminação. Apresentava e apresenta sanidade mental que lhe permitia não realizar a conduta ilícita, sendo exigível que agisse de modo diverso. Não há nos autos qualquer prova da existência de causa excludente da culpabilidade.

Nesse tópico, tenho que a mencionada culpabilidade deve ser considerada em seu grau acentuado, pela análise dos antecedentes, conduta social e personalidade do réu.

Iniciando pelos antecedentes, observo que José Severino apresenta extensa folha de apontamentos nesta Justiça Federal, constando inúmeras ações penais em andamento e também outras em que foi condenado pelo crime do artigo 171, § 3°, do Código Penal.

Tais registros constituem maus antecedentes, muito embora não tenha havido condenação com trânsito em julgado.

Nesse ponto, filio-me ao entendimento de Luiz Vicente Cernicchiaro, citado por Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, Editora Revista dos Tribunais, 4* edição, 2003, p. 263, para quem "o julgador, porque fato, não pode deixar de conhecer e considerar outros processos findos ou em curso, como antecedentes, partes da história do réu. Urge integrar a conduta ao modus vivendi anterior. Extrair a conclusão coerente com o modo de ser do acusado(...)".

Melhor explicitando, pode-se afirmar que o fato de ser réu em várias ações criminais ainda em curso, sendo que, em algumas delas, já foi proferida sentença condenatória pendente de recurso, constitui indício negativo, o qual só pode ser tido como maus antecedentes, sob pena de ser tal instituto considerado letra morta em matéria penal, a ser aplicado apenas na hipótese de condenação por ação anterior, transitada em julgado após a prática da conduta que é objeto do presente processo e que, por conseguinte, não geraria reincidência.

Não há que se falar em violação do princípio da presunção de inocência, previsto constitucionalmente, como defendido por alguns doutrinadores, já que tal garantia se aplica a cada uma das ações individualmente, impedindo, ademais, que os referidos apontamentos sejam utilizados para atribuir culpa pelo delito que nesses autos se imputa.

Prosseguindo na apreciação das circunstâncias do art. 59, tenho que a reiteração de ações semelhantes a que se apura nestes autos, conforme se observa pela leitura da folha de antecedentes, configura uma conduta social reprovável, assim como a existência de uma personalidade vocacionada para a prática de ilícitos, fato corroborado pela utilização de documentos falsos.

Desse modo, a despeito de conteúdo da Súmula n° 444, do STJ, dela divirjo veementemente e, não se tratando de enunciado com natureza vinculante, mantenho o agravamento da pena base nesse aspecto.

No que tange às consequências, muito embora atinja a infração praticada bem jurídico de suma importância, consistente no dinheiro público com o qual o Estado arca com o pagamento de benefícios previdenciários, há causa de especial aumento relacionada à natureza da pessoa jurídica prejudicada, a ser considerada na fase própria, razão pela qual deixo de acentuar a pena neste aspecto, para evitar a ocorrência de bis in idem.

Os motivos do crime são normais à espécie. A vítima não favoreceu a ocorrência dos fatos delitivos.

Em face do acima exposto, fixo a pena base privativa de liberdade para o crime em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

b) Na segunda fase da aplicação da pena, não há agravantes e atenuantes a serem consideradas.

Por conseguinte, mantenho a pena, nessa fase, em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

c) Na terceira fase da aplicação da pena, deve-se considerar a causa de diminuição prevista na parte geral, assim como a de especial aumento prevista no art. 171, §3° do Código.

No tocante à tentativa, verifico que o réu, tal como acima se demonstrou, praticou todos os atos que lhe cabiam para consecução do resultado pretendido, sendo que o íter críminis só se rompeu quando não lhe era mais possível qualquer intervenção, sendo de rigor, portanto, que se realize a redução em seu patamar mínimo.

Em relação à hipótese prevista no art. 171, §3°, trata-se de causa de aumento fixada em montante fixo, razão pela qual é desnecessária a realização de qualquer análise uma vez verificada sua ocorrência.

Assim, fixo a pena definitiva em 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias, estabelecendo, ainda, o regime inicial fechado, nos termos do art. 33, caput, e §3°, do Código Penal, uma vez que são desfavoráveis as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do mesmo Código.

d) Outrossim, em relação à pena de multa, fixo a pena base em 60 (sessenta) dias multa, em atenção às circunstâncias do art. 59 do Código Penal, bem como à correspondência que a sanção pecuniária deve guardar com a pena privativa, inclusive no que tange aos seus limites mínimo e máximo.

Considerando as causa de diminuição e de aumento de pena em que o acusado incidiu, fixo a pena de multa definitiva em 53 (cinquenta e três) dias multa. Arbitro o valor do dia-multa em um trigésimo do salário mínimo vigente, corrigido monetariamente pelos índices oficiais quando do pagamento, desde a data do fato, uma vez que não há, nos autos, informações atualizadas acerca da situação financeira do réu.

5.2. Substituição e suspensão da pena privativa de liberdade

Em relação à suspensão condicional da pena, observo que o réu não atende aos requisitos previstos no art. 77 do Código Penal, já que a pena aplicada é superior a dois anos.

Também não é o caso de ser a sanção substituída por pena restritiva de direitos, uma vez que não foram atendidas as exigências arroladas pelo art. 44, caput, do mesmo diploma legal.

Friso, nesse aspecto, que a última norma citada vincula a substituição à aplicação de pena não superior a quatro anos, não reincidência em crime doloso e circunstâncias judiciais que indiquem ser a medida suficiente.

Pelo que acima se apurou, apresenta o réu conduta social, personalidade e antecedentes extremamente desfavoráveis, não sendo socialmente recomendável a mencionada substituição.

5.3. Da prisão cautelar

No caso dos autos, tenho que a manutenção do réu em liberdade põe em risco a ordem pública, uma vez que têm expedidos contra si vários mandados de prisão preventiva, justamente pelos embaraços que causou a instrução de vários feitos de natureza semelhante.

De outra parte, a reiteração de condutas criminosas, aliada ao fato de que tem o acusado ciência da existência do feito e, mesmo assim, não se apresentou em juízo, constitui forte indício de que tem a intenção de continuar a delinquir, circunstância ainda mais reforçada por estar ausente do distrito da culpa. Desse modo, mantenho a decisão que decretou a prisão preventiva e determino a expedição de mandado de prisão."


Sustenta a defesa:

DA FIXAÇÃO DA PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. Não há qualquer sentença condenatória transitada em julgado que enseje a reincidência do Apelante, o que impede o aumento da pena base. Também não há como interpretar as sentenças condenatórias ainda pendentes de recurso como maus antecedentes, justamente porque não há como se afirmar com certeza que fora comprovado qualquer ilícito realizado por parte do Apelante. Pelas razoes expostas, requer a Defesa que seja reformada a r. sentença, fixando a pena base no mínimo admitido legalmente.

DO REGIME INICIAL. Fixou-se, na r. sentença de l° grau, o regime inicial fechado, que, no entanto, regime mostra-se mais gravoso do que o previsto para a quantidade de pena aplicada ao apelante.

DA NÃO SUBSTITUIÇÃO PELA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. Por fim, resta impugnar, pelas mesmas razões acima expostas, a não substituição da pena imposta de privativa de liberdade por restritiva de direitos. Faz jus o Apelante, por preencher os requisitos do artigo 44, do Código Penal, à substituição, direito que lhe deve ser assegurado, uma vez que sua pena não ultrapassou o limite de quatro anos.


Conclusão:

Merece reforma a sentença quanto à pena-base.

A Juíza consignou serem desfavoráveis ao réu os antecedentes, a conduta social e a personalidade, tudo baseado nas folhas de apontamentos da Justiça Federal.

A Juíza destacou que havia inúmeras ações em andamento, não havendo condenação com trânsito em julgado, mas que divergia do entendimento da Súmula 444 do STJ.

Entendo, entretanto, que o entendimento consignado na Súmula 444 do STJ deve ser observado. O texto da referida Súmula é o seguinte:

"É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base."


Desse modo, inviável fixar a pena-base acima do mínimo legal em razão dos processos em andamento.


De outro lado, verifico que os processos com trânsito em julgado citados no parecer da Procuradoria Regional da República tiveram extinção da punibilidade decretada (fls. 663, 669, 703 e 722), não servindo como maus antecedentes.


Assim, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, qual seja, 01 ano de reclusão.


Na segunda fase não houve agravantes nem atenuantes.


Na terceira fase deve-se considerar a causa de diminuição e a de aumento, esta do parágrafo 3º do artigo 171.

Quanto à diminuição pela tentativa, não merece reparo a sentença. A Juíza consignou que o réu "praticou todos os atos que lhe cabiam para consecução do resultado pretendido, sendo que o íter críminis só se rompeu quando não lhe era mais possível qualquer intervenção, sendo de rigor, portanto, que se realize a redução em seu patamar mínimo."

Em relação à causa de aumento do §3º do artigo 171, trata-se de causa de aumento em montante fixo.

Assim, a pena definitiva deve ser de (pena-base - 1/3 + 1/3) 10 meses e 20 dias de reclusão.


No que toca à pena de multa, sua fixação deve seguir os mesmos critérios da pena privativa de liberdade. Deste modo, redimensiono-a de 53 (cinquenta e três) dias-multa, fixada na r. sentença, para 10 (dez) dias-multa.

Fica mantido o valor unitário do dia-multa.


O regime inicial de cumprimento de pena deve ser o aberto (artigo 33, §2º, 'c').


Cabível a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, nos termos do artigo 44 do CP.

Nos termos do §2º do artigo 44 do CP, fixo a pena substitutiva em prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas.




DISPOSITIVO

Ante todo o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para reduzir a pena-base, fixar regime inicial de cumprimento de pena aberto, e substituir a pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos; e, de ofício, redimensiono a pena de multa para 10 (dez) dias-multa.


Por derradeiro, para fins do art. 387, §2º, do Código de Processo Penal, de rigor seja comunicado prontamente o Juízo da Execução Penal, com cópias do v. acórdão.

Oficie-se à Vara de Execuções Criminais, encaminhando-se cópia do acórdão.


É o voto.




WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): WILSON ZAUHY FILHO:10067
Nº de Série do Certificado: 54E0977545D2497B
Data e Hora: 30/01/2017 18:10:45