Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/02/2017
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000046-78.2015.4.03.6002/MS
2015.60.02.000046-9/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : REINALDO VIEIRA reu/ré preso(a)
ADVOGADO : DIEGO DETONI PAVONI (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00000467820154036002 1 Vr DOURADOS/MS

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 15 DA LEI 7.802/89. TRANSPORTE DE AGROTÓXICO. DESENVOLVIMENTO CLANDESTINO DE ATIVIDADE DE TELECOMUNICAÇÕES. LEI Nº 4.117/62. DOSIMETRIA DA PENA. PENA BASE. MULTA. SITUAÇÃO ECONÔMICA DO RÉU. NÃO CABIMENTO DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Ofendem de forma mais intensa o bem tutelado pela norma do art. 15 da Lei nº 7.802/89 a vultosa quantidade de mercadoria proibida, assim como a adoção meticulosa de artifícios para ludibriar a ação fiscalizatória, de modo a ensejar a majoração da pena com fulcro no art. 59 do CP.
2. O valor estabelecido para cada dia-multa se mostra razoável diante da situação econômica do réu.
3. Não substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos por ausência dos requisitos legais.
4. Recurso da defesa parcialmente provido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da defesa apenas para impor ao réu a pena mínima de 1 ano de detenção pela prática do crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62, mantidos os demais termos da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de janeiro de 2017.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000046-78.2015.4.03.6002/MS
2015.60.02.000046-9/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : REINALDO VIEIRA reu/ré preso(a)
ADVOGADO : DIEGO DETONI PAVONI (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00000467820154036002 1 Vr DOURADOS/MS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela defesa de Reinaldo Vieira contra a sentença de fls. 211/217 que o condenou pela prática do delito previsto no art. 15 da Lei nº 7.802/89 à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo, bem como pelo crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62, com imposição de pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 3 (três) meses de detenção, em regime inicial semiaberto, com manutenção da prisão preventiva e decretação de inabilitação para dirigir veículo.

Em razões de recurso (fls. 229/232), a defesa se insurge contra a dosimetria da pena. Alega que os fatos considerados pelo magistrado como circunstâncias dos crimes são a eles inerentes, razão pela qual não devem servir para majoração da pena base. Aduz, ainda, que a pena de multa deve ser reduzida diante da situação econômica do réu. Requer, por fim, a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direito.

Certificado o trânsito em julgado para o Ministério Público Federal em 08.09.2015 (fl. 233).

A acusação apresentou contrarrazões de apelação às fls. 235/237.

A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento do recurso interposto pela defesa (fls. 239/241).

É o relatório.

À revisão, nos termos regimentais.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000046-78.2015.4.03.6002/MS
2015.60.02.000046-9/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : REINALDO VIEIRA reu/ré preso(a)
ADVOGADO : DIEGO DETONI PAVONI (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00000467820154036002 1 Vr DOURADOS/MS

VOTO

Consta dos autos que o réu Reinaldo Vieira foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 15 da Lei nº 7.802/89 e pelo delito do art. 183 da Lei nº 9.472/97, por transportar agrotóxico de origem estrangeira em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente e desenvolver clandestinamente atividade de telecomunicação (fls. 79/80).

Segundo a peça acusatória, no dia 08.01.2015, por volta das 9 horas, nas imediações da cidade de Dourados/MS, o acusado foi preso em flagrante quando conduzia um caminhão Mercedes Benz 1518, momento em que foi surpreendido por uma equipe policial que fazia fiscalização de rotina.

De acordo com a denúncia, os agentes policiais constataram que o acusado transportava grande quantidade de agrotóxico de procedência estrangeira. Na mesma ocasião, averiguaram que o veículo possuía um rádio comunicador oculto entre os bancos, que provavelmente seria usado para comunicação nas rodovias.

Por derradeiro, consta da narrativa que o laudo de perícia química atestou que os produtos transportados não possuíam registro válido na ANVISA e no MAPA.

Após regular instrução, o acusado foi condenado pela prática do delito previsto no art. 15 da Lei nº 7.802/89 e pelo crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62.

Verifica-se que, no tocante à atividade clandestina de telecomunicação, o Juiz de primeiro grau atribuiu ao fato descrito na denúncia uma definição jurídica diversa e considerou que a conduta imputada ao réu amoldava-se ao delito do artigo 70 da Lei nº 4.117/62, razão pela qual aplicou o preceito secundário do mencionado tipo penal.

Em razões de recurso, a defesa pleiteia, em síntese, a fixação da pena base no mínimo legal para ambos os crimes, assim como a redução da pena de multa e a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direito.

Passo a apreciar as matérias devolvidas.

Verifico que a autoria e materialidade delitiva restaram devidamente comprovadas pelo conjunto probatório acostado aos autos e não foi objeto de impugnação específica, de modo que fica mantida a condenação de Reinaldo Vieira pela prática dos crimes previstos no art. 15 da Lei nº 7.802/89 e art. 70 da Lei nº 4.117/62.

No tocante à dosimetria da pena, o Juiz de primeiro grau procedeu da seguinte forma:


"DOSIMETRIA DA PENA
Atento ao disposto no artigo 59 do Código Penal, observo que a culpabilidade e o motivo dos crimes praticados pelo réu são comuns aos crimes à espécie; as consequências dos delitos foram pequenas, tendo em vista a apreensão da mercadoria que se tentava introduzir clandestinamente no país. A conduta da vítima em nada contribuiu para a prática do delito; embora o réu figure como réu ou investigado em diversas ações penais ou inquéritos policiais, tal fato não pode ser utilizado para agravar a pena-base, ex vi do disposto na súmula 444, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, de forma que à mingua de outros elementos, concluo que ele não ostenta maus antecedentes, personalidade voltada para o crime ou conduta social desajustada. As circunstâncias do crime de transporte de agrotóxicos foram bastante graves, tendo em vista a grande quantidade de mercadoria transportada, o fato do produto estar dissimulado em uma carroceria alta sem utilização de lona externa, para que aparentasse estar vazia, a utilização por parte do réu de vestimentas campestres para se disfarçar de agricultor local e dificultar a fiscalização pelas autoridades públicas, tendo, inclusive, trocado a sua camisa que estava suja e retirado o seu chapéu no momento da prisão. A circunstância do crime contra a telecomunicação também foi grave, tendo em vista que o radio transceptor estava oculto em meio aos bancos do veículo.
Desta forma, considerando que as circunstâncias judiciais não são totalmente favoráveis em relação a ambos os crimes, fixo a pena-base acima do mínimo legal em relação ao crime tipificado no artigo 15 da Lei nº 7.802/89, em 03 (três) anos e 03 (três) meses de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa e 01 (um) ano e 03 (três) meses de detenção relativo ao crime tipificado no artigo 70 da Lei nº 4.117/62.
Não incide na pena de transporte de agrotóxicos a atenuante da confissão espontânea prevista no art. 65, III, d do CP, tendo em vista que o acusado se retratou em Juízo, afirmando que não possuía ciência da irregularidade da mercadoria transportada.
Neste sentido, trago à colação o seguinte julgado:
PENAL. HABEAS CORPUS. CONFISSÃO EFETUADA NO INQUÉRITO POLICIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. SENTENÇA CONDENATÓRIA FIRMADA EM OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INAPLICABILIDADE.Inaplicável a atenuante da confissão espontânea quando esta, levada a efeito em sede de inquérito policial, e posteriormente retratada em juízo, não é efetivamente utilizada pelo magistrado para dar suporte à sentença condenatória, que se baseia em outros elementos de prova colhidos durante o processo. Habeas corpus denegado.(STJ, HC 35528 SP 2004/0068199-6, relator Ministro Paulo Medina, j. em 16/11/2004)
Da mesma forma, deixo de aplicar a agravante capitulada no artigo 62, inciso IV, do Código Penal, tendo em vista que a obtenção de vantagem econômica é ínsita a este tipo penal, bem como a prevista no artigo 61, inciso II, "c", tendo em vista que a dissimulação visava garantir a impunidade do delito, e não reduzir ou impossibilitar a defesa do ofendido, motivo pelo qual, aliás, foi valorado no momento da fixação da pena base.
Não incide qualquer agravante - visto que as elencadas pelo Parquet já foram utilizadas na fase do artigo 59, CP - ou causa de diminuição ou aumento de pena, de forma que fixo a pena definitivamente em 03 (três) anos, 03 (três) meses de reclusão e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, pela prática do delito tipificado no artigo 15 da Lei 7.802/89 e 01 (um) ano e 03 (três) meses de detenção relativo ao crime tipificado no artigo 70 da Lei nº 4.117/62.
Não há possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, porquanto o total de pena aplicada supera o limite objetivo de 04 (quatro) anos, previsto no artigo 44, do Código Penal.
Também por não atender ao limite objetivo, não se mostra possível a aplicação da suspensão condicional da pena, prevista no artigo 77 do Código Penal, que pressupõe para a sua aplicação que o quantum da pena não sobeje dois 02 (dois) anos de reclusão" (fls. 211/217 - g.n.).

No tocante a dosimetria da pena, a defesa pleiteia o afastamento da circunstância judicial considerada desfavorável e a fixação da pena base no mínimo legal.

Neste ponto, verifica-se que a sentença valorou negativamente as circunstâncias relacionadas aos crimes e elevou a pena base dos delitos.

O artigo 59 do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

Em relação ao crime do art. 15 da Lei nº 7.802/89, verifico que a valoração negativa da circunstância do crime se deu em razão da grande quantidade de produto agrotóxico e pela tentativa de simulação dos fatos mediante disfarce da carroceria do caminhão e do próprio acusado através de vestimentas de trabalhador rural.

Rechaço a alegação defensiva, já que ofendem de forma mais intensa o bem tutelado pela norma penal a vultosa quantidade de mercadoria proibida (comprovada pelo auto de apresentação e apreensão com informação de que metade da carroceria do caminhão era ocupada por pacotes com material agrotóxico - fls. 07/08), assim como a adoção meticulosa de artifícios para ludibriar a ação fiscalizatória, de modo a ensejar a majoração da pena com fulcro no art. 59 do CP.

Sendo assim, reputo suficiente à prevenção e punição a pena base imposta pelo Juízo sentenciante (3 anos e 3 meses de reclusão e 16 dias-multa).

No entanto, com relação ao delito do art. 70 da Lei nº 4.117/62, assiste razão à defesa.

Com efeito, não vejo maior reprovabilidade quanto à circunstância do crime, de modo a ensejar exasperação da pena base. Isso porque o fato do aparelho transceptor estar oculto no automóvel não torna o modus operandi do delito mais gravoso, mas se insere dentro do grau de normalidade daqueles que se verificam habitualmente na infração analisada.

Portanto, fixo a pena base no mínimo legal previsto para o delito, em 1 (um) ano de detenção.

Desta feita, considerando que não houve insurgência da defesa quanto às demais fases da dosimetria, estabeleço de forma definitiva a pena do crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62 no patamar mínimo de 1 (um) ano de detenção.

Em relação à pena de multa do delito ambiental, a defesa requer sua redução, ao argumento de que "o réu é pessoa pobre e se encontra desempregado" (fl. 231).

Neste ponto, destaco que a multa constitui sanção penal cujo valor é destinado ao fundo penitenciário, devendo sua fixação observar dois critérios, o sistema trifásico para a fixação da quantidade de dias-multa e a situação econômica do réu quanto ao valor de cada dia.

Na hipótese vertente, a multa prevista no art. 15 da Lei nº 7.802/89 foi estabelecida em 16 (dezesseis) dias-multa, com valor diário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.

Ora, o valor já foi estabelecido no mínimo previsto em lei e se mostra razoável diante da situação econômica do acusado, que trabalha como motorista (fl. 133).

Ademais, a alegação da defesa não veio amparada em qualquer documento que comprove a insuficiência econômica do réu.

Desta feita, mantenho a pena de multa na forma estabelecida pela sentença.

Por fim, sem razão o pedido defensivo de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito. Isso porque, o réu não preenche os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, tendo em vista que a somatória das penas concretamente aplicadas ultrapassam o limite de 4 anos. Ademais, em relação ao delito do art. 15 da Lei nº 7.802/89, as circunstâncias judiciais desfavoráveis também inviabilizam a substituição.

Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da defesa apenas para impor ao réu a pena mínima de 1 ano de detenção pela prática do crime do art. 70 da Lei nº 4.117/62, mantidos os demais termos da sentença.

É como voto.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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Nº de Série do Certificado: 1FAC9C5852853C5B
Data e Hora: 08/11/2016 11:48:03