D.E. Publicado em 08/05/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, DAR PROVIMENTO aos embargos infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, vencidos os Desembargadores Federais Andre Nekatschalow e Paulo Fontes que negavam provimento.
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RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de embargos infringentes opostos por CARLOS VITOR ABDUCH em face de acórdão proferido pela Quinta Turma desta Corte que, por maioria, deu provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal, nos termos do voto do Relator, Desembargador Federal André Nekatschalow, acompanhado pelo voto do Desembargador Federal Paulo Fontes.
A ementa do acórdão é a seguinte:
Ficou vencido o Desembargador Federal Mauricio Kato, que concedia, de ofício, habeas corpus para determinar o trancamento da ação penal.
A defesa pretende que prevaleça o voto vencido, sob o argumento de que o processo que tramitou perante a Justiça Estadual, considerado pelo acórdão embargado como "reincidência", não pode servir sequer para configurar mau antecedente, muito menos para impedir a aplicação do princípio da insignificância, isso porque a punibilidade foi extinta pelo pagamento do tributo.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento dos embargos infringentes (fls. 479/485).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): O embargante CARLOS VITOR ABDUCH foi denunciado pelo Ministério Público Federal como incurso no art. 334, § 1º, "c", do Código Penal, por ter exposto à venda, bem como mantido em depósito, no exercício de atividade comercial, mercadoria de procedência estrangeira que sabia ser produto de introdução clandestina no território nacional.
A denúncia foi recebida em 19 de outubro de 2012 (fls. 61).
Pela decisão de fls. 399/401, o juízo a quo concedeu a ordem de habeas corpus de ofício, a fim de reconhecer a atipicidade da conduta imputada ao réu, determinando, por conseguinte, o trancamento da ação penal, com fundamento no art. 654, § 2º, c.c. o art. 395, III, ambos do Código de Processo Penal, tendo o Ministério Público Federal interposto recurso em sentido estrito em face dessa decisão.
A Quinta Turma desta Corte, por maioria, deu provimento ao recurso para reformar a decisão e determinar o prosseguimento do feito, sendo que o voto vencido concedia, de ofício, habeas corpus, para determinar o trancamento da ação penal.
A divergência estabeleceu-se quanto à correção, ou não, da decisão que, por considerar atípica a conduta, em virtude da aplicação do princípio da insignificância, concedeu habeas corpus de ofício e determinou o trancamento da ação penal.
Inicialmente, observo que a concessão de habeas corpus de ofício pelo próprio juízo prolator da decisão que havia recebido a denúncia, para o fim de determinar o trancamento da ação penal, é vedada pelo ordenamento jurídico, por se tratar de reconsideração da decisão anteriormente proferida, sobre a qual já havia se operado a preclusão. Quanto a esse ponto, não houve divergência, uma vez que tanto o voto do Relator quanto o voto vencido reconheceram a nulidade da decisão recorrida neste aspecto.
Pois bem. O voto do Relator afastou a aplicação do princípio da insignificância, sob o fundamento de que a reiteração delitiva obsta a sua incidência, independentemente do valor do tributo não recolhido. No caso, como o réu seria "reincidente" na prática de crime contra a ordem tributária, conforme apontado pelo Ministério Público Federal (fls. 137/141), o Relator determinou o retorno dos autos à Vara de origem para o prosseguimento do feito.
O voto vencido, por sua vez, considerou aplicável o princípio da insignificância, por ser o valor dos tributos iludidos inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), conforme ofício expedido pela Receita Federal do Brasil (fls. 365), e por não haver prova de habitualidade criminosa a impedir a sua incidência. Por isso, concedeu habeas corpus de ofício e determinou o trancamento da ação penal.
Penso que a razão está com o voto vencido.
Nesse ponto, observo que o âmbito de cognição dos embargos infringentes encontra-se restrito à divergência retratada no acórdão originário, conforme dispõe o art. 609 do Código de Processo Penal, de sorte que, embora eu tenha reformulado meu entendimento sobre a matéria, passando a adotar a orientação do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1112748/TO, Rel. Ministro Felix Fischer, Terceira Seção, julgado em 09/09/2009, DJe 13/10/2009; REsp 1393317/PR, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/11/2014, DJe 02/12/2014; RHC 74.756/PR, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016), que adota como limite para a aplicação do princípio da insignificância o valor previsto no art. 20, caput, da Lei nº 10.522/2002, com a redação dada pela Lei nº 11.033/2004 (dez mil reais), o parâmetro a ser adotado para aplicação ou não do princípio da insignificância deve, necessariamente, ser o mesmo utilizado pelo voto vencido.
Consoante orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC nº 84.412/SP (Rel. Min. Celso de Mello), o princípio da insignificância, como fator de descaracterização material da tipicidade penal, deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima. A aplicação do postulado reclama a presença de certos vetores, a saber: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Prevalece no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que a conduta descrita no art. 334 do Código Penal é atípica quando o valor dos impostos incidentes não ultrapassa o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), previsto na Portaria nº 75/2012, do Ministério da Fazenda. A título exemplificativo, trago o seguinte julgado:
Também é consagrado que a reiteração de comportamentos antinormativos por parte do agente impede a aplicação do princípio em questão, já que não se pode considerar irrelevantes repetidas lesões a bens jurídicos tutelados pelo direito penal.
No caso em tela, as informações prestadas pela Receita Federal (fls. 365) revelam que o montante dos impostos supostamente iludidos (II e IPI) correspondia, à época, a R$ 17.517,60 (dezessete mil, quinhentos e dezessete reais e sessenta centavos).
Outrossim, não constam nos autos apontamentos em nome do recorrido que comprovem a reiteração dessa conduta delituosa (fls. 56/57). No apontamento de fls. 53 (cf. certidão de objeto e pé de fls. 102), relativo à suposta prática de crime contra a ordem tributária, houve a extinção da punibilidade pelo pagamento do débito fiscal, ainda em fase de inquérito policial (fls. 248/249). Desse modo, não há que se falar em "reincidência", a impedir a aplicação do princípio da insignificância.
Correta, portanto, a solução adotada pelo voto vencido, que concedeu habeas corpus de ofício e determinou o trancamento da ação penal.
Posto isso, DOU PROVIMENTO aos embargos infringentes para fazer prevalecer o voto vencido.
É o voto.
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