Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/03/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007278-89.2007.4.03.6110/SP
2007.61.10.007278-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : VERA LUCIA DA SILVA SANTOS
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : GILBERTO ZARDETTO
No. ORIG. : 00072788920074036110 3 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 313-A DOCÓDIGO PENAL. ISERÇÃO DE DADOS FALSO EM SISTEMA DE INFORMAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS. DOLO DEMONSTRADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DOSIMETRIA. PENA BASE REDUZIDA. SÚMULA N. 444 DO STJ. AFASTADO AUMENTO DE PENA NA TERCEIRA FASE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. FIXADO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO DO ARTIGO 44 DO CP PERTINENTE. RECURSO DA DEFESA PROVIDO EM PARTE.
1. Ré denunciada como incursa no artigo 313-A do Código Penal, por ter, na qualidade de servidora do INSS, inserido dados falsos em sistema informatizado viabilizando a concessão irregular de aposentadoria por tempo de contribuição.
2. Materialidade e autoria comprovadas. Dolo demonstrado pelo contexto fático e conjunto probatório coligido nos autos.
3. Desclassificação do delito capitulado no artigo 313-A do Código Penal para o delito previsto no artigo 171, §3º, do mesmo Códex. Não cabimento. Princípio da especialidade. Precedentes desta Corte Regional (TRF3, Quinta Turma, ACR - - 0013549-71.2003.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal André Nekatschalow, e-DJF3 Judicial 1:13/08/2014)
4. Mantido o decreto condenatório.
5. Dosimetria. Pena base reduzida. A condição da ré ser servidora pública devidamente autorizada a lidar com o sistema informatizado perfaz elementar do tipo em questão. Existência de ações penais em face da ré por fatos semelhantes e condenações penais sem trânsito em julgado consideradas como circunstância judicial desfavorável em dissonância com a Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça. Montante do prejuízo causado ao INSS no valor de R$ 56.176,56 (cinquenta e seis mil, cento e setenta e seis mil reais e cinquenta centavos) apto a conferir viés negativo à consequência do delito. Reduzida a pena base, mas mantida acima do mínimo legal. Inexistência de previsão legal de causa de aumento para o tipo do artigo 313-A do Código Penal. Afastado o aumento de 1/3 (um terço) procedido na terceira fase.
6. Fixado o regime inicial aberto de cumprimento de pena. Conquanto subsistente uma circunstância judicial desfavorável, pertinente a substituição do artigo 44 do Código Penal. Pena privativa de liberdade substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em: a) prestação pecuniária no valor de 05 (cinco) salários-mínimos, destinada à União Federal e, b) prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da execução, pelo mesmo prazo da pena corporal.
7. Recurso provido em parte.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da Defesa para diminuir a pena base e afastar o aumento aplicado na terceira fase da dosimetria da pena, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Por maioria, determinar a imediata expedição de guia de execução, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy.


São Paulo, 06 de março de 2018.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007278-89.2007.4.03.6110/SP
2007.61.10.007278-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : VERA LUCIA DA SILVA SANTOS
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : GILBERTO ZARDETTO
No. ORIG. : 00072788920074036110 3 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

Trata-se de Apelação Criminal interposta por VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, representada pela Defensoria Pública da União, contra a sentença de fls. 566/575-v, proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Sorocaba que:

a) absolveu GILBERTO ZARDETTO da prática do delito previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal com fulcro no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal; e

a) condenou VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e pagamento de 16 (dezesseis) dias multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 313-A do Código Penal.

Narra a denúncia que (fls. 317/320):

(...) que VERA, servidora do Instituto Nacional do seguro Social - INSS, na época dos fatos e, portanto, devidamente autorizada para tanto, inseriu dados falsos em sistema informatizado da Autarquia Federal, com fim de obter vantagem ilícita consistente na concessão de aposentadoria por tempo de contribuição em favor de GILBERTO e assim, causar dano a Previdência Social.
GILBERTO, por sua vez, obteve para si vantagem ilícita por meio de recebimento indevido de aposentadoria por tempo de contribuição, em prejuízo do INSS, induzindo em erro a Autarquia Federal, mediante meio fraudulento consistente na inserção, por VERA, de dados falsos no sistema informatizado da previdência Social.
Apurou-se que, em 18/11/2003 (fls. 47/48), VERA protocolizou na Agência da previdência Social em Itapetininga/ SP, onde era lotada, o pedido de concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição n. 42/128.872.994-1, em favor de GILBERTO.
Todavia, tendo em vista que ambos os denunciados tinham conhecimento que GILBERTO não contava com tempo suficiente de contribuição para obter o benefício pretendido, VERA, em 24/11/2003, processou o pedido protocolizado, inserindo no sistema informatizado do INSS vínculos empregatícios falsos de GILBERTO para com as empresas Têxtil Santa Adelaide, durante o período de 04/01/1988 a 03/08/1989 e Têxtil Assad Abdala S.A., durante os períodos de 23/01/1967 a 22/06/1969 a 31/01/1972. A auditoria realizada pelo órgão previdenciário constatou que não eram verdadeiros os vínculos empregatícios acima citados e que os períodos descritos foram utilizados na contagem de tempo para concessão do benefício (fls. 241/242).
Verifica-se que GILBERTO, embora resida em Santos/SP, protocolizou e teve concedido seu benefício de aposentadoria na cidade de Itapetininga/SP, municípios consideravelmente distantes, o que, por si só, já causa estranheza (fls. 274/275). Ademais, GILBERTO, mesmo podendo protocolizar seu pedido pessoalmente, valeu-se, para tanto, de um amigo que trabalhava em São Paulo que, segundo declarações do denunciado, hoje é falecido.
Além disso, GILBERTO é pessoa instruída, trabalha como administrador de empresas e possui curso superior, sendo, portanto, pouco crível que não tivesse conhecimento de que não possuía tempo de suficiente para obtenção do benefício pretendido.
Assim, por meio da inserção dos vínculos empregatícios falsos, GILBERTO passou a obter vantagem ilícita consistente no recebimento de aposentadoria a que não tinha direito, causando prejuízo à Previdência Social, uma vez que a quantia devidamente percebida por GILBERTO durante novembro de 2003 a dezembro de 2006 perfez a quantia de R$ 56.176,56 consoante demonstrativo de fls. 238, atualizado até junho de 2006.
A materialidade a autoria delitivas estão demonstradas, nos termos do procedimento administrativo oriundo do INSS, e que compõe os autos, bem como o incluso inquérito policial.
Como se vê VERA, servidora do INSS na época dos fatos inseriu dados falsos no sistema informatizado da Autarquia Federal, com o fim de obter vantagem ilícita em nome de GILBERTO e, dessa forma, causar dano à Previdência Social, incorrendo nas sanções previstas no artigo 313-A do Código penal. Já GILBERTO obteve para si vantagem ilícita em prejuízo do INSS, induzindo em erro a autarquia federal, mediante meio fraudulento consistente na inserção, por VERA, de dados falsos no sistema informatizado da Previdência Social, incorrendo nas sanções previstas no artigo 171, §3º, do Código Penal.(...)

Em razões recursais acostadas às fls. 589/596, ratificada pela Defensoria Pública da União à fl. 643, a defesa pugna pela absolvição, alegando, em síntese, fragilidade do conjunto probatório e ausência de dolo e, ainda, subsidiariamente, pretende:

a) a desclassificação da conduta para o tipo penal do artigo 171, §3º, do Código Penal;

b) o afastamento da causa de aumento de pena prevista "no parágrafo único do artigo 313-A do Código Penal", ao argumento de que a acusação não a incluiu na denúncia, sendo vedado o reconhecimento de ofício;

c) redução da pena ao mínimo legal;

d) a substituição do artigo 44 do Código Penal e a fixação do regime inicial aberto de cumprimento de pena, uma vez que não configurada a reincidência.

Contrarrazões da acusação acostadas às fls.606/609-v.

A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante, Dr. Elton Venturi, às fls. 628/633, opinou pelo parcial provimento do recurso, "devendo-se manter a r. sentença condenatória, exceto no que tange: (a) a classificação da imputação penal, tendo em vista que a conduta consubstanciada na concessão/obtenção fraudulenta de aposentadoria por tempo de serviço configura o delito de estelionato em detrimento da Previdência Social, previsto no art. 171, §3º, do Código Penal; (b) majoração da pena base, pelo fato de a ré se valer da sua condição de servidora pública para obtenção da vantagem indevida; (c) aplicação da agravante genérica contida no art. 61, II, "g", do CP; (d) a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.

Após manifestação da DPU (fls. 643), adveio manifestação do MPF (fls. 649/649-v)

É o relatório.

À revisão.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007278-89.2007.4.03.6110/SP
2007.61.10.007278-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : VERA LUCIA DA SILVA SANTOS
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
ABSOLVIDO(A) : GILBERTO ZARDETTO
No. ORIG. : 00072788920074036110 3 Vr SOROCABA/SP

VOTO

EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS foi denunciada por ter inserido, nos sistemas da Previdência Social, anotação de tempo de serviço falso em nome do codenunciado GILBERTO ZARDETTO, viabilizando, assim, a concessão e pagamento irregular de aposentadoria ao referido segurado.

VERA LÚCIA foi denunciada como incursa no artigo 313-A do Código Penal e Gilberto, no artigo 171, §3º, do mesmo códex.

Após regular processamento do feito, sobreveio sentença parcialmente procedente (absolvição de GILBERTO ZARDETTO), publicada em 28/04/2011 (fl. 576), o que ensejou a interposição do presente recurso.

Passo à matéria devolvida.

A materialidade delitiva encontra-se comprovada por meio do procedimento administrativo nº 35443.000560/2006-33, referente ao requerimento de aposentadoria por tempo de contribuição de GILBERTO ZARDETTO, NB nº 42/131.141.104-3 (fls. 08/246), que comprova que "o referido benefício foi concedido irregularmente com 30 anos e 04 meses e 12 dias de tempo de contribuição", "utilizando-se da inclusão de vínculo empregatício falso e da alteração de datas de admissão e demissão de vínculo empregatício no sistema de concessão de benefício, com envolvimento de servidor", no caso, VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS (fl. 245).

O grupo de Trabalho Portaria INSS/GEXSOR n. 95/2005 constatou as seguintes irregularidades (fl. 199):

- não comprovado o vínculo empregatício junto à empresa Textil Santa Adelaide no período de 04/01/1998 a 03/08/1989;

- junto à empresa Têxtil Assad Abdal S.A. o período correto do vínculo empregatício era de 23/06/1969 a 02/12/19696 e não o que foi inserido no sistema, de 23/01/1967 a 31/01/1972 (fl. 33).

A autoria também restou comprovada nos autos, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.

Anoto, de início, que, por ser formal o crime do artigo 313-A do Código Penal, esse se consuma no instante em que o agente insere ou facilita a inserção de dados falsos no sistema de informações com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem, sendo desnecessária a demonstração de que o servidor tenha obtido algum tipo de vantagem indevida.

In casu, restou fartamente demonstrado que VERA LÚCIA inseriu, em 24/11/2003, vínculos empregatícios inverídicos em sistema informatizado do INSS, em favor de GILBERTO.

Vejamos.

Interrogada pela autoridade policial, VERA LÚCIA disse ter sido ludibriada por uma suposta pessoa, um advogado chamado "João Anselmo", o qual, segundo ela, levava à agência da autarquia os requerimentos de benefício acompanhado da documentação que acreditava estar correta. Admitiu, entretanto, que, muitas vezes, não fez cópias dos documentos por ele apresentados e ter recebido dinheiro desta pessoa como forma de agradecimento pela rapidez na concessão de alguns pedidos de aposentadoria (fls. 267/268):

(...) que nos anos de 2002, 2003 e 2004 tinha contato com o advogado Dr. JOÃO ANSELMIO que dizia ser de são Paulo e lhe trazia documentação de pedidos de aposentadoria; que foi o Dr. JOÃO ANSELMO que protocolou o pedido de aposentadoria como procurador de GILBERTO ZARDETTO; que a interrogada não manteve contato pessoal com GILBERTO ZARDETTO, bem como nunca ouviu falar nem mesmo conhece a pessoa de ROBERTO LUIZ CAROZZI DE AGUIAR; que JOÃO ANSELMO comparecia à agência com certa regularidade para trazer documentação dos beneficia´rios entre os quais sempre trazia várias carteiras profissionais de um segurado, salientando que nenhum segurado possuía apenas uma CTPS; que algumas vezes JOAÕA ANSELMO passou dinheiro para a interrogada nos valores de R$ 500,00 (quinhentos reais) e R$ 300,00 (trezentos reais) dizendo que o segurado estava agradecendo, pois a aposentadoria teria saído rápido; que desconhecesse o paradeiro de JOÃO ANSELMO; que JOÃO ANSELMO deixava uma procuração com a interrogada no processo do INSS e retirava o requerimento para o beneficiário assiná-lo e, posteriormente, com o requerimento assinado JOÃO ANSELMO pedia procuração que se encontrava no processo, dessa forma a interrogada não tem conhecimento de qualquer dado do Dr. JOÃO ANSELMO, porém a interrogada confrontava os dados os dados do requerimento, assinatura e os documentos; que a interrogada alega que JOAÃO ANSELMO trazia documentação dos segurados e posteriormente não sabe porque sumiram tais documentos dos procedimentos do INSS; que muitos documentos JOAÃO ANSELMO mostrava a interrogada e levava na hora, sem que a interrogada retirasse qualquer cópia; que a interrogada acha que este fato ocorreu em mais de cem casos de benefícios; que nunca a interrogada teve contato com qualquer dos beneficiários protocolados por JOÃO ANSELMO (...)

Em Juízo (mídia digital de fl. 529), VERA LÚCIA negou os fatos e disse que apenas inseriu nos sistemas informatizados do INSS os dados constantes nos documentos que lhe foram apresentados pelo procurador "João Anselmo". Reafirmou que o 'erro' consistiu em não ter feito cópia reprográfica de muitos dos documentos originais que lhe foram apresentados e asseverou que o lançamento dos dados são feitos mediante apresentação de documentos originais, o que ocorreu no caso em comento.

Informou que trabalhou na autarquia por aproximadamente 32 anos e sempre em setor de concessão de benefícios.

Alegou que "João Anselmo" apresentou procuração do segurado GILBERTO, sendo que tal procuração ficou retida na autarquia, porém, disse ela: "ele pediu para levar o requerimento para o segurado assinar, aí quando o segurado assinou o requerimento, ele trouxe de volta, eu conferi novamente com a documentação apresentada, aí ele pediu de volta, a ele falou: "Ah se o segurado já assinou o requerimento para a senhora, então, acho que não tem necessidade da minha procuração ficar aí". Aí pediu de volta. E eu no momento achei que não tinha problema nenhum e devolvi".

Por fim, embora não se recordasse especificamente do caso dos autos, asseverou a ré que somente inseria vínculo empregatício constante de registro em CTPS e que não teve outros problemas durante sua vida profissional além dos ocorridos à época dos fatos.

De outro turno, a testemunha de acusação Sueli Franciso Paulino, servidora do INSS que integrou o grupo de Controle Interno da autarquia para verificação de eventuais irregularidades e atuou na análise da concessão do benefício de GILBERTO ZARDETTO, corroborou o quanto declarado extrajudicialmente, asseverando que foi detectado que o benefício foi deferido mesmo faltando quatro anos para a concessão de aposentadoria integral.

Reafirmou que houve procedimento administrativo instaurado contra a ré VERA LÚCIA e que, em auditoria, foram verificados de 12 a 15 casos de benefícios irregulares com atuação da referida servidora.

Não foram arroladas testemunhas defesa pela ré VERA LÚCIA (fls. 365/370).

A tese defensiva de que a acusada apenas inseriu nos sistemas informatizados da autarquia previdenciária os dados constantes na documentação apresentada e que por equívoco não fez cópias reprográficas destes não encontra respaldo no contexto fático e nas demais provas coligidas.

Não é crível que a apelante, servidora antiga da autarquia que atuava, especificamente, no setor de concessão de benefícios, ocupando, inclusive, cargos de chefia e supervisão, como ela mesma revelou em interrogatório, não estivesse acostumada com as rotinas de trabalho e, por simples descuido deixasse de fazer a reprografia dos documentos que comprovassem o tempo de serviço do requerente da aposentadoria.

Pelo mesmo motivo, não é verossímil que a servidora experiente se deixasse iludir pelo suposto advogado "João Anselmo" que a teria convencido de devolver a procuração já juntada no procedimento de requerimento de benefício.

Ainda que comprovada a existência desta terceira pessoa, o que, frise-se, não ocorreu, tal fato não seria apto a afastar a responsabilidade da acusada.

Além disso, como bem destacou o magistrado sentenciante, VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, á época, detinha matrícula e senha de acesso aos sistemas informatizados na condição de gerente da agência do INSS de Itapetininga/SP o que teria facilitado sua atuação.

Portanto, entendo, ao contrário do que afirma a Defesa, que o dolo restou devidamente comprovado.

Registro, outrossim, que não restaram demonstradas qualquer causa excludente de culpabilidade ou ilicitude, que pudessem afastar a configuração do delito.

Por fim, incabível a desclassificação do delito capitulado no artigo 313-A do Código Penal para o delito previsto no artigo 171, §3º, do mesmo Códex, como pretende a defesa, uma vez que o primeiro tipo penal é norma especial em relação ao segundo.

Nesta esteira, precedente desta Regional:

PENAL. PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. CÓDIGO PENAL, ART. 171, § 3º. DESCLASSIFICAÇÃO PARA INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES. CÓDIGO PENAL, ART. 313-A. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. ADMISSIBILIDADE. EMENDATIO LIBELLI. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESCINDIBILIDADE. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CULPABILIDADE NORMAL PARA O TIPO. AGRAVANTE DO ART. 62, IV, DO CÓDIGO PENAL. VANTAGEM INDEVIDA. ELEMENTO DO TIPO. INAPLICABILIDADE.
(...)
4. A conduta descrita na denúncia subsume-se exatamente ao tipo descrito no art. 313-A do Código Penal, consistente em inserir dados falsos nos sistemas informatizados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para outrem, sendo inviável, por força do princípio da especialidade, a aplicação do art. 171, § 3º, do Código Penal.
5. O delito de inserção de dados falsos em sistema de informações (CP, art. 313-A) é formal (NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, 4ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, p. 859, n. 38), de modo que prescinde de resultado naturalístico para sua consumação e, em consequência, afasta a incidência do art. 158 do Código de Processo Penal (TRF da 3ª Região, ACr n. 2003.61.81.009769-4, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, j. 06.09.11).
(...).
8. Apelações não providas.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 55019 - 0013549-71.2003.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 04/08/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/08/2014 )
"PENAL. PRELIMINAR. INÉPCIA DA INICIAL. INOCORRÊNCIA. CORRUPÇÃO PASSIVA. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMAS DE INFORMAÇÕES. QUADRILHA. ESTELIONATO. FALTA DE PROVAS. INOCORRÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO FIRME E COESO. ESTELIONATO. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. ARTIGO 317 DO CP. PRECEITO SECUNDÁRIO VIGENTE AO TEMPO DO CRIME. REFORMA DA PENA. RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1 - A exordial acusatória descreveu suficientemente a conduta delitiva imputada ao réu, permitindo o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. Na aludida denúncia, após delinear o fato delitivo e esmiuçar a fraude, o Parquet expôs os motivos que levaram as autoridades a vincular o episódio ao réu, de modo que todos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 41 do CPP estavam presentes. 2 - A prova angariada nos autos é robusta e coesa, abrangendo diálogos obtidos por meio de interceptação telefônica e também prova oral produzida sob o crivo do contraditório. 3 - Pelo princípio da especialidade, a conduta praticada pelo acusado amolda-se melhor àquela prevista no art. 313-A do CP do que à prevista no art. 171 do CP. De fato, a inserção de dados em sistema informatizado público, sendo o autor servidor público e tendo como finalidade a obtenção de vantagem indevida para si ou para outrem, adequa-se perfeitamente ao crime do art. 313-A do CP, especial em relação ao art. 171 do CP. 4 - Necessário que o delito de falsificação de documento público (art. 297, § 1º do CP) seja desclassificado para o delito de falsidade ideológica (art. 299, § 1º, do CP), e por ele seja condenado o acusado. A irregularidade nas certidões emitidas desponta somente em seu conteúdo, ou seja, foram inseridas declarações falsas ou diversas da que deveriam ser escritas, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. 5 - Resta claro que os crimes pelos quais o apelante foi condenado foram cometidos em concurso material, visto que as condutas praticadas foram autônomas, o que implica a somatória das penas, a teor do que dispõe o artigo 69 do Código Penal. 6 - A sentença proferida pelo Juízo "a quo" considerou adequadamente as circunstâncias judiciais, especialmente os motivos e as consequências dos delitos, fundamentando de forma clara a fixação das penas de cada crime acima do mínimo legal. 7 - Sem razão o inconformismo do apelante em relação à incidência da agravante do art. 61, II, g, do CP aos delitos 313-A e 317 do CP. Isso porque, na realidade, o magistrado fez incidir nestes casos a agravante do art. 62, I, do CP, eis a posição de destaque que Fernando na odisseia criminosa, organizando e dirigindo a atividade dos demais agentes. 8 - Apelação parcialmente provida.(ACR 00442721620124039999, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/12/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Destarte, conclui-se que o conjunto probatório é harmônico e seguro no sentido de que VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, voluntária e conscientemente, inseriu e dados falsos em sistema informatizado do INSS viabilizando a concessão irregular de benefício previdenciário em favor de GILBERTO ZARDETTO, devendo ser mantida a condenação firmada na sentença recorrida pela prática do delito previsto no artigo 313-A do Código Penal.

Passo ao exame da dosimetria da pena.

Pretende a defesa de VERA LÚCIA: o afastamento da causa de aumento de pena "prevista no parágrafo único do artigo 313-A do Código Penal", ao argumento de que a acusação não a incluiu na denúncia, sendo vedado o reconhecimento de ofício; redução da pena ao mínimo legal; a substituição do artigo 44 do Código Penal e a fixação do regime inicial aberto de cumprimento de pena, uma vez que não configurada a reincidência.

A magistrada a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, fundamentando nos seguintes termos (fls. 573-v/574)

(...) Circunstâncias judiciais - art. 59 do Código Penal - Considerando que a acusada era servidora do instituto nacional do seguro social - INSS, e incidiu na conduta típica descrita no art. 313-A do Código penal, pois alterou indevidamentre informações no banco de dados do referido instituto, a fim de obter vantagem indevida para outrem, de forma consistente, constata-se que a acusada praticou fato definido como crime, portanto, com essa conduta, incide nas penas do art. 313-a do Código Penal; considerando que a conduta social da ré merece reprovação nos termos do artigo 59 do Código penal, que se valeu do cargo que ocupava, já que na época era gerente da agência da previdência social em Itapetininga, portanto, Funcionária autorizada a operar sistemas informatizados do INSS para inserir dados falsos no sistema informatizado da Autarquia Federal, com fim de obter vantagem ilícita consistente na concessão de aposentadoria por tempo de contribuição em favor de Gilberto Zardetto; considerando que a ré causou dano à Previdência Social consistente no valor de R$ 56.176,56, atualizado até junho de 2006; considerando que esse não é o único caso em que atuou fraudulentamente, já que constam outros processos em face da ré abordando fatos semelhantes, sendo certo que esse não foi fato isolado, na medida em que, Vera foi denunciada em outros processos, conforme se observa no relatório de prevenção colacionado às fls. 323/324 dos autos e nas certidões de distribuição dos autos em apenso; considerando que já houve sentença penal condenatória em face da ré nos autos que tramitam nesta seção Judiciária sob n. 2006.61.10.008616-3 e 2006.61.10.010933-3, fixo a pena base acima do mínimo legal (...)

Do excerto acima transcrito, verifica-se que a magistrada de primeiro grau sopesou de modo negativo a condição da ré ser servidora pública devidamente autorizada a lidar com o sistema informatizado, o que perfaz elementar do tipo em questão e deve ser desconsiderada.

Do mesmo modo, a MM.ª Juíza consignou a existência de outras ações penais em face da ré por fatos semelhantes e condenações penais sem trânsito em julgado à época (n. 2006.61.10.008616- 3 e n. 2006.61.10.010933-3 - fls. 24 e 27 do apenso), em dissonância com a Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça, devendo ser, igualmente, afastadas.

De outro turno, como se trata de prejuízo suportado pelo INSS, autarquia voltada a prestação de serviços previdenciários à sociedade, considero que o montante do prejuízo ocasionado de R$ 56.176,56 (cinquenta e seis mil, cento e senta e seis reais e cinquenta e seis centavos), calculado em 2006, é apto a conferir viés negativo à consequência do delito.

Por tal motivo, reduzo ligeiramente a pena-base para 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão.

Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, na terceira fase, a magistrada a quo aumentou a pena à razão de 1/3 (um terço) ao argumento de ser decorrente do disposto no parágrafo único do artigo 313 do Código Penal.

Contudo, não há previsão legal de causa de aumento para o tipo do artigo 313-A do Código Penal, razão pela qual afasto referido recrudescimento e, ante a falta de recurso da acusação e da ausência de outras causas de aumento e diminuição, torno a pena de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão definitiva.

Quanto à pena de multa, aplico o mesmo critério utilizado para o cálculo da pena privativa de liberdade e redimensiono-a para 10 (dez) dias-multa.

O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade será o aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.

Conquanto subsistente uma circunstância judicial desfavorável, entendo pertinente e recomendável a substituição do artigo 44 do Código Penal, assim como opinou a Procuradoria Regional da República. Deste modo, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes em: a) prestação pecuniária no valor de 05 (cinco) salários-mínimos, destinada à União Federal e, b) prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da execução, pelo mesmo prazo da pena corporal.

Pelo exposto, dou parcial provimento ao recurso da Defesa para diminuir a pena base e afastar o aumento aplicado na terceira fase da dosimetria da pena, o que resultou na pena definitiva de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias multa.

Nos termos do entendimento firmado pelo STF no HC 126.292 e ADCs 43 e 44, expeça-se guia de execução para imediato início de cumprimento das penas restritivas de direito, encaminhando-as ao Juízo da Execução.

É o voto.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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