D.E. Publicado em 13/03/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da Defesa para diminuir a pena base e afastar o aumento aplicado na terceira fase da dosimetria da pena, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Por maioria, determinar a imediata expedição de guia de execução, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy.
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RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
Trata-se de Apelação Criminal interposta por VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, representada pela Defensoria Pública da União, contra a sentença de fls. 566/575-v, proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Sorocaba que:
a) absolveu GILBERTO ZARDETTO da prática do delito previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal com fulcro no artigo 386, VI, do Código de Processo Penal; e
a) condenou VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e pagamento de 16 (dezesseis) dias multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática do delito previsto no artigo 313-A do Código Penal.
Narra a denúncia que (fls. 317/320):
Em razões recursais acostadas às fls. 589/596, ratificada pela Defensoria Pública da União à fl. 643, a defesa pugna pela absolvição, alegando, em síntese, fragilidade do conjunto probatório e ausência de dolo e, ainda, subsidiariamente, pretende:
a) a desclassificação da conduta para o tipo penal do artigo 171, §3º, do Código Penal;
b) o afastamento da causa de aumento de pena prevista "no parágrafo único do artigo 313-A do Código Penal", ao argumento de que a acusação não a incluiu na denúncia, sendo vedado o reconhecimento de ofício;
c) redução da pena ao mínimo legal;
d) a substituição do artigo 44 do Código Penal e a fixação do regime inicial aberto de cumprimento de pena, uma vez que não configurada a reincidência.
Contrarrazões da acusação acostadas às fls.606/609-v.
A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante, Dr. Elton Venturi, às fls. 628/633, opinou pelo parcial provimento do recurso, "devendo-se manter a r. sentença condenatória, exceto no que tange: (a) a classificação da imputação penal, tendo em vista que a conduta consubstanciada na concessão/obtenção fraudulenta de aposentadoria por tempo de serviço configura o delito de estelionato em detrimento da Previdência Social, previsto no art. 171, §3º, do Código Penal; (b) majoração da pena base, pelo fato de a ré se valer da sua condição de servidora pública para obtenção da vantagem indevida; (c) aplicação da agravante genérica contida no art. 61, II, "g", do CP; (d) a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.
Após manifestação da DPU (fls. 643), adveio manifestação do MPF (fls. 649/649-v)
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DR. HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS foi denunciada por ter inserido, nos sistemas da Previdência Social, anotação de tempo de serviço falso em nome do codenunciado GILBERTO ZARDETTO, viabilizando, assim, a concessão e pagamento irregular de aposentadoria ao referido segurado.
VERA LÚCIA foi denunciada como incursa no artigo 313-A do Código Penal e Gilberto, no artigo 171, §3º, do mesmo códex.
Após regular processamento do feito, sobreveio sentença parcialmente procedente (absolvição de GILBERTO ZARDETTO), publicada em 28/04/2011 (fl. 576), o que ensejou a interposição do presente recurso.
Passo à matéria devolvida.
A materialidade delitiva encontra-se comprovada por meio do procedimento administrativo nº 35443.000560/2006-33, referente ao requerimento de aposentadoria por tempo de contribuição de GILBERTO ZARDETTO, NB nº 42/131.141.104-3 (fls. 08/246), que comprova que "o referido benefício foi concedido irregularmente com 30 anos e 04 meses e 12 dias de tempo de contribuição", "utilizando-se da inclusão de vínculo empregatício falso e da alteração de datas de admissão e demissão de vínculo empregatício no sistema de concessão de benefício, com envolvimento de servidor", no caso, VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS (fl. 245).
O grupo de Trabalho Portaria INSS/GEXSOR n. 95/2005 constatou as seguintes irregularidades (fl. 199):
- não comprovado o vínculo empregatício junto à empresa Textil Santa Adelaide no período de 04/01/1998 a 03/08/1989;
- junto à empresa Têxtil Assad Abdal S.A. o período correto do vínculo empregatício era de 23/06/1969 a 02/12/19696 e não o que foi inserido no sistema, de 23/01/1967 a 31/01/1972 (fl. 33).
A autoria também restou comprovada nos autos, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
Anoto, de início, que, por ser formal o crime do artigo 313-A do Código Penal, esse se consuma no instante em que o agente insere ou facilita a inserção de dados falsos no sistema de informações com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem, sendo desnecessária a demonstração de que o servidor tenha obtido algum tipo de vantagem indevida.
In casu, restou fartamente demonstrado que VERA LÚCIA inseriu, em 24/11/2003, vínculos empregatícios inverídicos em sistema informatizado do INSS, em favor de GILBERTO.
Vejamos.
Interrogada pela autoridade policial, VERA LÚCIA disse ter sido ludibriada por uma suposta pessoa, um advogado chamado "João Anselmo", o qual, segundo ela, levava à agência da autarquia os requerimentos de benefício acompanhado da documentação que acreditava estar correta. Admitiu, entretanto, que, muitas vezes, não fez cópias dos documentos por ele apresentados e ter recebido dinheiro desta pessoa como forma de agradecimento pela rapidez na concessão de alguns pedidos de aposentadoria (fls. 267/268):
Em Juízo (mídia digital de fl. 529), VERA LÚCIA negou os fatos e disse que apenas inseriu nos sistemas informatizados do INSS os dados constantes nos documentos que lhe foram apresentados pelo procurador "João Anselmo". Reafirmou que o 'erro' consistiu em não ter feito cópia reprográfica de muitos dos documentos originais que lhe foram apresentados e asseverou que o lançamento dos dados são feitos mediante apresentação de documentos originais, o que ocorreu no caso em comento.
Informou que trabalhou na autarquia por aproximadamente 32 anos e sempre em setor de concessão de benefícios.
Alegou que "João Anselmo" apresentou procuração do segurado GILBERTO, sendo que tal procuração ficou retida na autarquia, porém, disse ela: "ele pediu para levar o requerimento para o segurado assinar, aí quando o segurado assinou o requerimento, ele trouxe de volta, eu conferi novamente com a documentação apresentada, aí ele pediu de volta, a ele falou: "Ah se o segurado já assinou o requerimento para a senhora, então, acho que não tem necessidade da minha procuração ficar aí". Aí pediu de volta. E eu no momento achei que não tinha problema nenhum e devolvi".
Por fim, embora não se recordasse especificamente do caso dos autos, asseverou a ré que somente inseria vínculo empregatício constante de registro em CTPS e que não teve outros problemas durante sua vida profissional além dos ocorridos à época dos fatos.
De outro turno, a testemunha de acusação Sueli Franciso Paulino, servidora do INSS que integrou o grupo de Controle Interno da autarquia para verificação de eventuais irregularidades e atuou na análise da concessão do benefício de GILBERTO ZARDETTO, corroborou o quanto declarado extrajudicialmente, asseverando que foi detectado que o benefício foi deferido mesmo faltando quatro anos para a concessão de aposentadoria integral.
Reafirmou que houve procedimento administrativo instaurado contra a ré VERA LÚCIA e que, em auditoria, foram verificados de 12 a 15 casos de benefícios irregulares com atuação da referida servidora.
Não foram arroladas testemunhas defesa pela ré VERA LÚCIA (fls. 365/370).
A tese defensiva de que a acusada apenas inseriu nos sistemas informatizados da autarquia previdenciária os dados constantes na documentação apresentada e que por equívoco não fez cópias reprográficas destes não encontra respaldo no contexto fático e nas demais provas coligidas.
Não é crível que a apelante, servidora antiga da autarquia que atuava, especificamente, no setor de concessão de benefícios, ocupando, inclusive, cargos de chefia e supervisão, como ela mesma revelou em interrogatório, não estivesse acostumada com as rotinas de trabalho e, por simples descuido deixasse de fazer a reprografia dos documentos que comprovassem o tempo de serviço do requerente da aposentadoria.
Pelo mesmo motivo, não é verossímil que a servidora experiente se deixasse iludir pelo suposto advogado "João Anselmo" que a teria convencido de devolver a procuração já juntada no procedimento de requerimento de benefício.
Ainda que comprovada a existência desta terceira pessoa, o que, frise-se, não ocorreu, tal fato não seria apto a afastar a responsabilidade da acusada.
Além disso, como bem destacou o magistrado sentenciante, VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, á época, detinha matrícula e senha de acesso aos sistemas informatizados na condição de gerente da agência do INSS de Itapetininga/SP o que teria facilitado sua atuação.
Portanto, entendo, ao contrário do que afirma a Defesa, que o dolo restou devidamente comprovado.
Registro, outrossim, que não restaram demonstradas qualquer causa excludente de culpabilidade ou ilicitude, que pudessem afastar a configuração do delito.
Por fim, incabível a desclassificação do delito capitulado no artigo 313-A do Código Penal para o delito previsto no artigo 171, §3º, do mesmo Códex, como pretende a defesa, uma vez que o primeiro tipo penal é norma especial em relação ao segundo.
Nesta esteira, precedente desta Regional:
Destarte, conclui-se que o conjunto probatório é harmônico e seguro no sentido de que VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, voluntária e conscientemente, inseriu e dados falsos em sistema informatizado do INSS viabilizando a concessão irregular de benefício previdenciário em favor de GILBERTO ZARDETTO, devendo ser mantida a condenação firmada na sentença recorrida pela prática do delito previsto no artigo 313-A do Código Penal.
Passo ao exame da dosimetria da pena.
Pretende a defesa de VERA LÚCIA: o afastamento da causa de aumento de pena "prevista no parágrafo único do artigo 313-A do Código Penal", ao argumento de que a acusação não a incluiu na denúncia, sendo vedado o reconhecimento de ofício; redução da pena ao mínimo legal; a substituição do artigo 44 do Código Penal e a fixação do regime inicial aberto de cumprimento de pena, uma vez que não configurada a reincidência.
A magistrada a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, fundamentando nos seguintes termos (fls. 573-v/574)
Do excerto acima transcrito, verifica-se que a magistrada de primeiro grau sopesou de modo negativo a condição da ré ser servidora pública devidamente autorizada a lidar com o sistema informatizado, o que perfaz elementar do tipo em questão e deve ser desconsiderada.
Do mesmo modo, a MM.ª Juíza consignou a existência de outras ações penais em face da ré por fatos semelhantes e condenações penais sem trânsito em julgado à época (n. 2006.61.10.008616- 3 e n. 2006.61.10.010933-3 - fls. 24 e 27 do apenso), em dissonância com a Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça, devendo ser, igualmente, afastadas.
De outro turno, como se trata de prejuízo suportado pelo INSS, autarquia voltada a prestação de serviços previdenciários à sociedade, considero que o montante do prejuízo ocasionado de R$ 56.176,56 (cinquenta e seis mil, cento e senta e seis reais e cinquenta e seis centavos), calculado em 2006, é apto a conferir viés negativo à consequência do delito.
Por tal motivo, reduzo ligeiramente a pena-base para 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão.
Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes, na terceira fase, a magistrada a quo aumentou a pena à razão de 1/3 (um terço) ao argumento de ser decorrente do disposto no parágrafo único do artigo 313 do Código Penal.
Contudo, não há previsão legal de causa de aumento para o tipo do artigo 313-A do Código Penal, razão pela qual afasto referido recrudescimento e, ante a falta de recurso da acusação e da ausência de outras causas de aumento e diminuição, torno a pena de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão definitiva.
Quanto à pena de multa, aplico o mesmo critério utilizado para o cálculo da pena privativa de liberdade e redimensiono-a para 10 (dez) dias-multa.
O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade será o aberto, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.
Conquanto subsistente uma circunstância judicial desfavorável, entendo pertinente e recomendável a substituição do artigo 44 do Código Penal, assim como opinou a Procuradoria Regional da República. Deste modo, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes em: a) prestação pecuniária no valor de 05 (cinco) salários-mínimos, destinada à União Federal e, b) prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da execução, pelo mesmo prazo da pena corporal.
Pelo exposto, dou parcial provimento ao recurso da Defesa para diminuir a pena base e afastar o aumento aplicado na terceira fase da dosimetria da pena, o que resultou na pena definitiva de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias multa.
Nos termos do entendimento firmado pelo STF no HC 126.292 e ADCs 43 e 44, expeça-se guia de execução para imediato início de cumprimento das penas restritivas de direito, encaminhando-as ao Juízo da Execução.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | HELIO EGYDIO MATOS NOGUEIRA:10106 |
Nº de Série do Certificado: | 68D9614EDFBF95E3 |
Data e Hora: | 08/03/2018 09:58:22 |