D.E. Publicado em 07/06/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações de EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES e do Ministério Público Federal e, de ofício, alterar a destinação da prestação pecuniária à União, e, por maioria, afastar a condenação à reparação de danos, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Hélio Nogueira que mantinha o valor mínimo de reparação de danos fixado na sentença, nos termos do art. 387, inc. IV, do CPP e, por maioria, determinar a imediata expedição de guia de execução, nos termos do voto do Des. Fed. Valdeci dos Santos, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira, vencido o Relator que entende que a expedição da guia de execução deve ser feita após certificado o esgotamento dos recursos ordinários.
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VOTO
EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES foi denunciado por ter exigido para si, durante fiscalização realizada em rodovia federal, vantagem indevida no montante de R$200,00 sob a ameaça de apreensão do veículo e aplicação de multa, na forma do artigo 316 do Código Penal.
A r. sentença proferida pelo MM. Juízo da 6ª Vara Federal de Guarulhos/SP condenou o réu EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES como incurso na pena do artigo 316, do Código Penal à pena de 03 anos de reclusão em regime inicial aberto e pagamento de 15 dias-multa, no valor unitário mínimo legal. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Condenado ainda o réu à perda do cargo de agente da Polícia Rodoviária Federal, nos termos do artigo 92, I, alínea "a" e parágrafo único, do Código Penal, bem como à reparação de danos, nos termos do artigo 387, IV do Código de Processo Penal, arbitrada no montante de R$ 100,00.
Interpôs recurso de apelação o Ministério Público Federal, insurgindo-se somente quanto ao montante fixado a título de prestação pecuniária, em substituição à pena privativa de liberdade.
Apela também o acusado EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES, sustentando a controvérsia na identificação tanto do local do delito quanto do agente que abordou o veículo em questão, logo, pleiteia sua absolvição pela ausência de provas. Subsidiariamente, postula a redução da pena-base ao mínimo legal e o reconhecimento da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva.
DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. TIPICIDADE. CONCUSSÃO.
O tipo penal imputado à parte ré é o seguinte:
MÉRITO
MATERIALIDADE
A materialidade delitiva restou cabalmente demonstrada nos autos pelo Processo Administrativo Disciplinar, em especial o Relatório Final formulado pela Comissão Administrativa (fls. 404/471), corroborado pelo Corregedor Regional (fls. 475/478), harmônicos com os depoimentos das testemunhas de acusação (mídias de fls. 749, 774 e 899, e fls. 853 e 872/873), do que se conclui que houve fiscalização da Kombi, conduzida por Claudio Mitsuoka, placa CYD 4989, Sorocaba/SP, por policial rodoviário, que solicitou vantagem indevida, R$ 200,00, a fim de liberar o veículo sem a lavratura de multa.
Logo, não resta dúvida a respeito da materialidade do delito.
AUTORIA E DOLO
O acusado alega falta de provas quanto ao local dos fatos, o que teria induzido as testemunhas a identificarem, equivocadamente, o réu, logo tampouco estaria comprovada a autoria delitiva.
Em seu interrogatório judicial (mídia de fl. 976), o réu nega os fatos, reiterando que houve uma mera dedução de onde ocorreram os fatos narrados, mas que a região é extensa e fiscalizada por outras corporações que, inclusive, fazem uso do sistema da Polícia Rodoviária Federal para realizar pesquisas de placas de veículos. Da mesma forma, as testemunhas de defesa, demais policiais rodoviários em serviço na noite em questão, afirmam que não se recordam de nenhum incidente envolvendo um veículo Kombi na data dos fatos (mídia de fls. 936, 975/976, 990 e fls. 956/960), mormente o PRF Luiz Carlos de Jesus, que exercia a chefia na época dos fatos, atestou que não houve abordagem à Kombi de Claudio Mitsuoka pelo apelante, fato que teria sido por ele notado por ter supervisionado as fiscalizações realizadas naquela noite, na qualidade de chefe do comando (mídia de fl. 990).
A despeito de os depoimentos da defesa terem o mesmo valor probatório dos testemunhos de acusação, a versão do acusado e demais colegas não se coadunam aos demais elementos probatórios juntados nos autos.
Com efeito, à fl. 258, observa-se extrato emitido pelo Departamento Estadual de Trânsito, em que se verifica que a emissão de licenciamento eletrônico deu-se em 06/08/2003, às 07:54, em conformidade com as declarações de Claudio Mitsuoka e demais passageiros, na seara administrativa, de que, após o incidente relatado, por temor de nova fiscalização, procuraram sanar as irregularidades no veículo abordado, como o licenciamento vencido e o farol queimado. Da mesma forma, ofício expedido pela PRODESP noticia que, em 05/08/2003, às 01:15, foi realizada uma consulta à placa CYD 4998 pela Polícia Rodoviária Federal (fls. 300/303), em consonância ao quanto narrado pelos ocupantes da Kombi, esclarecendo qualquer dúvida a respeito de qual corporação teria sido responsável pela abordagem.
Quanto ao reconhecimento do acusado, observa-se que a Comissão de Sindicância, instaurada com o fito de apurar o quanto narrado em denúncia formulada pelos ocupantes da Kombi, apresentou, em dezembro de 2004, fotografias de policiais rodoviários federais em serviço na data dos fatos (fls. 49/50) e de imediato as testemunhas Antônio Abelardo Gonçalves (fl. 52), Claudio Mitsuoka (fls. 65/66) e Priscila Caproni (fls. 67/68) identificaram o acusado pela fotografia de nº 03 como o responsável pela abordagem e pela solicitação de numerário. Ainda que as demais testemunhas não tenham dado certeza quanto à identidade do policial rodoviário, tiveram dúvidas entre a fotografia do acusado e de um colega constante em fotografia de nº 04, descartando qualquer outro policial como o autor do delito.
Em depoimentos perante a Comissão de Processo Administrativo em março de 2005, em que houve reconhecimento pessoal do réu, tanto Antônio Abelardo quanto Priscila ratificaram ser EDIVAL o policial que efetuou a abordagem em agosto de 2003 (fls. 167/171 e 155/158, respectivamente), já Damaris Cristina Oliveira Gonçalves Pires identificou imediatamente o acusado, dissipando qualquer dúvida que tivera quando do reconhecimento fotográfico (fls. 172/176). Não obstante Claudio Mitsuoka não tenha apontado o réu como o policial, pois sua fisionomia estava um pouco distinta (fls. 150/154), em seu depoimento judicial, Claudio asseverou que o acusado estava mais magro na época da sindicância, o que dificultara sua identificação, mas que tinha certeza que era o mesmo policial. Tal declaração coaduna-se com a explicação dada por Antônio Abelardo perante a Comissão de Processo Administrativo Disciplinar de que o réu estava mais magro.
Quanto às supostas contradições entre os depoimentos apontados pela defesa, observa-se que, primeiramente, entre a data dos fatos e os depoimentos judicias decorreram aproximadamente 10 anos, o que possibilita a ocorrência de pequenas discrepâncias, porém, apenas em detalhes. Os testemunhos são uníssonos e harmônicos no sentido de que a Kombi placa CYD 4998, conduzida por Claudio Mitsuoka, foi abordada quando estavam a caminho do município de Caraguatatuba/SP, por policial rodoviário federal que verificou irregularidades na lanterna do veículo, bem como na documentação do carro, assim, exigiu quantia indevida para autorizar o prosseguimento da viagem sem a lavratura de multa, de forma grosseira e ameaçando os ocupantes do veículo de deixa-los a beira da estrada até a parte da manhã, quando passaria um ônibus que poderia leva-los embora, de modo que todos contribuíram com o numerário entregue ao réu. Outrossim, os passageiros que tiveram mais contato com o acusado, identificaram-no imediatamente por fotografia e, posteriormente, pessoalmente, evidenciando a comprovação da autoria e dolo na conduta de EDIVAL DE AMAZONAS RODRIGUES.
Portanto, provadas a materialidade e a autoria delitiva, bem como o dolo, a manutenção da sentença condenatória é de rigor.
Passo à análise da dosimetria.
DOSIMETRIA
O Magistrado a quo fixou a pena-base acima do mínimo legal, por entender como desabonadoras a culpabilidade do réu, os motivos, circunstâncias e consequências do crime, assim, fixada a pena-base em 03 anos de reclusão e 15 dias-multa, tornada definitiva à míngua de atenuantes e agravantes, bem como causas de diminuição e de aumento. Arbitrado cada dia-multa em 1/30 do salário mínimo.
A defesa de EDIVAL pugna pela fixação da pena-base no mínimo legal e, por consequência, o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.
Vejamos.
Ainda que deva ser afastada a valoração negativa da culpabilidade do acusado e os motivos do delito, tendo em vista que a violação e o desrespeito à administração pública já são parte intrínseca do tipo penal do artigo 316 do Código Penal, as circunstâncias do crime devem ser negativadas, uma vez que o acusado ameaçou os passageiros da Kombi durante a madrugada, horário de maior vulnerabilidade para pedestres ficarem à beira de estrada, considerando também que havia uma mulher grávida e crianças entre os ocupantes do veículo, tornando sua conduta mais grave. Da mesma forma, são negativas as consequências do delito, pois o réu autorizou um veículo com farol parcialmente queimado continuar viagem de madrugada, colocando em risco a segurança dos passageiros.
Segundo orientação do C. STJ, o aumento da pena em razão das circunstâncias judiciais deve levar em conta "o consagrado parâmetro de aumento de 1/8 (um oitavo) para cada circunstância desfavorável" (HC 325.306-RS - Rel. Min. Ribeiro Dantas, STJ). Daí considerando, no caso concreto, a incidência da fração (1/8) sobre o intervalo da pena em abstrato do preceito secundário do crime de furto qualificado (de 02 a 08 anos = intervalo de 06 anos), tem-se 09 meses para cada circunstância desfavorável o que resultaria na pena de 03 anos e 06 meses e pagamento de 17 dias-multa, no caso concreto. No entanto, não houve recurso do Ministério Público Federal neste tocante, assim, sob pena de reformatio in pejus, deve ser mantida a pena-base fixada na sentença de 03 anos de reclusão e pagamento de 15 dias-multa, a qual se torna definitiva, à míngua de atenuantes e agravantes, causas de aumento e de diminuição. Mantida a fixação do dia-multa em 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Quanto à alegação de transcurso do prazo prescricional, ante a manutenção da pena fixada pelo magistrado a quo, resta prejudicada. Apenas a título de argumentação, tendo em vista a ausência de trânsito em julgado para acusação, a prescrição regula-se pela pena máxima (08 anos), por conseguinte, verifica-se que não decorreu mais de 12 anos entre qualquer dos marcos prescricionais, data dos fatos (05/08/2003), recebimento da denúncia (19/12/2007) e publicação da sentença condenatória (24/06/2013).
DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS.
Deve ser mantido o regime inicial aberto fixado acertadamente pela r. sentença, em consonância com o disposto no artigo 33, §2º, "c" do Código Penal.
Da mesma forma, mantém-se a substituição da pena privativa de liberdade, tendo em vista o preenchimento dos requisitos do artigo 44 do Código Penal, consistentes, em prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo da duração da pena privativa de liberdade em entidade a ser apontada pelo Juízo da Execução Criminal, e em prestação pecuniária.
Insurge-se o Ministério Público Federal em face do montante fixado a título da prestação pecuniária, sob a alegação de que o valor não guarda proporcionalidade com a conduta do acusado.
Não merece acolhida tal alegação, tendo em vista que o quantum de 01 salário mínimo é adequado às circunstâncias do caso (o acusado solicitou R$200,00 e recebeu menos de R$100,00) e à situação financeira do réu, pois, conforme Portaria nº 1822 de 13 de outubro de 2006, EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES foi demitido do cargo de policial rodoviário federal (fl. 508), assim, não há qualquer elemento nos autos suficiente para que seja aferida a sua situação econômica. Por fim, cabe ao Juízo das Execuções Penais ajustar a forma de pagamento de acordo com as condições financeiras do acusado ao tempo da execução da pena.
De ofício, altero somente a destinação da prestação pecuniária à União, nos termos do artigo 45, §1º do Código Penal.
REPARAÇÃO DE DANOS
A reparação de danos disposta no artigo 387, IV do CPP é norma de direito material mais gravosa ao réu, por conseguinte, não pode ser aplicada retroativamente em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência. Nesse sentido, trago julgado do C. STJ:
No caso concreto, os fatos ocorreram em agosto de 2003, anteriores, portanto, à vigência da Lei 11.719/2008.
De outro lado, deve haver pedido expresso do Ministério Público, com oportunidade ao réu para manifestação a respeito da fixação do valor, sob pena de violação ao contraditório e à ampla defesa.
Neste sentido:
E ainda, da doutrina de Guilherme de Souza Nucci, em sua obra Código de Processo penal comentado, 11ª edição, extrai-se o seguinte trecho (pág. 742):
Assim, incabível a condenação do réu em valor de reparação de danos, a qual afasto de ofício.
Ante o exposto, nego provimento às apelações de EDIVAL DO AMAZONAS NEVES RODRIGUES e do Ministério Público Federal e, de ofício, altero a destinação da prestação pecuniária à União e afasto a condenação à reparação de danos.
Expeça-se a pertinente guia de execução provisória, após seja certificado o esgotamento dos recursos ordinários no caso concreto.
É o voto.
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