Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/10/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000909-19.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.000909-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : DANILO SERGIO GRILLO e outro.
ADVOGADO : SP024974 ADELINO MORELLI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
ACUSADO(A) : PEDRO DE ALCANTARA LEITAO RODRIGUES (desmembramento)
: LUIZ EUGENIO COSTA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: JOAO LUIZ AURELIO CALADO
APELANTE : RICHARD MONTOVANELLI
ADVOGADO : SP125526 DANIELA APARECIDA RODRIGUEIRO P FONSECA
ACUSADO(A) : WILLIAM DE LIMA (desmembramento)
: SERGIO ROBERTO DEJUSTE (desmembramento)
: MILTON SERGIO GIACHINI (desmembramento)
: MARCOS DANIEL DIAS FILHO (desmembramento)
: SANDRO SAO JOSE (desmembramento)
: ELIZEU DORIVAL BARRO JUNIOR (desmembramento)
: MARCEL JOSE STABELINI (desmembramento)
: LUIZ FABIANO TEIXEIRA (desmembramento)
: RONALDO JOSE RODRIGUES (desmembramento)
: ALTAIR OLIVEIRA FULGENCIO (desmembramento)
: IZAC PAVANI (desmembramento)
: HERMINIO MASSARO JUNIOR (desmembramento)
: JOSE EDUARDO FERNANDES MONTEIRO (desmembramento)
: SAMUEL SANTOS MARTINS (desmembramento)
: CLAUDIO TITO DOS SANTOS (desmembramento)
: NYDER DANIEL GARCIA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ARNALDO KINOTE JUNIOR (desmembramento)
: LUCAS IORIO (desmembramento)
: DENIZAR RIVAIL LIZIERO (desmembramento)
: RODOLFO APARECIDO VECHI (desmembramento)
: MARCO ANTONIO DE ABREU SANTO (desmembramento)
: VLADIMIR IVANOVAS (desmembramento)
: GUILHERME CASONE DA SILVA (desmembramento)
: ANDRE MURILO DIAS (desmembramento)
ACUSADO(A) : JOAO GERALDO DE ALMEIDA FRANCA (desmembramento)
ADVOGADO : SP011896 ADIB GERALDO JABUR
ACUSADO(A) : GISLAINE APARECIDA ECLES DE SOUZA (desmembramento)
: SILAS FRANCISCO ASSINI JUNIOR (desmembramento)
: ANA PAULA GUIMARAES MAURICIO (desmembramento)
: DANILO TOMASELLA (desmembramento)
: SERGIO DE ARAUJO MARTINS (desmembramento)
: ADILSON FRANCA (desmembramento)
: CHRISTIAN ANDERSON WALTER (desmembramento)
: GILMAR JOSE STABELINI (desmembramento)
: FABIO GOUVEIA SARTORI (desmembramento)
: REGINALDO SILVA MANGUEIRA (desmembramento)
: RITA DE CASSIA STABELINI FRANCA (desmembramento)
: CRISTINA FABIANA LAZARO DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ROBERTO DE MELLO ANNIBAL (desmembramento)
: ANTONIO CARLOS PICCINO FILHO (desmembramento)
: LUIZ FERNANDO GONCALVES FRAGA (desmembramento)
: ALEXANDRE ROSSI (desmembramento)
: FABIO AUGUSTO CASEMIRO DA ROCHA (desmembramento)
: DAVI SANTOS MARTINS (desmembramento)
: ANTONIO ROBERTO FRANCA (desmembramento)
: GUSTAVO ZANATTO CRESPILHO (desmembramento)
: CARLLO BENITO SANTEZZI BERTOTELLI ANDREUZA (desmembramento)
: MARCO PASCHOAL CARRAZZONE (desmembramento)
: ANTONIO APARECIDO SERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009091920114036117 1 Vr JAU/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO. ART. 318 CP. NULIDADES. INOBSERVÂNCIA DO ARTIGO 5º DA LEI N. 9.296/96. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. NOTIFICAÇÃO NOS TERMOS DO ARTIGO 514 DO CP. INTIMAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE NOVA DEFESA ESCRITA NOS TERMOS DO ARTIGO 396-A APÓS PROCESSO ANULADO. FINALIDADE DA CITAÇÃO ALCANÇADA. COMPARECIMENTO DO RÉU NOS ATOS PROCESSUAIS SUBSEQUENTES. VÍCIO SANADO. PRELIMINARES AFASTADAS. POSSIBILIDADE DO POLICIAL CIVIL INCORRER NO DELITO DE FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO. ARTIGO 144 DA CF. DEVER FUNCIONAL DE COIBIR ILÍCITOS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS.
1. Apelações Criminais contra sentença que condenou os corréus à pena de 03 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor mínimo legal em razão da prática do crime tipificado no artigo 318 do Código Penal.
2. Nulidade por inobservância do artigo 5º da Lei nº 9.296/96. Interceptação telefônica deferida e prorrogada por autoridade judicial competente, por meio de decisões devidamente motivadas e pautadas no artigo 2º da Lei n.º 9.296 /96, indicando a existência de fumus boni juris e periculum in mora para a decretação da medida. Prazo máximo para a vigência da interceptação. Inexistência de delimitação legal. Comprovada a indispensabilidade do meio de prova (na dicção do próprio artigo 5º da Lei nº 9.296 /96), é possível a renovação da interceptação telefônica. Posicionamento dos Tribunais Superiores (HC 106225-STF; HC 149.866/PR-STJ). Considerando a complexidade e número de pessoas envolvidas, tem-se que a interceptação perdurou pelo tempo necessário para a elucidação da trama criminosa em toda sua extensão, inexistindo qualquer vício.
3. Nulidade por ausência de citação. Devida notificação para cumprimento do artigo 514 do CPP. Inexistência de citação formal posterior. Comparecimento do réu devidamente acompanhado de sua defensora aos atos processuais subsequentes supera o referido vício e não enseja nulidade do feito. Inexistência de qualquer prejuízo para a Defesa. Não apresentação de defesa preliminar, nos termos do artigo 396-A do CPP, por opção da Defesa, pois devidamente intimada para tanto, após anulação do feito por decisão proferida pela 1ª Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no HC 0025563-59.2009.403.0000. Finalidade da citação, qual seja, a de cientificar o acusado do teor da denúncia e o seu chamamento ao processo para que possa exercer seu direito de defesa, plenamente alcançada com as notificações e intimações ocorridas. Preliminar afastada.
4. Possibilidade ou não da prática da conduta de facilitação de contrabando por policial civil. Aos órgãos de polícia compete, na dicção do artigo 144 da CF, o exercício de atividade que vise à preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Aos policiais civis, em específico, também na redação da norma constitucional, ressalvada a competência da União e militar, cabe a função de polícia judiciária que tem por fim a apuração das infrações e penais e de sua autoria. Neste contexto, delineado pela própria Constituição Federal, qualquer que seja órgão de polícia (polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícia civil, polícia militar e corpo de bombeiros), não é possível excluir o dever funcional de coibir delitos, seja de competência estadual ou federal, prima facie, pela própria natureza da atividade policial. Precedente do Superior Tribunal de Justiça (RHC 24.998/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2011, DJe 02/02/2012).
5. Materialidade e autoria delitivas que se extraem das provas coligidas nos autos.
6. Dosimetria mantida. Pena fixada no mínimo legal e substituída por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, esta revertida, de ofício, em favor da ofendida, a União.
7. Recursos desprovidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, afastar as preliminares arguidas, negar provimento aos recursos e reverter, de ofício, as prestações pecuniárias substitutivas em favor da União, e determinar a expedição das guias de execução, nos termos do relatório e voto do Relator, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy, que absolvia os réus do delito tipificado no art. 318 do Código Penal.


São Paulo, 04 de setembro de 2018.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000909-19.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.000909-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : DANILO SERGIO GRILLO e outro.
ADVOGADO : SP024974 ADELINO MORELLI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00009091920114036117 1 Vr JAU/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

Quanto à materialidade delitiva, tenho que ela não se apresenta de modo a permitir o decreto condenatório.


Como se nota, os laudos indiretos meramente homologam o Auto de Infração.


Ora, não se pode presumir a origem estrangeira das mercadorias apenas porque não é possível determinar o país de procedência dos bens em questão. Conforme já decido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, para formular denúncia válida pelo crime de contrabando na hipótese de apreensão de máquina "caça-níquel", o Ministério Público deve apontar indícios concretos acerca da origem estrangeira dos equipamentos eletrônicos, bem como da ciência do acusado no tocante à introdução clandestina do produto no país, sendo insuficiente, para tanto, a mera presunção nesse sentido tão somente por ser proprietário do estabelecimento comercial onde as máquinas foram apreendidas.

Neste sentido:
"PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME DE CONTRABANDO. MÁQUINAS CAÇA-NÍQUEIS. NÃO COMPROVAÇÃO DA CIÊNCIA DO RÉU QUANTO À INTRODUÇÃO CLANDESTINA DO EQUIPAMENTO NO PAÍS. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ.
- É firme neste Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é insuficiente a mera presunção da ciência do proprietário do estabelecimento, sobre a origem estrangeira dos equipamentos eletrônicos introduzidos clandestinamente no país, para justificar a deflagração de ação penal por crime doloso de descaminho ou contrabando. Precedentes.
- A inversão das conclusões a que chegaram as instâncias ordinárias, no sentido de se aferir o dolo na conduta do agente, encontra óbice no enunciado n. 7 da Súmula do STJ. Agravo regimental desprovido "
(AGRESP - AGRESP 201001750871-AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 1213493- Relator(a) ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) - STJ- SEXTA TURMA-DJE- DATA:18/11/2014)
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE CONTRABANDO. APREENSÃO DE MÁQUINAS "CAÇA-NÍQUEIS" EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ERRO DE TIPO. PREMATURA COISA JULGADA MATERIAL ANTES DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DA ORIGEM ESTRANGEIRA DA MERCADORIA E DA CIÊNCIA DA RÉ QUANTO À INTRODUÇÃO CLANDESTINA DO EQUIPAMENTO NO PAÍS. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS SUFICIENTES DA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ART. 334, § 1º, ALÍNEA C, DO CÓDIGO PENAL. CARACTERIZAÇÃO, EM PRINCÍPIO, DE CONTRAVENÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. Conforme já decidido pela Quinta Turma do STJ, para formular denúncia válida pelo crime de contrabando na hipótese de apreensão de máquina "caça-níquel", o Ministério Público deve apontar indícios concretos acerca da origem estrangeira dos equipamentos eletrônicos, bem como da ciência do acusado no tocante à introdução clandestina do produto no país, sendo insuficiente, para tanto, a mera presunção nesse sentido tão somente por ser o proprietário do estabelecimento comercial onde as máquinas foram apreendidas. (grifei)
2. Agravo regimental a que se nega provimento. "Não tem competência a Justiça Federal para apuração de infração penal consistente na posse de máquinas eletrônicas programadas para a exploração de jogos de azar quando, conforme as instâncias ordinárias, não há comprovação da origem estrangeira dos equipamentos nem da ciência do réu quanto à introdução clandestina e à existência de componentes estrangeiros inseridos nas máquinas eletrônicas. Isso porque, conforme entendimento da Terceira Seção do STJ, a existência de um dispositivo eletrônico de origem estrangeira na máquina caça-níquel não tem o condão de caracterizar o delito de contrabando ou descaminho, tratando-se, em princípio, apenas da contravenção penal de exploração de jogo de azar, prevista no artigo 50 do Decreto-lei 3.688/1941".
(AARESP 201001493245, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:02/05/2014 ..DTPB:.)

Destarte, ainda que assim não fosse, tendo-se em conta a orientação jurisprudencial citada e a inconsistência do laudo, como se pode afirmar que os réus conheciam a origem estrangeira dos equipamentos se sequer a perícia pôde fazê-lo? Não se há de afirmar, portanto, com a segurança necessária para a condenação que os réus conhecessem essa circunstância fática.


Sendo essa a situação versada na espécie, mister a reforma da r. sentença para que os réus sejam absolvidos do delito tipificado no artigo 318 do Código Penal.


WILSON ZAUHY
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000909-19.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.000909-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : DANILO SERGIO GRILLO e outro.
ADVOGADO : SP024974 ADELINO MORELLI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
ACUSADO(A) : PEDRO DE ALCANTARA LEITAO RODRIGUES (desmembramento)
: LUIZ EUGENIO COSTA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: JOAO LUIZ AURELIO CALADO
APELANTE : RICHARD MONTOVANELLI
ADVOGADO : SP125526 DANIELA APARECIDA RODRIGUEIRO P FONSECA
ACUSADO(A) : WILLIAM DE LIMA (desmembramento)
: SERGIO ROBERTO DEJUSTE (desmembramento)
: MILTON SERGIO GIACHINI (desmembramento)
: MARCOS DANIEL DIAS FILHO (desmembramento)
: SANDRO SAO JOSE (desmembramento)
: ELIZEU DORIVAL BARRO JUNIOR (desmembramento)
: MARCEL JOSE STABELINI (desmembramento)
: LUIZ FABIANO TEIXEIRA (desmembramento)
: RONALDO JOSE RODRIGUES (desmembramento)
: ALTAIR OLIVEIRA FULGENCIO (desmembramento)
: IZAC PAVANI (desmembramento)
: HERMINIO MASSARO JUNIOR (desmembramento)
: JOSE EDUARDO FERNANDES MONTEIRO (desmembramento)
: SAMUEL SANTOS MARTINS (desmembramento)
: CLAUDIO TITO DOS SANTOS (desmembramento)
: NYDER DANIEL GARCIA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ARNALDO KINOTE JUNIOR (desmembramento)
: LUCAS IORIO (desmembramento)
: DENIZAR RIVAIL LIZIERO (desmembramento)
: RODOLFO APARECIDO VECHI (desmembramento)
: MARCO ANTONIO DE ABREU SANTO (desmembramento)
: VLADIMIR IVANOVAS (desmembramento)
: GUILHERME CASONE DA SILVA (desmembramento)
: ANDRE MURILO DIAS (desmembramento)
ACUSADO(A) : JOAO GERALDO DE ALMEIDA FRANCA (desmembramento)
ADVOGADO : SP011896 ADIB GERALDO JABUR
ACUSADO(A) : GISLAINE APARECIDA ECLES DE SOUZA (desmembramento)
: SILAS FRANCISCO ASSINI JUNIOR (desmembramento)
: ANA PAULA GUIMARAES MAURICIO (desmembramento)
: DANILO TOMASELLA (desmembramento)
: SERGIO DE ARAUJO MARTINS (desmembramento)
: ADILSON FRANCA (desmembramento)
: CHRISTIAN ANDERSON WALTER (desmembramento)
: GILMAR JOSE STABELINI (desmembramento)
: FABIO GOUVEIA SARTORI (desmembramento)
: REGINALDO SILVA MANGUEIRA (desmembramento)
: RITA DE CASSIA STABELINI FRANCA (desmembramento)
: CRISTINA FABIANA LAZARO DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ROBERTO DE MELLO ANNIBAL (desmembramento)
: ANTONIO CARLOS PICCINO FILHO (desmembramento)
: LUIZ FERNANDO GONCALVES FRAGA (desmembramento)
: ALEXANDRE ROSSI (desmembramento)
: FABIO AUGUSTO CASEMIRO DA ROCHA (desmembramento)
: DAVI SANTOS MARTINS (desmembramento)
: ANTONIO ROBERTO FRANCA (desmembramento)
: GUSTAVO ZANATTO CRESPILHO (desmembramento)
: CARLLO BENITO SANTEZZI BERTOTELLI ANDREUZA (desmembramento)
: MARCO PASCHOAL CARRAZZONE (desmembramento)
: ANTONIO APARECIDO SERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009091920114036117 1 Vr JAU/SP

RELATÓRIO

Exmo. Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):

Trata-se de Apelações Criminais interpostas por DANILO SÉRGIO GRILLO e RICHARD MONTOVANELLI contra sentença (fls. 251/274-v) proferida pelo Juízo da 1º Vara Criminal Federal de Jaú/SP, que julgou parcialmente procedente o pedido e:

- condenou DANILO SÉRGIO GRILLO como incurso na conduta descrita no artigo 318 do Código Penal, à pena de 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída pelas penas de prestação pecuniária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo da condenação, a ser discriminada pelo Juízo da Execução;

- condenou RICHARD MANTOVANELLI como incurso na conduta descrita no artigo 318 do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo, substituída pelas penas de prestação pecuniária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo da condenação, a ser discriminada pelo Juízo da Execução;

- absolveu JOÃO LUIZ AURÉLIO CALADO, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.

Consta da denúncia, no tocante aos réus apelantes processados na presente ação, fruto do desmembramento da ação penal 2007.61.17.002322-5 (mídia fls. 03 - fls. 168/298 dos autos principais):

(...)
1 - Breve Histórico:
No ano de 2006, diversos estabelecimentos comerciais de Jaú e região, mormente bares, deram início à exploração das chamadas máquinas " caça -níqueis", atividade que tipifica, em tese, contravenção penal de jogo de azar (artigo 50, do Decreto-Lei n.° 3.688/1941), vez que o ganho depende principal ou exclusivamente da sorte.
A Procuradoria da República no Município de Jaú, em razão de oficio enviado pela Câmara de Vereadores, instaurou, no mês de novembro de 2006, os autos de n.° 1.34.022.000097/2006-62, para apurar e acompanhar a repressão a essas máquinas. Fora expedida recomendação à Prefeitura de Jaú para que esta cassasse os alvarás dos bares que mantivessem os chamados "caça -níqueis", bem como oficiado ao Parquet Estadual, solicitando-se informações das providências adotadas, porque, pelo menos em princípio, a repressão à exploração das máquinas constitui atividade sujeita à competência estadual.
Nesse ínterim, é imperioso ressaltar que soem tais máquinas serem montadas com peças ou componentes eletrônicos estrangeiros, sendo que a sua manutenção, no exercício de atividade comercial, pode consistir em contrabando. Seja como for, em um primeiro momento, a contravenção penal é praticamente indiscutível, com o que a Polícia Civil, até por uma questão de estrutura, deveria agir primeiro e, no caso da constatação de peças estrangeiras na perícia, o que geralmente ou quase sempre ocorre, é que haveria o desmembramento e remessa à esfera federal. Em resposta datada de 26 de março de 2007, parquet. Estadual informou que havia requisitado a abertura de inquérito policial em razão da dispersão das referidas máquinas.
Nessa época, representantes da Polícia Militar compareceram na Procuradoria da República para noticiar a disseminação das máquinas, bem como para informar a existência de um possível escritório gerenciador das atividades relativas a elas, oportunidade em que se solicitou a referido órgão que fizesse o levantamento dos estabelecimentos de Jaú e região em que havia "caça -níqueis". De posse das referidas informações, fora realizado pedido de busca e apreensão, inicialmente relativo à Jaú, e, em operação conjunta da Polícia Federal, Militar e Receita Federal, realizada em 15 de maio de 2007, foram apreendidos cerca de 230 (duzentos e trinta) "caça -níqueis", tão-só neste Município.
Na operação, realizou-se busca em um imóvel localizado na Rua Orozimbo Loureiro, ri.° 77 (ou 77-A), Vila Hilst, Jaú/SP, bem como na sala 74, 7° andar, do Edifício Centro Empresarial, situado na Rua Lourenço Prado, n.° 218, também nesta cidade, locais apontados pelos representantes da Polícia Militar local como sendo um escritório de possível gerenciamento das atividades relativas a " caça -níqueis". Neste último local, foram apreendidos 03 (três) gabinetes de computadores, R$ 16.927,00 (dezesseis mil, novecentos e vinte e sete reais) em espécie, 50 (cinqüenta) cheques de bancos e valores diversos, um revólver calibre 38, n.° CL 66953, Taurus, com 04 (quatro) cartuchos íntegros, além de vários documentos.
Esta primeira operação deu origem ao inquérito policial de n.° 7- 0258/2007 (2007.61.17.002322-5), tanto em razão da apreensão realizada no escritório, bem como em razão da apreensão de 155 (cento e cinquenta e cinco) máquinas "caça -níqueis", realizada em barracão situado na Rua Iara, n 236 ou 250, Jardim Estádio.
Novas diligências foram feitas, notadamente pelos Comandos da Polícia Militar da região de Jaú/SP, e outras buscas e apreensões foram realizadas, abrangendo os Municípios de Bariri, Barra Bonita, Bocaina, Itapuí, Santa Maria da Serra, Igaraçu do Tietê e ainda Jaú, culminando na apreensão de várias máquinas. Essas novas operações foram realizadas nas datas de 22 de agosto, 28 de agosto e 05 de setembro de 2007.
Em outubro de 2007, adveio informação transmitida pelo Comando da Polícia Militar local no sentido de que o referido escritório ou até mesmo um outro escritório de gerenciamento das atividades relativas a "caça -níqueis"" estaria funcionando na Rua Carlos Eduardo Gomes, 236, em Jaú, o qual seria comandado por um indivíduo chamado Sérgio, de Rio Claro/SP.
Com o objetivo de desmantelar a organização criminosa de distribuição de máquinas, fora realizado pedido de busca e apreensão, agora nesse novo endereço referido, cujo morador era Sérgio Roberto Dejuste, ocasião em que houve a apreensão de R$ 4.365,00 (quatro mil, trezentos e sessenta e cinco reais) em moeda corrente nacional, cheques, blocos de recibos, controles de arrecadação preenchidos com numeração de máquinas e com valores diversos, dentre outros documentos, tudo correlato à prática ilícita em apuração, além de uma arma com a numeração raspada.
Sucederam-se diversas apreensões de "caça -níqueis", mormente realizadas pela Polícia Militar, bem como o Parquet Federal ofereceu várias denúncias, principalmente em face de donos de bares, com os quais as máquinas haviam sido apreendidas, pela prática, em tese, do delito de contrabando, previsto no artigo 334, § 1°, "e", do Código Penal; no entanto, mesmo após as inúmeras ações executadas ao combate de tal prática delituosa, a exploração das máquinas continuou se perpetrando, em diversos bares e outros estabelecimentos desse jaez, além de residências.
Impende dizer que o Ministério Público Federal, para a melhor investigação dos fatos, requereu a interceptação telefônica dos envolvidos.
Paralelamente, teve curso no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) - Núcleo de Bauru, órgão integrante do Ministério Público Estadual de São Paulo, procedimentos investigatórios criminais relativos à disseminação das máquinas "caça -níqueis" em Jaú e região. Em um deles, também houve interceptação telefônica, como será visto no decorrer.
Por derradeiro, impende dizer que se concluiu que, por trás do reiterado desrespeito à lei, havia pessoas responsáveis pelo gerenciamento e pela distribuição dos " caça -níqueis" na região, bem como a participação de autoridades públicas que garantiam a impunidade e a perpetuação da prática delituosa, atuando, mormente, como informantes de operações policiais.
II - Da Interceptação (autos n.° 2008.61.17.000342-5):
Em 08.02.2008, o Parquet Federal ingressou com pedido de interceptação das comunicações telefônicas de Sérgio Roberto Dejuste e de José Marcelino Teodoro Neto.
Os indícios de envolvimento de Sérgio Roberto Dejuste no sentido de ser um dos principais responsáveis pela distribuição das máquinas e pelo gerenciamento da atividade ilícita na região eram evidentes, urna vez que já havia sido denunciado nos autos n° 2007.61.17.003762-5 por manter em depósito 118 (cento e dezoito) máquinas " caça -níqueis", bem como em razão de ter sido realizada medida de busca e apreensão em sua residência, logrando-se encontrar documentos correlates à exploração das referidas máquinas. Além disso, diversas informações transmitidas à Procuradoria da República de Jaú pela Polícia Militar local e por proprietários de estabelecimentos comerciais que tiveram máquinas apreendidas convergiam para o nome "Sérgio", de Rio Claro/SP, como um dos responsáveis pela distribuição e comando da atividade. Já quanto a José Marcelino Teodoro Neto, as suspeitas foram levantadas em razão do Ofício n.° 27BPMI-042/20/08, encaminhado à Procuradoria da República de Jaú. No entanto, no decorrer da execução da medida de interceptação, os indícios de sua participação na atividade criminosa não se confirmaram. Em 13.02.2008, a medida fora autorizada pela Autoridade Judiciária nos terminais indicados pelo Parquet Federal. No Relatório de Inteligência Policial n.° 01/2008, elaborado pela Delegacia da Polícia Federal em Bauru, haja vista divergências quanto aos números de terminais indicados nas denúncias, bem como ausência de senhas que possibilitassem bilhetagem dos números e realização de pesquisas através de nome e CPF, a Autoridade Policial não encontrou indícios de envolvimento dos investigados na prática de crimes envolvendo máquinas.
Solicitou-se, então, ordem judicial para suprir as dificuldades operacionais encontradas, bem como, em análise das novas informações contidas no bojo dos autos n.° 2008.61.17.000178-7, requereu-se o aditamento para a medida de interceptação abranger também José Eduardo Fernandes Monteiro, César Augusto Raiz Galves e Milton Sérgio Ciachini, porquanto, nos referidos autos, a maioria dos proprietários de bares que tiveram máquinas "caça -níqueis" apreendidas indicou como fornecedores das máquinas, além de Sérgio, as referidas pessoas.
Deferido o aditamento à medida inicial, o segundo Relatório de Inteligência Policial (n.° 02/2008) apontou o envolvimento de Sérgio Roberto Dejuste na exploração de máquinas "caça -níqueis", inclusive, com possível colaboração de policiais, e novamente relatou dificuldades operacionais no monitoramento das linhas. Requereu-se a inclusão nas investigações de Herminio Massaro Júnior e Altair Oliveira Fulgêncio em razão de ambos terem sido mencionados por Sérgio Roberto Dejuste como responsáveis pelas 118 (cento e dezoito) máquinas apreendidas na chácara "Nossa Senhora Aparecida" (autos n.°. 2007.61.17.003762-5), bem como em razão do envolvimento deles com as 155 (cento e cinquenta e cinco) máquinas, que foram apreendidas no interior de um barracão. em Jaú/SP, na operação realizada em maio de 2007.
Já no terceiro Relatório de Inteligência Policial (n.° 03/2008), a Autoridade Policial relatou que o monitoramento das linhas telefônicas indicou efetivo envolvimento de Sérgio Roberto Dejuste, José Eduardo Monteiro e de Altair Fulgêncio na atividade ilícita em análise, e solicitou autorização para prorrogação da medida.
Nesta época, o investigador de polícia Antonio Carlos Pavini, em depoimento na Procuradoria da República, no bojo do autos n.° 1.34.022.000097/2006-62, já referidos, noticiou a possível participação do Delegado Seccional de Polícia Civil de Jaú, Antonio Carlos Piccino Filho, do investigador João Luiz Aurélio Calado e do advogado Pedro de Alcântara Leitão Rodrigues, nos fatos em análise, conforme será melhor demonstrado no decorrer. Desta feita, o Parquet Federal requereu a inclusão das referidas pessoas na medida de interceptação, tendo sido deferida somente em relação a Pedro de Alcântara Leitão Rodrigues. Impende ressaltar que também foram citados, na referida oitiva, Alexandre Rossi, Fábio Augusto Casemiro da Rocha e Roberto de Mello Annibal.
No Relatório de Inteligência Policial n.° 04/2008, após intenso trabalho de monitoramento efetivado, a Autoridade Policial destacou a existência de 03 (três) grupos, aparentemente independentes, atuantes na exploração de máquinas " caça -níqueis" na região (Grupo 01: Sérgio Roberto Dejuste, Milton Sérgio Giachini, Samuel Santos Martins, Hermínio Massaro Júnior e André; Grupo 02: José Eduardo Monteiro, Flávia e Júnior do Bilhar; Grupo 03: Caril° Benito Santezzi Bertotelli Andreuzza -"Benito", Elizeu Dorival Barros Júnior - "Juninho", Ronaldo, Fabiano e Altair Oliveira Fulgência).
Houve nova prorrogação da medida e, à vista de novo pedido do Parquet Federal, a Justiça incluiu o Delegado Antonio Carlos Piccino Filho, bem como o investigador João Luiz Aurélio Calado no monitoramento. Em relação a estas pessoas, a medida não obteve êxito.
Impende ressaltar que, neste interregno, fora realizada busca e apreensão em local captado durante o monitoramento das conversações, na cidade de Bauru/SP, logrando-se apreender material relacionado à exploração de máquinas (fls. 590/601).
Às fls. 628/709, fora juntado nos autos, pelo Parquet Federal, cópia do relatório de monitoramento efetivado no curso de procedimento investigatório criminal instaurado pelo GAECO - Núcleo Bauru, que indicava, inclusive, a possível participação de policias civis como informantes acerca de operações de apreensão de "caça -níqueis". Com base no relatório, requereu-se a inclusão de Vladimir Ivanovas, bem como os policiais civis João Geraldo de Almeida França e Richard Montovanelli, que não chegou a ser concretizada. Todavia, foram verificadas menções a Vladimir e a João em áudios interceptados anteriormente.
No quinto Relatório de Inteligência Policial (n.° 05/2008) houve a colheita de vasto material, envolvendo além das pessoas indicadas pelo Parquet, outras que, no decorrer da medida, revelaram-se como atuantes na exploração de máquinas. Neste, bem como no sexto Relatórios, além da transcrição de conversas, sugeriu-se o encerramento do monitoramento.
Já no Relatório Preliminar (final), bem como em seu adendo, a Autoridade Policial fez um relato sobre a estruturação dos grupos empenhados na exploração de máquinas "caça -níqueis" na região, os quais foram identificados através do monitoramento, indicando a existência de 04 (quatro) grupos criminosos voltados à prática estável de exploração de máquinas " caça -níqueis" e com divisão de tarefas entre seus integrantes, como será demonstrado no decorrer.
O Relatório apontou, ademais, fortes indícios de envolvimento de servidores públicos, supostamente policiais, que prestam serviço às organizações criminosas, repassando informações no intuito de garantir a ocultação dos equipamentos frente à repressão policial.
Ressalte-se que, ante o grande número de envolvidos na atividade delituosa e a forma de atuação velada das organizações, o monitoramento telefônico mostrou-se como relevante instrumento possível e eficaz de elucidação dos crimes que serão narrados, além de ser o mais seguro.
Será realizada a análise das conclusões do relatório final, no item VI.
(...)
V. II - Da interceptação realizada no telefone celular de Vladimir Ivanovas (PIC n. 05/08 ou autos n. 240/08)
O GAECO - Núcleo Bauru, auxiliado pela Polícia Militar, bem como autorizado pela 2ª Vara Criminal de jaú, realizou medida de interceptação telefônica no celular de Vladimir Ivanovas.
Referida interceptação evidenciou que Vladimir, vulgo "Vlad". Integra uma organização criminosa de exploração de máquinas caça níqueis na região de jaú, com autuação importante na quadrilha, contudo, inclusive, com o auxílio dos policiais civis João Geraldo de Almeida França, Richard Montovanelli e Danilo Sérgio Grilo.
(...)
Nos autos da interceptação telefônica levada a efeito pela Polícia Federal (fls. 865/867), também restara apurado que Vladimir é, além de funcionário, informante do grupo encabeçado por Hermínio Massaro Junior.
(...)
O monitoramento da linha celular de "Vlad" também evidenciou o envolvimento dos policiais no esquema delituoso, em especial, de João Geraldo de Almeida França, Richard Montovanelli e Danilo Sérgio Grillo.
(...)
Em diálogos datados de 28 de maio de 2008, Vladimir fala com um indivíduo não identificado, com Hermínio e William, sobre uma operação que as policias de Jaú e Bauru estariam realizando na cidade. "Vlad" diz que já havia recebido informação sobre a operação, sé que eles adiantaram um dia. Hermínio reclama que poderiam ter sido avisados antes.
Neste mesmo dia, "Vlad" telefona para o investigador de polícia Richard Montovanelli e marca encontro com ele, para tomar conhecimento sobre os detalhes da aludida operação. Em seguida, Vladimir fala com hermínio e diz que falou com "Gordo" (apelido de Richard" e que vai a tarde falar com ele para saber o que está acontecendo, deixando claro que o investigador iria informa-lo sobre as diligências da polícia. Depois, Vlad fala também com Gustavo sobre a mesma operação policial.
Em 17 de abril de 2008, VLADIMIR conversou com o advogado Gustavo Crespilho, o qual disse que havia enviado "as formigas" para o investigador de polícia Richard Montovanelli que estaria de plantão. Segue a transcrição do diálogo:
Em 17 de abril de 2008, às 22:52:23 - Vlad utilizando o telefone móvel n. (14) 9777-0719, conversa com GUSTAVO CRESPILHO que está utilizando a linha móvel (14)9742-4929, cadastrada em seu nome. Este diz que mandou um lanche para o investigador RICHARD, no plantão policial:
(...)
Em seguida, Vladimir telefonou para Richard e perguntou acerca do "lanche"enviado por Gustavo, tendo Richard confirmado o recebimento.
Reforça-se, assim, a troca existente de favores entre Richard, Vladimir e Gustavo, sendo o "lanche" referido, certamente, pagamento de propina por alguma informação prestada ou um "agrado" para que o mesmo mantivesse contato com a organização em caso de possível realização de operação para apreensão de máquinas.
Verificou-se que Vladimir também manteve contatos com outro policial civil, Danilo Sérgio Grillo, que, tal como João Geraldo de Almeida França e Richard Montovanelli, atua como informante de operações policiais.
Em 19 de agosto de 2008, após passar nas proximidades de um local que está ocorrendo uma operação policial de apreensão de máquinas e verificar que Danilo estava participando, "Vlad" telefonou-lhe e informou que o ponto pertencia ao seu grupo, mas que esqueceu de avisá-lo.
Em 19 de agosto de 2008, às 16:22:01 - VLAD conversa com DANILO, policial civil, que está em frente à residência que será realizada a operação: está utilizando a linha móvel (14) 9713-1271, cadastrada em nome de DANILO SÉRGIO GRILLO, constando endereço a Rua Marechal Deodoro n. 664, Vila nova, Jaú/SP, VLAD diz que o local é explorado por ele.
(...)
Em seguida, "Vlad" telefonou para outro integrante da quadrilha (William de Lima) e disse que era Danilo que estava no local e que deveria orientar a comerciante que teria seu estabelecimento fiscalizado a conversar direto com Danilo.
Em 19 de agosto de 2008, às 16:23:46 - VLAD conversa com WILLIAM vulgo (PRETO) que está utilizando a linha móvel (14) 9679-7991, cadastrada em seu nome, VLAD pede para PRETO ligar para uma mulher e dizer para ela esconder.
(...)

Restaram denunciados pelo Ministério Público Federal em conjunto com o Ministério Público do Estado de São Paulo neste feito:

a) DANILO SÉRGIO GRILLO, qualificado nos autos, nascido aos 02/12/1952, como incurso no artigo 288 do CP; artigo 317, §1º c.c artigo 71 do CP; artigos 318 e 319 c.c artigo 71 do CP, em concurso formal, e todos em concurso material.

b) JOÃO LUIZ AURÉLIO CALADO (absolvido), qualificado nos autos, nascido aos 09/11/1967, como incurso no artigo 288 do CP; artigo 317, §1º c.c artigo 71 do CP; artigos 318 e 319 c.c artigo 71 do CP, em concurso formal, e todos em concurso material.

c) JOÃO GERALDO DE ALMEIDA FRANÇA, qualificado nos autos, nascido aos 08/11/1963, como incurso no artigo 288 do CP; artigo 317, §1º c.c artigo 71 do CP; artigos 318 e 319 c.c artigo 71 do CP, em concurso formal, e todos em concurso material.

d) RICHARD MONTOVANELLI, qualificado nos autos, nascido aos 20/01/1961, como incurso no artigo 288 do CP; artigo 317, §1º c.c artigo 71 do CP; artigos 318 e 319 c.c artigo 71 do CP, em concurso formal, e todos em concurso material.

A ação penal originária nº 2007.61.17.002322-5 foi proposta em face de 52 denunciados.

Em 24/03/2009, a denúncia foi recebida em relação aos acusados não servidores públicos, com exceção da imputação da contravenção do artigo 50 do Decreto-lei 3.668/41 (fls. 299/335 dos autos principais n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia de fls. 03).

Em relação aos denunciados e aos demais servidores públicos, a denúncia foi recebida em 06/05/2009 (fls. 2.598/2.599 dos autos originais n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia à fl. 03 - vol. 10).

Posteriormente, nos autos do HC 0025563-59.2009.403.0000 a 1ª Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região concedeu parcialmente a ordem para anular os atos processuais praticados na ação penal originária, a partir da defesa preliminar do artigo 396-A do Código de Processo Penal, determinando-se sua renovação, fase processual também concedida aos servidores públicos (mídia digital de fls. 03 - volume 17 - fls. 4.720/4.737).

Abriu-se novo prazo para a apresentação de defesa prévia a todos os 52 acusados (mídia digital de fls. 03 - volume 17 - fls. 4.708)

Procedeu o Juízo à nova deliberação sobre o recebimento da denúncia, reconsiderando a decisão de fls. 299/335 dos autos principais n. 0002322-09.2007.403.6117, determinando, ainda, que o desmembramento do feito seria processado somente após a oitiva das testemunhas arroladas pela acusação, exceto em relação ao acusado Denizar Rivail Liziero, cujo desmembramento restou realizado de imediato em virtude da instauração de incidente de insanidade mental (mídia de fls. 03 - volume 19 - fls. 5.407/5.419 dos autos principais n. 0002322-09.2007.403.6117).

Às fls. 6.144/6.146 (mídia de fls. 03 - n. 0002322-09.2007.403.6117), determinou-se, novamente, o desmembramento dos autos originais (2007.61.17.002322-5) em doze processos, incluindo o presente.

À fl. 236, foi determinado o desmembramento deste feito em relação ao codenunciado JOÃO GERALDO DE ALMEIDA FRANÇA.

A sentença parcialmente procedente foi publicada em 29/09/2011 (fl. 275), restando condenados pela prática do delito de facilitação de contrabando os corréus DANILO SÉRGIO GRILLO e RICHARD MONTOVANELLI, absolvidos das demais imputações, assim como o codenunciado JOÃO LUIZ AURÉLIO CALADO, este absolvido de todas as imputações, com fulcro no artigo 386, VII, do Código Penal.

Em razões de fls. 288/303, a defesa de DANILO SÉRGIO GRILLO pretende a absolvição, alegando:

a) Infringência ao artigo 5º da Lei n. 9.296/96 diante da renovação, por treze vezes, da interceptação telefônica sem fundamentação consistente;

b) Insuficiência de provas para condenação e atipicidade da conduta;

c) Impossibilidade do réu DANILO praticar o delito previsto no artigo 318 do Código Penal, pois o crime em tela somente pode ser cometido por funcionário público que tenha o dever funcional de coibir o contrabando;

Por sua vez, a defesa de RICHARD MONTOVANELLI, às fls. 304/311, aduz, preliminarmente, a nulidade por ausência de citação e, no mérito, pugna pela absolvição, alegando, em síntese:

a) a fragilidade do conjunto probatório;

b) impossibilidade de subsumir a conduta do acusado ao tipo previsto do artigo 318 do Código Penal, pois não se pode exigir que a polícia civil desempenhe funções alfandegárias;

c) atipicidade do delito, pois "o acusado não poderia se ocultar ou fazer a mencionada "tábua rasa" a uma prática delitiva posto que a mesma não se opera, por absoluta impropriedade do meio, o plantão policial".

Contrarrazões ministeriais às fls. 316/331.

A Procuradoria Regional da República, em parecer de fls. 315/328, da lavra da Dra. Rosane Cima Campiotto, opinou pelo desprovimento das apelações das defesas.

Os autos baixaram em diligência para a juntada da cópia digitalizada dos áudios obtidos nos autos de Interceptação Telefônica n. 0000956.61.2009.403.6117, o que foi feito às fls. 361/363.

É o relatório.

Ao Revisor nos termos regimentais.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 20/07/2018 17:05:57



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000909-19.2011.4.03.6117/SP
2011.61.17.000909-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : DANILO SERGIO GRILLO e outro.
ADVOGADO : SP024974 ADELINO MORELLI e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
ACUSADO(A) : PEDRO DE ALCANTARA LEITAO RODRIGUES (desmembramento)
: LUIZ EUGENIO COSTA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: JOAO LUIZ AURELIO CALADO
APELANTE : RICHARD MONTOVANELLI
ADVOGADO : SP125526 DANIELA APARECIDA RODRIGUEIRO P FONSECA
ACUSADO(A) : WILLIAM DE LIMA (desmembramento)
: SERGIO ROBERTO DEJUSTE (desmembramento)
: MILTON SERGIO GIACHINI (desmembramento)
: MARCOS DANIEL DIAS FILHO (desmembramento)
: SANDRO SAO JOSE (desmembramento)
: ELIZEU DORIVAL BARRO JUNIOR (desmembramento)
: MARCEL JOSE STABELINI (desmembramento)
: LUIZ FABIANO TEIXEIRA (desmembramento)
: RONALDO JOSE RODRIGUES (desmembramento)
: ALTAIR OLIVEIRA FULGENCIO (desmembramento)
: IZAC PAVANI (desmembramento)
: HERMINIO MASSARO JUNIOR (desmembramento)
: JOSE EDUARDO FERNANDES MONTEIRO (desmembramento)
: SAMUEL SANTOS MARTINS (desmembramento)
: CLAUDIO TITO DOS SANTOS (desmembramento)
: NYDER DANIEL GARCIA DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ARNALDO KINOTE JUNIOR (desmembramento)
: LUCAS IORIO (desmembramento)
: DENIZAR RIVAIL LIZIERO (desmembramento)
: RODOLFO APARECIDO VECHI (desmembramento)
: MARCO ANTONIO DE ABREU SANTO (desmembramento)
: VLADIMIR IVANOVAS (desmembramento)
: GUILHERME CASONE DA SILVA (desmembramento)
: ANDRE MURILO DIAS (desmembramento)
ACUSADO(A) : JOAO GERALDO DE ALMEIDA FRANCA (desmembramento)
ADVOGADO : SP011896 ADIB GERALDO JABUR
ACUSADO(A) : GISLAINE APARECIDA ECLES DE SOUZA (desmembramento)
: SILAS FRANCISCO ASSINI JUNIOR (desmembramento)
: ANA PAULA GUIMARAES MAURICIO (desmembramento)
: DANILO TOMASELLA (desmembramento)
: SERGIO DE ARAUJO MARTINS (desmembramento)
: ADILSON FRANCA (desmembramento)
: CHRISTIAN ANDERSON WALTER (desmembramento)
: GILMAR JOSE STABELINI (desmembramento)
: FABIO GOUVEIA SARTORI (desmembramento)
: REGINALDO SILVA MANGUEIRA (desmembramento)
: RITA DE CASSIA STABELINI FRANCA (desmembramento)
: CRISTINA FABIANA LAZARO DE OLIVEIRA (desmembramento)
: ROBERTO DE MELLO ANNIBAL (desmembramento)
: ANTONIO CARLOS PICCINO FILHO (desmembramento)
: LUIZ FERNANDO GONCALVES FRAGA (desmembramento)
: ALEXANDRE ROSSI (desmembramento)
: FABIO AUGUSTO CASEMIRO DA ROCHA (desmembramento)
: DAVI SANTOS MARTINS (desmembramento)
: ANTONIO ROBERTO FRANCA (desmembramento)
: GUSTAVO ZANATTO CRESPILHO (desmembramento)
: CARLLO BENITO SANTEZZI BERTOTELLI ANDREUZA (desmembramento)
: MARCO PASCHOAL CARRAZZONE (desmembramento)
: ANTONIO APARECIDO SERRA (desmembramento)
No. ORIG. : 00009091920114036117 1 Vr JAU/SP

VOTO

O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

Considerações inaugurais: a investigação, levada a cabo na fase extraprocessual, detectou a existência de agremiações criminosas diversas, atuantes na região de Jaú/SP, e Rio Claro/SP, especializadas no contrabando de peças eletrônicas de máquinas caça níqueis, as quais se encontravam disseminadas em estabelecimentos comerciais da aludida região do interior do Estado de São Paulo, também, para a exploração do jogo de azar, contravenção penal sob a competência do Juízo Estadual.

As investigações também elucidaram a participação de autoridades públicas que garantiam a impunidade e a perpetuação da prática delituosa, atuando, mormente, como informantes de operações policiais, como no caso dos ora denunciados, policiais civis.

Cabe ainda pontuar, antes de adentrar propriamente na matéria recursal, e até para evitar repetições desnecessárias, que a interceptação telefônica, prevista constitucional e legalmente, foi determinada por ordem judicial, obedecendo aos trâmites da Lei nº 9.296/96 (autos nº 2008.61.17.000342-5), sendo meio de prova que não pode, pois, ser descartado do nosso ordenamento jurídico, ainda mais quando, in casu, o monitoramento telefônico conduziu à produção de outros elementos de prova ou fizeram referência a eventos ocorridos e demonstrados nos autos, não restando insulada no acervo probatório.

Nessa ordem de ideias, pontifica José Paulo Baltazar Junior: "Tendo em vista a adoção do princípio do livre convencimento motivado, não se pode qualificar, a priori, a prova decorrente da interceptação telefônica como secundária, devendo ser considerada no conjunto com as demais (...)" (in "Crimes Federais", 8ª ed., 2012. Ed. Livraria do Advogado, p. 674).

Feitas essas colocações inaugurais, passo ao exame dos recursos das Defesas.

Das preliminares

1.Nulidade decorrente da inobservância do artigo 5º da Lei n. 9.2196/96

Alega a defesa de DANILO SÉRGIO GRILLO que houve infringência ao artigo 5º da Lei n. 9.296/96 ao serem renovadas as interceptação telefônicas por treze vezes consecutivas sem fundamentação consiste.

Não lhe assiste razão.

In casu, a interceptação telefônica, autos n. 0000956.61.2009.403.6117, cuja cópia digitalizada encontra-se na mídia acostada à fl. 363 dos presentes autos, foi deferida e prorrogada por autoridade judicial competente, por meio de decisões devidamente motivadas, o que torna a prova legítima.

Ademais, as interceptações telefônicas não embasaram exclusivamente o decreto condenatório, havendo nos autos outros elementos probatórios da prática da conduta, que serão apreciados por ocasião da análise do mérito.

Nesta esteira, observo, ainda, que a Lei n.º 9.296/96 não delimita prazo máximo para a vigência da interceptação.

No caso concreto, considerando a complexidade da prática delitiva e o número de pessoas envolvidas (52 denunciados), tem-se que a interceptação perdurou pelo tempo necessário para a elucidação da trama criminosa em toda sua extensão, inexistindo qualquer vício.

Note-se que, conquanto o artigo 5° da Lei n° 9.296/96 tenha previsto que a interceptação de comunicação telefônica tem prazo de 15 (quinze) dias, renovável pelo mesmo período, o que, frise-se, foi rigorosamente cumprido neste caso (fls. 26, 43, 54, 78, 85, 100, 105, 112, 139, 209/210 e 224/225 dos autos de interceptação telefônica n. 0000956.61.2009.403.6117 - mídia fl. 363), a jurisprudência das Cortes Superiores é pacífica no sentido da possibilidade das prorrogações, mediante fundamentação adequada, por quantas vezes necessárias à investigação, comprovada a indispensabilidade do referido meio de prova (na dicção do próprio artigo 5º da Lei nº 9.296/96), hipótese dos autos, o que afasta a alegação de nulidade por excesso de prazo e ausência de razoabilidade. Confiram-se:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CONHECIMENTO. OPERAÇÃO POLICIAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. CABIMENTO. COMPLEXIDADE DA INVESTIGAÇÃO. DEFERIMENTO DE MEDIDA INVESTIGATIVA. POSTERIOR DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA. VALIDADE. JUÍZO APARENTE. INOVAÇÃO ARGUMENTATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME. RISCO DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. (...) 2. É possível a prorrogação do prazo de autorização para interceptação telefônica, ainda que sucessivamente, especialmente quando, em razão do número de fatos e investigados, o caso seja dotado de complexidade que demande uma investigação diferenciada, profícua e contínua. (...). 5. Habeas corpus não conhecido, revogando-se a liminar anteriormente deferida.(HC 120027, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 24/11/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-030 DIVULG 17-02-2016 PUBLIC 18-02-2016)
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. POSSIBILIDADE DE O MAGISTRADO INSTRUTOR INDEFERIR AS DILIGÊNCIAS CONSIDERADAS IRRELEVANTES, IMPERTINENTES OU PROTELATÓRIAS. IDENTIFICAÇÃO DOS ENVOLVIDOS POR MEIO DOS DIÁLOGOS INTERCEPTADOS. TRANSCRIÇÃO INTEGRAL DAS ESCUTAS TELEFÔNICAS. DESNECESSIDADE. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. LEGITIMIDADE. 1. É legítimo o indeferimento de diligências requeridas pelas partes, quando consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Inteligência do art. 400, § 1º, do CPP. Precedentes. 2. À luz dos precedentes do STF, o art. 6º, § 1º, da Lei 9.296/1996 deve ser interpretado no sentido de que a transcrição integral é somente de tudo aquilo que seja relevante para esclarecer os fatos da causa penal (cf. Inq 2424, Pleno, DJe de 26-03-2010). 3. A interceptação telefônica é instrumento excepcional e subsidiário à persecução penal, cuja decisão autorizadora deve observar rigorosamente o disposto no art. 5º , XII, da Constituição Federal e na Lei 9.296/1996. Demonstrado que as razões iniciais legitimadoras da interceptação subsistem e o contexto fático delineado pela parte requerente indique a sua necessidade, como único meio de prova, para elucidação do fato criminoso, a jurisprudência desta Corte tem admitido a razoável prorrogação da medida, desde que respeitado o prazo de 15 dias entre cada uma delas. 4. Ordem denegada.(HC 116989, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 03/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-085 DIVULG 07-05-2015 PUBLIC 08-05-2015)
HABEAS CORPUS. QUADRILHA OU BANDO. DISTRIBUIÇÃO E REVENDA CLANDESTINA DE COMBUSTÍVEIS. FALSIDADE IDEOLÓGICA. USO DE DOCUMENTO FALSO. CORRUPÇÃO ATIVA. 1. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS MOTIVADAS E PROPORCIONAIS. IMPRESCINDIBILIDADE PARA O PROSSEGUIMENTO DAS INVESTIGAÇÕES. 2. PRORROGAÇÃO SUPERIOR À TRINTA DIAS. RAZOABILIDADE. INVESTIGAÇÃO COMPLEXA. 3. NULIDADE DO ACÓRDÃO QUE INDEFERIU LIMINARMENTE SEGUNDO HABEAS CORPUS IMPETRADO NA ORIGEM. NÃO OCORRÊNCIA. MERA REITERAÇÃO. TEMAS DETIDAMENTE ANALISADOS. 4. ORDEM DENEGADA. (...) 4. A Lei n.º 9.296/1996 é explícita quanto ao prazo de quinze dias, bem assim quanto à renovação. No entanto, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, essa aparente limitação do prazo para a realização das interceptações telefônicas não constitui óbice à renovação do pedido de monitoramento telefônico por mais de uma vez. Precedentes. 5. No caso, não seria razoável limitar as escutas ao prazo único de trinta dias, pois, a denúncia indica a participação de 58 (cinquenta e oito) réus, e se pauta em um conjunto complexo de relações e de fatos, com a imputação de diversos crimes praticados com permanência, estabilidade e habitualidade. Assim, não poderia ser ela viabilizada senão por meio de uma investigação contínua e dilatada a exigir a interceptação ao longo de diversos períodos de quinze dias. Precedentes. 6. Habeas corpus denegado.
(HC 201001866975, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:29/06/2012 ..DTPB:.)

Desta feita, afasto a nulidade arguida.

2. Da nulidade por ausência de citação nos termos do artigo 396-A do CPP

Alega a defesa de RICHARD MONTOVANELLI que, embora observada a regra do artigo 514 do Código de Processo Penal, o réu RICHARD não fora intimado do recebimento da denúncia e não fora citado para se defender, nos termos do artigo 396-A do Código de Processo Penal, acarretando vício insanável.

Compulsando os autos observo que a denúncia em relação ao apelante RICHARD MONOVANELLI foi recebida em 06/05/2009 (fls. 2.598/2.599 dos autos originais n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia à fl. 03 - vol. 10).

Nesta mesma decisão, o magistrado de primeira instância concedeu a todos os acusados servidores públicos, o prazo de 10 dias para apresentarem defesa preliminar e requerem provas, nos seguintes termos:

(...) Noutro passo, para evitar bis in idem, não faria sentido apresentarem os policiais outra defesa preliminar. Ainda assim, oportunizo a eles o prazo de 10 (dez) dias para eventuais outras alegações, não constantes da defesa anteriormente apresentada, consignando-se que na ausência, as defesas prévias já apresentadas (artigo 514 do CPP) farão as vezes de defesa preliminar (artigo "397-A" do CPP - "sic"), assegurando-se de qualquer forma, aos co-réus o direito de requerem as provas que entenderem pertinentes, nesse prazo.(...)

Antes, porém, determinou-se a notificação do acusado para responder à acusação nos termos do artigo 514 do CPP, o que não se efetivou na primeira tentativa, conforme certificado à fl. 2.668 dos autos originais (n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia à fl. 03 - vol. 10), sendo tal diligência cumprida após o recebimento da denúncia.

A defesa de RICHARD apresentou a petição de fls. 3.170/3.178 (n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia à fl. 03 - vol. 12) cumprindo a determinação.

O processo seguiu até ser anulado por decisão proferida pela 1ª Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no HC 0025563-59.2009.403.0000 (fls. 4.720/4.737 - mídia digital à fl. 03 - volume 17), a partir da defesa preliminar do artigo 396-A do Código de Processo Penal, com a renovação de tal fase processual para todos os denunciados, sem exceção, o que foi determinado pelo Juízo de origem às fls. 4.708/4.708-v dos autos principais (mídia digital de 03 - volume 17).

Devidamente intimada, a defesa de RICHARD MONTOVANELLI não apresentou a defesa escrita nos termos do artigo 396-A do CPP, conforme certificado à fl. 5.406 dos autos originais (n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia digital de 03 - volume 19).

Da análise dos fatos processuais acima indicados, verifico que, de fato, após a notificação para cumprimento do artigo 514 do CPP, deveria ter ocorrido a citação formal do réu RICHARD MONTOVANELLI, o que não ocorreu. Contudo, entendo que o comparecimento do réu devidamente acompanhado de sua defensora aos atos processuais subsequentes, supera o referido vício e não enseja nulidade do feito, pois não vislumbro qualquer prejuízo para a Defesa, nos termos do art. 563 do CPP.

Destaco que a Defesa de RICHARD e o próprio acusado compareceram pessoalmente as audiências para oitiva das testemunhas (fls. 6.118/6.121, fls. 6.135/6.140 dos autos originais - mídia fl. 03 - volume 22; fls. 30/31) e, posteriormente, foi regularmente interrogado (mídia fl. 32), do que se infere teve amplo conhecimento dos fatos que lhe foram imputados.

Curial frisar, também, que a não apresentação de defesa preliminar, nos termos do artigo 396-A do CPP foi opção da Defesa, pois devidamente intimada para tanto.

Pelo exposto, entendo que a finalidade da citação, qual seja, a de cientificar o acusado do teor da denúncia e o seu chamamento ao processo para que possa exercer seu direito de defesa, in casu, foi plenamente alcançada com as notificações e intimações ocorridas.

Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. ADITAMENTO DA DENÚNCIA. CITAÇÃO POR EDITAL. NULIDADES NÃO CONFIGURADAS. AGRAVO DESPROVIDO.
I - É assente nesta Corte Superior de Justiça que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos (precedentes).
II - O reconhecimento da nulidade de ato processual, de acordo com o princípio pas de nullité sans grief e nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal, exige a demonstração do prejuízo sofrido.
As nulidades relativas, ainda, devem ser arguidas no momento oportuno, sob pena de preclusão (precedentes). Na hipótese, as nulidades não foram alegadas oportunamente, bem como não foram comprovados os prejuízos.
III - No presente caso, "Ausente expresso pedido ministerial de arquivamento da investigação em face de agentes, não se tem arquivamento implícito, hoje diretamente inexistente, mas opção de imediata acusação contra os investigados em face de quem já se encontra presente a justa causa, podendo a persecução penal em face dos demais ser ainda desenvolvida por aditamento à denúncia ou em ação penal autônoma" (RHC n. 75.856/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 6/12/2016, Dje de 16/12/2016).
VI - Ademais, "a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que eventual nulidade decorrente da ausência de citação pessoal é sanada em razão do comparecimento do acusado, em cumprimento à requisição, para ser interrogado judicialmente" (HC n. 97.737/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Dje de 24/2/2014). É o caso dos autos, pois, na hipótese, o paciente foi interrogado devidamente, bem como contou com defesa técnica.
Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC 344.227/PE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 14/03/2017, Dje 06/04/2017)
HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO DO RÉU AO ATO DE INTERROGATÓRIO. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE PREVISTA NO ART. 157, § 2º, I, do CP. DESNECESSIDADE DE APREENSÃO E PERÍCIA DA ARMA DE FOGO PARA COMPROVAÇÃO DA POTENCIALIDADE LESIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. REGIME FECHADO. ADEQUAÇÃO.
1. Embora a citação do paciente não tenha ocorrido formalmente, porque não foi localizado, se ele compareceu espontaneamente ao interrogatório judicial, tendo sido nomeado para o referido ato defensor dativo, eventual nulidade encontra-se sanada nos termos do art. 570 do CPP.
2. Segundo entendimento pacificado da Terceira Seção desta Corte, a incidência da majorante prevista no art. 157, § 2º, I, do Código Penal, prescinde da apreensão da arma e do consequente exame pericial.
3. A lesividade da conduta pode ser comprovada por outros meios, como declarações das vítimas ou depoimentos de testemunhas.
4. Fixada a pena-base acima do mínimo legal, portanto, reconhecidas circunstâncias judiciais desfavoráveis previstas no art. 59 do Código Penal, é cabível a imposição de regime fechado ao réu, a teor do disposto no art. 33, § 3º, do mesmo Diploma Legal, ainda que se cuide de reprimenda inferior a 8 (oito) anos de reclusão.
5. Ordem denegada.
(HC 152.829/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 21/08/2012, Dje 29/08/2012) PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. CITAÇÃO. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. PRONÚNCIA. INDÍCIOS. SÚMULA 284 DO STF. SÚMULA 07 DESTA CORTE.
I - Conforme já decidiu esta Corte em caso análogo: "Em que pese não ter havido citação formal do recorrente, a ciência da acusação formulada ocorreu antes do início do interrogatório, nos termos do artigo 186 do Código de Processo Penal, uma vez que o preso foi devidamente requisitado e compareceu ao ato processual acompanhado de seu Defensor constituído." (Resp 1094709/RN, 5ª Turma, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho, Dje de 221/09/2009).
II - Por outro lado, quanto à alegação de que não haveria indícios suficientes de autoria, não bastasse a ausência de indicação de qual dispositivo da legislação federal teria restado malferido, o que atrai a incidência da Súmula 284 do Pretório Excelso, é flagrante o intuito do recorrente de revolvimento de matéria fático probatória neste ponto, o que, a toda evidência, encontra óbice no disposto na Súmula 07 desta Corte.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.
(Resp 1133823/RN, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 19/08/2010, Dje 20/09/2010)

Desta feita, não há nulidade a ser sanada.

Do mérito

Por primeiro, cumpre discorrer sobre a possibilidade ou não da prática da conduta de facilitação de contrabando por policial civil.

Aduzem as Defesas que o delito em questão somente pode ser praticado por funcionário público que tenha "o dever funcional de reprimir o contrabando e descaminho" o que não se insere nas atribuições dos réus, policiais civis.

Não lhes assiste razão.

Aos órgãos de polícia compete, na dicção do artigo 144 da CF, o exercício de atividade que vise a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio.

Aos policiais civis, em específico, também na redação da norma constitucional suprarreferida, ressalvada a competência da União e militar, cabe a função de polícia judiciária que tem por fim a apuração das infrações e penais e de sua autoria.

Neste contexto, delineado pela própria Constituição Federal, qualquer que seja órgão de polícia (polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícia civil, polícia militar e corpo de bombeiros), entendo não ser possível excluir o dever funcional de coibir delitos, seja de competência estadual ou federal, prima facie, pela própria natureza da atividade policial.

Ademais, o presente feito trata da apreensão de máquinas caça-níqueis, atividade indissociável da prática de jogos de azar, delito previsto no artigo 50 da Lei de Contravenções Penais, este, indiscutivelmente, inserido nas atribuições específicas da Polícia Civil, como bem anotado pelo magistrado a quo.

O Superior Tribunal de Justiça, em situação análoga, já se posicionou sobre a possibilidade do policial civil incorrer em delito de facilitação de contrabando, confira-se:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO. ALEGAÇÃO DE QUE POLICIAL CIVIL NÃO PODE INCORRER EM TAL DELITO, SOB O FUNDAMENTO DE QUE A REPRESSÃO DA REFERIDA INFRAÇÃO COMPETE PRECIPUAMENTE À POLÍCIA FEDERAL. TESE QUE DEVE SER REFUTADA. POLÍCIA CIVIL: ÓRGÃO CUJOS AGENTES TÊM O DEVER CONSTITUCIONAL DE EXERCER A PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA E DA INCOLUMIDADE DAS PESSOAS E DO PATRIMÔNIO. RECURSO DESPROVIDO.
1. Se Policial Civil, ao infringir dever funcional, facilita a terceiros a prática do contrabando ou descaminho, incorre no delito do art. 318, do Código Penal, independentemente do interesse da União relativo ao crime previsto no art. 334, do mesmo Estatuto.
2. Explicite-se: é completamente descabida a alegação de que a facilitação não pode ser cometida por Policial Civil, sob o fundamento de que a ele não compete reprimir e investigar infrações cujo processamento e julgamento cabem à Justiça Comum Federal.
3. Ora, a Polícia Civil se trata de órgão cuja finalidade imediata é a de preservar a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio (art. 144, caput, da Constituição da República), não se lhe cabendo omitir de tais deveres gerais ainda que a infração tenha sido cometida em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas.
4. Recurso desprovido.
(RHC 24.998/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2011, DJe 02/02/2012)

Desse modo, perfeita e adequada a imputação do crime de facilitação de contrabando aos réus.

Outrossim, cumpre consignar que a jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região é no sentido de que o crime de facilitação de descaminho/contrabando é de mera conduta, consumando-se independentemente da consumação do descaminho/contrabando. Nesse sentido:

PENAL - PROCESSO PENAL - ART. 318 DO CÓDIGO PENAL - FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO COM INFRAÇÃO DE DEVER FUNCIONAL - ALEGADAS INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO E VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL- PRELIMINARES RECHAÇADAS - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO - VALIDADE -MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO - COMPROVAÇÃO - PENA BEM DOSADA - IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1.De acordo com a peça acusatória, os denunciados, incluído o apelante, participavam da prática de crimes de facilitação de contrabando e descaminho, visando permitir que o Aeroporto Internacional de Guarulhos fosse utilizado como porta de entrada no país de grande quantidade de produtos estrangeiros sem o pagamento dos tributos devidos. (...) 18. O crime de facilitação de contrabando ou descaminho consubstancia delito de mera conduta, em que a simples violação do dever funcional já o configura, independentemente da consumação do delito de contrabando ou descaminho, restando desnecessária a apreensão das mercadorias. (...) 23. Preliminares arguidas rejeitadas. Improvimento do recurso.
(ACR 01040276419954036119, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/10/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO: e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/02/2015.)
PENAL. PROCESSO PENAL. DESCAMINHO. FACILITAÇÃO DE CONTRABANDO OU DESCAMIMNHO. ARTIGOS 334, "CAPUT", E 318, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO. CORRÉU. OCORRÊNCIA. APELO PREJUDICADO. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. (...) 17. O crime de facilitação de contrabando ou descaminho consubstancia delito de mera conduta, em que a simples violação do dever funcional já o configura, independentemente da consumação do delito de contrabando ou descaminho, restando desnecessária a apreensão das mercadorias. (...)
(ACR 00067223120054036119, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/12/2012 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Ainda nessa senda, o entendimento doutrinário, que cito: José Paulo Baltazar Junior, "Crimes Federais", 8a. ed., Livraria do Advogado, p. 175.

Isto posto, cumpre anotar, ainda, que a ação repressiva estatal à prática do contrabando e de jogos de azar culminou em inúmeras apreensões de máquinas caça-níquel em diversos estabelecimentos comerciais na cidade de Jaú e região, destacando-se especialmente o arquivo digital intitulado "2007.61.17.002322-5-APENSOS" - constante da mídia de fl. 03, compilando diversos Autos de Infração e Termo de Apreensão de Guarda Fiscal lavrados, a demonstrar as apreensões dos equipamentos em questão.

Outrossim, registro que vários laudos atestam a origem estrangeira dos componentes das máquinas apreendidas, dentre eles:

- o Laudo de Exame Merceológico nº 1471/2009 - fls. 2.339/2.340 - volume 9 - mídia de fls. 03;

- Laudo nº 4296/08 - apenso 11 - mídia de fls. 13;

- o Laudo de Exame Merceológico n.º 173/2010 - mídia de fls. 03, fls. 5.430/5.432 - volume 19.

Assentadas tais proposições, prossigo analisando, em separado, as condutas atribuídas a cada um dos apelantes.

- Da conduta atribuída a DANILO SÉRGIO GRILLO

A acusação imputa a DANILO SÉRGIO GRILLO a condição de informante de operações policiais àqueles que detinham e exploravam máquinas caça níqueis. Segundo o Ministério Público Federal, DANILO, investigador de polícia civil, mantinha contato frequente com VLADMIR IVANOVAS, integrante da organização criminosa voltada para a exploração de máquinas caça-níqueis na região de Jaú/SP, encabeçada pelo codenunciado HERMÍNIO MASSARO JUNIOR.

Segundo a acusação HERMÍNIO MASSARO JUNIOR gerenciava a montagem de máquinas caça-níqueis em um dos locais alvo das apreensões realizadas em 26/08/2008 e 29/08/2008, bem como adquiria peças importadas para montagem das referidas máquinas e explorava pontos de jogos.

De acordo com a denúncia, o episódio que atestou a participação de DANILO no esquema delituoso ocorreu em 19/08/2008, durante a execução de um mandado de busca e apreensão de máquinas caça-níqueis, diligência esta conduzida por DANILO SÉRGIO GRILLO. Durante a investida policial, VLADIMIR IVANOVAS, vulgo "Vlad", telefonou para o referido investigador de polícia e o comunicou que aquele local era explorado por seu grupo, na tentativa de obstar a apreensão, aduzindo ter esquecido de avisá-lo que o local era explorado pelo grupo delituoso.

Interrogado, DANILO (mídia fl. 32) negou a participação no esquema de exploração de máquinas caça-níqueis. Confirmou, entretanto, ter recebido a ligação de VLADIMIR supracitada, o qual intencionava que as máquinas caça-níqueis não fossem apreendidas. Afirmou, porém, que desconsiderou o telefonema e cumpriu a sua função realizando a apreensão. Negou ter recebido ordens superiores para não proceder a apreensões de máquinas caça-níqueis, bem como de possuir qualquer inimizade dentro e fora da polícia.

Pertinente a transcrição de excertos de seu interrogatório:

(...) No dia dos fatos, eu... da ocorrência, da ligação que eu recebi. Eu tinha a denúncia que eu recebi dia quatorze, e à medida que eu tinha a disponibilidade eu ia cumprir a denúncia (...) nesse dia, eu recebi uma denúncia, dia quatorze e dia dezenove eu fui cumprir, dentro da possibilidade que eu tinha, eu fiz um trabalho antes para constatação da existência de máquinas no local. Existia. E fui pro local. Cheguei no local e encontrei a mulher que impossibilitou a nossa entrada, a franquia da casa. Eu liguei pro meu delegado, comunicando ele que a gente tinha encontrado resistência dela pra gente entrar na casa. Ele falou que eu aguardasse que ele ia elaborar o pedido de busca e logo em seguida ele ia me ligar pra eu descer pra ir buscar o pedido de busca. Mas só que ele deixou claro pra mim, falou: não sai de frente da casa, porque as máquinas podem sair. Tudo bem, ficamos ali, só que neste momento, eu também, me clareou, eu falei; Pô mas se eu fico aqui na frente, de repente, essas máquinas saem pelo fundo aí vai comprometer. Aí eu deixei o pessoal ali e saí pelas laterais para dar uma olhada nos locais para ver se tinha a possibilidade de evasão das máquinas. Neste momento, eu tava em contato com a gente que mora ali na periferia, ali nas proximidades e, também, vendo viatura o pessoal também quer saber o que está se passando. Vieram conversar comigo, neste momento, tocou o telefone. Então o cara falando... o cara falando no telefone... eu pouco ouvi do que ele falou.. eu sei que no frigir dos ovos, o que ele queria que eu deixasse de apreender as máquinas. Isso eu não ia deixar nunca. O que eu não fiz né? A pessoa que poderia ser, poderia ser, não sei, porque eu não... não chequei;...não fiz nenhum...checagem, porque eu não tenho ligação com ninguém, então não tenho que dar satisfação pra ele. Aí foi feita a apreensão das máquinas no local.(...) Quer dizer pouco ouvi do que ele falou... também entendi pouco...então... dei cumprimento. Se eu tivesse ligação com ele, logicamente, eu teria comunicado ele antes. Porque eu fiquei cinco dias com esta denuncia na mão, já tinha levantado o local. E outra não foi só estas máquinas que eu apreendi, eu apreendi praticamente, no DP e auxiliando outras unidades, umas duzentas máquinas. Isso dentro das possibilidades que eu tinha. (...)

Perguntado sobre VLADIMIR, respondeu que o conhecia, que possuía o celular dele em razão de umas ocorrências que eram investigadas e acrescentou:

(...) Conhecia. Conhecia ele da cidade e outra, tá aqui os boletins de ocorrência que ele fez parte, tem dois boletins de ocorrência que ele tem parte direta e dois parte indireta, que eu fui obrigado a manter um relacionamento com ele. Porquê? Um ele era vítima do estelionato, e eu não achei o autor, tem uma ordem de serviço aí inclusive, eu tive que localizar o cidadão e precisei dele. A outra foi uma que ele teve um briga de trânsito e foi apreendida uma "tonfa" e ele ficou na minha cabeça querendo a "tonfa" de volta. E também teve uma outra do filho, que o filho teve na... tá aqui os BO...na boate, o segurança agrediu o menino (...) e ele ficou de me fornecer o nome do autor. Só que como ele trabalhava com segurança, ele não queria se indispor com esse povo ali, porque ele achava que era o pessoal da linha dele e ele não queria se indispor. Mas eu precisava dos dados para fazer o esclarecimento. Mas quer queira quer não o boletim vem despachado pra mim e eu preciso dar uma resposta apara o delegado(...) Tem outro fato também, que teve um roubo, em abril de 2009, 2008 alías que do Osmir Guetta, ele trabalhava lá para o Osmir, lá na fábrica de sapatos como segurança(...) e o sr. Osmir eu tentei várias vezes ligar para ele pra saber, para pegar dados do roubo que teve lá... (...) e eu não conseguia falar com ele, é uma pessoa difícil ocupada e ele (Vladmir) serviu como intermediário (...) o único contato quer eu mantive com ele foi o contato em relação aos boletins de ocorrência e nada mais (...)

Contudo a negativa de DANILO é esvaziada pelos elementos de prova constantes dos autos.

A conversa entre DANILO e VLADMIR foi captada nos autos de interceptação telefônica (000095661.2009.4.03.6117 - mídias fls. 361, 362 e 363), cujos áudio e transcrição encontram-se à mídia acostada à fl. 100. Confira-se o inteiro teor da conversa:

DANILO X VLADIMIR - 19/08/2008 - 16:22:01 (DCRS800608819162.201- mídia fl. 100)
DANILO: Alô.
VLAD: O fio.
DANILO: Oi.
VLAD: É marmita nossa aí viu.
DANILO: Ah da... o rapaz falou que vai passar daqui uns vinte minutos para ver aquele negócio do serviço dele lá.
VLAD: Vai passar daqui vinte minutos? Mas não vai dar tempo né?
DANILO: Por quê?
VLAD: O patrão tá na porta aí [está se referindo ao Delegado de Polícia que está no local também].
DANILO: Ah, vinte minutos ôh patrão; não tem jeito.
VLAD: O pessoal vai sair?
DANILO: Ham?
VLAD: Vai sair daí?
DANILO: Da onde?
VLAD: Da frente.
DANILO: Não.
VLAD: Então, esqueci de falar pra você, é nossa.
DANILO: Ah.
VLAD: É segurança nossa.
DANILO: Falou.
VLAD: Falou então, tchau."

Há outro diálogo captado, na sequência, em que VLADMIR, após falar com o investigador DANILO, telefona para um de seus comparsas (WILLIAM) avisando-o que é DANILO que está à frente daquela diligência e diz para o interlocutor orientar a pessoa que estava na residência alvo da apreensão para ela esconder as máquinas caça-níqueis e conversar diretamente com DANILO:

WILLIAN X VLADIMIR - 19/08/2008 - 16:23:46 (DCRS800608819162.346 - mídia fl. 100)
WILLIAN: Oi?
VLAD: PRETO, liga lá.
WILLIAN: Ãh?
VLAD: Liga lá e fala pra ela deixar bem muquiadinho [escondido] que eles vão fazer uma vista.
WILLIAN: Ela guardou uma dentro do carro véio.
VLAD: Ãh?.
WILLIAN: E uma no guarda-roupa lá no quartinho lá no fundo.
VLAD: Ah, belezinha. É o DANILO que está lá.
WILLIAN: É?
VLAD: É, vai fazer uma vista tá?
WILLIAN: Tá bom, beleza.
VLAD: Não tem medo não.
WILLIAN: Não, ela tá sozinha, aí ela falou: foi até bom que vieram agora que eu tô sozinha.
VLAD: Ãh.
WILLIAN: Porque se vem com a minha mãe aqui, a minha mãe não guarda, não dá nem tempo de fazer nada.
VLAD: Ah tá, e o que ela tá esperando?
WILLIAN: Ela ta esperando porque falaram que iam buscar o mandado pra entrar lá. VLAD: É, mas pra ela deixar entrar, liga lá, não tem porque, não tem nada.
WILLIAN: Eu vou ver com ela.
VLAD: Manda ela falar com o DANILO, manda ela falar com o barbudinho, fala pro barbudinho, fala: entra, não tem nada, a minha mãe não está aqui, a casa não é minha, o que seria? Dá uma de boba.
WILLIAN: Eu vou ligar pra ela.
VLAD: Orienta ela.
PRETO: Falou." (grifo nosso)

No mesmo dia, VLADIMIR e WILLIAM voltam a conversar sobre as máquinas apreendidas na diligência em que participou DANILO. O objeto da conversa é uma chave que seria utilizada para abrir uma das máquinas que continha dinheiro. Imediatamente após esta conversa, VLADMIR volta a falar com DANILO, comunicando-o que estava com a chave em mãos, do que se infere que a intenção era que DANILO retirasse os valores a contidos no interior do equipamento apreendido. Porém, DANILO avisa que não poderia fazê-lo com a expressão: "deu zica aqui". Confira-se o diálogo:

WILLIAN X VLADIMIR - 19/08/2008 (DCRS800608819165.705 - mídia fl. 100)
WILLIAN: Oi?
VLAD: A chave dele é 6513?
WILLIAN: A dele?
VLAD: É.
WILLIAN: Não, é cada um com uma.
VLAD: Cada um com uma, mas nem de cima nada?
WILLIAN: Não.
VLAD: Tá com você a chave aí?
WILLIAN: Tá aqui comigo.
VLAD: Deixa preparado aí, acho que eu vou precisar dela agora.
WILLIAN: Tá.
VLAD: É pra ter "jota" dentro né?.
WILLIAN: Tem, tem pouca coisa, mas tem.
VLAD: É, mas não pode ter nada. Será que achou cara?
WILLIAN: Acho que sim, porque ela falou: WILLIAN tô descendo pra delegacia com a minha filha e desligou rapidinho.
VLAD: Ah, você não falou que ela tinha escondido bem? Será que não escondeu?
WILLIAN: Ela falou que tinha escondido uma dentro do carro velho no fundo e uma no guarda-roupa, acho que abriram o guarda-roupa, ou abriram o carro.
VLAD: Se foi uma só tá bom. Tô vendo aqui, não sai daqui ninguém caraio.
WILLIAN: Cê ta aí na casa dela?
VLAD: Tô perto.
WILLIAN: Mas a viatura tá?
VLAD: Tá parada ainda, parada ainda, só que eu tive com o cara ontem e não falou nada né meu.
WILLIAN: É.
VLAD: Também podia mandar o MAGÚ [advogado GUSTAVO CRESPILHO] lá, lá é só escutar e virar embora.
WILLIAN: Mas por que ta aí parada? Será que está pegando os dados da mãe dela?
VLAD: Vou saber já, já, [trecho incompreensível] deixa separado que eu vou passar pegar aí na frente aí.
WILLIAN: Tá, tchau.
DANILO X VLADIMIR - 19/08/2008 (DCRS800608819170.333 - mídia fl. 100)
DANILO: Alô?
VLAD: Oh fio.
DANILO: Oi.
VLAD: Tá muito ocupado hoje ou não?
DANILO: Ah, um pouco hein.
VLAD: Sabe por que, é o seguinte, eu tô com a chave do corredor aqui pra você ficar.
DANILO: Ãh.
VLAD: Você não vai fazer aquele bico lá, você ta na escala, não ta?
DANILO: Então, eu preciso, dá um tempinho que... deu zica aqui.
VLAD: É?
DANILO: É.
VLAD: Ah, eu tô com a chave aqui.
DANILO: Eu tô com problema aqui, depois eu converso com você aí, vê direito, depois eu vejo com você aí.
VLAD: Você me liga então, tá bom?
DANILO: Tá, falou.
VLAD: Falou.
DANILO: Tá tchau".

Curial destacar, que os dados constantes do Boletim de Ocorrência n. 1716/2008, acostado às fls. 43/44 (fls. 02/03 do apenso 19 - mídia fl. 03), referente a esta apreensão e no qual DANILO aparece como condutor, coadunam-se perfeitamente com o teor das conversas, notadamente, em relação aos locais em que foram escondidas as máquinas:

(...)iniciando as diligências, visando encontrar máquinas caça -níqueis no interior daquela residência, logrou-se encontrara um máquina escondida num quarto nos fundos da casa, dentro de um guarda roupas. Prosseguindo-se as buscas e demonstrando o intuito de ludibriar os policiais que efetuavam as buscas, a segunda máquina apreendida foi encontrada no interior do veículo Passat que se encontrava na garagem daquela casa. (...) sendo que nesta unidade policial foi solicitada à mesma as chaves para se proceder a abertura das referidas, a mesma afirmou não estar em seu poder. Determinou a autoridade que se procedesse a abertura mediante arrombamento das mesmas, sendo que na máquina 1 foi apreendida a quantia de R$ 222,00 em dinheiro e na máquina 02 foi apreendida a quantia de R$ 106,00 também em dinheiro (...)

Por oportuno, consigno que em relação a tais máquinas o Laudo n. 4.296/09, atesta a origem estrangeira do equipamento (fls. 16/17 do apenso 19 - mídia fl. 03).

Do cotejo das transcrições acima, revelou-se a existência de uma relação próxima entre DANILO e VLADIMIR, bem como restou evidenciada a participação de DANILO, ainda que não habitual, no auxílio a atividades ilícitas do grupo ao qual pertencia VLADIMIR, o que somente não ocorreu in casu porque, conforme dito pelo próprio VLADIMIR, foi esquecido de se avisar ao réu DANILO que naquele ponto explorava-se jogos com máquinas caça-níqueis pertencentes ao grupo criminoso.

Nesta esteira, a alegação da defesa de que a efetiva apreensão das máquinas no dia do telefonema interceptado obstaria à prática do delito de facilitação de contrabando por parte de DANILO não prospera.

Em verdade, o conteúdo da interceptação revela claramente que DANILO tinha conhecimento das atividades de VLADIMIR e que o auxiliava, alias, justificativa única para que VLADIMIR telefonasse para DANILO durante o transcorrer da diligência na tentativa de evitar que as máquinas caça-níques, constituídas por peças de origem estrangeira, fossem apreendidas, como o próprio DANILO admitiu em interrogatório e, após a apreensão, para que o policial tentasse reaver a quantidade de dinheiro em espécie contida no interior dos equipamentos.

Nesta senda, como bem pontuou o magistrado sentenciante, DANILO foi informado que o ponto pertencia ao grupo do qual VLADIMIR era integrante e claro seu enredamento com a organização criminosa, ao menos como informante, ao relatar que seria impossível retirar o dinheiro das máquinas apreendidas naquela diligência, relembrando a natureza formal do delito de contrabando, que se consuma ainda que esse não venha a ser efetivado.

Assim, a conduta do increpado, aderindo às ações do grupo de VLADIMIR, tornava mais fácil a prática do contrabando pelo grupo de HERMÍNIO, e, no dia 19.08.08, ao não tomar providência em relação a VLADIMIR (cf. se observa do B.O. de fls. 43/44 - mídia de fls. 03), incorreu em omissão dolosa penalmente relevante (art. 13, §2º do CP).

Impende consignar, também, que conquanto as testemunhas de acusação (mídia digital fl. 03 - n. 0002322-09.2007.403.6117) não tenham se referido especificamente às condutas atribuídas ao réu DANILO e a esta apreensão realizada por ele no dia 19/08/2008, certo é que seus depoimentos são convergentes no sentido de que, à época dos fatos, houve uma grande colocação de caça- níqueis na região de Jaú/SP, que, por vezes, as apreensões foram obstaculizadas pela ocorrência de vazamentos sobre as operações que seriam realizadas e que integrantes da polícia civil, incluindo a cúpula da instituição, estavam envolvidos com a exploração de máquinas caça-níqueis.

Destaco dentre os depoimentos, os prestados pelo Subcomandante do Batalhão da Polícia Militar de Jaú/SP, Airton Troijo, compilado às fls. 258/259, pelo Delegado de Polícia aposentado Roberto Fernandes, conteúdo transcrito às fls. 260-v/261, pelo Investigador de Polícia Antônio Carlos Pavini 256-v/258 e pelo Diretor de Fiscalização da Prefeitura de Jaú, João Fernandes Coelho da Silva, reproduzido à fl. 258.

Transcrevo, por oportuno, os respectivos excertos contidos na r. sentença (fls. 255-v/261):

(...) A testemunha de acusação Antonio Carlos Pavini, ao ser ouvido em Juízo, relatou os fatos da maneira como descritos na denúncia. Afirmou que, até fevereiro do ano de 2006, exerceu o cargo de Investigador de Polícia Chefe da Delegacia Seccional de Jaú, quando foi afastado da Delegacia Seccional em razão de não aderir a um "esquema" de corrupção envolvendo "caça-níqueis", tendo sido substituído por João Luiz Aurélio Calado. Relatou que, em janeiro de 2006 ou dezembro de 2005, Antonio Carlos Piccino Filho, Delegado Seccional, chamou-o em seu gabinete e disse que viria um funcionário do DEINTER de Bauru e que deveria acompanhar essa pessoa para falar com outras duas e que, após esse diálogo, sentariam todos à mesa para conversar. Que questionou Piccino da razão de ter que sair da Seccional, já que, no local, teria a sua sala de investigador chefe e uma sala de reunião, ao que Piccino disse para acompanhar essa pessoa e que no retorno conversariam. Assim que saiu do gabinete, chegou o Agente Policial Alexandre Rossi. Alexandre também não quis dizer o assunto, sendo que ele estava com um veículo Santana descaracterizado. Foram a uma lanchonete, a dois quarteirões da Seccional, próxima à Santa Casa, sendo que Pavini já avistou duas pessoas "engravatadas" no interior do referido estabelecimento. Entraram na lanchonete, Alexandre os apresentou e disse que ficaria na esquina. As duas pessoas identificaram-se como advogados de Rio Claro, sendo um deles Pedro Alcântara Leitão, que o indagou se era o famoso investigador Pavini, ao que respondeu que não e que era somente investigador. Disseram que entrariam na cidade 1000 (mil) máquinas "caça-níqueis", já que estavam instalados mil pontos em diversos estabelecimentos. O investigador Pavini respondeu que se houvesse a instalação, a Polícia Civil iria apreendê-las. Disseram que não seriam apreendidas, porquanto a chefia do Departamento em Bauru e da Seccional daqui estavam no "esquema". Pavini encerrou o assunto, dizendo que não acreditava naquilo e dito que ia se reportar ao Secional. Pediu que lhe desse um cartão de visita, tendo um deles entregue dois cartões. Pavini deixou o local e se dirigiu, a pé, até a Seccional, não entrando no veículo em que estava Alexandre. Pavini disse para o Seccional Piccino estar indignado, que não queria acreditar que as chefias do Departamento e de Jaú estariam no "esquema", sendo que o Delegado Antonio Carlos Piccino Filho disse que era ordem do Diretor. Pavini falou a Piccino que não deveria se deixar levar pela vaidade do cargo, deveria falar não ao Diretor, mas Piccino novamente aduziu que era ordem do Diretor. Pavini entregou um dos cartões ao Seccional para que tomasse as providências que entendesse, mas disse que não iria compactuar com essa situação. Após um ou dois dias, Piccino retirou-lhe do cargo de chefia da Seccional, dizendo que não seria mais chefe em lugar nenhum, transferindo-o para o Terceiro Distrito Policial, acabando por ficar subordinado a um Investigador de 4ª Classe. Foi substituído por João Luiz Aurélio Calado. Aduziu que, antes desses fatos, não havia "caça-níqueis" em Jaú, e que no transcorrer das próximas semanas, meses, adentraram, de uma só vez, 400 (quatrocentas) máquinas em Jaú e na sub-região. Antonio Carlos Pavini mencionou que tomou conhecimento que, no mesmo dia em que foi transferido, fora realizada uma reunião com Piccino e todos os delegados da sede e da sub-região de Jaú, ocasião em que Piccino afirmou que a competência para as apreensões era da Polícia Federal e disse para eles que não deveriam ser apreendidas máquinas "caça-níqueis" por ordem do Diretor. Relatou que em Dois Córregos entraram cerca de 20 (vinte) máquinas e o delegado desta cidade, que discordou dos termos da reunião acima, determinou que fossem apreendidas, sendo que Piccino entrou em contato com ele falando que não estava atendendo à sua determinação de não apreendê-las, tendo o delegado dito que em seu entendimento era jogo de azar e que haveria apreensões. Em seguida, o próprio Diretor Roberto Annibal ligou para José Carlos e questionou sobre as apreensões, tendo José Carlos dito que entendia ser jogo de azar, afirmando que iria haver apreensões. Roberto Annibal finalizou dizendo que José Carlos não iria trabalhar em Bauru enquanto fosse Diretor, pretensão do referido Delegado. Segundo a testemunha, o Delegado José Carlos ligou para o Delegado Edson Maldonado, do Terceiro Distrito Policial, para o qual Pavini havia sido transferido e por isso soube dos fatos relatados no parágrafo anterior. Nesta ocasião, José Carlos afirmou para Edson o que havia ocorrido. Ele pediu um favor para Edson, no sentido de entrar em contato com os demais delegados da sede que ele entraria em contato com os delegados da sub-região, para se unirem no combate aos "caça-níqueis". Edson prontificou-se a ligar, mas não teve respaldo, por medo dos delegados. Então, retornou a ligação para José Carlos dizendo que não houve solidariedade e para ele continuar apreendendo na sua região que iria continuar apreendendo no âmbito do Terceiro Distrito Policial. Esclareceu que o medo era de transferências. Afirmou que o Terceiro Distrito Policial fazia apreensões, mas os outros faziam "vistas grossas", não eram feitas apreensões como deveriam. Pavini declarou, ainda, que, após uma denúncia de que em um estabelecimento havia 04 (quatro) máquinas "caça-níqueis", a pedido do Delegado Edson Maldonado telefonou para a Delegacia Seccional a fim de solicitar uma viatura descaracterizada, tendo sido a ligação atendida por João Luiz, o qual, após comunicar-lhe acerca da apreensão, disse "vocês não estão sabendo que não é para apreender caça-níquel? não vou emprestar a viatura para esta finalidade", tendo João Luiz novamente negado o empréstimo da viatura ao conversar diretamente com o delegado. Afirmou que as máquinas foram apreendidas e transportadas por um veículo pertencente a um particular que estava nas proximidades. A mesma testemunha confirmou ter tomado conhecimento, através de João Fernandes Coelho da Silva, encarregado de fiscalização da Prefeitura Municipal de Jaú, da realização de uma reunião realizada no gabinete do Delegado Seccional Piccino, na qual estaria presente um investigador de polícia, possivelmente o investigador chefe, além de um delegado e de dois funcionários da Prefeitura, sendo que Piccino, falando que o Natal seria gordo para todos eles, teria dito para Coelho permitir a entrada de "caça-níqueis" e para que não realizasse a fiscalização. Segundo Antonio Carlos Pavini, nesta época já haveria cerca de 800 (oitocentos) equipamentos eletrônicos em Jaú. Havia muitas reclamações de donas de casa via imprensa escrita e falada, falando que seus maridos perdiam todo o dinheiro; houve manifestação de repúdio na Câmara Municipal pela não apreensão das máquinas, tendo o Ministério Público Estadual de Jaú requisitado a instauração de inquérito na Seccional. Como esta não tomou providências, o Ministério Público Estadual entrou em contato com o Procurador da República. Com isso, a Polícia Federal efetivou uma operação de apreensão com a participação da Receita Federal e da Polícia Militar, tendo a Polícia Civil ficado de fora, tamanha a sua falta de credibilidade. Isso gerou desconforto aos policiais civis de bem. Na operação foram apreendidas 240 (duzentos e quarenta) máquinas, arma de fogo e numerário.
João Fernandes Coelho da Silva, ouvido em Juízo, disse ter sido Diretor do Departamento de Fiscalização da Prefeitura de Jaú no período de 2001 a 2008. Afirmou que houve um derrame de "caça-níqueis" e uma enxurrada de queixas na Prefeitura em 2004/2005. Confirmou ter sido procurado por dois empresários do ramo dos "caça-níqueis", que afirmavam estarem em um esquema com a Polícia Civil e com alguém da Secretaria Geral da Prefeitura. Afirmou que em Jaú havia cerca de 700 (setecentas) máquinas em dezembro de 2006. Aduziu que, na véspera de Natal, no ano de 2006, houve uma reunião na sala do Delegado Seccional, Antonio Carlos Piccino, na qual estavam presentes Antonio Aparecido Serra, Euclides Salviato, outras pessoas e dois fiscais de posturas que ele havia levado, ocasião em que foi repreendido por Piccino em razão de suas fiscalizações envolvendo as máquinas "caça-níqueis", vez que estava "estragando o Natal do pessoal". João Fernandes disse que a questão do armazenamento das máquinas era uma questão complicada, vez que na Prefeitura não havia local seguro disponível. Segundo a testemunha, os dois fiscais que estavam na reunião ouviram os seus termos, mas devem ter levado um susto, porque se tratam de dois moços ínteão Luiz Aurélio Calado, disse ser um bom policial e o tem como pessoa de sua confiança.
(...)
Airton Troijo afirmou que, no período de 2006/2009, era subcomandante do batalhão da polícia militar em jaú, periodicamente, assumia o comando interino. Disse que, antes do ano de 2006, havia esporadicamente máquinas caça níqueis no Município de jaú/SP. Esclareceu que houve um crescimento gradual do surgimento de máquinas caça-níqueis a partir do ano de 2006, com pico no ano de 2009. Disse ter procurado o Ministério Público Federal para auxiliar no combate as máquinas em razão do vazamento de informações durante as operações realizadas pela polícia militar em conjunto coma Polícia Civil, acabando por frustá-las. Aduziu que, após a reunião no Ministério Público Federal, foram realizadas algumas operações com a polícia federal, mas que também continuaram sendo realizadas com a Polícia Civil. Acrescentou ter tomado conhecimento da existência de um escritório de gerenciamento da atividade de máquians caça níqueis, tendo sido realizada diligência no local com delegado da polícia federal, com apreensão de farto maerial e munição, mas frisou que alguém teria avisado previamente da referida operação. Disse que o porteiro do estabelecimento avisou que Vladimir, que fazia a segurança do local, havia saído anteriormente à diligência. Aduziu que, na mesma data, em uma operação realizada em um barracão, foram apreendidas máquinas que encheram o pátio do quartel até o teto. (...) Em relação a repergunta da defesa, quanto ao vazamento da operação do escritório, disse que houve um vazamento, mas que não tinha afirmado que eteria sido efetivado pela polícia civil (...)
(...)
O Delegado de Polícia aposentado, Roberto Fernandes, aduziu ter trabalhado no DEINTER IV no período de maio a outubro de 2007, quando Roberto de Mello Aníbal era o Diretor, tendo sido Delegado Seccional de Marília nessa época. Confirmou ter elaborado dossiê versando sobre algumas irregularidades perpetradas por alguns policiais da região do DEINTER IV, sendo o próprio diretor, Roberto de Mello Annibal, um dos envolvidos, além do Investigador Chefe Fábio Augusto Casemiro de Abreu, o Agente Policial Alexandre Rossi e, posteriormente, o Delegado Seccional de Jaú, Piccino. Acrescentou que o dossiê faz referência a várias irregularidades e ilicitudes, sendo que, no tocante a "caça-níqueis", disse que alguns contraventores ouvidos por ele relataram o envolvimento dos policiais do DEINTER IV, especificamente Fábio e Alexandre. Aduziu ter filmado e gravado tais conversas que foram feitas em um hotel, para ter uma retaguarda, sem que soubessem. Confirmou ter conversado com Luiz Carlos de Castro, o qual teria feito algumas investigações para o Ministério Público, para a Polícia Militar e para a Polícia Federal, que contou-lhe que a cidade estava abandonada nesse aspecto da criminalidade, que não só havia o problema dos "caça-níqueis", além de outros, bem como que havia a pressão dos policiais referidos, sendo de conhecimento da população. Acrescentou que Rogério Valverde, contraventor de Bauru, procurou-lhe em razão de não aguentar mais "pagar pedágio" (propina), valor mensal variável de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) a R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais), destinados aos policiais Fábio e Alexandre, bem como ao DEINTER IV, na pessoa de Roberto de Mello Annibal, a fim de assegurar a prática da atividade de "caça-níqueis". Por fim, disse que, em razão de um histórico que antecedia suas investigações no sentido de que em Jaú havia uma mobilização de contraventores que aumentou gradativamente, procurou Antonio Carlos Pavini, o qual lhe contou que, em certa ocasião, quando Benedito Valencise ainda era o Delegado Seccional, foi procurado por duas pessoas que lhe ofereceram o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), bem como que, em uma segunda oportunidade, por ordem do Seccional da época, Piccino, foi conversar com os advogados dos contraventores Pedro Alcântara Leitão e outro indivíduo, os quais teriam sido trazidos por uma viatura oficial descaracterizada no trajeto Bauru/Jaú, conduzida por Alexandre Rossi. Que, anteriormente, os indivíduos haviam conversado com Piccino que, posteriormente, teria ordenado que Pavini tivesse uma conversa com eles fora da Delegacia. Disse que, segundo Pavini, os advogados disseram-lhe que seriam colocadas 1.000 (mil) máquinas em Jaú ou na sub-região, tendo Piccino dito que era ordem superior de Roberto de Mello Annibal e que deveria ser cumprida, razão pela qual, ante a recusa, Pavini foi destituído da chefia dos investigadores de Jaú.(...)

Deste modo, considero que há prova seguras, colhidas sob o crivo do contraditório, que o réu DANILO SÉRGIO GRILLO praticou os fatos que lhe foram imputados na inicial, razão pela qual mantenho o decreto condenatório em relação a ele.

b. Da conduta imputada a RICHARD MONTOVANELLI

A acusação imputa a RICHARD MONTOVANELLI, a exemplo do corréu DANILO SÉRGIO GRILLO, o papel de informante de operações policiais a VLADIMIR IVANOVAS, como sobredito e segundo a acusação, integrante da organização criminosa voltada para a exploração de máquinas caça-níqueis na região de Jaú/SP, encabeçada pelo codenunciado HERMÍNIO MASSARO JUNIOR.

De acordo com a denúncia (fl. 197-v - n. 0002322-09.2007.403.6117 - mídia fl. 03), em 28/05/2008, VLADIMIR IVANOVAS teria buscado e obtido de RICHARD MONTOVANELLI informações sobre operações policiais na cidade de Jaú.

Em troca de informações como estas, VLADIMIR teria enviado ao referido investigador, em 17/04/2008, durante um plantão policial, propina ou outro tipo de favorecimento, por meio do advogado e codenunciado GUSTAVO ZANATTO CRESPILHO, mencionada nas conversas telefônicas captadas como as palavras "formigas" e "lanche".

Interrogado, RICHARD negou veementemente as acusações. Informou que as apreensões eram determinadas pelos delegados de polícia, que por trabalhar em plantões policiais não possuía competência para decidir sobre a pertinência ou não de uma apreensão. Admitiu conhecer VLADIMIR IVANOVAS e ter conversado com ele por telefone. Entretanto, negou que o contato tenha sido para obtenção de informações sobre operações policiais, disse que VLADIMIR trabalhava com segurança privada e que o contato era mantido com VLADIMIR para a realização de "bicos" na área de segurança. Negou ter o apelido de "Gordo".

Sobre a entrega de um suposto "lanche", citado em uma das conversas interceptadas entre VLADIMIR e o advogado GUSTAVO CRESPILHO, RICHARD alegou que "nós conhecemos, nós temos contato, não com esse advogado, com todos praticamente da área criminal, que vão lá, acompanham, eles levam até lanche para os presos e não vou negar que teve algumas vezes que eles levaram lanche para nós, pizza pra nós, alguma coisa assim. Mas nada é cobrado. Eles dão gratuitamente. Porque nós não temos horário de saída" .

Entretanto, os diálogos interceptados entre o VLADIMIR e o advogado GUSTAVO CRESPILHO, bem como entre VLADIMIR e o próprio réu RICHARD demonstram uma intimidade entre os dois e que este último recebia dos primeiros "agrados" espúrios. Os diálogos ocorridos em 17/04/2008 apontam nesse sentido.

No primeiro, VALDIMIR pergunta ao advogado GUSTAVO o que ocorreu no plantão policial e se chegou as "formigas" para o investigador RICHARD. Na sequência, o próprio VLADIMIR liga para RICHARD para perguntar se o "lanche" foi entregue. Confiram-se as transcrições dos áudios registrados na mídia de fl. 100:

GUSTAVO X VLADIMIR - 17/04/2008 (DCRS800608417225.223 - mídia fl. 100)
VLAD: Fala Promessa.
GUSTAVO: Ôh, Promessa.
VLAD: Oi.
GUSTAVO: Liga pro seu amigo lá, conversinha
VLAD: Ham?
GUSTAVO: Pergunta se chegou as formigas para ele.
VLAD: Ham?
GUSTAVO: Pergunta se chegou com formiga.
VLAD: Ah, mandou?
GUSTAVO: Mandei, ele sabe até os... ham?
VLAD: Acabei de sair de lá caraio.
GUSTAVO: Ah, eu mandei, eu mandei, eu mandei no Plantão e mandei lá.
VLAD: Tá.
GUSTAVO: Acabei de sair do Plantão.
VLAD: É, quem que foi?.
GUSTAVO: O WILIAN CALOBRISI, mas já saiu e pegaram um tal de ELIAS, suspeito de ser o financiador das casas lotéricas.
VLAD: Ah, beleza, amanhã nós conversa, vou ligar pra ele.
GUSTAVO: Liga para ele e fala pra ele ligar para mim depois.
VLAD: Falou.
GUSTAVO: Agradecendo.
VLAD: [incompreensível].
GUSTAVO: Tá, tchau.
VLAD: Tchau.
RICHARD X VLADIMIR - 17/04/2008 (DCRS800608417225.416 - mídia fl. 100)
RICHARD: Alô.
VLAD: Gordo
RICHARD: Oba.
VLAD: Chegou o lanche pra você aí?
RICHARD: Chegou.
VLAD: [risos], o promessa [risos].
RICHARD: Chegou, promessa cumprida.
VLAD: [risos], belezinha então.
RICHARD: Valeu.
VLAD: Falou fio, tchau.
RICHARD: Falou, tchau."

Em outro diálogo ocorrido em 28/05/2008, RICHARD e VLADIMIR marcam um encontro. Na sequência VLADIMIR entra em contato com HERMÍNIO (o proprietário das maquinas caça-níqueis) e diz que conversará com RICHARD, chamado de "GORDO" pelos dois, para saber a respeito das diligências policiais. Também comentam que há "gente de fora", referindo-se aos policiais da cidade de Bauru.

RICHARD X VLADIMIR - 28/05/2008 (DCRS800608528163.857 - mídia fl. 100)
RICHARD: Alô.
VLAD: GORDO.
RICHARD: Ôh!
VLAD: Eu tô vendo sua escala aqui, você tá à noite aonde?
RICHARD: Hoje?
VLAD: É.
RICHARD: Hoje na dona RITA.
VLAD: Ah bom, porque eu não achei você na escala aqui, você entendeu?
RICHARD: É, eu estou na dona RITA.
VLAD: Tá bom então.
RICHARD: O dia que eu tô em branco aí é que eu tô em casa, por quê?
VLAD: Tá, [risos].
RICHARD: Por quê?
VLAD: Aguarda eu chegar aí.
RICHARD: Por quê?
VLAD: Aguarda eu chegar aí então.
RICHARD: Tá, você chega que horas aqui?
VLAD: Não, não, eu saio daqui cinco e meia.
RICHARD: Beleza, não demora muito que eu quero voar pra casa pra dormir rapaz, eu tô, passei já da...
VLAD: Já ta passado.
RICHARD: Mais eu espero você nego, nossa senhora.
VLAD: Espera eu chegar, tá bom?.
RICHARD: Tá bom.
VLAD: Falou, tchau.
RICHARD: Tchau.

RICHARD X VLADIMIR - 28/05/2008 (DCRS800608528164.145 - mídia fl. 100)
VLAD: Oi.
HERMÍNIO: Viu fio.
VLAD: Oi.
HERMÍNIO: O HERRERA também está lá e ele também foi no BAIXO.
VLAD: Eu sei filho disso, eu sei, e o pessoal foi lá buscar, por isso que eu estou levantando aqui.
HERMÍNIO: [incompreensível].
VLAD: Entendeu?
HERMÍNIO: Certo.
VLAD: Tá?
HERMÍNIO: Está jóia então.
VLAD: É esses que chegaram, catou falou vamos, eles não teve que fazer nada.
HERMÍNIO: [incompreensível].
VLAD: É isso que eu quero saber quem que está de Bauru aí.
HERMÍNIO: Segundo o povo lá, diz que não.
VLAD: É, não, não, eu sei que tem já gente de fora porque estão em outros lugares aqui também, entendeu?
HERMÍNIO: Certo.
VLAD: Você lembra daquela coisa que eu te falei, ôh esta semana vem gente de fora.
HERMÍNIO: Certo.
VLAD: Então eles estão aqui, estão aqui, pegaram, chegaram lá e falaram: vem, sai todo mundo vamos agora, eles nem sabiam o que era, acabei de falar com o GORDO agora.
HERMÍNIO: Ham?
VLAD: E as cinco e, cinco e meia eu estou sentado lá para saber o que está acontecendo
HERMÍNIO: Tá jóia então.
VLAD: Tá bom? Aí eu já dou, já ligo e te dou a resposta, agüenta aí.
HERMÍNIO: Tá jóia.
VLAD: Falou, tchau.
HERMÍNIO: Valeu, falou, tchau, tchau."

Infere-se, portanto, que RICHARD também mantinha bom relacionamento com VLADIMIR, relacionamento este que extrapolava o simples contato que RICHARD alegou ter com VLADIMIR, em interrogatório, em razão de supostamente prestar serviços esporádicos na área de segurança privada.

Na verdade, dessume-se do contexto fático delineado nos autos que VLADIMIR trabalhava para os donos das máquinas caça níqueis e obtinha informações sobre as apreensões que seriam feitas pela policia civil de Jaú com os investigadores RICHARD e DANILO, aos quais oferecia, além de "agrados", como flagrado na conversa interceptada acima mencionada, serviços esporádicos na área de segurança, como afirmado pelos próprios réus em interrogatório.

Deste modo, não encontra respaldo nos autos a assertiva de RICHARD de que desconhecia que VLADIMIR estava envolvido com a exploração de caça-níqueis.

Como já assinalado anteriormente, os testemunhos de acusação também esvaziam a versão apresentada por RICHARD em interrogatório, pelos mesmos motivos declinados anteriormente em relação ao corréu DANILO: o aumento exponencial de máquinas caça-níqueis, à época, na região de Jaú/SP, vazamentos sobre a realização de operações policiais conjuntas para apreensão de máquinas caça-níqueis quando havia participação da polícia civil e interferência da cúpula da polícia civil nas apreensões realizadas na região.

De outro turno, não se olvide que as testemunhas de defesa e algumas de acusação referiram-se tanto ao réu RICHARD como ao réu DANILO como profissionais capacitados e eficientes, entretanto, como bem pontuou o magistrado sentenciante, tais referências não elidem a prática do delito de facilitação de contrabando.

A exemplo de DANILO, não há dúvidas que RICHARD também tinha ciência do envolvimento de VLADIMIR com caça níqueis e, ao menos em relação a este, infringiu dever funcional ao prestar-lhe auxílio, caracterizando o delito em questão.

Por fim, aduz a defesa que a conduta de RICHARD é atípica, pois nada teria ocorrido no plantão policial e assim "o acusado não poderia ter feito tábula rasa a uma prática delitiva, posto que a mesma não se opera, por absoluta impropriedade do meio, o plantão policial."

De fato, a denúncia não se refere a eventual apreensão de máquina com componentes eletrônicos de origem estrangeira de internação proibida no país durante aquele plantão policial. Contudo, a denúncia registra que durante diálogo captado entre VLADIMIR e o advogado GUSTAVO há referência à entrega de favorecimento ao correú RICHARD durante o período em que ele estava trabalhando, demonstrado a troca de favores existente entre eles, o que poderia ter ocorrido em qualquer momento, independentemente do plantão policial, pois para caracterização do delito exige-se infringência a dever funcional e não que a prática do delito ocorra no local de trabalho. Ademais, no monitoramento telefônico entre VLADIMIR e HERMÍNIO há menção que policiais de Bauru estariam no local para realizações de apreensões das máquinas e que isso seria conferido com o o acusado RICHARD.

Portanto, desarrazoada tal alegação.

Por todo o exposto, entendo que não há motivo para a reforma da sentença. Assim, mantenho o decreto condenatória, também, em relação ao réu RICHARD MONTOVANELLI.

Passo a dosimetria das penas, embora não tenha sido objeto dos recursos.

Dosimetria

Na primeira fase, o magistrado de primeira instância fixou a pena-base, para cada um dos réus, em seu mínimo legal, 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias multa, considerando inexistentes circunstâncias judiciais desfavoráveis e a tornou definitiva, ante a ausência de circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como de causas de aumento e diminuição, o que não merece reparo.

Irretorquível a fixação do regime inicial de cumprimento de pena no aberto e a fixação do valor unitário mínimo legal para a pena de multa.

Igualmente irreparável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, também, para cada um os condenados, consistentes em prestação de serviços à comunidade, na forma a ser especificada pelo Juízo da Execução, pelo mesmo prazo da pena corporal e prestação pecuniária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a qual, reverto, de ofício, em favor da União.

Mantidos os demais termos da sentença.

Por esses fundamentos, afasto as preliminares arguidas, nego provimento aos recursos e reverto, de ofício, as prestações pecuniárias substitutivas em favor da União.

Nos termos do entendimento firmado pelo STF no HC 126.292 e ADcs 43 e 44, expeçam-se guias de execução para imediato cumprimento das penas restritivas de direito, encaminhando-as ao Juízo da Execução.

É o voto.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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