D.E. Publicado em 04/12/2017 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações criminais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelações criminais interpostas contra a sentença que julgou procedente a denúncia e condenou Ovídio Pereira, Alex Sandro e Matheus Freitas a 13 (treze) anos, 7 (sete) meses e 10 (dez) dias de reclusão, regime inicial fechado, e a 1.360 (mil, trezentos e sessenta) dias-multa, regime inicial fechado, todos pelo art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, da Lei n. 11.343/06.
O feito foi desmembrado em relação a Roberto Nunes, que se encontra em local incerto e não sabido (fls. 401/453).
Matheus Freitas recorre e alega o quanto segue:
a) a sentença se baseou tão somente em escutas telefônicas realizadas durante a Operação Cristal;
b) não foi apreendida nenhuma droga nem realizados exames de corpo de delito e toxicológico;
c) não se fez prova do transporte da droga do Paraguai a Sorocaba (SP);
d) a mera transcrição de diálogos entre Juninho e Matero, fazendo menção a "Tilápia", em trechos desconexos entre si, não comprovam o efetivo transporte da droga;
e) não foi provada a autoria delitiva, sendo que o apelante não responde pelos apelidos de CABO ou TILÁPIA;
f) os diálogos interceptados não são claros o suficiente para identificar quem são as pessoas envolvidas, não comprovam o efetivo transporte nem o envolvimento da apelante com a prática delitiva;
g) a dosimetria da pena é equivocada e deve ser revista, tendo em vista que as circunstâncias judiciais são favoráveis ao apelante;
h) a gravidade abstrata do delito não é suficiente para a majoração da pena;
i) não foi provada a transnacionalidade do crime;
j) o apelante faz jus à aplicação do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 (fls. 496/524).
Alex Sandro apela com os seguintes argumentos:
a) não houve apreensão de drogas em poder do apelante e não foi provada a autoria delitiva;
b) o Policial Federal Araldo de Lima Bogado, em depoimento, informou que não realizou nenhum trabalho de campo, como também não participou de apreensão de drogas; não soube declinar quem efetuou a apreensão do caminhão contendo entorpecentes nem os nomes dos agentes que realizaram as escutas telefônicas e não se recorda se foi apurado a quem se destinava a droga apreendida;
c) a fixação da pena é teratológica (fls. 530/533).
Ovídio também apelou e alegou o quanto segue:
a) o apelante negou veementemente a autoria delitiva e esclareceu que conhecia tão somente Alex Sandro, seu irmão;
b) nada de ilícito foi apreendido em seu poder ou nos locais onde os policiais realizaram diligências;
c) o apelante explicou que usava o número de telefone 15 99849-9067, que não usava o aparelho da marca Blackberry e que o número 15 99815-8910 pertencia à sua esposa;
d) o telefone objeto da interceptação telefônica não estava em nome do apelante e sequer foi apreendido; a droga não era transportada pelo apelante e Ovídio não estava no veículo;
e) o conjunto probatório, consistente no depoimento do agente de polícia federal não permite concluir a participação do réu na empreitada criminosa, em que pese o entendimento do Ministério Público Federal;
f) a pena fixada é excessiva e teratológica (fls. 535/539).
Contrarrazões às fls. 550/553.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento das apelações (fls. 557/560).
Feito sujeito à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
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VOTO
Denúncia. Ovídio Pereira, Alex Sandro Carvalho, conhecido por "Zica", Roberto Nunes, conhecido por "Cabo" ou "PX" e Matheus Freitas, conhecido por "Mineiro", foram denunciados por tráfico internacional de drogas, como segue:
O feito foi desmembrado em relação a Roberto Nunes Portillo, o qual não foi localizado para responder à ação penal nem constituiu defensor (fl. 451).
Materialidade. Tráfico de drogas. Materialidade. Laudo. Prova indireta. Reformulo meu entendimento para admitir que, em casos excepcionais, a ausência de laudo pericial não implica necessariamente a insuficiência de prova da materialidade do crime de tráfico de drogas, que pode ser demonstrada por outros meios probatórios constantes dos autos, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça:
Do caso dos autos. Ao contrário do que alegam as defesas dos réus, a materialidade do delito de tráfico transnacional de droga foi provada por meio de interceptação telefônica, de mensagens de texto e de imagens da droga trocadas entre os criminosos por meio de telefones celulares, pelas quais é possível acompanhar o carregamento e o transporte da maconha, bem como a negociação que envolveu a prática do delito (fls. 5/20), da digitalização e gravação dos autos do pedido de interceptação das comunicações telefônicas n. 0007813-71.2014.403.6110, da Representação Criminal n. 0004240-88.2015.403.6110, do IPL n. 0006699-97.2014.403.6110 (fl. 95) e das gravações contidas no apenso I, volume I.
Tais elementos são aptos a fazer a prova da materialidade, sendo prescindível, no caso, o exame de corpo de delito.
Anoto que a droga não foi apreendida daí a impossibilidade do exame pericial. Todavia, restou provado o transporte da droga, sua importação, condutas previstas no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, o que é suficiente para a comprovação de que o delito ocorreu e de que a droga chegou ao município de Sorocaba (SP), conforme planejado pela organização criminosa.
Autoria. A autoria restou devidamente provada.
Ovídio Pereira, conhecido como Juninho, entre outros apelidos, foi ouvido em 11.06.15 no Inquérito Policial n. 881/2014, que iniciou a investigação sobre uma organização criminosa que envolve os réus, especializada na importação de maconha do Paraguai para a distribuição no interior do Estado de São Paulo.
O réu negou ter o apelido de "Terrorista". Ovídio mencionou que tinha apenas um relacionamento com o irmão Alex Sandro, desconhecendo seus apelidos, como o de "Matero". Negou conhecer Matheus Freitas, vulgo "Tilápia" ou "Mineiro", entre outros. Nunca ouviu falar de Roberto Nunes Portillo, vulgo "Cabo" ou "PX". Negou seu envolvimento com a compra e venda de entorpecentes. Permaneceu fugitivo durante 6 meses em 2009 por acusação de tráfico de drogas. Negou ter relação com a apreensão de 973kg (novecentos e setenta e três quilogramas de maconha) em Pedro Juan Caballero (PY), em fevereiro de 2015, na qual seu irmão Alex comentou ter realizado anotações nos tabletes de maconha. Negou também seu envolvimento com a apreensão de 740kg (setecentos e quarenta quilogramas) de maconha, ocorrida em 25.03.15, bem como com outros transportes de droga. Negou ter ido de carro para Mato Grosso e para o Paraguai, não se recordando da placa de um veículo Toyota Hilux, do qual já teve posse. Negou utilizar aparelho celular Blackberry, o qual não foi encontrado em sua residência, dado que somente utiliza o aparelho celular n. 15 99849-9067. Os demais aparelhos de celular apreendidos em sua residência vieram dentro de veículos que compra e vende, tendo-os deixado em casa para sua filha brincar. Foram apreendidos outros aparelhos telefônicos, que são da empresa em que trabalha, a STOP CAR, na Av. Independência, n. 5.290, em Sorocaba. Voltou a trabalhar para essa empresa, porém sem registro. Foi apreendida uma chave de um veículo Corolla em sua residência, que disse ter sido vendido a Emeraldo, de quem não tem dados de identificação. Nada sabe sobre os fatos dos presentes autos. (fls. 25/29).
Ovídio continuou a negar em Juízo seu envolvimento com várias importações de droga investigadas na denominada Operação Cristal (mídia de fl. 287).
Os demais réus foram citados por edital, constituíram defensores, mas não compareceram em Juízo para serem interrogados.
Araldo de Lima, Agente de Polícia Federal, disse quanto ao crime tratado nesta ação penal que era responsável pela análise de informações na Operação Cristal; que associaram os réus aos detentores dos aparelhos telefônicos, objeto da denúncia, por meio de diligência local. Mencionou que Ovídio saiu de sua loja, viu os policiais na proximidade, e transmitiu tal fato por mensagem de texto em seu telefone celular. O réu foi fotografado em sua loja por policiais. Foram investigados veículos que saíram de propriedades do réu, sendo que sua identificação se deu por meio de vigilância, já que os réus se comunicavam por apelidos (mídia de fl. 287).
O relato com imagens do Ovídio, no sentido de que o réu percebeu a vigilância policial nas proximidades de seu estabelecimento comercial, fato confirmado pelas mensagens de texto captadas, a evidenciar que o réu se tratava do indivíduo denunciado anonimamente como sendo Juninho, traficante na região de Sorocaba, consta da seguinte diligência policial:
Os depoimentos das testemunhas de defesa não tiveram o condão de enfraquecer as provas acusatórias.
De fato, conforme é possível constatar das provas reunidas no feito, notadamente dos diálogos mantidos entre os réus por meio de mensagens de texto, objeto de interceptação telefônica, é possível acompanhar todo o procedimento que envolveu a negociação da droga proveniente do Paraguai, inicialmente 1.000kg (mil quilogramas) de maconha a ser dividida entre os irmãos Ovídio e Alex Sandro.
Conforme se observa dos relatórios da investigação (fl. 5/20), do relatório da Autoridade Policial (fls. 38/64), dos eventos investigados e descritos na Representação Policial do apenso I, volume I, os réus dolosamente se conluiaram para a importação de maconha do Paraguai e posterior distribuição no País.
A prova da materialidade e da coautoria delitiva se baseou na interceptação de dados dos celulares dos réus, cujo conteúdo é de grande relevância para o juízo condenatório, na medida em que foram encontradas fotografias da droga acondicionada no veículo que a recebeu e que a transportou ao País, trocadas entre os réus. Veja-se que os envolvidos somente se tratavam por apelidos, seguidamente substituídos por outros, a exemplo do que ocorria com os números dos telefones celulares, de modo a dificultar qualquer investigação sobre o carregamento, o transporte e a forma de pagamento da droga.
No presente caso, é possível constatar as trocas de mensagens inicialmente gravadas em 21.01.15 entre Ovídio, vulgo Juninho, e seu irmão Alex Sandro, vulgo Matero. O transporte foi realizado pelo réu Matheus, conhecido por Tilápia, tendo a droga sido adquirida do paraguaio Roberto Portillo, vulgo Cabo.
Dos diálogos se infere que a droga seria adquirida por R$130.000,00 (cento e trinta mil reais), sendo que uma parte seria paga por meio da entrega de um veículo no valor de R$70.000,00 (setenta mil reais).
Matero enviou a Juninho uma fotografia de pequena parte da maconha embalada, a qual foi transmitida a um indivíduo de alcunha Bandoleiro, com o objetivo de divulgar a qualidade da droga para a venda (fls. 7, 8).
O carregamento do veículo com a droga foi fotografado por Matero e enviado a Juninho (fls. 10,11), a evidenciar a prática delitiva. Os irmãos conversam no mesmo dia sobre a quantidade da droga que iria ser transportada (1.000kg) por Tilápia, identificado como sendo Matheus (fls. 14/16). Este realiza a entrega da droga, conforme se constata das mensagens trocadas entre Matero e Juninho (fls. 16/18).
Conforme se constata das mensagens entre os irmãos em 22.01.15, foi transportado aproximadamente 800kg (oitocentos quilogramas) de maconha, metade para cada um. Consta, outrossim, que eles teriam recebido 21kg (vinte e um quilogramas) de cocaína na mesma entrega, droga que nomearam de "cristal" (fls. 19/20).
Há, inclusive, referências à negociação de outros carregamentos de droga vindos do Paraguai, a indicar a existência, de fato, de uma organização criminosa voltada ao cometimento do tráfico internacional de drogas.
Ovídio foi preso em razão dos fatos, sendo que seu irmão Alex Sandro tomou conhecimento da prisão e se evadiu, conforme se constata dos diálogos mantidos por Alex com outro indivíduo (fls. 56/58).
Matheus Freitas também se encontra foragido, sendo que apurado que se dedicava não somente ao transporte da droga mas também à sua comercialização, atuando como comprador (fls. 59/63). O envolvimento do réu foi corroborado pelas declarações de outro criminoso, Welisson, ouvido no mesmo inquérito policial em razão da Operação Cristal:
Pelo que se observa da tabela exposta na sentença condenatória, foram descobertas várias ações criminosas com participação dos réus, visando o trafico internacional de drogas. O depoente Welisson foi denunciado juntamente com Ovídio, Alex Sandro e Matheus na Ação Penal n. 0006699-97.2014.403.6110 (fls. 406/408).
A alegação de Ovídio de que não usava os celulares objeto das interceptações telefônicas e de que o apelido Juninho era usado somente no âmbito familiar não foi provada, sendo, ao contrário, infirmada pelas provas dos autos.
Com efeito, se extrai da prova testemunhal que o grupo criminoso trocava frequentemente os números dos aparelhos celulares para evitar interceptações telefônicas e essa troca se estendia aos apelidos, tudo para dificultar as investigações policiais e evitar que os crimes fossem descobertos.
É sintomática, nesse sentido, a descoberta de vários aparelhos celulares na residência de Ovídio (8 aparelhos de celular e 9 unidades de cartões com chips, fl. 95) e o uso de apelidos distintos durante a fase de interceptação telefônica (como Patati e Terrorista) entre o réu e seu irmão Alex Sandro.
Assim, provadas a materialidade e autoria criminosa, a manutenção da condenação é de rigor.
Dosimetria. Ovídio, Alex Sandro e Matheus foram condenados pelo crime do art. 33, caput, da Lei n. 11.434/06.
Foram consideradas desfavoravelmente aos acusados para a fixação da pena-base a natureza e a quantidade da droga (800kg de maconha) transportada, a revelar expressiva gravidade e reprovabilidade da conduta, bem como seu potencial ofensivo. Considerou-se ainda como negativas a personalidade e a conduta social dos agentes para majorar as penas.
Ovídio e Alex Sandro respondem a outros processos criminais relacionados com o tráfico de drogas (fls. 34, 91/94, 81/92 da folha de antecedentes). Ambos já condenados em primeiro grau na Ação Penal n. 0006699-97.2014.403.6110 (Operação Cristal) e Ovídio na Ação Penal n. 0005532-11.2015.403.6110. Matheus responde a uma ação penal (fl. 444 da sentença). Tais fatos foram considerados como indicativos da dedicação à atividades ilícitas.
As penas-base foram fixadas em 11 (onze) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 1.166 (mil, cento e sessenta e seis) dias-multa.
Ausentes atenuantes e agravantes.
As penas foram majoradas em 1/6 (um sexto) em face da transnacionalidade do crime e tornadas definitivas em 13 (treze) anos, 7 (sete) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 1.360 (mil, trezentos e sessenta dias-multa).
O valor do dia-multa foi fixado em 1/10 (um dez avos) do salário mínimo para Ovídio e em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo para Matheus e Alex Sandro, todos com atualização monetária.
Foi fixado o regime inicial fechado de cumprimento de pena e obstada a substituição das penas privativas por restritivas de direito.
Os réus recorrem da dosimetria das penas, ao argumento de que excessiva e teratológica.
Em que pese a irresignação, devem ser mantidas as penas fixadas na sentença, as quais foram fundamentadamente majoradas.
Com efeito, a expressiva quantidade da droga importada do Paraguai (800kg de maconha) e a extrema potencialidade lesiva da conduta, na medida em que o entorpecente não foi apreendido, e certamente vendido a outros traficantes e usuários diretos da droga, autorizam a elevação das penas conforme sentenciado pelo Juízo a quo.
Os elementos dos autos dão conta de uma estruturada organização criminosa, altamente sofisticada e bem sucedida, que realiza sucessivos carregamentos de grande quantidade de droga ao País, sendo que dois réus ainda não foram presos em razão da traficância internacional.
O modus operandi é extremamente grave, inclusive pelo cometimento de outros delitos, como o roubo de veículos para o pagamento da compra do entorpecente. Há justificativa, portanto, para o aumento das penas.
Assiste razão, por fim, ao Juízo a quo ao não aplicar o § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 para reduzir as penas, dado os elementos de que os réus integram organização criminosa e se dedicam ao tráfico internacional.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO às apelações.
É o voto.
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